Grande Plano MancheteContratação pública | Novo regime “está no bom caminho”, diz advogado Andreia Sofia Silva - 24 Mar 2025 Marco Caldeira, advogado e professor auxiliar convidado da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, defende que a proposta de lei de contratação pública, em análise na especialidade no hemiciclo, está “no bom caminho”, no que diz respeito à tentativa de “promover a transparência e concorrência e apostar na digitalização”. O tema foi discutido na última semana no Centro Científico e Cultural de Macau A proposta de lei de contratação pública, actualmente em análise na especialidade na primeira comissão permanente da Assembleia Legislativa (AL), foi um dos temas abordados nas “Conferências da Primavera”, no Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), na última semana. O autor da palestra, o advogado e docente Marco Caldeira, teceu elogios ao diploma pela sua tentativa de reforma e inovação em vários aspectos. “Embora não sendo perfeita, a proposta de lei em discussão justifica-se pela necessidade de actualizar legislação que foi aprovada há quatro décadas. Trata-se de uma proposta que parece apontar no bom caminho, havendo um esforço de codificar o regime, promover a transparência e a concorrência e apostar na digitalização”, defendeu o professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) ao HM. Além disso, Marco Caldeira entende que o diploma, e o conteúdo proposto pelo Governo, visa “seguir aquilo que são as boas práticas adoptadas na Europa e no Ocidente, em geral”. “É também muito louvável o facto de a proposta ter sido elaborada na sequência de um procedimento sério e participado de consulta pública, que deu oportunidade aos operadores económicos e entidades contratantes de identificarem deficiências na legislação vigente e apresentarem sugestões”, acrescentou Marco Caldeira. Na sessão do CCCM, o docente da FDUL apontou ainda ser “louvável a preocupação [demonstrada, no diploma] com a concorrência e transparência dos procedimentos”, e também “o foco na formação na utilização de bases de dados, bem como a aposta na centralização”. O docente entendeu ainda que, nesta proposta de lei, o regime português “pode ajudar, pois a prática seguida em Portugal, e as evoluções legislativas, têm ensinamentos úteis que, com as devidas adaptações, podem ser transpostos para Macau”. Pontos positivos Na apresentação no CCCM, Marco Caldeira destacou vários aspectos positivos da actual proposta de lei, nomeadamente “a determinação expressa da inaplicabilidade a certos contratos”, ou o facto de estarem estabelecidos “princípios fundamentais da contratação pública”. Exige-se, ainda, com a nova lei, “qualificações aos candidatos e concorrentes” de concursos públicos, existindo também “a clarificação e uniformização dos tipos procedimentos de contratação pública”. Cria-se, assim, um “regime de contratação centralizada”, além de se regulamentarem “critérios de adjudicação” nos concursos, prevendo-se ainda a criação de um website exclusivo para a área da contratação pública. Marco Caldeira chamou ainda a atenção para a real necessidade deste diploma, pois a contratação pública estava legislada com diplomas variados, incluindo dois decretos-leis de 1984 e 1985, que estabeleciam, respectivamente, o regime de despesas com obras e aquisições de serviços, e o processo de aquisição de bens e serviços. Tais diplomas estavam “desfasados da realidade” de Macau, mesmo que o decreto-lei de 1984 tenha sido revisto em 2021, considerou o docente. Marco Caldeira considerou também que o processo de revisão deste diploma tem sido “moroso”, pois a consulta pública realizou-se entre 6 de Novembro de 2018 e 4 de Janeiro de 2019, tendo sido elaborado um relatório posterior, mas a verdade é que a proposta de lei está em análise na especialidade desde Dezembro de 2023, tendo sido votada na generalidade a 11 de Janeiro do ano passado. O que tem de mudar Na mesma sessão, o causídico e professor universitário realçou ainda os pontos já abordados pela primeira comissão permanente da AL quanto às mudanças necessárias para legislar na área da contratação pública. Impunha-se “consagrar expressamente os princípios jurídicos fundamentais, como a economia, eficiência e eficácia, bem como a publicidade e transparência”, existindo ainda “uma falta de regulação das políticas de contratação pública”. Havia ainda a “necessidade de promover a transparência nos procedimentos de contratação pública” e assegurar “uma maior protecção da concorrência leal”. Verificava-se também “a falta de regulamentação rigorosa e explícita sobre a composição e funcionamento das comissões de avaliação das propostas” submetidas a concurso público, além de haver “falta de exigências explícitas sobre as qualificações e capacidades dos candidatos e concorrentes nos procedimentos de contratação”. Outras lacunas apontam para a “insuficiência de regulamentação e transparência nos procedimentos de avaliação e adjudicação”, ou “falta de regulamentação explícita sobre situações de apresentação de propostas com um preço anormalmente baixo”. Era ainda necessário “aperfeiçoar o regime sancionatório e de fiscalização”, bem como apostar na “regulamentação que promova o desenvolvimento da contratação electrónica”. Diz o Executivo Olhando para a nota justificativa sobre a proposta de lei, submetida pelo Executivo à AL, lê-se que um dos grandes motivos para a sua apresentação foi mesmo a dispersão legislativa que se verificava e o desajustamento face à actual realidade. “A parte nuclear desses diplomas foi elaborada em meados dos anos 80 do século passado, encontrando-se em vigor há mais de 30 anos. Uma parte significativa do disposto nos outros diplomas legais já apresenta uma evidente divergência relativamente às necessidades do desenvolvimento socioeconómico actual de Macau, à eficiência da gestão da Administração pública e ao reforço da transparência e fiscalização”, lê-se. Segundo o Executivo, “dado que a contratação pública envolve a utilização do erário público, torna-se essencial rever esses regimes, a fim de ir ao encontro das necessidades da sociedade dos nossos dias”. Assim, nesta proposta de lei, “regulamenta-se, de forma integrada, o processo e regime de despesas com obras e aquisições de bens e serviços”, mantendo-se algumas disposições de uma lei de 1999, por se entender que “as disposições relativas ao regime de empreitadas de obras públicas têm um elevado grau de especialização e se apresentam ainda eficazes”. Pretende-se, com a nova lei da contratação pública, “garantir a justiça, imparcialidade na avaliação das propostas”, definindo-se “expressamente critérios de ajudicação e determinando-se de forma rigorosa as normas de conduta dos trabalhadores e membros das comissões de abertura e avaliação de propostas” submetidas a concurso, para que “excerçam as suas funções de forma imparcial e íntegra”. Prevê-se, assim, “que as entidades contratantes devem publicitar, de forma adequada, os elementos informativos relativos aos procedimentos de contratação pública”. São eles “os que estão relacionados com o concurso público, os esclarecimentos prestados, a rectificação de documentos, a prorrogação do prazo para a apresentação de propostas, as causas para a não adjudicação, a decisão de anulação do procedimento e a decisão de adjudicação”. A fim de garantir a concorrência leal, o Governo quer garantir que todas as entidades interessadas em participar num concurso tenham “o mais amplo acesso” a todos os procedimentos, proibindo “todos os actos, acordos ou práticas susceptíveis de impedir, falsear ou restringir a concorrência”. Além disso, existe o “princípio da imparcialidade”, que determina que “o programa de procedimentos, caderno de encargos ou outros documentos, elaborados pela parte contratante, não podem conter qualquer cláusula destinada a favorecer ou prejudicar um determinado interessado”.