Inês Vilhena, educadora de infância | Macau nas estrelas

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá há três anos no território. Inês Vilhena é educadora de infância e nunca pensou ser outra coisa. Apesar de não atribuir uma razão em concreto para a opção profissional, depois de reflectir um pouco surge uma possível explicação. “Se pensar bem, posso dizer que não tenho memórias muito boas do meu tempo de escola e, se calhar, isso teve alguma influência”, diz ao HM.

Para a educadora de infância é fundamental “conceber que as crianças são pessoas, que têm voz e que os seus direitos têm de ser salvaguardados”. “Se dizem que não, querem dizer isso mesmo, não. Se dizem que não querem comer é porque não querem. A mim ninguém me dá comida à boca se eu disser que não quero”, exemplifica.

Claro que Inês Vilhena admite que as crianças “ainda não sabem bem gerir aquilo que querem e precisam”, mas salienta que há formas de o fazer sem ser à força. “Há jogos em que se podem manipular tendo em conta as necessidades, sendo que não é por sermos mais velhos que temos mais direito sobre os outros”, acrescenta.

Vir e ficar

A vinda para Macau não foi uma novidade. Com o pai a viver cá há 11 anos, Inês Vilhena estava familiarizada com o território antes de surgir a oportunidade de cá trabalhar. “Vinha frequentemente e por vezes passava cá temporadas. Já tinha uma ideia do que era Macau. Não vinha para o desconhecido e não vinha para um colo vazio”, recorda.

No entanto, ter sido chamada para trabalhar no Jardim de Infância D. José da Costa Nunes acabou por ser um momento de surpresa. “Nos últimos meses de mestrado soube que o infantário estava a pedir educadores. Na altura ainda nem a tese tinha, para dizer a verdade, começado, e não me ia candidatar a um lugar e depois pudesse vir a não ter habilitações para o poder preencher. Não me candidatei”, recorda.

Mas “os astros alinharam-se”. Depois de terminada a tese em Julho, houve uma desistência nas contratações do infantário. Inês Vilhena foi seleccionada e, pouco mais de uma semana depois, estava de malas feitas a caminho de Macau.

Sempre achou que queria vir mas, no momento em que a realidade era essa, Inês Vilhena já não tinha tantas certezas. Veio. No entanto, vir por temporadas e estar a viver no território são coisas diferentes. Se até há sua chegada, há três anos, não tinha a noção das dinâmicas da terra, quando veio para ficar houve todo um conjunto de situações que emergiram. “Não tinha percepção nenhuma da comunidade portuguesa cá e o mesmo se passou com os vários grupos sociais que se constituem no território”, refere.

Entre comunidades

A educadora de infância teve de aprender uma série de códigos de conduta mais ou menos evidentes. “Tive de me adaptar a toda esta dinâmica e não é que seja difícil, mas fui começando a perceber o que já me tinham dito: por vezes tem de haver uma fluidez e cuidado com as palavras. Temos de ter cuidados com o que falamos, com quem e onde.”

Outra forma de se relacionar com as comunidades locais é no trabalho onde acompanha crianças portuguesas e chinesas. Relativamente a diferenças culturais, em idades tão pequeninas não há muitas a assinalar. O desafio inicial é sempre o mesmo: ganhar a confiança, o que é “universal”. As diferenças encontram-se em pequenas coisas. Entre aquelas que marcaram a educadora, a partilha de comida está em destaque. “Culturalmente achei mesmo muita piada ao facto de as crianças chinesas partilharem a comida. Estão numa mesa grande a lanchar, levantam-se e vão distribuir parte do que têm.”

A maior dificuldade continua a ser a língua. Inês Vilhena gostava de saber falar cantonês para melhor perceber os seus “meninos”. Já pensou em aprender, “mas a vida vai-se pondo no meio”. Acontecem sempre outras coisas a que se dá prioridade e a aprendizagem da língua vai ficando para depois.

O que mais lhe falta faz, deste lado do mundo, é “o mar e o cheiro”. Mas há formas de ultrapassar. “Macau não é um lugar com grande paisagem natural mas, por exemplo, em Coloane temos as montanhas e quando chegamos a Hac Sá cheira a mar e a árvores”, aponta satisfeita.

O território tem mais vantagens. A vida por cá acontece com outro tempo. “Sabe a mais e parece que vivemos muito num mesmo dia”, principalmente para quem tiver a sorte de conhecer de imediato a “suas pessoas”, as certas, que agora são a nova família.

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