h | Artes, Letras e Ideias“Fala demais, constróis frases cheias de erros e as suas cenas de sexo são muito vulgares… etc. etc.” 高行健同志 Julie Oyang - 11 Jan 2017 [dropcap style≠’circle’]G[/dropcap]ao Xingjian (nascido a 4 de Janeiro de 1940) é um romancista, dramaturgo e crítico, naturalizado francês, que em 2000 recebeu o Nobel da Literatura por “uma obra de valor universal, de uma lucidez amarga e uma ingenuidade linguística…”. Em 1990, Gao recebeu uma carta de rejeição da parte de uma afamada editora chinesa, a propósito do seu romance A Montanha da Alma e que rezava assim: Camarada Gao Xingjian, Saudações! Lemos o seu manuscrito de A Montanha da Alma. Devo informá-lo que tivemos dificuldade concluir a sua leitura. A julgar pela sua linguagem, fomos forçados a concluir que deve ser muito novo e inexperiente. Contudo, a sua dedicação à literatura agradou-me bastante, bem como a todos os que trabalham nesta editora. Apesar do que acabei de referir, o seu trabalho demonstra muitas falhas. Listámos algumas, que passamos a citar: Em primeiro lugar, o tema do romance não é claro. Os conteúdos são retrógrados e as técnicas de narrativa são datadas. Será que ficou preso nos anos 80? Em segundo lugar, fala demasiado. Um romance deve contar uma história e desenvolver as personagens. Demasiada reflexão pode aborrecer os leitores. Pessoalmente, acho que os seus pontos de vista não passam de clichés. Além disso, é um grande erro usar a reflexão como enquadramento do romance. Claro que, se conseguisse apresentar ideias filosóficas como Milan Kundera, que estão profundamente interligadas à estrutura orgânica do livro, seria atractivo para os leitores. Repare que não estamos necessariamente a ser injustos consigo, porque pode não ter lido a obra do escritor checo. Em terceiro lugar, a sua linguagem é pobre, constrói frases cheias de erros, é como se misturássemos arroz com areia. Fez-me dores de cabeça. Sugiro-lhe que leia os clássicos, os chineses e os estrangeiros, para desenvolver o seu gosto literário. Em quarto lugar, existem muitas cenas de sexo, o que não vai ao encontro das políticas do nosso país. A propósito, as cenas de sexo são muito vulgares, parecem fantasias sexuais de um campónio. Apesar disto, você batalha para escrever e desenvolver um trabalho intelectual. Aconselho-o a cortar nas cenas de sexo nas próximas revisões. Existem ainda mais falhas no seu trabalho, mas não as vou mencionar agora. Resumindo, não acho que o seu manuscrito esteja em condições de ser publicado. Iremos devolver a cópia por correio registado. Com os melhores cumprimentos, Assinatura do Editor Departamento Editorial (selo oficial) 5 de Fevereiro de 1990