h | Artes, Letras e IdeiasO ano da vida de Ricardo Reis Amélia Vieira - 7 Jan 20197 Jan 2019 [dropcap]C[/dropcap]ansados da morte que é sempre a mesma, vem em qualquer instante, é certa, e nunca consentida, queiramos numa vertical tendência inaugural recriar um ciclo de renascimentos sem par ( o par atrasa o crescimento) e refazer as coisas, projetar os cultos, fugir da rota, atravessar os mares. Que de todas as matérias que trabalhamos haja uma super-matéria que nos trabalhe a nós, vítimas de corrompidas quedas e penosas dores em obscura forma. Que saibamos passar, pois que só passando se atravessa, que os caminhos tanto podem ser experiências como círculos fechados, os caminhos que vamos talhando são a geografia do nosso entendimento e, claro, serão entendíveis todas as marchas do processo, se com ele, formos de nós mesmos o Bode do deserto, por um lado, e o Expiatório, pelo outro. A matéria legítima da vida é um sopro. Assim estabelecido o pacto todos os caminhos são possíveis, todas as direções destinos, todas as casas estalagens, pois nos guia a fluidez de imponderáveis razões. Uma vida nunca pode ser julgada e não seremos certamente nós a poder fazê-lo, apenas servimos de ajuda uns aos outros na marcha do tempo, e, protelamos a memória como a melhor fonte de recompensa. Nunca devemos ser rápidos a lembrar. Pois que Ricardo Reis era um outro que em outro vivia, e cada “si” um outro sim que em si se sente, quem são, quem somos, todos nós em romagem decrescente para o nada, pois que mais Anos, mais vida descontada?! Coisa nova criada, somos outros, estamos numa rota galáctica e lá para baixo ficam as Nações. Esta certeza faz vida! O instante protege os sonhos e quase tocamos nas suas caudas que olhos visionários trouxeram entre os escuros cinzentos das eras industriais; homens juntos por uma causa exalam ódios a que chamam política, homens livres exultam propostas e chamam-lhe poema, nestas curvaturas está agora o tempo que vem fechando postigos, cansados, inúteis. Este Ano foi o Ano do Cão, o Ano que aí vem dar-nos-á o do Porco, que está sempre representado em forma de mealheiro o que denota que é Ano associado à riqueza, porém, nem Porcos nem Cães são um alter ego predileto, mas, reconheço a boa e leal colaboração do Cão que faz do sacrifício a sua vitória. Nós, resumimos tudo em quase nada: se não ritualizamos também não nos ocupamos de façanhas inexplicáveis, de modo, que condensamos no Natal todos os propósitos da vacuidade das Festas. E talvez não seja em vão fazer renascer o nosso tão querido latinista imaginário, que, bem vistas as coisas, não teve data de morte, sabendo-se apenas que nasceu a 19, e chegou ao Brasil em 1919. Por isso, neste Ano, ir-se-á provar que não só não morreu como continua vivo em 2019, o que dita uma atmosfera de esperança de vida para todos nós. Mas, a criatura, suplanta está claro o criador, e só a criação da criatura de ora em diante será lembrada como uma outra natureza ( natureza outra). Por qual, dezanove simboliza o Sol, brilha agora bons augúrios para seres construídos nas cabeças de cada um, e assim, cada um terá à disposição várias delas que consubstanciarão a própria Hidra que os representará. Proeminentes desígnios esperam dar vida aos condenados bem como animar a robótica de forma a deixar descansar este humano que já longe vai e grave anda na razão da sua natureza. Quanto a mim, propus-me ressuscitar os mortos, já que os vivos não se encontram em bom estado experimental para práticas futuras; e não é que logo encontro o nosso querido Ricardo? – Eu sentia que andava alguém aqui nos meus umbrais, mas até pensei que fosse de novo o Corvo, só quando vi o Ricardo é que disse: não morreu! – Ricardo, não deixes que te matem. E assim foi, agora que partilho uma experiência paranormal e recupero um helenista algo estranho ao contacto direto com os deuses- nós, os Bodes do Deserto – aqueles que foram para lá durante mil anos escapando à morte, vos saudamos do cimo da nossa montanha. Quando nos encontrarmos de novo por aqui será um recomeço bem vindo pois que da morte, o da Expiação nos foi livrando, e sempre assim será enquanto houver em cada um de nós tal entendimento. Recomendai-vos uns aos outros como epifenómenos em vias de extinção, e recuperai as oferendas de um Deus benigno que vos foi desconhecido até ao limiar do abandono. O Novo Ano transluz de coisas tais, que é preciso não ter evoluído para Ciclope e ver em todas as direções a «Grande Marcha». Prósperos os que encontrarem Ricardo Reis. O «Homem (lido)» e relido, encontrou-o e continua. Por que não fareis vós a mesma coisa? Ponho na altiva mente o fixo esforço Da altura, e à sorte deixo, E as suas leis, o verso; Que, quando é alto e régio o pensamento, Súbdita a frase o busca E o escravo ritmo o serve. Um belo Ano então.