‘Chef’ português entra para ‘panteão’ de titulares do ‘green card’ chinês

[dropcap]A[/dropcap]o fim de nove anos, um casamento e dois filhos, o português Paulo Quaresma alcançou um feito raro na China: obteve autorização de residência permanente, tornando-se um dos poucos estrangeiros a ter ‘green card’ chinês.

“Este documento permite-me ter os mesmos direitos que os locais”, explica à agência Lusa o português, de 44 anos, e ‘chef’ de cozinha num hotel de cinco estrelas em Pequim.

A China emite apenas algumas centenas de ‘green cards’ por ano, sobretudo para investidores estrangeiros ou profissionais altamente qualificados em sectores-chave para o país. Até 2017, apenas 10.000, dos cerca de um milhão de estrangeiros a viver no país, tinham obtido aquela autorização de residência, que é válida por dez anos.

A física norte-americana Joan Hinton, uma das poucas mulheres cientistas que participou no Projecto Manhattan, que produziu as primeiras bombas atómicas, foi a primeira estrangeira a receber uma autorização de residência permanente do Governo chinês, em 2004.

Hinton viveu no país durante mais de 50 anos, após a fundação da República Popular, em 1949.
A embaixada portuguesa em Pequim disse à Lusa não ter registo de outro português que tenha obtido aquele documento. Já o consulado português em Cantão, sul da China, contabilizou apenas um caso.

Com cerca de 1.400 milhões de habitantes, o país asiático é, tradicionalmente, um dos maiores emissores do mundo de população emigrante. Segundo dados da ONU, o número total de emigrantes chineses ronda os 50 milhões.

Mas a posição da China nos fluxos migratórios mundiais tem-se alterado, à medida que três décadas de rápido desenvolvimento converteram o país na segunda maior economia mundial, atraindo pessoas de todo o mundo. Dados consulares apontam para mais de 1.100 portugueses a residir na China continental, em 2016.

Paulo Quaresma destaca “uma certa liberdade”, já que deixou de depender do visto de trabalho, emitido através da entidade patronal, para permanecer na China.

“Fica tudo mais simples”, descreve. “Não preciso renovar o visto todos os anos e até para uma empresa me contratar já não é uma carga de trabalhos”, nota.

Os titulares do ‘green card’ têm os mesmos direitos que os cidadãos chineses em áreas como educação, segurança social, mercado imobiliário, negócios ou mercado de trabalho.

Com mais de 20 anos de profissão, o ‘chef’ português chegou a Pequim em 2010 para dirigir a cozinha do “Camões”, restaurante aberto num hotel de cinco estrelas do centro de Pequim, propriedade de David Chow, CEO da Macau Legend Development.

Entretanto, casou com uma mulher chinesa, com quem teve dois rapazes. Apesar de as autoridades chinesas priorizarem profissionais estrangeiros em centros de pesquisa ou empresas de alta tecnologia considerados “chave” para o desenvolvimento da China, o processo de Quaresma acabou por ser mais rápido e simples do que o previsto.

“Estava estimado durar entre um e dois anos, e durou seis meses. Disseram que eventualmente me iam ligar para entrevistas, mas nunca ninguém me contactou”, conta. O programa está também aberto a estrangeiros casados com cidadãos chineses há pelo menos cinco anos.

“Os ‘green card’ são destinados a pessoas muito inteligentes”, reconhece Paulo Quaresma. “E eu fui inteligente em ter casado com a minha mulher”.

5 Abr 2019

Justa Nobre e José Bengaló, chefs de cozinha: “É uma profissão de amor”

Justa Nobre e José Bengaló são os chefs portugueses que puseram mãos na cozinha do Clube Militar em mais uma quinzena gastronómica. Pela segunda vez na RAEM e em final de mais uma iniciativa de sucesso salientam os reencontros e o interesse pelas suas criações das receitas da terra

[dropcap style=’circle’]D[/dropcap]e regresso a Macau, a convite do Clube Militar, a dupla de Chefs Justa Nobre e José Bengaló mostram do que melhor se faz na cozinha portuguesa numa iniciativa bianual dedicada à gastronomia lusa. Paralelamente à mesma sai uma nova ementa composta pelos pratos com mais sucesso para acompanhar os mais saudosos e apreciadores dos sabores de Portugal.
Começaram ambos a cozinhar desde pequenos. Justa Nobre lembra a paixão pela cozinha “desde o berço” diz ao HM. “Desde pequena sempre adorei tachos e panelas. Vinha das escola e a primeira coisa que fazia era destapar as panelas e provar a comida” para dizer à mãe o que faltava. Para ela, “cozinhar ou brincar era igual”. Aos 21 anos sai de Trás os Montes para chefiar um restaurante em Lisboa e não mais largou o sucesso. Autodidacta, considera-se “muito intuitiva para a cozinha.” Apesar de criar pratos mais dentro da gastronomia portuguesa, nomeadamente transmontana, a sua terra natal, desfruta da mesma forma pelo amor à criação de novos pratos. josé bengaló
Por seu lado José Bengaló partilha o amor pela confecção de pratos, principalmente de peixe. Nascido em Cascais, na altura terra saloia esteve sempre em contacto com o mar e a ligação à cozinha vem desde pequeno. “Sempre gostei de comer e sempre me fui interessando pelas cozinhas”. Na origem do interesse esteve também a família, neto de dono de restaurante e filho de alentejanos e dos pitéus locais. Depois vieram as viagens pela Europa para a apanha da fruta e vindimas e com isso o interesse por outros sabores. Refere que “acabei por me interessar por isto, mas foi no Sul de França onde estive antes de cumprir serviço militar que o amor se revelou”. Mais tarde fez parte da equipa que abriu a Escola de Hotelaria do Estoril. Para ambos “cozinhar é um estado de espírito que vem de dentro” sem esquecer as técnicas e a mão, salienta o cozinheiro, enquanto Justa Nobre adianta ainda a importância do gostar de comer” porque só assim se entende o paladar dos outros também. .

Casas cheias

Desde a primeira vez que a dupla conta com um forte interesse pela iniciativa. A chef lembra que “tivemos muita adesão tanto de portuguesas como chineses”. Agora, e dada a casa cheia com carácter permanente, justifica que “as pessoas estavam com saudades nossas e quiseram regressar, temos aqui pessoas que vêm cá todos os dias almoçar e jantar.” Sendo que por parte dos criadores de pratos há o cuidado de trazer sempre receitas diferentes.
Apesar de algumas limitações relativas a “um ou outro ingrediente”, nomeadamente de peixe, “têm sempre o bacalhau”. Para Justa Nobre “quando temos bom bacalhau e bom azeite está meio caminho andado”.
Já o chef salienta a cuidado com a qualidade que sente por parte do Clube Militar.
Justa Nobre e José Bengaló apesar de terem os seus restaurantes independentes, “há muitos anos que trabalham juntos e que são amigos” sendo esta mais uma oportunidade de cada um fazer as suas criações e depois, juntos, chegarem a um consenso: “não faz sentido estar a cozinhar em pratos separados, é em conjunto! Assim é que se faz bem!”remata a cozinheira.

Novo cardápio

Depois de 15 dias de degustação é o feedback dos clientes que lança os nomes para a nova ementa do Clube. Tendo em conta os pratos mais apreciados é feito o novo menu sendo que o resultado deste ano já anuncia a integração da canja de amêijoas, da sopa de crustáceos folhada ou o cesto de sapateira e, claro, o bacalhau com couve e grão, entre outros. No entanto, “o importante é que eu e a Justa deixemos este cunho de como fazer as receitas portuguesas”.
Aliado a este legado está a formação da equipa permanente da casa em que “eles têm que aprender a fazer correctamente os nossos pratos” adianta Justa. Salienta ainda a mais valia de conhecimentos bem como o dinamismo do cardápio. Da equipa à qual dão formação, há quem conte já com 20 anos de casa. Para os chefs “é de fácil formação e constituída por elementos que gostam de aprender e que pela humildade dá gosto ensinar.” O Festival Gastronómico vai dando esta aprendizagem com os chefs que vai convidando e os que ficam “já entendem os pormenores que fazem realçar os nossos sabores”, conclui José Bengaló.
Da cozinha de Macau, são ambos fãs: “Uma cozinha rica cheia de cor e de sabor” afirma a cozinheira.
Levam consigo a familiaridade e os reencontros . Bengaló gosta também de “ ver os amigos que já não via há trinta anos e é uma oportunidade de avivar memórias”, salientado que sente uma grande ligação entre Portugal e Macau. “É bom que Portugal ainda tenha deixado alguma coisa e que continue a manter uma boa presença em Macau”. Por outro lado refere com espanto “o crescimento assustador” que regista neste últimos quatro anos. Justa Nobre também reencontra na RAEM amigos e vai “ganhando outros e também clientes.” Ao mesmos tempo, vem sempre gente nova e “é sempre bom conversar com outros portugueses” enquanto que “a respeito dos chineses e macaenses são pessoas muito simpáticas, sempre com um sorriso para nós” . Remata ainda que se sente em casa nestas idas e vindas que vão gerando laços.

13 Jun 2016