Tantos que fizeram falta

Portugal foi a votos e à hora que escrevemos esta crónica ainda não se sabem resultados. O que se sabemos é o que nos doeu ao ver e ouvir a campanha eleitoral. Os líderes dos partidos não brilharam, não cativaram o povo, não ensinaram nada de política futura e o povo fartou-se de recordar políticos que fizeram história. E o povo tem toda a razão. Portugal teve mulheres e homens que deixaram saudades à política e a quem gosta de aprender política. Nesta campanha eleitoral assistimos a banalidades proferidas por líderes políticos fraquíssimos e a arruadas mobilizadas pelas máquinas partidárias. Não nos referimos às habituais arruadas da baixa lisboeta ou de Santa Catarina, no Porto, do PS e do PSD. Salientamos apenas as arruadas onde houve partidos que chegavam à urbe e não viam ninguém, nem sequer nos mercados. Um dia, o CDS com dez apoiantes elevando as bandeiras do partido encontraram seis pessoas na rua que tinham escolhido. Em outra ocasião, o Bloco de Esquerda realizou um comício num salão e estavam apenas oitenta pessoas sentadas…

Esta campanha eleitoral fez-nos recordar quem fez falta, muita falta. Lembramos uma mulher que era a vida do Bloco de Esquerda, culta, bem-falante, educadíssima, que no seu lugar de deputada respondia a todos os emails que lhe enviavam, mesmo a criticá-la. Referimo-nos a Ana Drago, uma política que lutava, contestava, ensinava e mostrava como há mulheres geniais. A história deixou-nos imensos nomes de mulheres como Ana Drago. Sem medo de nada, com uma seriedade suprema e que não admitia presunções e arrogâncias. Talvez, por isso, Ana Drago deixou o Bloco de Esquerda. Ana Drago fez muita falta nesta campanha porque o seu ex-partido não tem ninguém que saiba proferir um discurso que deixe marcas. O Bloco de Esquerda até teve de chamar o reformado Francisco Louçã para discursar e anunciar algo de positivo.

Fez tanta falta Freitas do Amaral ao CDS, um partido que sempre foi o terceiro maior em Portugal e que passou para “partido do táxi” e arrisca-se a não ter grupo parlamentar. A esta hora que os queridos leitores estão com o jornal na mão já sabem se o CDS elegeu algum deputado. Freitas do Amaral foi genial na sua forma de estar na política, um mestre no professorado que se dedicou a ensinar e a lutar por uma democracia decente. Apenas cometeu um erro: quando mataram Amaro da Costa não soube impor-se de que um assassinato se tinha tratado. Mas, Freitas do Amaral à frente do CDS neste Janeiro de 2022 teríamos os democratas-cristãos apoiados por uma avalanche de portugueses sérios e foi, talvez, a falta de seriedade no CDS que levou Freitas do Amaral a transformar-se no maior amigo de Mário Soares,

Fez muita falta no PSD o político genial que foi Sá Carneiro. Tanta falta que fizeram os seus discursos de sempre lutar por um país melhor procurando sempre que o povo melhorasse o seu nível de vida.

Fez falta, muita falta o velhote Jerónimo de Sousa, que teve de ser alvo de uma intervenção cirúrgica, a qual felizmente correu bem, e que só lhe foi permitido aparecer nos últimos dias de campanha eleitoral. Jerónimo de Sousa é um político cativante, não gosta da demagogia, não gosta que o comité central do seu parido lhe chame velho, não gosta dos fascistas que cada vez mais se escondem nos partidos que ele, Jerónimo, sabe quem são e onde estão. Com Jerónimo de Sousa o Partido Comunista tinha tido comícios cheios de gente e de bandeiras com quase 50 anos de fabricação. Quando Jerónimo de Sousa se dirige aos seus militantes não sabe proferir balelas, barbaridades, parvoíces, não, os militantes do PCP com ele, entram em êxtase e mobilizam-se para a luta em arranjar mais camaradas que não faltem ao voto no partido.

Fez falta, muita falta Mário Soares, considerado por quase todos os portugueses o pai da democracia e o político que a fazer asneiras durante a descolonização, também ofereceu ao país a liberdade em momentos difíceis que atravessámos. Fez muita falta porque o PS ganharia as eleições à vontade se tivesse tido os seus abraços, beijos e afectos a toda a gente que encontrava pelo caminho, incluindo uma bofetada que levou na Marinha Grande. Mário Soares colocou o PS no palanque da governação e fê-lo bem ou mal, mas foi diferente. E teria sido diferente com ele em secretário-geral dos socialistas neste Janeiro de eleições legislativas.

Terminou mais um acto eleitoral em Portugal. A chamada democracia continua cheia de dúvidas, de lacunas e de líderes com grande capacidade de realização política em benefício do povo.

Uma última palavra de parabéns para os jovens que votaram pela primeira vez. Sentiram algo de diferente nas suas vidas. Sentiram que ser adulto e votar é passar a ser responsável pelas vicissitudes do seu país e dos seus compatriotas. Votar pela primeira vez é um facto inesquecível para todos nós, porque acima de tudo significa que ficamos cientes do que é a liberdade.

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