Caso Suncity | Juíza ameaça advogado com proibição de falar

A sessão de ontem do julgamento do caso Suncity ficou marcada pelas ameaças da juíza Lou Ieng Ha contra o advogado Pedro Leal. De acordo com o portal Macau News Agency, quando se debatia a admissibilidade das provas em julgamento, a juíza não terá gostada da oposição de vários advogados e ameaçou Pedro Leal, advogado de Celestino Ali, que se voltar a mostrar oposição como fez ontem fica proibido de falar durante o julgamento.

O momento quente da sessão, surgiu quando se debateu em tribunal se os depoimentos por escrito dos arguidos, prestados em fase de investigação diante da polícia, deviam ser admitidos como prova pelo tribunal.

Depois de abordar o assunto, Lou Ieng Ha determinou que o tribunal admite provisoriamente os depoimentos e que mais tarde vai tomar uma decisão definitiva. No entanto, segundo o portal Macau News Agency, a decisão causou oposição por parte de vários dos advogados presentes, que defendem que os depoimentos prestados apenas perante a polícia não devem ser admitidos como prova pelo tribunal.

Vale tudo

Assim que vários advogados tentaram intervir e argumentar, Lou Ieng Ha mostrou que a decisão estava tomada e que não há espaço para recuos: “Vocês não podem falar [desta maneira] para forçar o tribunal a fazer algo que não quer… Todos estudaram Direito e todos vocês sabem que há formas de recorrerem da decisão, mas não devem agir desta maneira”, avisou os causídicos.

Neste momento, Pedro Leal tentou ainda argumentar mais uma vez e foi ameaçado que seria proibido de falar: “O tribunal já tomou uma decisão…. estou a avisá-lo pela última vez, se voltar a mostrar oposição outra vez [como hoje] vou bani-lo de falar neste julgamento a partir de agora”, intimidou Lou Ieng Ha.

Em relação à sessão de ontem, terminou a parte do julgamento em que se ouve a versão dos arguidos. Durante a sessão de hoje, devem começar a ser ouvidas as testemunhas.

Alvin Chau é acusado de ter liderado uma sociedade secreta dedicada ao branqueamento de capitais e à promoção de jogo ilegal, tanto online como em apostas paralelas nos casinos de Macau. Segundo a acusação, o grupo criminoso levou a Administração a perder cerca de 8,26 mil milhões de dólares de Hong Kong em receitas fiscais desde 2013.

29 Set 2022

Liberdade condicional | Número de aprovações em queda desde 2014

No ano passado foram aprovados 19 por cento dos pedidos de liberdade condicional. Advogados e profissionais do sector da justiça justificam o fenómeno com a aleatoriedade de critérios e as políticas securizantes do território. O psicólogo Nuno Gomes considera que este panorama coloca em causa a reabilitação social. Um ex-recluso ouvido pelo HM acha que o sistema desencoraja o bom comportamento

“Pedir liberdade condicional é como jogar Bacará” sintetiza Luís (nome fictício), ex-recluso, referindo-se à aleatoriedade com que a apreciação dos pedidos é encarada. Luís está em liberdade há 10 anos depois de cumprir uma pena de quase dois anos no Estabelecimento Prisional de Macau (EPM), na sequência de uma agressão e de lhe ter sido detectado ketamina no sangue. Dado o período “limitado” de tempo em que esteve encarcerado, Luís não avançou com o processo de liberdade condicional, que considera “inútil e revoltante”.

Luís é apenas um entre muitos que deixaram de acreditar no sistema de reabilitação por entender que “não é feito para integrar os reclusos na sociedade”

Em 2018, dos 523 pedidos de liberdade condicional apresentados à Direcção dos Serviços Correcionais de Macau (DSC), 352 foram negados e 101 foram autorizados, número que representa uma taxa de autorização na ordem dos 19 por cento, um claro contraste com os 51,3 por cento de aprovações registados em 2007.

Neste momento, estão em curso 56 pedidos e 14 em que os procedimentos foram interrompidos por vontade do próprio recluso.

Perante a realidade mostrada pelos números, o advogado Pedro Leal considera que a atribuição de liberdade condicional em Macau é um processo aleatório que revela insuficiências na avaliação. “Não há um raciocínio lógico para a liberdade condicional. A doutrina diz que cada caso é um caso e que cada caso tem que ser deveras apreciado. Só que o os pedidos de liberdade condicional em Macau não são, de facto, bem apreciados”, contextualiza o advogado especialista da área penal.

A atestar a incerteza dos processos, Luís recorda situações em que colegas não perceberam os requisitos a cumprir para que lhes fosse atribuída a liberdade condicional. “Tenho um amigo que teve o pedido aprovado na segunda tentativa, mas na primeira tinha tudo o que à partida seria necessário: era um ‘bom samaritano’ na prisão, tinha pessoas cá fora que o contratavam e se responsabilizavam por ele. Era também pai, e tinha um filho a começar a escola, e não foi aprovado”, conta.

Ao questionar a razão para a recusa, os serviços competentes responderam que “ele tinha praticado um crime, tinha feito mal e lá por ter direito a pedir liberdade condicional não queria dizer que lhe fosse concedida”. Neste processo “a parte mais chata é nem se saber o que se deve fazer. Não há controlo nem critérios que nos mostrem como nos devemos comportar para termos mais hipóteses de aprovação dos nossos pedidos de liberdade condicional. Vamos sempre completamente às escuras, como nas apostas”.

Requisitos dúbios

Na base desta ausência de critérios objectivos estará um requisito previsto no Código Penal. De acordo com a lei, “o tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se: for fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e se a libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social”. É precisamente neste último ponto que as dificuldades se adensam. Para Pedro Leal, a lei permite a incerteza através de um requisito “muito vago, o que faz com que seja interpretado pelos juízes de formas diferentes”. Tendo em conta esta condição, entra na apreciação dos magistrados a sua percepção pessoal da sociedade, a relação com o crime cometido pelo indivíduo e se é merecedor ou não de ser libertado antes de cumprir por completo a pena. “Aqui é a sociedade que acaba por reprimir a liberdade condicional do individuo”, comenta. O advogado entende que se pode dar o caso de se “considerar que o crime pelo qual o arguido foi condenado era muito grave e se a pessoa for posta em liberdade pensa-se que o crime não tem a gravidade que seria suposto ter”. Nestes casos, se o indivíduo for posto em liberdade a sociedade pode pensar que a justiça não funcionou, acrescenta.

Na visão de Pedro Leal, esta não é uma “boa interpretação da lei”, ou seja, a avaliação da gravidade do crime não deve ser feita aquando do pedido de liberdade condicional, porque essa tarefa é realizada quando a pena é aplicada.

É aqui que se regista uma aplicação aleatória de critérios em que “quer o juiz de instrução criminal quer os tribunais de recurso não são coerentes na aplicação deste pressuposto que tem que ver com este requisito”, reitera o advogado

Ao contrário do que seria de esperar, o princípio que parece vigorar em Macau é o de negar a liberdade condicional, o que é “um princípio invertido”. “A melhor forma para evitar a aleatoriedade deveria ser ter a concessão deste direito previsto na lei enquanto regra e o que existe é a sua negação”, acrescenta.

Antes quieto

Pedro Leal vai mais longe e admite que, actualmente, aconselha evitar o processo devido à falta de critérios de avaliação bem definidos. “Costumava incentivar as pessoas a pedirem liberdade condicional mas, a dada altura, desisti porque os juízes umas vezes têm uns critérios e outras vezes têm outros”, comenta.

Em 2018, os 14 pedidos de liberdade condicional interrompidos por opção do recluso representam 2,6 por cento do total de pedidos. Desde 2011, ano em que este tipo de situações começou a ser registada, é o maior  número de casos de reclusos que decidiram parar o processo, à excepção de 2014, ano que registou igualmente 14 casos de desistência – 2,5 por cento do total dos pedidos (542).

Sempre a descer

2014 é também o ano que marca a crescente recusa de pedidos de liberdade condicional, de acordo com os dados fornecidos pela DSC.

Desde a transferência de soberania até àquele ano, os pedidos aprovados por ano situavam-se acima dos 36 por cento. Em 2007, a taxa de aprovação foi na ordem dos 51 por cento.

O ano de 2014 regista pela primeira vez um valor abaixo dos 35 por cento, (32 por cento), sendo que de entre os 542 pedidos submetidos 177 foram aprovados e 351 recusados.

Em 2015 foram apresentados 589 pedidos, 179 dos quais (30,3 por cento) foram aprovados, 399 recusados e 11 interropidos. No ano seguinte, foram aprovados 25,3 por cento, ano com menor taxa de aprovação até o ano passado. No total foram aprovados 149 pedidos dos 587 processos apreciados.

Em 2017 a taxa de aprovação fixou-se nos 30 por cento. Dos 520 pedidos submetidos a apreciação foram aprovados 156, 357 foram recusados e 7 – 1,3 por cento, não progrediram por opção do recluso.

Este aumento de pedidos negados, não surpreende o advogado João Miguel Barros que interpreta os números como um reflexo das crescentes políticas securizantes no território. “Acho que é fácil  identificar esta lógica com as tendências que estamos a sentir na própria sociedade de Macau”, comenta.

João Miguel Barros ilustra a situação com a actualidade da política local em que o “secretário para a segurança, Wong Sio Chak, tem tido cada vez mais poder, comparativamente com o resto dos secretários”.

É este tipo de lógica que considera resultar na forma como são avaliados os pedidos de liberdade condicional. “Tem havido uma tendência de acentuar a lógica muito securizante da sociedade, o que faz um pouco parte da mentalidade política e da mentalidade do sistema”, reforça.

Peso chinês

Uma das principais causas para o aumento de recusas de pedidos de liberdade condicional pode ainda estar associada ao maior número de juízes chineses envolvidos nestes processos, sublinha ao HM uma fonte ligada à justiça que não se quis identificar. “Não tenho dúvida nenhuma que os juízes chineses são mais severos que os juízes portugueses”, apontou.

A mesma fonte explica que os magistrados portugueses “deixaram de estar nesta área”. “Havia um juízo criminal composto por um juiz macaense e dois juízes portugueses e os reclusos na cadeia diziam que os portugueses eram mais benévolos”. Hoje em dia, existem cinco juízos criminais entre os tribunais de Macau, entre 15 juízes nenhum é português. “A justiça chinesa é diferente da portuguesa”, remata a fonte ligada à justiça.

Reinserção esquecida

Na impossibilidade de conquistar a liberdade condicional, o processo de reinserção social também percorre um caminho sinuoso. “As prisões têm precisamente essa componente. A reinserção social e a liberdade condicional andam lado a lado”, conclui Pedro Leal.

A opinião é partilhada por João Miguel Barros que considera que “em Macau, infelizmente, não se aposta na reinserção social”. “É preciso implementar políticas muito claras e muito fortes de reinserção social. Nessa linha o Governo tem falhado completamente”, revela.

Tudo isto sublinha aquilo que está “errado nesta área”, visto que “em Macau vai tudo para a prisão e cumpre-se a pena”. Por cá, “a pessoa é condenada a x anos de prisão e passa lá esse tempo. Depois esquece-se de tudo o que tem a ver com a  função social. As prisões devem ter capacidade para induzir alguns valores aos reclusos”, acrescenta o advogado.

Objectivos invertidos

A papel reabilitativo da prisão também é defendido pelo psicólogo clínico Nuno Gomes. “A pessoa cometeu um delito e vai para a prisão, não só como pena mas para que possa ser reinserido socialmente”, aponta ao HM. Para o psicólogo, a integração deve estar subjacente ao sistema prisional, o que difere do passado quando o objectivo seria a exclusão do indivíduo da sociedade e o mero castigo. “Os estabelecimentos correcionais servem para a reabilitação de indivíduos, a parte do castigo é um factor mas a reabilitação e a reinserção social são factores ainda mais importantes”, reitera.

É neste sentido integrativo que Nuno Gomes considera o processo de liberdade condicional “ou seja, da possibilidade de reinserção social para o indivíduo que já tenha feito o processo de reabilitação durante um determinado período e que tenha dado provas de evolução para poder ser de novo inserido na sociedade”.

Por outro lado, esta perspectiva de poder conquistar uma liberdade antecipada pode funcionar como mecanismo  promotor da própria reabilitação. “A partir do momento em que se é inserido na prisão, sabendo que poderá haver a possibilidade de liberdade condicional isso poderá servir como motivação para o recluso se reabilitar mais rapidamente”, aponta o clínico. No sentido inverso, e “não havendo a perspectiva de liberdade condicional, isso já não acontece”.

Esta situação é ilustrada por Luís tendo como pano de fundo a sua experiência no EPM. “As recusas injustificadas acabam por mudar muita coisa no comportamento dos reclusos, tanto na prisão como, no futuro, fora dela”, refere acrescentando que “as pessoas deixam de acreditar no sistema e em vez de tentarem melhorar o seu comportamento o que acontece muitas vezes é o contrário”.

A descrença no sistema correcional torna-se, assim, um factor de frustração. “Fazem serviço comunitário, trabalham nas limpezas e ainda assim são negados. É escusado. Há pessoas que têm um crime leve, lá dentro trabalham nas limpezas do estabelecimento, não entram em lutas com outros reclusos, ajudam no que podem, e quando pedem liberdade são rejeitados. Acabam por desistir do bom comportamento”, revela Luís.

Para Nuno Gomes, psicologicamente, o tempo que se tem na prisão é um factor muito importante.“Se o recluso tem cinco anos de pena e se souber que pode cumprir menos tempo, com a possibilidade de liberdade condicional, terá motivação para se reabilitar mais rapidamente e mostrar trabalho nesse sentido”.

Acima de tudo deveria ser tida em conta a capacidade de recuperação do indivíduo, considera o psicólogo. “Haverá alguns que conseguem e outros que podem ter esta capacidade menos desenvolvida. Deve-se dar os meios necessários para que desenvolvam novas formas de adaptação”, aponta.

Há ainda que ter em conta que, depois de anos encarcerado, um indivíduo terá dificuldade em viver em sociedade e que “esta integração não é de um dia para o outro”. A nível psicológico, é necessário trabalhar na adaptação ao mundo real e às necessidades do quotidiano: “ir comprar pão, ter que arranjar o dinheiro para isso e ter uma disciplina diária”.

Problemas avulsos

As dificuldades acrescem quando o acompanhamento no exterior não promove a vida “honesta”. Um dos principais problemas prende-se com a procura de emprego. “Seria importante verificar se a pessoa que sai em liberdade condicional consegue arranjar um emprego, por exemplo. Tem de haver um acompanhamento”, aponta Pedro Leal. “As concessionárias do jogo não dão emprego a ninguém que tenha mais de uma condenação” aponta a título de exemplo.

Esta situação provoca aquilo que considera ser “outro tipo de condenação”, porque “a pessoa cumpriu pena e não tem possibilidade de trabalhar, é o mesmo que dizer que aquela pessoa não tem hipótese”.

O advogado ilustra a situação com casos que tem acompanhado: “Tenho exemplos de pessoas que depois de cinco anos do final da pena me vêm pedir a reabilitação social”. O pedido em causa é feito aos serviços de identificação que vão constatar a gravidade do crime pelo qual o indivíduo foi condenado e se cumpriu a pena com bom comportamento. “Se tudo correr bem a pessoa é reabilitada e quando isso acontece retiram do registo criminal que cumpriu pena”.  Nessa altura, já é mais fácil conseguir emprego. Por outro lado, trata-se de mais uma situação “sem sentido” visto que “se sabe que a pessoa não é primária porque cumpriu pena, mas como há um papel então já pode ter emprego”.

Luís recorda as dificuldades que sentiu em termos de emprego quando saiu da prisão. “Apresentaram-se, de facto, algumas alternativas. Mas ganhava-se muito pouco, era impossível sustentar-me com aquele ordenado que nem para pagar a casa era suficiente”, diz. Foi através de contactos e ajudas familiares que conseguiu encontrar um emprego. “Tenho um trabalho, tenho a minha vida, mas tive que me desenrascar sozinho. Era impensável aceitar o que me queriam dar depois de sair da prisão”, recorda.

De acordo com o Instituto de Acção Social, em 2018 o organismo deu apoio na procura de emprego a um total de 759 pessoas, das quais 95 se encontravam em liberdade condicional.

5 Mar 2019

Caso Sulu Sou | Pedro Leal realça esforço político contra carreira do deputado

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] acusação do Ministério Público contra Sulu Sou e Scott Chiang integra-se num esforço político que tem como objectivo acabar com a carreira do deputado. Foi este um dos pontos defendido nas alegações finais por Pedro Leal, advogado de Scott Chiang, que pediu a absolvição dos arguidos.

“Há um esforço grande do ponto de vista político para acabar com a carreira de Sulu Sou. Felizmente, há separações de poderes”, disse Pedro Leal, durante as alegações finais do caso.

“Macau devia orgulhar-se de ter políticos como estes dois. Hong Kong devia ter mais políticos como estes”, acrescentou.

O causídico considerou que o MP não foi claro na acusação, ao contrário das suas obrigações legais e que, por isso, teve dificuldades para saber o momento e a conduta que o MP afirmou ser o crime de desobediência qualificada.

“Constato que não há um crime de desobediência de forma continuada. Mas não percebo como podemos passar por esta situação. É o próprio Ministério Público que não consegue explicar como os arguidos violaram uma ordem pública”, sublinhou. Em causa está o facto do MP ter apontado quatro momentos diferentes e distanciados temporalmente para a alegada conduta de desobediência qualificada.

Aviões só com autorização

Pedro Leal criticou o facto da acusação ter focado grande parte do processo na paragem de 20 minutos à frente do auto-silo junto ao New Yao Hon. Uma parte do processo que já tinha sido arquivada pelo MP.

“Não se percebe como são reabertos em audiência do tribunal factos que já tinham sido arquivados. A acusação diz que deviam ter circulado no passeio. Mas até o MP, quando arquivou esta parte do processo, entende que não era possível prosseguir com a acusação”, apontou.

Sobre os manifestantes terem parado na tenda branca de Nam Van, o advogado destacou que nunca houve uma ordem contrária: “Nunca houve ordem a dizer que não podiam estar ali e que tinham de seguir até à Assembleia Legislativa”, apontou.

Em relação à situação junto ao Palacete de Santa Sancha, Pedro Leal recordou as palavras do responsável pela segurança: “Até o chefe Lam disse que a conduta dos indivíduos tinha sido de desobediência, porque precisavam de autorização para entregar uma carta na caixa do correio e para atirar aviões de papel. Foi essa conduta que apontou como crime”, apontou. “A polícia não soube justificar a sua actuação, não foi nada eficaz e posso dizer que foi mesmo desastrosa”, considerou.

16 Mai 2018

Julgamento de Sulu Sou e Scott Chiang novamente adiado

Pela segunda vez o julgamento de Sulu Sou e Scott Chiang, por desobediência qualificada, foi adiado por tempo indeterminado. A juíza Cheong Weng Tong justificou a decisão com a providência cautelar que pode fazer Sulu Sou regressar à Assembleia Legislativa e impedir o prosseguimento do julgamento

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] julgamento do deputado Sulu Sou e do activista Scott Chiang estava agendado para ontem de manhã, mas acabou por ser adiado, pela segunda vez, quando os intervenientes já estavam na sala de audiências. A juíza Cheong Weng Tong considerou que não estavam reunidas as condições para avançar com o caso, devido ao pedido da defesa para que Sulu Sou regresse temporariamente à Assembleia Legislativa, até que haja uma decisão final sobre a legalidade do processo que resultou na suspensão do seu mandato.
A juíza do Tribunal Judicial de Base justificou a decisão com o “risco” da providência cautelar apresentada por Sulu Sou no Tribunal de Segunda Instância ser aceite, o que interromperia a suspensão do mandato do legislador e o voltaria a proteger pela imunidade parlamentar. Mesmo que as sessões do julgamento para ouvir as testemunhas, apresentação de provas e alegações finais fossem realizadas a tempo, a juíza apontou que poderia haver o risco da decisão do TSI ser tomada antes da leitura da sentença, o que colocaria automaticamente todo o processo em causa.
A decisão de ontem foi tomada em pouco mais de uma hora, depois do Tribunal Judicial de Base ter sido notificado, logo pela manhã, pelo Tribunal de Segunda Instância e terem sido notificadas e ouvidas as partes envolvidas, ou seja os advogados de defesa e a representante do Ministério Público.
Assim, frisou Cheong Weng Tong, “tendo em conta a necessidade de estar reunido o princípio processual da continuidade” e a possibilidade das decisões tomadas pelo tribunal poderem “ser consideradas inválidas ou incorrerem em vícios”, o julgamento foi adiado por tempo indeterminado. O objectivo passa por aguardar por uma decisão do TSI.

Promessa de compromisso ignorada

Quando confrontado com este cenário, o deputado Sulu Sou comunicou ao seu representante, o advogado Jorge Menezes, que estava disposto a abdicar da providência cautelar e a comunicar essa decisão ao TSI até hoje.
“Se o tribunal considerar que é suficiente para não criar um impedimento e o julgamento prosseguir, o meu cliente, Sulu Sou, está disposto a comprometer-se a abdicar do pedido de suspensão de eficácia da deliberação da Assembleia Legislativa no Tribunal de Segunda Instância”, disse Jorge Menezes, na sala de audiência. “Esse compromisso vai ser comunicado hoje [ontem] ou, o mais tardar, amanhã [hoje]”, frisou.
Apesar da promessa do deputado suspenso, a juíza não esboçou qualquer resposta, limitando-se a declarar que o julgamento ia ser adiado.
Porém, momentos antes, Cheong Weng Tong tinha-se mostrado muito agastada com a situação, uma vez que considerou que a defesa tinha o dever de ter informado o TJB sobre a providência cautelar e sobre o recurso da suspensão do deputado. Estes são dois processo que foram apresentados pela defesa e decorrem no TSI.

Sermão à defesa

Como a defesa não comunicou ao tribunal a existência dos outros processo, a juíza apenas teve conhecimento oficial dos mesmos na manhã de ontem. Cheong Weng Tong mostrou-se bastante incomodada com a situação e não hesitou em utilizar um tom mais áspero para questionar o advogado Jorge Menezes.
“Se o processo de suspensão de eficácia for diferido o arguido Sulu Sou volta a assumir as funções de deputado e não podemos avançar com o processo. Disse que os outros processos tinham sido entregues no outro tribunal no dias 4 de Janeiro e 5 de Janeiro. A resposta da Assembleia Legislativa foi dada a 8 de Janeiro. Porque razão não informou este tribunal?”, perguntou Cheong.
“Se soubesse que tinham sido apresentados esses processos não tinha agendado para hoje a sessão do julgamento. O Dr. [Jorge Menezes] tem o dever de colaboração com o tribunal e devia ter apresentado essa informação”, apontou.
“A minha intenção nunca foi perturbar o andamento da sessão e não queria que o tribunal ficasse com a impressão que recorremos a outro tribunal para perturbar este processo”, respondeu o advogado.
“Queríamos que os dois processos corressem de forma separada para que não se afectassem, mas admito que não ponderei completamente os efeitos. Deixo a ponderação sobre a situação ao tribunal. Quero realçar que não se tratou de nenhuma estratégia para atrasar o julgamento”, sublinhou.

MP apoiou adiamento

Ainda antes de Sulu Sou ter admitido a hipótese de voltar atrás com a providência cautelar, tanto o MP, que está representado no julgamento através de Mei Fan Chan da Costa Roque, como o advogado de defesa de Scott Chiang, Pedro Leal, concordaram que o adiamento seria a melhor opção.
“Muito provavelmente, devido ao pedido de suspensão de eficácia, Sou Ka Hou vai retomar as funções e o processo crime não vai poder continuar”, começou por dizer Mei Fan Chan da Costa Roque. “Há um risco e há que ter em conta o princípio da continuidade, que é um dos princípios processuais”, acrescentou.
“Concordo com a posição do Ministério Público. Eu e o meu colega [Jorge Menezes] não tomámos este aspecto em conta. Podemos tentar acabar o julgamento antes de uma decisão [do TSI], mas corremos o risco de enquanto esperamos pela sentença haver a decisão e isso impede o julgamento de prosseguir”, considerou, por sua vez, Pedro Leal.
Esta é a segunda vez que o julgamento é adiado. A primeira sessão estava agendada para 28 de Novembro, mas a data teve de ser alterada para que a Assembleia Legislativa votasse o levantamento da imunidade parlamentar do deputado.
Sulu Sou e Scott Chiang são acusados do crime de desobediência qualificada devido às manifestações contra uma doação da Fundação de Macau à Universidade de Jinan, no valor de 100 milhões de yuan. A pena máxima para o crime aplicado é de 2 anos de prisão. Caso Sulu Sou seja considerado culpado e condenado com uma pena superior a 30 dias, a Assembleia Legislativa pode votar a perda do mandato do pró-democrata.

 

 

Pedro Leal assume defesa de Scott Chiang

Foi uma das novidades de ontem. O advogado Pedro Leal surgiu como representante de Scott Chiang no Tribunal Judicial de Base, entrando no edifício do tribunal acompanhado pelos arguidos e pelo colega Jorge Menezes. “Há cerca de três dias fui contactado e assumi o patrocínio do Scott Cheang. Era uma decisão que já estava decidida há cerca de sete dias, mas só hoje [ontem] é que foi revelada. Não tem grande relevância, se o julgamento tivesse sido realizado, acredito que tivesse sido uma situação que nem se levantava”, afirmou Pedro Leal, em declarações ao HM. O causídico escusou-se ainda a prestar mais declarações, a de Scott Chiang e Sulu Sou.

 

 

“Confiantes num julgamento justo”

À entrada para o tribunal, ontem, o deputado suspenso Sulu Sou declarou estar confiante num julgamento justo e encorajou os jovens interessados na política a não abdicarem das suas ambições: “Estamos confiantes num julgamento justo. Agradeço à imprensa e aos cidadãos toda a atenção que me têm dedicado nos últimos dois meses. Espero do fundo do coração que os jovens que se interessam pela política continuem com os seus esforços”, disse Sulu Sou. O pró-democrata voltou a abordar o caso, já no fim da audiência, em comunicado, afirmando que a defesa vai ponderar se abdicar da providência cautelar ainda é a melhor solução, visto que o julgamento já foi adiado.

 

Cândido de Pinho decide providência cautelar

A decisão sobre a providência cautelar que pode fazer com que Sulu Sou regresse de forma temporária à Assembleia Legislativa está nas mãos do juiz José Cândido de Pinho, que foi escolhido para ser o relator do caso. A decisão sobre o processo que entrou no tribunal a 4 de Janeiro deve ser conhecida dentro do período de um mês. Neste momento, já houve uma primeira resposta à providência cautelar por parte da Assembleia Legislativa, a 8 de Janeiro, que invocou o “interesse público” para que o regresso de Sulu Sou ao hemiciclo não tivesse ocorrido de imediato. No entanto, a defesa da AL, a cargo do advogado Lei Wun Kong, ainda está a preparar a contestação formal, que só vai ser entregue ao tribunal mais tarde.

17 Jan 2018