Hoje Macau China / ÁsiaXangai | Lula da Silva questiona dólar e defende outras soluções no comércio mundial O Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, atacou ontem, em Xangai, o domínio do dólar norte-americano como moeda de reserva mundial e apelou ao uso de outras divisas na relação comercial entre Brasil e China. “Eu todos os dias me pergunto por que motivo os países estão obrigados a fazer o seu comércio em dólar”, afirmou o chefe de Estado brasileiro, na sede do Novo Banco de Desenvolvimento, criado pelo BRICS, o bloco de economias emergentes que junta Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. “Quem é que decidiu que era o dólar a moeda de reserva depois de ter desaparecido o ouro como paridade?”, questionou. “Nós precisamos de ter uma moeda que dê aos países um pouco mais de tranquilidade”, acrescentou. A China tem tentado internacionalizar a sua moeda, o yuan, desde 2009, visando reduzir a dependência do dólar em acordos comerciais e de investimento e desafiar o papel da divisa norte-americana como a principal moeda de reserva do mundo. Esta questão tornou-se mais urgente num período de fricções geopolíticas, que resultaram na fragmentação das cadeias de produção, visando enfraquecer o papel central da China, e em sanções contra Moscovo, na sequência da invasão da Ucrânia. O dólar é utilizado em 84,3 por cento das trocas comerciais a nível global, segundo dados recentes divulgados pelo jornal britânico Financial Times. Mas a participação do yuan mais do que duplicou desde a invasão da Ucrânia, de menos de 2 por cento para 4,5 por cento, reflectindo o maior uso da moeda chinesa no comércio com a Rússia. As dificuldades de financiamento das nações mais pobres, que enfrentam já uma crise de dívida soberana, na sequência da pandemia de covid-19, agravaram-se, nos últimos meses, devido à subida das taxas de juro nos Estados Unidos, que visa combater a inflação galopante. O Brasil tem sido particularmente afectado: o Banco Central do país sul-americano manteve, no mês passado, a taxa de juros base em 13,75 por cento ao ano – o patamar mais alto desde Dezembro de 2016. Uma moeda para os BRICS? Lula da Silva questionou por que motivo “um país tem que correr atrás do dólar para poder exportar”. “Se tem uma coisa que os chineses sabem ter é paciência”, afirmou o líder brasileiro. “Se for necessário ter um pouco de paciência, a gente tem que ter, mas um banco como o do BRICS pode criar uma moeda capaz de financiar a relação comercial entre Brasil e China e entre o Brasil e outros países BRICS”, acrescentou. O Presidente brasileiro defendeu ainda a importância da criação de novas instituições multilaterais de financiamento e da reforma das instituições vigentes, visando gerar melhores condições para responder às necessidades dos países em desenvolvimento. “O Fundo Monetário Internacional (FMI), ou qualquer outro banco, quando empresta dinheiro a um país do terceiro mundo, sente-se no direito de mandar, de administrar a conta do país, de visitar o país para ver as suas contas”, observou Lula da Silva. “Nenhum governante pode trabalhar com uma faca na garganta”, disse. “Os bancos têm que ter paciência e, se for preciso, renovar os acordos e colocar a palavra ‘tolerância’ em cada renovação”. O chefe de Estado brasileiro lamentou que se esteja no século XXI como se estava no início do século XX, “com os ricos a tornarem-se mais ricos e os pobres a ficarem mais pobres”. Um banco de crédito sem condicionantes políticas Na senda de Lula da Silva, a antiga presidente do Brasil Dilma Rousseff, agora líder do Banco dos BRICS, prometeu na sua tomada de posse que a instituição de crédito multilateral vai conceder crédito aos países em desenvolvimento sem condicionantes políticas. “O Novo Banco de Desenvolvimento surge como uma verdadeira plataforma de cooperação entre as economias emergentes, em que condicionantes não farão parte do menu de soluções”, apontou Dilma, no discurso proferido durante a cerimónia de tomada de posse como presidente da organização, criada pelo BRICS, o bloco de economias que junta Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O banco multilateral “vai manter uma visão de desenvolvimento compartilhado, que respeite e afirme a soberania de cada país” e “não imporá condições extra financeiras”, disse. As palavras de Dilma reflectem a posição de Pequim, que frequentemente refere que as suas linhas de crédito “não têm condições políticas subjacentes”, contrastando com as instituições ocidentais, incluindo o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), que geralmente exigem que o destinatário cumpra mudanças estruturais de governação e adote as “melhores práticas” internacionais. “A fundação do Novo Banco de Desenvolvimento pelo BRICS, além de um acontecimento histórico, é uma demonstração da importância da relação destes países e do seu compromisso com o multilateralismo e a cooperação Sul – Sul, num mundo que atravessa profundas transformações”, afirmou Dilma. A responsável apontou ainda para o “compromisso inarredável” da instituição com a agenda para o clima e ambiente. “Apoiamos as estratégias dos países membros que reduzem as emissões de gases com efeito estufa, financiando energias renováveis, infraestrutura verde e resiliente, na direcção de um crescimento de baixo carbono”, sublinhou. “O Banco do BRICS está comprometido em ajudar os países membros a alcançarem os objectivos do desenvolvimento sustentável e os compromissos assumidos sob o Acordo de Paris”. No conjunto, os BRICS representam cerca de 40% da população mundial e 24% do produto global bruto. O acordo para o estabelecimento do Novo Banco de Desenvolvimento foi assinado durante a cimeira do BRICS realizada na cidade brasileira de Fortaleza, em 2014, quando Dilma era presidente do Brasil. O banco iniciou as operações no ano seguinte. A instituição aprovou já 70 projectos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável no valor de mais de 25 mil milhões de dólares, incluindo nas áreas da energia limpa, saúde pública, educação, água, saneamento ou transporte. “Libertar” países emergentes da “submissão” Já o Presidente do Brasil, Lula da Silva, apontou o “potencial transformador” do banco dos BRICS enquanto instituição que “liberta” os países em desenvolvimento da “submissão” às organizações financeiras dominantes. “Pela primeira vez, um banco de desenvolvimento de alcance global é estabelecido sem a participação dos países desenvolvidos na sua fase inicial, estando, assim, livre das amarras das condicionalidades impostas pelas instituições tradicionais às economias emergentes”, afirmou Lula, no discurso proferido durante a cerimónia de tomada de posse de Dilma Rousseff. O chefe de Estado brasileiro, que acusou as instituições financeiras dominantes de “pretenderem governar” os países emergentes, “sem que tenham um mandato para isso”, frisou ainda a importância do Novo Banco de Desenvolvimento no financiamento de projectos nas respectivas moedas locais dos países membros. Lula assegurou que o Novo Banco de Desenvolvimento é uma “ferramenta para a redução das desigualdades” entre países ricos e países emergentes, que se “traduzem em exclusão social, fome, extrema pobreza e migrações forçadas”. “Não queremos ser melhores do que ninguém: queremos oportunidades para expandir as nossas potencialidades e garantir aos nossos povos dignidade, cidadania e qualidade de vida”, enfatizou. O chefe de Estado brasileiro lembrou que as “necessidades de financiamento não atendidas dos países em desenvolvimento eram e continuam a ser enormes”, numa altura em que as nações mais pobres enfrentam uma crise de dívida soberana, agravada pelo aumento das taxas de juro nos Estados Unidos e na Europa, tornando o custo de financiamento mais caro. “A falta de reformas efectivas das instituições financeiras tradicionais limita o volume e as modalidades de crédito dos bancos já existentes”, observou Lula. “O Novo Banco de Desenvolvimento reúne todas as condições para se tornar o grande banco do Sul Global”.
Hoje Macau China / ÁsiaVisita | Lula vai ao Banco dos BRICS em Xangai e reúne com Xi em Pequim A preenchida agenda da visita de dois dias do Presidente brasileiro inclui participar na tomada de posse de Dilma Rousseff como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento em Xangai e um encontro com Xi Jinping no dia seguinte O Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, inicia esta quinta-feira uma viagem de dois dias à China, com uma visita ao Novo Banco de Desenvolvimento e às instalações do grupo Huawei, em Xangai. A delegação de Lula inclui sete ministros, 19 deputados e cinco governadores. A visita vai arrancar com a participação na cerimónia de tomada de posse de Dilma Rousseff como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, criado pelo BRICS, o bloco de economias emergentes que junta Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O mandato de Dilma prolonga-se até 2025. Após o almoço, Lula vai realizar uma visita de trinta minutos às instalações em Xangai do grupo de telecomunicações chinês Huawei, líder em redes de quinta geração (5G). De seguida, o Presidente brasileiro regressa ao hotel onde vai ficar hospedado, situado no “Bund”, a famosa marginal neoclássica de Xangai. No hotel, Lula da Silva vai reunir com os directores executivos da fabricante chinesa de veículos eléctricos BYD e do grupo China Communications Construction Company, o accionista chinês da Mota-Engil. Ao fim da tarde, o líder brasileiro vai reunir e jantar com o líder do Partido Comunista Chinês em Xangai, Chen Jining. Na capital Após o jantar, Lula vai partir para Pequim, onde, na sexta-feira, vai reunir de manhã com o director executivo da State Grid, a estatal chinesa que, em Portugal, detém 25 por cento da REN (Redes Energéticas Nacionais) e que é também uma das maiores empresas no sector eléctrico brasileiro. A empresa opera as duas linhas de alta tensão que conectam a hidroeléctrica de Belo Monte, no Pará, à região Sudeste do país latino-americano. No final da manhã na China, Lula da Silva vai reunir com Zhao Leji, o presidente da Assembleia Popular Nacional, o órgão máximo legislativo do país asiático. De seguida, o chefe de Estado do Brasil vai participar na cerimónia de entrega de cestos florais ao Monumento dos Heróis do Povo, situado na Praça Tiananmen. De tarde, Lula vai reunir com o primeiro-ministro chinês, Li Qiang. O encontro com o Presidente chinês e secretário-geral do Partido Comunista, Xi Jinping, está marcado para as 16:45.
Hoje Macau China / ÁsiaBrasil | Custo de financiamento “proibitivo” trava oportunidades geradas pela China O ministro da Agricultura e Pecuária do Brasil, integrado na extensa comitiva presidencial brasileira, lamenta os impedimentos financeiros que impedem o país sul-americano de agarrar todas as oportunidades de negócio ao dispor na segunda maior economia mundial O ministro da Agricultura e Pecuária do Brasil, Carlos Fávaro, disse na passada quarta-feira, em Pequim, que a taxa de juros no Brasil, de 13,75 por cento, constitui um obstáculo para os empresários aproveitarem as oportunidades geradas pela China. “É frustrante gerar tantas oportunidades aqui na China e os empresários brasileiros depois não conseguirem arrecadar investimentos com os juros nesse patamar”, afirmou Carlos Fávaro, durante um fórum empresarial realizado na capital chinesa. O Banco Central do Brasil decidiu, na terça-feira, manter a taxa de juros base em 13,75 por cento ao ano – o patamar mais alto desde Dezembro de 2016. O governante brasileiro considerou aquele valor “proibitivo” e defendeu que o país sul-americano tem a inflação e gastos públicos “sob controlo”. Carlos Fávaro enalteceu ainda a decisão das autoridades chinesas de levantar o embargo às importações de carne bovina brasileira, que estavam suspensas desde Fevereiro. O embargo foi suspenso pela China após 29 dias de negociação. “Essa rapidez, não comprometendo de forma alguma a qualidade e a segurança necessária para a relação comercial, mostra a relação afectuosa e profícua entre os dois países”, vincou. “A última vez que aconteceu um caso semelhante, foram precisos mais de 100 dias para o embargo ser levantado”, disse o ministro. O ministro também comemorou a habilitação de quatro novas plantas frigoríficas brasileiras para exportar para a China, o que não ocorria desde 2019, além da retoma de duas plantas frigoríficas que estavam suspensas. “Temos hoje mais de 50 plantas frigoríficas cadastradas para serem avaliadas pelo governo chinês. As oportunidades estão postas na mesa e tenho a certeza de que teremos mais produtos comercializados com a China”. O responsável afirmou também que houve avanços na negociação de outros produtos como algodão, milho, uva fresca, noz, sorgo e gergelim. Moeda em crescimento Em Fevereiro, os bancos centrais do Brasil e da China assinaram um memorando de entendimento para o estabelecimento de acordos de compensação do yuan, como parte dos esforços de Pequim para internacionalizar a moeda chinesa. O estabelecimento desses arranjos “vai beneficiar as transacções transfronteiriças e promover ainda mais o comércio bilateral e a facilitação de investimentos”, disse então, em comunicado, o Banco Popular da China (banco central). A China tem tentado internacionalizar o yuan desde 2009, visando reduzir a dependência do dólar em acordos comerciais e de investimento e desafiar o papel da moeda norte-americana como a principal moeda de reserva do mundo. Esta questão tornou-se mais urgente à medida que fricções políticas e a prolongada guerra comercial e tecnológica entre Pequim e Washington resultaram na imposição de sanções contra várias entidades chinesas.