Lei Sindical reprovada por 18 deputados

Eles tentam, mas não conseguem. O projecto de Lei Sindical continua a não agradar aos deputados. Momento inoportuno, complicações para o investimento, pressões – muitas foram as justificações dadas para reprovarem pela sétima vez o diploma

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]inda não foi desta que o projecto relativo à Lei Sindical convenceu a Assembleia Legislativa (AL). Esta é a sétima vez que um projecto sobre este assunto é chumbado pelos deputados e desta vez não foi excepção: da responsabilidade dos deputados Kwan Tsui Hang, Ella Lei e Lam Heong Sang, o projecto reuniu 12 votos a favor, 18 contra e uma abstenção do deputado Leonel Alves. O estado da economia e, para alguns deputados, o facto dos direitos dos trabalhadores “já estarem” salvaguardados deram as justificações para mais um chumbo.
Muitas foram as vozes que se elevaram contra a existência dessa lei, recorrendo a todas as razões possíveis. O deputado Tsui Wai Kwan, por exemplo, afirmou que a esta “lei vai afectar o investimento” numa altura em que Macau passa por uma “situação económica” frágil. O deputado nomeado pelo Chefe do Executivo acredita que regulamentar esta lei “em nada contribui para a promoção do trabalho”, tendo em conta que o que Macau precisa neste momento é de investimentos. “Se aprovarmos esta lei vamos assustar [os investidores]”, apontou.
Não sendo o momento “oportuno” para os deputados – justificação que tem sido, aliás, a principal para a reprovação de projectos anteriores – esta lei vem ainda mexer, defendeu Tsui Wai Kwan, com a “relação patronal e laboral” que vive agora “uma fase harmoniosa”. “Não é a altura certa”, rematou.
Por sua vez, o deputado Ma Chi Seng defendeu que esta lei deve surgir de uma vontade tanto do Governo como das partes interessadas. “Este projecto não convém ser apresentado só por uma das partes”, indicou o deputado nomeado, referindo-se ao facto dos deputados que apresentaram a proposta serem do sector Operário. O deputado sublinhou a necessidade desta ser uma legislação da vontade de todos.

Doidos à mesa

Com um discurso muito polémico e provocador esteve o deputado Fong Chi Keong que chegou a perguntar em plena sessão plenária se os deputados que apresentaram o projecto estavam “doidos”, “malucos” ou “tolos”.
Começando o seu discurso com um “espero que esta lei seja aprovada” – mas não para já – Fong Chi Keong criticou severamente o projecto em causa. “Todo o conteúdo deste projecto… qualquer pessoa inteligente irá discordar destes artigos”, apontou.
Referindo vários problemas, desde a dispensa de trabalho para participarem em reuniões sindicais, por exemplo, o deputado defendeu que esta não é altura para aprovar a lei. “Em Macau os trabalhadores nunca foram descriminados. Nunca foram tratados de forma injusta. Isto é uma realidade, verdade. É verídico”, apontou.
Não existe, para o deputado, necessidade de recorrer a sindicatos quando o “Governo consegue resolver” os problemas. “Ele [o Governo] não é inútil”, frisou.

Prejudicar outros

Num discurso que parecia de apoio, a deputada Melinda Chan mostrou várias preocupações quanto à interferência que o projecto de lei poderá ter para com as “mais de seis mil associações do território”. “Isto poderá afectar os interesses das associações, não podemos afectar os interesses das outras associações que estão a funcionar há muito tempo. Também não podemos obrigar as associações a construir uniões”, refutou.
Gabriel Tong também se mostrou muito reticente ao projecto apresentado pelos três deputados. “Acho que é preciso ter em conta a realidade de Macau. A vida das associações… é preciso ver. O que é que deve ser melhorado? Esta é a grande pergunta”, apontava, frisando que na sua opinião o projecto apresentado não era maduro o suficiente para aprovação. “É um bom direito, mas ainda precisa de maturidade, acho que há muitas questões para seguir para a especialidade”, apontou.
O autor de cinco projectos sobre o assunto, José Pereira Coutinho, não se mostrou muito convencido. “Este projecto tem coisas diferentes daqueles que já apresentei”, disse em plenário, aplaudindo, ainda assim, a iniciativa e mostrando-se completamente a favor. “Claro que aprovo, apesar do conteúdo ser diferente. Este é um passo dado para conseguir cumprir o dever e responsabilidade da Lei Básica”, disse, referindo-se ao artigo 27, que determina a liberdade dos residentes de Macau em “organizar e participar em associações sindicais e em greves”. “Somos legisladores, temos essa responsabilidade”, frisou.
O deputado Au Kam San assumiu que esta é uma lei que deve ser regulada e que a resposta ao momento certo nunca será encontrada. “Quando é que podemos avançar com a lei, então?”, indagou o hemiciclo. Au Kam San admitiu que nenhum projecto é perfeito na sua primeira apresentação, por isso é que depois existe a avaliação na especialidade. “Podemos discutir para melhorar a lei, para cuidar dos direitos dos trabalhadores e empregadores”, referiu.
Ng Kuok Cheong, deputado, foi ainda mais longe e disse que se, caso a lei não fosse aprovada – como não foi –, o Governo deveria assumir a sua responsabilidade e avançar com uma proposta, cumprindo o que a própria Lei Básica indica. “Isto é lamentável”, apontou, referindo ao desinteresse claro por parte de alguns deputados. O Governo já disse ao HM, recorde-se, que está “aberto” à possibilidade, mas que ainda se encontra a estudar a ideia.

Votos a favor:

Ng Kuok Cheong, Kwan Tsui Hang, Ho Ion Sang, Leong Veng Chai, Si Ka Lon, Ella Lei, Song Pek Kei, Au Kam San, José Pereira Coutinho, Lam Heong Sang, Chan Meng Kam e Wong Kit Cheong

Votos contra:

Zheng Anting, Ma Chi Seng, Lau Veng Seng, Sio Chi Wai, Mak Soi Kun, Melinda Chan, Gabriel Tong, Chan Iek Lap, Tsui Wai Kwan, Chan Chak Mo, Cheong Chi Keong, Vong Hin Fai, José Chui Sai Peng, Angela Leong, Vitor Cheong, Fong Chi Keong e Chui Sai Cheong

O que disseram os deputados

“Será mesmo necessário legislar? Já passaram tantos anos, não sei se isto é um vazio legal, porque se fosse já tínhamos sido pressionados pelo Governo Central. Será que estamos a violar a Lei Básica? Se tivéssemos, o país dizia alguma coisa”, Chan Chak Mo

“Não são só os trabalhadores que levam uma vida árdua, os patrões também”, Fong Chi Keong

“Se a economia já esteve em alta e não se produziu esta lei, então só posso chegar à conclusão que se deve à estrutura da AL, onde a maioria dos deputados não foi escolhido por sufrágio universal e, por isso, não apoia [a lei]. Por outro lado, porque é que o Governo nunca apresentou a proposta de Lei Sindical? Porque não está a assumir a sua responsabilidade”, Ng Kuok Cheong

“Noutras jurisdições nota-se que a Lei Sindical estimula o crescimento económico. Estão todos a olhar para esta lei como se fosse um mostrengo. Um sindicato não é uma arma”, Lam Heong Sang, um dos promotores do projecto

“Disse que há empregados que se suicidam ou ameaçam suicidar-se por causa dos salários? Os empregadores também se suicidam por causa da falta de dinheiro. Deve ser o Governo a ser o interlocutor [entre os conflitos laborais]. Há sindicatos que são seitas, como no Japão”, Tsui Wai Kwan

“Associações e sindicatos são coisas diferentes, as regras são diferentes e há leis diferentes. Não deve haver comparações entre as duas figuras, se não é perigoso. Podia ser que, com a Lei Sindical, os trabalhadores a quem são devidos salários deixassem de ter de ir ao Gabinete de Ligação do Governo Central”, Leong Veng Chai

“A lei não resolve o problema, mas a Lei Sindical só vai dar mais trabalho à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais e ao Conselho de Concertação Social”, Chan Chak Mo

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