Andreia Sofia Silva Eventos Manchete24 de Junho | Invasão dos holandeses em 1622 lembrada em Lisboa Mariana Pereira, antropóloga, e Rui Loureiro, historiador, foram os protagonistas de uma conferência, organizada pelo Centro Científico e Cultural de Macau, que lembrou os 400 anos do 24 de Junho de 1622, quando os holandeses tentaram invadir o território de Macau. A data continua viva na memória dos macaenses que lhe deram uma nova roupagem, assegura a antropóloga “24 de Junho de 1622: História e Memória” é o nome da conferência que decorreu na última sexta-feira, em Lisboa, com o intuito de lembrar os 400 anos da invasão dos holandeses no território sob administração portuguesa. O evento, organizado pelo Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), contou com a presença do historiador Rui Loureiro e a antropóloga Mariana Pereira, que está a fazer um doutoramento sobre as percepções da comunidade macaense residente em Portugal face a esta data histórica. De frisar que, no período da Administração portuguesa, 24 de Junho era um dia feriado. Mariana Pereira começou a desenvolver o trabalho de investigação em 2019, partindo não só de conversas com membros da comunidade. Uma coisa é certa: a data está longe de estar esquecida ou ignorada. “Nós é que decidimos o que queremos que o 24 de Junho seja”, apontou. “É difícil dizer se há ou não uma ameaça à celebração [desta data], porque tem havido uma nova história sobre o 24 de Junho, com novos públicos e contextos. O 24 de Junho tem hoje um formato mais aberto e plural. A sociedade civil está a criar um novo rumo, com base em elementos da tradição histórica. A diáspora macaense também faz isso nos locais onde vive”, apontou. Mariana Pereira acredita que esta data vai continuar a ser celebrada. “O cerne de estar ligado a um acontecimento histórico de Macau está lá e vai continuar nos próximos tempos”, disse. Da guerrilha Entre 1580 e 1640 Portugal ficou sob domínio dos espanhóis, herdando os conflitos que o país vizinho tinha com outros impérios europeus. Foi o caso dos holandeses, que tentaram estabelecer-se na Ásia e criar rotas de comércio tal como os portugueses já faziam a partir de Goa. Até finais do século XVI os portugueses detinham o exclusivo do comércio pela Rota do Cabo, sendo que “todos os europeus iam a Lisboa comprar produtos”, recordou Rui Loureiro. Além de falar da figura do rei Filipe II de Espanha, cujo reinado foi marcado pela tentativa expansionista dos holandeses, o historiador abordou também a importância do livro “Itinerario”, de Jan Huygen van Linschoten’s, que mais não era “uma descrição muito bem informada de toda a Ásia e dos negócios dos portugueses, e que apresentou a Ásia aos holandeses”. Traduzido para várias línguas, este livro mais não era do que um verdadeiro “roteiro das principais rotas comerciais informações obtidas em Goa” pelo autor, provavelmente na qualidade de espião. Desta forma, os holandeses conseguem estabelecer-se no que hoje é conhecido como a ilha de Java, conseguindo uma rota directa para o Oriente. A China, lugar de porcelanas e sedas exóticas, era o grande atractivo. “A China era o melhor mercado para vender especiarias. A partir de 1631 os holandeses tentaram instalar-se em Macau, sem sucesso. Depois de 1622 nunca mais tentaram, e como alternativa conseguiram estabelecer-se na ilha de Taiwan, mas não durante muito tempo.” Rui Loureiro relatou então o que se passou no dia 24 de Junho, com a chegada dos holandeses a Macau. “A armada holandesa, composta por 13 navios e 800 homens, tinha informação de que Macau estaria quase desprotegida. No entanto, tiveram de enfrentar uma resistência quase desorganizada, pois muitos portugueses tinham experiência de anos de navegação e, com poucas espingardas e canhões, obtiveram uma vitória fulgurante sobre as forças holandesas que iam preparadas para uma guerra convencional, mas depararam-se afinal com uma guerra de guerrilha.” A vitória sobre os holandeses levou à construção de mais fortificações em Macau, após uma negociação com Cantão. Imperava a necessidade de segurança e protecção. “Macau, na década seguinte, passou a ter uma série de fortalezas em sítios estratégicos e nunca mais houve tentativas de conquista por parte de outra potência.” Rui Loureiro destaca os trabalhos de investigação de Charles Boxer ou Wu Zhiliang, entre outros, sobre o 24 de Junho de 1622. Mas aponta que “não tem havido investigação mais recente” acerca deste episódio histórico.