PolíticaA revolução dos periféricos Julie Oyang - 13 Dez 2017 As classes estratificam-se de forma perfeitamente natural. A nobreza vomita onde lhe dá na gana. A burguesia vomita em cima do povo; e o povo vomita sobre si próprio. [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] poeta russo Vladimir Mayakovsky escreveu este excerto durante os anos 20 numa viagem a Nova Iorque, uma ilustração acutilante da luta de classes Marxista. “Existirá luta de classes enquanto existirem classes. Não ignorem nunca a luta de classes!” Ensinamentos do Presidente Mao Tsé Tung em 1966, nas vésperas da Revolução Cultural. Embora o termo luta de classes tenha desaparecido completamente do vocabulário do actual Governo comunista, apenas um mês pós o encerramento bombástico do 19º Congresso do Partido, foi lançado para a ribalta um termo oficial que desencadeou as discussões mais acaloradas na Internet: população periférica, 低端人口。 Dezenas de milhares de trabalhadores migrantes, pertencentes à “população periférica” estão a ser forçados a abandonar as suas casas em Pequim, na sequência de uma operação de “limpeza” da cidade, que teve origem no incêndio que matou 19 pessoas na madrugada de 18 de Novembro. Leia-se o artigo da Quartz sobre os pormenores da expulsão em, https://bit.ly/2BLFElv. Hoje quero contar uma história sobre um famoso membro da população periférica, o Imperador Shi Le, da Dinastia Jin (265-425), sobre o qual o Presidente Mao disse: “O Imperador Shi Le da Dinastia Jin, ergueu-se no dorso do seu cavalo. Foi um estratega com aptidões militares e visão política.” Há muitos anos atrás, no tempo da Dinastia Jin Ocidental, vivia no Norte da China um rapaz xiongnu pertencente a uma tribo nómada. Era de origem tão humilde que nem teve direito a receber um nome quando nasceu. Quando cresceu e se tornou adolescente, passaram a chamar-lhe Shi Le. O jovem Shi Le ganhava a vida como vendedor ambulante e desta forma era feliz, não se preocupando em perseguir a fortuna. Contudo, as elites sociais – as pessoas de “topo” – achavam que Shi Le e os seus iguais eram uma maçada e um incómodo para os olhos, porque as “populações periféricas” estragavam a beleza da capital. Por isso na sequência da “limpeza” da cidade, Shi Le foi vendido como escravo. O período das Dinastias Wei e Jin ficou conhecido pelos feitos de artistas e filósofos, mas os governantes eram extremamente corruptos e decadentes. Os homens da elite apostavam as esposas em concursos de bebida. Shi Le observava tudo isto calmamente, aparentemente sem se deixar impressionar. No entanto, preparava em segredo a sua ascensão. Esperava a sua vez pacientemente. Então, quando se desencadeou a revolta na capital, ele comandou a cavalo o seu pequeno exército e deu inicio à vingança contra a “população de topo”. Este acontecimento histórico ficou conhecido como o Desastre de Yongjia 永嘉之祸 (311), quando as forças nómadas do Norte da China tomaram e saquearam a capital do Império Jin Ocidental, Luoyang. Depois da vitória, as forças nómadas cometeram um massacre quando da entrada na cidade. O Príncipe e a maior parte dos ministros foram mortos, bem como mais de 30.000 civis. Também incendiaram palácios, destruíram os mausoléus Jin e enterraram vivos os “inimigos de classe”. Em 319, Shi Le declarou a independência sob o título de Príncipe de Zhao. Durante os anos que se seguiram à independência, o príncipe focou-se na anexação de pequenas bolsas de poder Jin que ainda existiam no Norte e no centro da China. Em 330, Shi Le assumiu o título de “Rei Celestial”, vindo a morrer três anos mais tarde. O nómada e periférico Zhao caiu com um golpe de estado.