DesportoRashidnia Reza | Treinador de karaté da selecção da RAEM Hoje Macau - 22 Fev 2016 Veio para Macau com um contrato de três meses para preparar a equipa de karaté para os Jogos Asiáticos de Busan. Conseguiu três das quatro medalhas obtidas por Macau. Entretanto passaram-se 14 anos. Continua a ser treinador da selecção local e já trouxe mais 150 medalhas para o território. É iraniano mas para ele Macau já é a sua segunda casa. Rashidnia Reza, com o seu permanente sorriso e trato delicado é uma pessoa especial [dropcap style=’circle’]L[/dropcap]embra-se de quando foi convidado para vir para Macau? Em 2002, o presidente da associação de karaté na altura, José Achiam (falecido em 2008) era também secretário geral da Associação Ásia eu era treinador do Irão há já cinco anos, propôs-me vir para Macau. Mandei-o falar com o presidente da federação iraniana, o Nazerian, e um contrato de três meses foi negociado e a 17 de Agosto de 2002 cheguei a Macau para preparar a equipa para os Jogos Asiático Busan. Como correu a experiência? Muito bem. Conseguimos uma prata e dois bronzes. Na altura em que Macau conseguiu apenas quatro medalhas. As nossas três e uma de prata para o wushu. Mas depois voltei para o Irão e voltaram a propor-me um novo contrato, desta vez de dois anos para preparar a equipa para os Jogos da Ásia Oriental (EAG Macau 2005). Eu era apenas um simples treinador mas o trabalho de equipa foi muito e conseguimos duas medalhas de ouro, duas de prata e três de bronze. Depois o contrato foi prolongado para nos prepararmos para Doha, mais três medalhas… Três meses que se transformaram em 13 anos… É verdade. Na altura nunca perspectivei uma coisa dessas. Os primeiros meses foram muito difíceis. Porque decidiu ficar? Em 2007 trouxe a minha família, tenho duas filhas e um filho. Começaram a aqui a universidade. Agora já voltaram para o Irão mas essa permanência aqui nessa altura foi muito importante para a decisão de ficar. Não pensa em voltar para o Irão? Desde 2014 sou residente permanente e este é o meu segundo país. Sempre que volto ao Irão tenho saudades dos meus alunos, tenho muitos estudantes, são como meus filhos. Catorze anos é muito tempo, é difícil deixar Macau agora. O que o fez aceitar vir para Macau? Nunca tinha experimentado uma carreira internacional. Tinha apenas tido duas curtas experiencias na Bielorrússia, em part-time, e nalguns países do Golfo Pérsico por muito pouco tempo. Quanto me pediram para vir para Macau para preparar a equipa para um grande evento como os jogos asiáticos aceitei porque queria experimentar treinar fora do meu país. O Irão é um país grande, com muitos atletas e muitos treinadores. Quando sentiu que ia ficar mais tempo do que os três meses? Se no início, depois dos três meses, me tivessem proposto um contrato de 10 anos nunca teria aceitado mas a partir de 2005, com os EAG, já estava habituado a estar aqui, tinha planos para trazer a minha família, o que aconteceu em 2007, e queria trazer mais títulos para Macau, nomeadamente o título mundial que é algo que ainda não conseguimos. E tem atletas para conquistar o titulo mundial? Não é difícil conseguir este objectivo. Temos muitos bons atletas e treinadores e o governo apoia. Só precisamos que os atletas continuem. Para além disso, desde há dois anos para cá começámos a ter profissionais, não são muitos para já, apenas três, mas espero que no futuro tenhamos mais. Quando é que isso pode acontecer? Estamos no caminho. Precisamos de mais atletas, a escola de karaté começou apenas no ano passado e espero que em breve tenha mais atletas o que é fundamental para termos campeões. Quais as razões para praticar karaté? Para mim o karaté é um desporto especial. Não é apenas físico como a corrida ou a halterofilia; no karaté usamos muito a parte psicológica. A psique e o físico têm de andar de mãos dadas. Além disso, o karaté dá-nos lições para a vida. Temos de controlar a técnica. Quando enfrentamos um oponente é tudo sobre controlo . Mesmo quando estamos a perder não podemos bater-lhes. Temos de aprender o auto controlo e isso é uma lição para a vida. Nós ensinamos os estudantes a serem educados, a respeitarem os mais velhos. Alguns vêm para aqui e não sabem o que é o karaté mas depois acabam por perceber que isto não é apenas um desporto, é uma filosofia. Trabalhamos muitas áreas a nível físico como reflexos, agilidade, velocidade, resistência e flexibilidade, mas também damos treino mental para a táctica. É como jogar xadrez. Temos de praticar muitas tácticas e estratégias para o combate. E depois há vários estilos, várias escolas, vários tipos de adversários. O karaté também é importante para os estudos pela agilidade mental que proporciona. Também temos muitas técnicas para aprender, onde o foco e a concentração são essenciais. E a vida em Macau? Para mim agora é boa, após 14 anos é a minha segunda casa. Como vê as mudanças que ocorreram nestes últimos anos? Não ligo muito. À volta pode ter mudado mas a cultura não mudou. As pessoas continuam educadas a seguirem as regras e continua a ser um sitio seguro para viver. Que sente falta do Irão? Sinto alguma falta da comida mas também já estou habituado à comida chinesa. Ao princípio era difícil mas agora não. Estou confortável aqui. Como descreve o Irão nestes dias? Vai melhor. Mais liberdade que antes. É um pais seguro. Todos os anos levo a equipa a acampar lá. Os pais preocupam-se sempre mas eu tranquilizo-os. As pessoas imaginam que é um sitio perigoso mas não é nada disso. Se alguém decidir visitar o Irão que aconselha as pessoas a fazer por lá? A experimentarem a comida, claro, há muitos tipos de grelhados. Mas como é um país muito antigo também há muitos locais históricos para visitar como Pasargadae onde está o túmulo do primeiro rei da Pérsia, há 3000 anos, ou Kashan uma das primeiras cidades no mundo, com 5000 anos de história. Há sítios muito interessantes no Irão e muitas culturas diferentes. É muçulmano? Sou. Como se sente quando se vê a destruição de relíquias museológicas que o Daesh tem feito no Médio Oriente? Sinto-me perturbado, muito triste por estarem a apagar a história. Há alguma diferença entre ser persa e iraniano? Não. É a mesma civilização. Como começou a praticar karaté? Comecei com 13 anos, há praticamente 43 anos. Nessa altura visitei um clube no Irão, a luta é muito popular no país, e alguns amigos meus escolheram luta livre, outros boxe, judo, mas quando vi as pessoas entrarem no “tatami”, a fazerem a vénia ao “sensei”, fiquei impressionado, um amigo praticava e disse-me que o respeito pelos outros era um valor fundamental na modalidade e isso interessou-me muito. E depois? Que aconteceu depois? Pratiquei até aos 19 anos e depois veio a guerra, mesmo quando eu ia para a equipa nacional. E depois foram 13 anos sem podermos entrar em competições internacionais o que me impediu de seguir uma carreira internacional. Mas fui umas sete ou oito vezes campeão do Irão ou de Teerão. Quando finalmente voltámos a ter competições internacionais já tinha passado o meu tempo de ir à selecção, mas num torneio com oito países organizado no Irão ainda fiz parte da equipa de Kata durante dois anos, tinha 32, e ganhei um segundo e um terceiro lugares. Terminado a carreira como atleta fiquei secretário geral de uma das maiores associações de karaté do Irão, com 30 000 membros dos quais cerca de 8000 cinturões negros, e mais tarde quando o meu sensei saiu do Irão, passei a presidente e depois tornei-me treinador da equipa nacional por cinco anos até vir para Macau. Qual é o seu lugar preferido em Macau? À beira mar, a praia de Coloane. Desde o início, desde que cheguei a Macau. Gosto de observar o mar porque aprendo muito com ele. Digo isso muitas vezes aos meus alunos: o karaté é como o mar: nem sempre calmo, nem sempre bravo. Muda. E assim têm de ser os nossos ritmos no karaté, uma alternância de força e pausas. As ondas não são sempre iguais, tal como os nossos movimentos não podem ser. Vocês criam movimentos novos? Sim, no Kata não, mas no Kumité criamos muitos movimentos novos, muitos tipos de saltos diferentes. Comida favorita em Macau? Chok (canja) e marisco. Desejo particular? Conquistar um título mundial para Macau.