Um Grito no Deserto VozesFolhas caídas Paul Chan Wai Chi - 14 Nov 2025 Este ano, o Inverno não tem estado particularmente frio e não encontramos muitas folhas caídas no chão. No entanto, a 30 de Outubro, o site noticioso “All about Macau”, sediado na cidade, anunciou que depois de cuidadosa ponderação, tinha decidido interromper a sua publicação mensal na sequência do incidente de Outubro e que, a partir de 20 de Dezembro, deixaria de fazer actualizações no website e nas plataformas de comunicação. Os jornalistas devem ter sentido que caiu a última folha da comunicação social independente. No editorial, “Adeus, até à próxima. Cuidem-se e Sigam em Frente”, o “All about Macau” explicava brevemente as razões do cancelamento das publicações. O principal motivo foi os seus jornalistas estarem impedidos de entrar em eventos oficiais desde Outubro de 2024. Em Abril de 2025, foi-lhes vedado o acesso à Assembleia Legislativa e três deles enfrentam agora um possível processo criminal devido àquele incidente. Além disso, o Gabinete de Comunicação Social notificou o “All about Macau” o mês passado, declarando que, de acordo com os requisitos do registo de publicações especificados na Lei de Imprensa, o “All about Macau” “deixou de reunir as condições para exercer actividade jornalística”, tendo sido cancelado o número de registo da sua publicação mensal. Tendo sido director da extinta publicação católica “Observatório de Macau”, compreendo perfeitamente o sentimento de profunda impotência daqueles que aspiram a ter uma carreira no jornalismo quando a publicação em que trabalham é encerrada. Desde o regresso de Macau à soberania chinesa, sucessivos Chefes do Executivo mantiveram e, inclusivamente, apoiaram os órgãos de comunicação social, organizando em Janeiro almoços anuais com os seus representantes chineses e portugueses. Durante estes encontros, os funcionários do Gabinete de Comunicação Social aproveitavam a oportunidade para trocar opiniões, ouvir o que os profissionais do sector tinham a dizer e o clima que se vivia era amigável. É inegável que desde a desclassificação de candidatos ao sufrágio directo (deputados eleitos por sufrágio directo) nas eleições de 2021 para a Assembleia Legislativa, o cenário político de Macau mudou. A publicação online “Macau Concealers”, fundada pela “Associação de Novo Macau”, foi a primeiro a encerrar devido à falta de recursos operacionais, seguido pela “aposentação” da própria “Associação de Novo Macau”. Por outro lado, o “Observatório de Macau”, do qual fui responsável, foi afectado pela revisão do sistema de apoios do Governo da RAEM às publicações periódicas e deixou de poder concorrer aos apoios financeiros. Assim, o Observatório de Macau, que sempre funcionou sem subsídios governamentais, reduziu as despesas, passou da impressão a cores para a impressão a preto e branco e os colaboradores começaram a participar com base no voluntariado. Nos finais de 2021, o “Observatório de Macau” continuava à procura de apoio junto dos subscritores e de apoiantes. E foi só no início de 2022 que recebemos subitamente a notícia do encerramento da publicação. O motivo apresentado para o encerramento oficial do “Observatório de Macau” na segunda metade de 2022 não tinha a ver com o Governo; foi meramente uma decisão tomada pela entidade que o geria. Foi-nos dito que o conselho de administração planeava reestruturar o “Observatório de Macau”. Será o encerramento do “All about Macau” a última folha caída da imprensa independente de Macau? Pessoalmente, acredito que o valor de um órgão de comunicação social depende antes de mais das necessidades sociais, particularmente no que respeita a transmitir a realidade dos factos, a salvaguardar o direito dos cidadãos à informação, a apoiar o Executivo ajudando a aperfeiçoar a governação e a assumir um papel de supervisor do desempenho do Governo. Na China, durante a Dinastia Tang, o Imperador Taizong estava muito insatisfeito com Wei Zheng, um ministro que frequentemente o criticava. O Imperador disse mesmo à Imperatriz que tinha vontade matar esse “burgesso sem educação”, mas foi dissuadido pela esposa e por isso Wei Zheng continuou a ser ministro por mais de uma década. Embora o poderoso imperador Taizong estivesse certamente insatisfeito com as críticas de Wei Zheng, também sabia que o seu primo mais inteligente, Yang Guang, último Imperador da Dinastia Sui, foi derrubado porque se recusava a aceitar as críticas dos seus ministros. Por conseguinte, o encerramento da publicação “All about Macau” pode não vir a ser a última folha caída. A garantia da liberdade de expressão, da co-existência de valores diferentes e do direito do público à informação é essencial quer para o Governo quer para a sociedade. Enquanto Macau permanecer como a “terra de Lótus”, certamente que novas folhas irão nascer para saudar o nascer do Sol quando a Primavera chegar.