G20 | Defendidas “acções concretas” para enfrentar desafios globais

A cimeira do G20 terminou ontem com a entrada da União Africana como membro permanente. Em Nova Deli, foi assinada uma declaração que promete “acções concretas” para responder a desafios mundiais, nomeadamente um compromisso de aposta em energias renováveis

 

A cimeira do G20, presidida pelo primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, que decorreu este fim-de-semana em Nova Deli, resultou numa declaração final consensual com o estabelecimento de um compromisso com “acções concretas para enfrentar desafios globais”.

“Encontramo-nos num momento decisivo da história em que as decisões que tomamos agora determinarão o futuro das pessoas e do planeta. É com a filosofia de viver em harmonia com o ecossistema envolvente que nos comprometemos com acções concretas para enfrentar os desafios globais”, lê-se na declaração dos líderes do G20.

A cimeira do G20 teve como tema “Vasudhaiva Kutumbakam”, frase sânscrita encontrada em textos hindus como o Maha Upanishad, que significa “O mundo é uma família”. “A cooperação do G20 é essencial para determinar o rumo que o mundo tomará. Persistem os ventos contrários ao crescimento económico e à estabilidade globais. Anos de desafios e crises em cascata reverteram os ganhos da Agenda 2030 e dos seus Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”, refere a declaração.

No documento, os líderes do G20 indicam que “as emissões globais de gases com efeito de estufa continuam a aumentar, com as alterações climáticas, a perda de biodiversidade, a poluição, a seca, a degradação dos solos e a desertificação, ameaçando vidas e meios de subsistência”.

“O aumento dos preços das matérias-primas, incluindo os preços dos alimentos e da energia, está a contribuir para as pressões sobre o custo de vida. Desafios globais como a pobreza e a desigualdade, as alterações climáticas, as pandemias e os conflitos afectam desproporcionalmente as mulheres e as crianças, assim como os mais vulneráveis”, sublinha o G20, considerando que juntos têm a oportunidade de construir um futuro melhor.

De acordo com a declaração, transições energéticas justas podem melhorar o emprego e os meios de subsistência e reforçar a resiliência económica. “Afirmamos que nenhum país deveria ter de escolher entre combater a pobreza e lutar pelo nosso planeta. Procuraremos modelos de desenvolvimento que implementem transições sustentáveis, inclusivas e justas, a nível mundial, sem deixar ninguém para trás”, lê-se no documento.

Palavra de Li

A agência estatal Xinhua afirmou que o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, que representou a China nesta cimeira pautada pela ausência de Xi Jinping, defendeu a globalização e “promoção da unidade, cooperação e inclusão” das nações.

Li Qiang fez um apelo para que os países se respeitem mutuamente, procurem “um campo [de actuação] comum apesar das respectivas diferenças e vivam conjuntamente de forma pacífica”, e afirmou ainda que nenhuma nação “está imune a enfrentar grandes crises e desafios comuns”. Na perspectiva do primeiro-ministro chinês, os membros do G20 devem buscar “a aspiração original de unidade e cooperação”, apostando na “responsabilidade dos tempos em prol da paz e desenvolvimento”. O dirigente adiantou também que o G20 precisa de unidade em vez de divisão, cooperação em vez de confronto e inclusão em vez de exclusão, acrescentou.

Alô, África

Uma das novidades desta cimeira prende-se com a entrada da União Africana (UA), um forte sinal para África e uma vitória diplomática para a Índia, que deverá ser a líder dos países do Sul, não tendo sido ainda mencionada a alteração do nome para G21.

Narendra Modi bateu o martelo três vezes antes de fazer o anúncio, que recebeu aplausos na sala, apertou a mão do actual líder da UA, o Presidente das Comores, Azali Assoumani, e abraçou-o calorosamente. “Com a aprovação de todos, solicito ao representante da União Africana que assuma o seu lugar como membro permanente do G20”, disse depois Modi, sublinhando que foi a Índia a propor a alteração.

O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, tinha defendido, na sexta-feira, que a UA deveria tornar-se membro permanente do grupo. “Veremos qual será a decisão, mas o que é claro é que a União Europeia [UE] apoia a adesão da União Africana ao G20”, declarou Michel, numa conferência de imprensa em Nova Deli, antes do início da cimeira.

Sem consenso

Profundamente dividido sobre o futuro do petróleo, o G20 não apelou à saída dos combustíveis fósseis na sua declaração final, mas apoia, pela primeira vez, o objectivo de triplicar as energias renováveis até 2030, compromisso assumido três meses antes da COP28, a 28.ª conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que se realizará de 30 de Novembro a 12 de Dezembro, no Dubai.

Nesta cimeira, os EUA defenderam um ambicioso projecto de “corredor” logístico que ligasse a Índia e a Europa ao Médio Oriente, com um papel de liderança para a Arábia Saudita. Foi assinado um acordo de princípio entre EUA, Índia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, UE, França, Alemanha e Itália. No que diz respeito à Ucrânia, a declaração final denunciou o “uso da força” para conquista de territórios, mas não menciona a Rússia.

O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, abriu a cimeira do G20 atrás de uma placa onde o seu país foi identificado como “Bharat”, o sinal mais forte até à data de uma potencial mudança no nome oficial “Índia”, herdado do passado colonial. Índia e Bharat são os dois nomes oficiais do país segundo a sua Constituição, cujo artigo 1 começa: “Índia é Bharat”. O G20 reúne as 19 economias mais desenvolvidas ou emergentes e a União Europeia.

Homenagem a Gandhi

Os líderes do G20 foram ontem convidados a prestar homenagem, descalços, a Mahatma Gandhi, o herói da independência indiana, no memorial que lhe foi dedicado. Narendra Modi cumprimentou-os um a um em Raj Ghat, o local onde Gandhi foi cremado em Janeiro de 1948, um dia depois de ter sido assassinado por um ideólogo nacionalista hindu.

Cada um dos líderes inclinou a cabeça perante o primeiro-ministro indiano para que Modi lhe atasse uma estola de cor creme ao pescoço, segundo o relato da agência francesa AFP. O chefe do Governo esperava-os em frente a uma enorme fotografia a cores do ‘ashram’ de Sabarmati, o retiro espiritual onde Gandhi viveu durante muito tempo, situado no estado natal de Modi, Gujarat. O ‘ashram’ é um local que muitos líderes visitaram em viagens oficiais à Índia, como o norte-americano Donald Trump em 2020, ou o britânico Boris Johnson em 2022.

Os líderes do G20 foram então convidados a juntar-se a Modi em frente a uma placa de mármore preto, decorada com grinaldas de malmequeres laranja e amarelos.

Ali, uma chama eterna celebra a memória de Gandhi (1869-1948), o apóstolo indiano da não-violência. Após a interpretação de um hino hindu, todos guardaram um minuto de silêncio diante das coroas fúnebres enviadas por cada Estado. O memorial é um dos locais mais sagrados da capital indiana, onde mais de um milhão de pessoas seguiram os restos mortais de Gandhi após ter sido assassinado.

Alerta de Lula

O Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, alertou na cimeira do G20 para a “emergência climática sem precedentes” no mundo que põe em risco a segurança alimentar e energética. “A falta de compromisso com o ambiente está a conduzir a uma emergência climática sem precedentes”, afirmou Lula no início da reunião. “As secas, as inundações, as tempestades e os incêndios são cada vez mais frequentes e põem em risco a segurança alimentar e energética”, disse Lula, citado pela agência francesa AFP.

Cimeira no Brasil

A próxima cimeira do G20 irá realizar-se no Rio de Janeiro em 2024 e Lula da Silva alertou que se Vladimir Putin se deslocar ao país para o evento, não será detido. “Posso dizer que se eu for Presidente do Brasil e ele vier ao Brasil, não há nenhuma razão para ele ser preso”, disse citado pela agência francesa AFP. Lula da Silva garantiu, numa entrevista a uma televisão indiana, que Putin vai ser convidado para visitar o Rio de Janeiro. Putin é alvo de um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional (TPI) emitido em Março, por suspeita de crimes de guerra pela deportação de crianças ucranianas. Desde então, condicionou os destinos das suas viagens e falhou reuniões internacionais como a cimeira do G20. “Todos vão à cimeira dos BRICS, por isso, espero que venham à cimeira do G20 no Brasil. No Brasil, eles vão sentir um clima de paz”, afirmou Lula. “Gostamos de cuidar das pessoas. Por isso, acho que o Putin pode facilmente vir ao Brasil”, acrescentou.

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