Bordalo II | Artista português ergue panda gigante na Taipa velha

Foi apresentada esta terça-feira, na antiga fábrica de panchões na Taipa velha, a obra do artista Bordalo II. Um panda gigante, feito com materiais encontrados no lixo, marca a estreia do artista em Macau no âmbito da quinta edição do “Encontro em Macau – Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa”

 

O artista Bordalo II apresentou esta terça-feira um panda de 6,5 metros, feito de resíduos, na antiga fábrica de panchões na Taipa velha, onde volta a chamar a atenção para a contínua produção de lixo e destruição do planeta.

Caixotes de lixo, capacetes, vários tipos de mangueiras e tubos, para-choques, separadores de estrada, pneus e redes de pesca. Lixo que dá forma a um panda, de pernas para o ar, de 6,5 metros de altura, erguido pelo artista português Bordalo II na histórica fábrica de panchões Iec Long.

A mensagem do autor deste panda gigante é conhecida. Também a ideia desta “primeira peça” em Macau da série “Big Trash Animals” – em que são produzidos animais com resíduos – é “utilizar a poluição, a contaminação ou o próprio lixo, plástico na maioria, para fazer imagens das vítimas”, disse o artista num encontro com jornalistas.

“Quando fazemos a representação dos animais com aquilo que os destrói, com aquilo que destrói a natureza, acho que vai além de ser uma preocupação ambiental, deve ser também uma preocupação com nós mesmos, porque somos animais também, portanto, provavelmente aquilo que destrói a natureza, animais e seus habitats, vai-nos destruir também”, completou.

E o animal de plástico “encaixa perfeitamente” no espaço seleccionado. “É muito importante que uma estrutura como esta tenha espaço para respirar, e neste sítio tem”, disse, ao falar sobre as antigas ruínas da fábrica Iec Long, recuperadas recentemente e com “árvores loucas” centenárias.

Além disso, estar ao ar livre também tem um lado positivo, porque o espaço público é “o sítio onde se consegue comunicar arte com mais pessoas”.

Mão de engenheiro

Questionado por uma artista presente sobre como sobrevive uma obra destas a condições meteorológicas adversas – ainda mais numa cidade afectada por tempestades tropicais – Bordalo II notou que este trabalho teve a intervenção e os cálculos de um engenheiro, ou seja, “não se mexe, não se vai estragar e não é uma coisa perigosa”.

Bordalo II, nome artístico de Artur Bordalo, foi um dos artistas convidados para a exposição anual do “Encontro em Macau – Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, na quinta edição.

Além do panda gigante, estão expostas quatro outras obras que seguem o mesmo conceito: três quadros – um panda, um lince e um pangolim – na galeria de exposições das Casas da Taipa, e um mural com dois colhereiros-de-cara-preta, nos antigos estaleiros navais de Lai Chi Vun, estrutura também recuperada recentemente.

Aos jornalistas, o artista sublinhou a dificuldade em encontrar localmente matéria para completar o panda gigante, pelo que apenas parte do lixo utilizado na obra foi recolhido pela equipa em Macau. Cerca de 30 por cento da escultura veio preparada de Portugal.

“Não entendi exactamente como funciona o sistema de reciclagem cá, ou se é tudo queimado, ou se existe ou não. Percebermos só que era difícil. Geralmente quando é difícil é porque a organização não é boa, porque quando é boa, é fácil ir a um sítio e saber onde é que estão as coisas”, declarou.

E o acesso aos materiais não foi o único imprevisto, já que era suposto que o panda estivesse de patas assentes no chão: “A produção aqui no local tornou-se tão difícil, com uma série de problemas, que foi a forma que encontrámos para ser mais fácil reconstruir a peça”.

Sendo o jovem artista também conhecido pelo activismo social e político, Bordalo II referiu que não houve “tempo suficiente para pensar numa coisa pertinente do momento para fazer um ‘provoc'” em Macau.

“Aproveito o facto de ter peças que são aceites e mais facilmente aceites pelas pessoas, para ter outras séries de trabalho mais corrosivas, mais críticas, mais provocadoras”, disse ainda sobre o trabalho que desenvolve.

“Há outras questões que se estão a passar no mundo que são muito fortes neste momento e temos estado a preparar peças para falar sobre isso – Gaza, obviamente”, explicou.

Recentemente, o artista pintou a bandeira da Palestina numa escadaria de uma estação de comboios de Lisboa, num trabalho batizado de “Guilty steps”. “Já fizemos mais duas [peças] entretanto e temos três em produção agora para a época natalícia, em que toda a gente está feliz e em harmonia, mas as coisas não são assim tão simples”, rematou.

21 Dez 2023