João Santos Filipe Manchete SociedadeGoverno: Restrições foram impostas para que Macau não fique como os EUA A proibição de aterragens de voos em Macau tem como objectivo evitar um surto e impedir que a RAEM fique numa situação pandémica semelhante à vivida nos Estados Unidos, que regista novos recordes de infecções. As explicações foram avançadas por Leong Iek Hou, coordenadora do Núcleo de Prevenção e Doenças Infecciosas e Vigilância da Doença, ontem, na conferência de imprensa sobre a evolução da pandemia. A responsável admitiu ainda que o período de proibição de entradas do estrangeiro pode ser alargado. “Estamos num momento crítico a nível mundial […] antes de tomarmos a decisão considerámos a alta transmissibilidade da variante Ómicron, e a necessidade de evitar o surgimento de casos internos. Temos de trabalhar para evitar ser como os Estados Unidos e ter muitos casos”, afirmou Leong Iek Hou. “Não queremos sobrecarregar as nossas instalações médicas, nem causar um grande impacto à vida da população e à actividade económica de Macau”, acrescentou. Segundo a médica, a restrição vai prejudicar a vida da população, mas o que está em causa é “o interesse global” da sociedade, principalmente tendo em conta as várias infecções ligadas a voos vindo exterior. “Em cada voo que regressa via Singapura conseguimos identificar um a três casos confirmados de covid-19. Houve pessoas que no início eram consideradas um caso de contacto próximo e, dias depois, são confirmados casos confirmados. Por isso, não excluímos a possibilidade de serem infectadas no avião”, argumentou. As autoridades admitiram ainda a possibilidade de alargar a proibição para além de 23 de Janeiro, de acordo com uma “análise dinâmica”. Informação inútil Na conferência de ontem, Leong Iek Hou foi confrontado com a falta de aviso prévio sobre a possibilidade de proibir voos e ainda as recomendações de Ho Iat Seng que, no passado, sugeriu que os reencontros familiares fossem no estrangeiro e não em Macau. Em resposta, a médica recusou a ideia de que os residentes não foram alertados e afirmou que vigora há dois anos uma política aconselhamento contra viagens não essenciais. A coordenadora recusou a ideia da existência de restrições à liberdade de entrada e saída do território aos residentes, porque só estão “a restringir os voos”. Leong Iek Hou insistiu também que os residentes podem regressar a Macau de outra forma, que não sejam os voos de Singapura. Segundo a médica, é possível entrar a partir do Interior e Taiwan, que disse ter voos directos. Porém, actualmente, as entradas em Taiwan estão reservadas apenas a quem tem autorização de residência. Mesmo assim, o tempo das escalas no aeroporto de Taipé seria outro motivo para a opção não ser viável para chegar a Macau vindo da Europa. Governo pondera bolha de vacinação local O Governo equaciona tornar a vacina um requisito obrigatório para que um residente possa frequentar restaurantes, cinemas e salas de espectáculos. A possibilidade foi admitida por Leong Iek Hou, coordenadora do Núcleo de Prevenção e Doenças Infecciosas e Vigilância da Doença, ontem na conferencia de imprensa. Em cima da mesa está também a possibilidade de as pessoas terem como alternativa, caso não seja vacinadas, fazer um teste a cada sete dias para frequentar os espaços mencionados. “Espero que compreendam que o mais importante na vacinação é reduzir o risco de morte e de sintomas graves. Em alguns estabelecimentos, quando entramos, tiramos sempre a máscara, como restaurantes, também há outros espaços, como cinemas ou salas de concertos em que ficamos por um período longo. São situações que aumentam o risco de contágio”, justificou a médica. A obrigatoriedade ainda não é certa, ao contrário do que acontece em Hong Kong, mas está a ser ponderada: “vamos avaliar consoante a situação epidémica”, foi garantido. Também ontem foi encurtado o tempo para a tomada da terceira dosa da vacina contra a covid-19, que passa a ser de três meses. Neste capítulo, Leong Iek Hou apelou aos residentes para tomarem a vacina da BioNTech, uma vez que os estudos apontam que o reforço com esta vacina oferece uma protecção mais eficaz, do que se o reforço for feito com o produto da Sinopharm. Residente vinda do Vietname é mais um caso importado Uma residente de 21 anos acusou positivo no teste de ácido nucleico na quarta-feira, à chegada a Macau vinda do Vietname, com escala em Singapura. Como não apresenta sintomas, o caso foi classificado como importado de infecção assintomática. A jovem tomou duas doses da vacina da Sinopharm nos passados meses de Novembro e Dezembro e no dia em que saiu do Vietname fez um teste que deu negativo. Após o resultado positivo à chegada, foi transportada para Centro Clínico de Saúde Pública de Alto de Coloane para observação médica.
João Santos Filipe Manchete SociedadeCovid-19 | Proibição de chegada de aviões pressiona comunidade portuguesa A medida que impede a entrada em Macau de pessoas vindas do estrangeiro foi surpreendente e as justificações escassas. O HM ouviu figuras da comunidade portuguesa que viram a proibição como um sinal de que a pressão psicológica e o stress estão para ficar O anúncio da proibição de aterragem em Macau de todos os voos civis que tenham origem fora da China a partir de domingo apanhou de surpresa a comunidade portuguesa. Também o facto de não ter sido inicialmente prestada qualquer justificação, como realçado pelas opiniões ouvidas pelo HM, contribui para as expectativas de continuação de um clima de forte pressão psicológica e stress crescente. “Este tipo de medidas repentinas aumenta muito a pressão psicológica. Com a situação da covid-19, as restrições que limitam os seus movimentos, as pessoas atravessam períodos de ansiedade e ficam muito nervosas”, considerou Amélia António, presidente da Casa de Portugal, em declarações ao HM. “As medidas surgem de forma súbita, sem explicações ou fundamentos, e fazem com que não se possa tomar cautelas, por isso, é muito difícil encaixar estas políticas”, acrescentou. Na altura em que prestou declarações ao HM, ainda não eram conhecidos os fundamentos, que só foram abordados horas mais tarde, na conferência de imprensa sobre a situação pandémica. Por isso, a responsável pela Casa de Portugal recusou fazer críticas à decisão das autoridades: “Admito que estas medidas sejam tomadas porque os Serviços de Saúde têm dados concretos… Mas, nós não conhecemos mais do que razões abstractas. Apenas nos dizem que são motivadas pela covid-19 e que servem para proteger a população”, lamentou. Com compreensão Por sua vez, o deputado José Pereira Coutinho, ligado à Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), defendeu que a medida é sensata, desde que aplicada de forma temporária. O legislador aceita até a hipótese de o período de proibição, que vigora até 23 de Janeiro, seja prolongado, dependendo da evolução pandémica. “Eu apoio esta medida. A saúde pública de Macau está de rastos. É uma medida acertada, desde que seja temporária. A transmissibilidade deste vírus é extremamente elevada”, defendeu sobre a variante ómicron. “Depois de duas semanas, é necessário fazer uma avaliação e ver como está a situação. É uma medida sensata, porque vai proteger a maioria dos cidadãos de Macau”, completou. Pereira Coutinho afirmou ainda compreender o facto de a medida ter sido tomada sem qualquer tipo de indicação prévia, por considerar que a luta contra a pandemia é imprevisível. “As coisas surgem desta forma. Foram detectados dois casos assintomáticos de ómicron, e é um sinal de que as autoridades sanitárias estão preocupadas”, vincou. “Havendo um surto não temos capacidade para enfrentá-lo, a não ser que já tivéssemos o Hospital das Ilhas a funcionar”, sustentou. Lógica de zero casos Para Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação dos Macaenses, a medida justifica-se pela política de zero casos, que tem sido implementada. “É uma medida que entronca na lógica da política de zero casos e que tem a ver com a pandemia. É a única explicação, porque caso contrário não se poderia compreendê-la”, disse Senna Fernandes. “É inevitável considerar que a nova variante está a fazer muitos estragos, a mortalidade não é tão elevada, mas, o nível de contágios está a fazer muitos estragos em outras partes do mundo, como nos Estados Unidos ou na Europa, com novos recordes de infecções”, justificou. O advogado defendeu ainda a política de zero casos, que considera a mais adequada face às características da RAEM. “Compreende-se a adopção desta política para Macau, porque é um território muito pequeno. Um contágio aqui seria brutal, porque não teríamos infra-estruturas para terminar com o contágio em massa”, apontou. “Também a população de Macau é muito frágil, porque se houver uma epidemia não só vai haver pânico, mas também se vai alastrar e alcançar número incalculáveis”, frisou. O custo silencioso Se, por um lado, as medidas são tidas como aceitáveis, por outro, não deixam de ter um preço pago pela população. O aspecto da generalidade do impacto foi realçado pelo presidente da ADM, que também constatou que a covid-19 levou muitos portugueses a deixarem o território. “Claro que estas restrições causam grandes desconfortos, as pessoas não podem sair, há problemas psicológicos que advêm desta situação. Para a população portuguesa, estas medidas são uma causa de êxodo”, reconheceu. “Se antes era possível apanhar um avião amanhã e ir a Lisboa ver um familiar, actualmente não é possível. Isto dificulta a vida, a pandemia tornou as distâncias maiores, o que pesa muito nas escolhas das pessoas que sempre viveram em Macau”, destacou. Segundo Miguel de Senna Fernandes, as saídas serão mais prováveis no caso em que os membros da comunidade têm familiares com idades avançadas, mesmo nos casos em que praticamente viveram sempre em Macau. “As pessoas começam a rever os planos de vida, o que é natural. Se tenho um pai ou uma mãe idosa em Portugal, e se não posso ter certezas de poder viajar com a maior brevidade possível, então começo a fazer contas à vida”, explicou. “Isto ditou a saída de muitos portugueses”, constatou.