h | Artes, Letras e IdeiasAvenida Vasco da Gama José Simões Morais - 8 Jun 2018 [dropcap style=’circle’] I [/dropcap] naugurada às 5 e meia da tarde de 20 de Maio de 1898, quatrocentos anos depois do dia da chegada a Calicute da primeira armada portuguesa à Índia, a Avenida Vasco da Gama fora planeada pelo então Director das Obras Públicas, Eng. Augusto Abreu Nunes. Encontra-se no sopé do Monte da Guia e tem 32.500 m², tornando-se o segundo jardim público de Macau e a primeira ampla avenida da cidade. Em alameda, com um comprimento na sua maior extensão de 500 metros e largura média de 65 metros, situa-se entre a Estrada da Flora e a da Vitória e desde a Calçada do Gaio até ao Quartel da Flora. Abreu Nunes quando a descreve no início do seu texto prolonga-a, “… a NE. da cidade, na encosta dos outeiros da Guia e da Flora, entre a estrada da Flora e a da Victoria, estendendo-se desde a Calçada do Gaio até à Rampa da Inveja, que passa junta ao jardim do Palácio de Verão do Governador da Província. (…) É dividida no sentido longitudinal por muitos renques de árvores vulgarmente denominadas de S. José (Ficus chlorocarpas) que, apesar de recentemente plantadas, produzem já um efeito muito agradável e que quando se tornarem frondosas formarão extensas abóbadas de folhagem transformando aquele local num retiro fresco e aprazível. Do lado do Norte termina a Avenida por um pitoresco jardim com a forma circular cujo diâmetro é de 58 m sendo torneado pela rua central da Avenida. Ao centro do jardim eleva-se um elegante monumento de mármore, levantado pelo Leal Senado em 1864 para comemorar a vitória que em 1622 os portugueses alcançaram contra os holandeses que pretendiam tomar a cidade.” Como dá para perceber por estas palavras do Eng. Abreu Nunes, a avenida termina na Praça de Vitória, mas agora é a data do Monumento que não está em sintonia com a referida pela História. Quartel da Flora Partindo do Palácio da Flora, residência de Verão do Governador, após atravessada a Rampa da Inveja apresenta-se, no extremo Norte do Campo dos Arrependidos, o edifício do Quartel da Flora. Ainda não representado no mapa de 1838, aparece referenciado em 30 de Março de 1882 quando para aí se mudou a 3ª Companhia da Guarda Policial e em 1896, no Quartel da Flora estava instalado o Corpo da Polícia de Macau. Entrando pela Praça da Vitória, inaugurada a 26 de Março de 1871, tal como o monumento ao centro colocado, “no mesmo jardim, entre o monumento e a rua que o torneia, com o centro na continuação do eixo da Avenida, acha-se implantado um vistoso lago de granito, tendo ao centro uma peça monumental de ferro formada de diferentes bacias de onde se desprende a água que nelas é lançada por meio de um tudo central. Quatro peixes, que ficam num plano inferior, lançam pela boca outros tantos jactos de água. Sobre a bacia superior, três garças simulam gozar aquela agradável frescura rematando assim este gracioso conjunto [o Padre Manuel Teixeira adita, <esta peça encontra-se agora no Jardim da Flora e as garças desapareceram>]. O lago é cercado por uma cadeia de ferro presa a doze pequenas colunatas colocadas nos ângulos de um polígono que o circunscreve sendo ela, a seu turno, cercada por canteiros de flores dispostos segundo uma coroa circular. Simétricos com o lago e em disposição análoga possui o jardim ainda um fontenário e dois elegantes caramanchões; é muito arborizado e, quando as árvores se desenvolverem, deve tornar-se aquele recinto de uma frescura agradabilíssima”, descrição do Eng. Abreu Nunes. <Este campo [dos Arrependidos, local onde os holandeses se encontravam e se mostraram indecisos e vacilantes (arrependidos) quando os dois tiros de canhão, calculados pelo Padre Rho e disparados da inacabada Fortaleza do Monte, fizeram estourar o seu barco da pólvora em frente da Praia de Cacilhas], ora transformado numa deliciosa Avenida e plantada de tenras árvores, já esteve regado de sangue…>, assim refere um jovem em 1898 n’ O Provir. Após descrever o lago, “no lado oposto está um fontanário também de ferro colocado simetricamente com o lago e em cada lado dele há um copo de metal preso por uma corrente”. Descrição da Alameda À Praça da Vitória chega a Avenida Vasco da Gama, cujos limites, a Leste tem a Estrada da Vitória e no outro lado, a Estrada da Flora, mais tarde chamada Rua Sidónio Pais. Colocados longitudinalmente na alameda uma fila de bancos de madeira e alguns renques de árvores de S. José. A cruzar a então longa Avenida Vasco da Gama duas ruas perpendiculares a ligar as estradas laterais, sendo uma próxima da Praça da Vitória, que deve ser a então Rampa da Vitória e a outra, aproximadamente a meio, a fazer a ligação da Estrada do Cemitério com a Estrada da Guia. Nesse pequeno troço, para o lado Leste, entre a Avenida Vasco da Gama e a Estrada da Vitória, aparece já um largo, onde se pretende colocar o busto do navegador. “Contíguo a este largo e do lado da estrada da Victoria procede-se actualmente à construção de um coreto para música, ao centro de um pequeno jardim, sendo este jardim fechado por duas rampas circulares d’ acesso da avenida para a estrada da Victoria que devem produzir um lindo efeito. Do lado da estrada da Flora, é a avenida cercada por sólidos muros de alvenaria e possui diversas escadas e rampas de acesso”, segundo Abreu Nunes. Inauguração da Avenida A cerimónia da inauguração da Avenida, realizada a 20 de Maio de 1898, ocorre no largo, ao lado do coreto que ficará ainda pronto em 1898, onde se projecta erigir o monumento com o busto do navegador português. O Independente de 22 de Maio de 1898 relata, “A acta do lançamento da primeira pedra, depois de assinada, foi encerrada num cofre de bronze, juntamente com uma colecção de estampilhas e bilhetes-postais do centenário, umas provas do Jornal Único (jornal feito para a comemoração), um exemplar do Echo Macaense e outro de O Independente. O cofre foi depois metido num bloco de pedra, onde assentaria o monumento a construir”. O busto de Vasco da Gama encontra-se ainda em forma de projecto, apresentado com um desenho no Jornal Único, diferente do que virá a ser realizado pelo escultor Tomás da Costa e só inaugurado a 31 de Janeiro de 1911. Abreu Nunes descreve-o em 1898: “Ao centro proximamente da avenida, no ponto onde esta cruza com uma rua transversal que parte da estrada da Flora, existe um largo com a forma poligonal onde se projecta elevar um elegante monumento a Vasco da Gama. Este monumento, representado na 1.ª vista [do Jornal Único], é construído por dois corpos de mármore sobrepostos encimados pelo busto fundido em bronze do grande Navegador; o todo eleva-se sobre uma escadaria de granito de forma hexagonal. Na superfície do corpo inferior de mármore serão colocadas passagens moldadas em bronze alusivas à saída de Lisboa da frota Vasco da Gama que em 1498 descobriu o caminho marítimo da Índia e à sua chegada a Calicut. No corpo superior serão aplicadas, em bronze também, de um lado as armas reais portuguesas e do outro, uma inscrição lembrando a época em que foi levantado o monumento.”