Com oito anos a traficar droga

Na década de 1990 visitei Macau e fui apresentado a um homem muito especial. Era o pastor Juvenal Clemente que estava a realizar uma obra exemplar. Pedia ajuda ao governo, a empresas e a personalidades destacadas da sociedade macaense. O senhor pastor tinha ficado chocado quando se apercebeu que Macau tinha um número exagerado de toxicodependentes muito jovens e alguns encontravam-se praticamente perdidos para a vida. Edificou uma estrutura de apoio a esses jovens e recuperou dezenas deles que deixaram a dependência das drogas e arranjou-lhes emprego. A sua obra foi reconhecida pela comunidade macaense e hoje não faço ideia o que será feito deste homem bom que apenas se preocupava com o bem dos seus semelhantes, especialmente os jovens.

Vem isto a propósito, de Portugal precisar de vários Juvenais Clementes. O tráfico de droga tem aumentado em Portugal, incluindo os Açores e a Madeira, com os gangues de traficantes a usarem os métodos mais sofisticados, incluindo os barcos à vela que de vez em quando a Polícia Judiciária ou a GNR anunciam ter desmantelado e apreendido alguns desses traficantes. No aeroporto de Lisboa, muitos funcionários que trabalham na recolha das bagagens dos aviões recebem fortunas do crime organizado para facilitarem a entrada em Portugal de carregamentos incalculáveis das mais diferentes drogas, especialmente cocaína e heroína. O negócio é mundial. O tráfico inicia-se na Colômbia, Venezuela ou Brasil e destina-se fundamentalmente a Espanha, França e Inglaterra, servindo Portugal como entreposto. Há anos, tivemos conhecimento que os grupos nazis da Ucrânia eram os que mais adquiriam os vários tipos de droga.

A cocaína está enraizada nas classes mais abastadas portuguesas e há políticos que não podem passar sem o seu consumo. Um porteiro de uma discoteca de Lisboa comprou um Porsche e ao experimentar o carro no Autódromo do Estoril perguntámos-lhe de quem era a “bomba” ao que nos respondeu ser seu. A nossa admiração, por ser um simples porteiro de discoteca, levou-o a desabafar que tinha feito uma grande fortuna simplesmente a vender drogas aos clientes da discoteca e a políticos e advogados que pagavam bom dinheiro para que nunca lhes faltasse o consumo dos estupefacientes. Para o caso não interessa, porque não somos polícia, mas o tal porteiro adiantou-nos vários nomes de gente importante que era sua clientela. Lamentavelmente a venda de drogas tem aumentado em Portugal e os jovens do ensino secundário e universitário chegam a roubar as pratas e joias que os seus pais têm em casa para poderem com a venda desses valores matar o vício da dependência da droga. Casos de filhos a bater nas mães por não lhes darem dinheiro é notícia assídua.

Na semana passada veio a público uma notícia chocante e que ultrapassa os limites deste assunto que estamos a abordar: miúdos de oito anos de idade são vendedores de droga e traficam os estupefacientes nas mochilas da escola. Miúdos com oito anos a traficar droga, anúncio grave do ministro da Administração Interna. Mas, como é isto possível? Se um ministro tem conhecimento que uma criança é traficante está consequentemente a passar um atestado de incompetência às forças de segurança que chefia. Então, o que faz a Polícia de Segurança Pública? E a Guarda Nacional Republicana? Duas instituições que de vez em quando convocam os jornalistas para anunciarem que apanharam um carregamento de droga. Afinal, o que investigam? Quem trafica? E foram essas instituições que descobriram que crianças traficam droga e informaram o ministro? Ou o ministro soube por outras vias? E não é anunciado como foi descoberto esta situação chocante de crianças a traficar. E o que acontece a um miúdo de oito anos quando é apanhado a traficar droga? Com oito anos apenas é enviado para uma instituição de recuperação? Não creio. Para essas instituições que deveriam recuperar os jovens mas no seu interior é onde se consome mais droga entre os internados. Algo está muito errado neste país, onde uma criança que devia estar na escola, ter pais que controlassem a sua educação e o que se depreende de um caso destes é que estas crianças andam por este país à deriva, podem nem ter pais, podem ter sido abandonados ou fugido de casa. Mas, alguém está a aproveitar-se dessas crianças para traficarem. E a notícia devia ser o anúncio da prisão de indivíduos que exploram crianças para o tráfico de droga. E quem é esse “alguém”? Serão criminosos de redes organizadas? O ministro não anunciou a prisão dessa possível gente que abusa dos miúdos. Limitou-se a deixar-nos de boca aberta dizendo que crianças de oito anos estão a traficar estupefacientes. Algo está errado e é muito grave, quando sabemos que há agentes policiais que já nem entram em determinados bairros ditos sociais, quando esses agentes não têm seguro de risco de vida, quando a segurança é cada vez menor e o crime, segundo as estatísticas, tem vindo a aumentar de ano para ano. Por favor, senhores governantes da Administração Interna e da Segurança Social, façam algo de profundo e eficiente no sentido de nunca mais virmos a ter conhecimento que andam crianças a traficar droga… Que dor, ai, Portugal, Portugal…

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