José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasEspécies de vinho liu-pun No Boletim Official do Governo da Província de Macau e Timor de 4 de Março de 1893, o inspector da fazenda apresenta o número de licenças e respectiva cobrança para negócio de Liu-pun em Macau, na Taipa e Colovane em relação ao período decorrido de 15 de Janeiro a 14 de Abril de 1893. Em Macau existiam 24 licenças para importação do Liu-pun que renderam à fazenda 345,000; para o fabrico de vinho 13 licenças pagaram 260,000; para a venda por grosso 41 renderam 501,500 e venda a retalho 136 licenças pagaram 669,500. Só na península de Macau a fazenda arrecadou em três meses um total de 1.776,000 patacas. Quanto à Taipa e Colovane não foram emitidas licenças para importação de vinho e as 11 licenças para o fabrico renderam à fazenda 87,500; as 21 licenças para venda por grosso 107,500 e na venda a retalho 7 pagaram 21,000, perfazendo em três meses um total de rendimento de 216,000 patacas. No resumo comparativo deste mapa com os publicados nos Boletins Oficiais n.º 31 e n.º 46 da série de 1892, o número de licenças concedidas para o trimestre de 31 de Julho a 15 de Outubro de 1892 foi de 229, sendo 246 nos três meses seguintes, de 31 de Outubro de 1892 a 15 de Janeiro de 1893, e 253 de 31 de Janeiro a 15 de Abril de 1893, logo mais 24 licenças que desde o início. Enquanto a importância cobrada até 31 de Julho de 1892 com relação a três meses que findou em 15 de Outubro foi de $1,640,000, no trimestre seguinte para o período que acabou a 15-1-1893 foi de $1,888,500 e $1,992,000 até 15-4-1893, logo mais $353,000 que o previsto no início. O valor anual do imposto calculado a 31-7-1892 era de $6,560,000, a 31-10-1892 de $7,554,000 e para 31 de Janeiro a 15 de Abril de 1893 de $7,600,000, logo mais $1040,000 do que o estimado a 31 de Julho de 1892. O Echo Macaense refere a 17-10-1893: “a câmara municipal ainda quer lançar 17% sobre o imposto do vinho liu-pun, sem se lembrar que este vinho é género alimentício de primeira necessidade, e que para implantar esse imposto o governo viu-se em embaraços de que não convém suscitar a recordação.” A 5 de Março de 1894 na repartição de Fazenda se procederá, perante o inspector de fazenda Arthur Tamagnini Barbosa, à venda, em hasta pública, de 168 bules de vinho liu-pun das espécies: Ung-ka-pi 84 bules, Mui-kuai-lu 36 bules e o mesmo número de Si-kuoc-kung e 12 bules de In-ch’an-lu, apreendidos em harmonia com as instrucções para a arrecadação e fiscalização do imposto sobre o dito vinho em Macau, Taipa e Colovane de 16 de Julho de 1892. O imposto indirecto sobre o vinho liu-pun no ano de 1894-95 rendeu à fazenda 7:067.00 patacas e no ano seguinte (1895-96) 6:667.33. Em 1896-97 deu 6:092.00 patacas; 6:595.51 no ano de 1897-98 e em 1898-99 a fazenda recebeu 6:855.58 das licenças; em 1899-1900 foi de 6:738.57; em 1900-01 rendeu 6:606.75; em 1901-02 facturou 6:683.50 e no ano de 1902-03 o valor de 6:457.50 patacas. Por acórdão do conselho de província de 3 de Maio de 1889 e decreto de 31 de Janeiro de 1895 para as receitas do Leal Senado foi autorizado o Imposto municipal directo de 2% sobre o valor dos exclusivos. Daí relativo ao ano económico de 1895-96 a Câmara recebeu $188,75 do exclusivo da licença da venda de liu-pun, $150 em 1896-97, $120,50 em 1897-98 e $110 em 1898-99 como refere o B.O. de 16-7-1898, valor rectificado para 125,82 patacas no B.O. n.º 51 de 1899. No B.O. n.º 30 de 1899 o Inspector da Fazenda faz público que no dia 3 de Agosto se procederá à adjudicação em hasta pública, por licitação verbal, do vinho liu-pun abaixo designado: Vinho de limão 2 boiões, 4 de vinho de abrunho, 1 de vinho de pera, 20 boiões de vinho de gramma, 21 de arroz preto e 4 de arroz branco; 28 potes de vinho de Ung-ka-pi e 6 garrafas de vinho medicinal. Nesse mesmo ano, o inspector da fazenda Arthur Tamagnini Barbosa publica o anúncio da arrematação a 23 de Novembro de 1440 boiões de liu-pun e a amostra desse vinho estaria patente na casernaria da fazenda. Mais 104 boiões de vinho liu-pun vão em hasta pública à adjudicação a 26 de Dezembro de 1899. Nova legislação O vinho liu-pun passou nas duas primeiras décadas do século XX sem referência no B.O. e apenas aparece em 1913 o convite aos proprietários das casas de venda por grosso e fabrico de vinhos chineses para comparecerem a uma reunião a 1 de Abril na Procuratura Administrativa dos negócios sínicos. No diploma legislativo n.º 55 de 24 de Outubro de 1923 a Fazenda lançava um imposto adicional de 5% sobre a contribuição predial e licenças comerciais e industriais cobradas para pagar o seguro feito por o Tesouro Provincial contra incêndio dos bens móveis e imóveis da Colónia. No B.O. de 22-11-1924 aparece aprovado o diploma provincial n.º 50 onde estão fixadas as taxas das licenças para o vinho liu-pun em Macau, Taipa e Coloane, estabelecidas pelo disposto no artigo 3.º do regulamento aprovado pela portaria provincial n.º 102 de 16 de Junho de 1892. Passam a ser: Em Macau, as taxas das licenças para fabricar, importar e exportar ou vender por grosso são de 100,00 patacas e para venda a retalho de 60,00. Na Taipa, fábrica, importação e exportação ou venda por grosso pagam 60,00 e venda a retalho 36,00. Sobre essas taxas continua incidindo o adicional de 5%, estabelecido pelas disposições do artigo 10.º do diploma legislativo n.º 55 de 24-10-1923. O Diploma legislativo provincial n.º 45, publicado no B.O. de 27-8-1927, aprovava o regulamento para a cobrança do imposto sobre bebidas para Macau e Ilhas, e ao contrário dos vinhos chineses, que não pagavam imposto, por o Artigo 3.º o liu-pun continuava a ter as taxas fixadas no diploma provincial n.º 50 e por portaria provincial n.º 102. No Boletim Oficial da Colónia de Macau de 29 de Dezembro de 1928 aparece o Diploma legislativo N.º 45 a actualizar o imposto sobre o vinho liu-pun e alterar algumas das disposições do respectivo regulamento. No ano seguinte, nesse diploma é substituído o artigo 3.º, suas alíneas e § único, como refere o Governador Artur Tamagnini de Sousa Barbosa no B.O. de 28-12-1929:
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasVinho de arroz em Macau O arroz, cultivado no Sudeste Asiático pelo menos desde 8200 a.n.E., era em Macau plantado nas várzeas junto à aldeia de Mong-há e serviria apenas para consumo da população agrícola, sendo pouco provável fazer-se com ele vinho, ou se produzido, era em pequenas quantidades e apenas consumido pelos agricultores locais. O arroz, género alimentício de primeira necessidade para os chineses do Centro e Sul da China, era de excelente qualidade o produzido no distrito de Heungshan (Zhongshan), de onde provinha também o vinho feito com esse cereal. No reinado do Imperador Qianlong (1735-95), em Macau havia lojas a vendê-lo, sobretudo o proveniente de Guangdong, sendo comercializado dois tipos de vinhos de arroz, o no-mai-chau, 糯米酒 adocicado feito com arroz glutinoso e o de pior qualidade, o destilado liu-pun, 料半, significando liu=material e pun=metade. Na década dos anos 60 do século XIX, o grande aumento da população chinesa em Macau levou a um enorme consumo de vinho de qualidade inferior, o liu-pun, florescendo o negócio da sua venda e importação e muito mais ainda no decénio seguinte. Logo aí viu o Governo português de Macau uma forma de arrecadar dinheiro e como em 1849 a administração do Governador Ferreira do Amaral introduzira a política de atribuição da venda de alguns produtos em forma de exclusividade, deste modo, “eram subtraídos à iniciativa privada alguns ramos de negócio sendo concedidos, quase sempre por arrematação, a indivíduos ou a empresas instaladas no território”, segundo Fernando Figueiredo. O Governo cedia ao arrendatário, mediante o pagamento de uma quantia, a exclusividade da venda do produto integral por um determinado período de tempo e assim ficavam os cofres públicos com uma regular receita fixa. A razão era a situação das finanças de Portugal obrigarem à redução drástica das despesas públicas em todas as províncias ultramarinas, devido a terem em cinco anos passado de 1.198:668$933 réis entre 1885-86 para 3.476:860$100 em 1889-90, segundo o Boletim Official do Governo da Província de Macau e Timor N.º 48 de 26-11-1891. O B.O. N.º 12 de 24 de Março de 1892 apresenta o mapa das receitas cobradas em Macau nos anos económicos de 1886-87 a 1890-91: em Impostos directos [Décima predial e industrial; direitos de mercê; Selo; Contribuição de registo; Renda de carne de porco; Renda do peixe; Lotaria de Vae-seng; Lotaria de Pacapio; Fantan; Licença para venda de ópio cozido; Multas; Emolumentos sanitários] 1.482:077$729 e só entre 1890-91, 320:213$980. Já nos Impostos indirectos [Direitos da renda do sal; Direitos da pesca das ostras; Licenças para pesca no litoral da cidade; Rendimentos do Porto; Rendimentos da Taipa] entre 1886 e 1891 recebeu 159:049$231 e a quantia no ano 1890-91 de 40:965$457, existindo ainda outros rendimentos colectados. Condições de arrematação O ministro e secretário d’ Estado do Ministério dos Negócios da Marinha e Ultramar Júlio Marques de Vilhena enviou em 1 de Outubro de 1891 à 2.ª Repartição da Direcção Geral do Ultramar o seguinte: O Rei ordenou que se faça executar. O Decreto autorizando o governador da província a estabelecer em Macau o exclusivo da bebida denominada Liu-pun saiu no B.O. n.º 50 de 10-12-1891. No B.O. n.º 4 de 28-1-1892 foi publicada a portaria régia N.º 114 a determinar que as arrematações sejam feitas perante uma comissão, lavrando-se em seguida ao encerramento da praça o contrato definitivo. 2.ª Repartição N.º 114: O anúncio da repartição de fazenda provincial sobre a arrematação do exclusivo do vinho Liu-pun é publicado no B.O. de 3 de Março de 1892: As condições para a licitação são: Primeira – Apresentação por parte de cada um dos licitantes do documento comprovativo de terem em seu nome depositado no cofre geral desta província, a quantia de quinhentas patacas que serão restituídas, encerrada a praça, àqueles a quem não seja feita a adjudicação ou que sendo-o, reverterá para a Fazenda se o adjudicatário se recusar a assinar o respectivo contrato ou a completar a caução exigida para garantia do mesmo contrato, logo em acto contínuo à adjudicação. Segunda – A Fazenda reserva para si o direito de fazer a adjudicação quando e a quem mais lhe convenha. Terceira – No caso de ser feita a adjudicação, o respectivo contrato será desde logo assinado por ambas as partes contratantes. Macau, 2-3-1892, o inspector da fazenda Arthur Tamagnini Barbosa. Chegou o dia 17 de Março e quatro pretendentes depositaram dinheiro para entrar na licitação.