Dez frases que revelam toda a essência da China (Parte 2) 随时翻翻《红楼梦》(第一部分)

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]onho da Câmara Vermelha foi ao longo de todas as épocas um dos livros que mais vendeu. Escrito no séc. XVIII, é considerado uma obra-prima e um dos pontos mais altos da ficção chinesa. A Vermelhologia é um campo de estudo dedicado exclusivamente a esta obra. Para dar um exemplo, o Presidente Mao, tinha consigo um vermelhologista de renome. No entanto, eu não sou uma vermelhologista, vou apenas desfolhando este clássico só para preservar no meu ADN a marca da língua chinesa, eu que me tornei uma escritora de língua inglesa. Recentemente, coleccionei dez frases para partilhar com os meus leitores. Trata-se de literatura, mas também de política (chinesa). Pode servir igualmente como uma Bíblia dos negócios. Aborde a coisa com cuidado (do género quando faz yoga).

Sê verdadeiro contigo próprio 不忘初心

A história: Miss Yiu é uma mulher apaixonada, ao contrário da irmã mais velha que não se atreve a tomar decisões. Sente-se atraída pelo Sr. Liu e decide esperar por ele o tempo que for preciso.

A certa altura, diz: “O amor não é um jogo de crianças. Também não é um negócio. Eu não sou o tipo de mulher que precisa de escolher um homem para ser feliz. Mas, se dependesse de ti, escolhias o homem mais rico que pudesse conquistar o meu coração. Que desperdício de vida!”

Miss Sexy é uma das mulheres mais memoráveis da câmara vermelha, contando com um total de 500 caracteres.  Ela põe-nos KO!

Distribui a tua atenção (igualmente) (e serás recompensado) 一视同仁

A história: A Tia Zhao (segunda mulher do chefe da Dinastia Jia) não cabia em si de contente quando soube que a jovem senhora Baochai tinha enviado presentes ao seu filho. Pertencendo à “segunda divisão”, estava habituada a ser ignorada. Por causa deste pequeno gesto, Baochai conquistou a sua eterna lealdade.

O coração dos que são maltratados é como um tesouro negligenciado, que não lamentamos ter recolhido porque um dia pode fazer-nos falta!

Nunca desafies a ordem 安分守己

A história:  Uma anciã que estava a cuidar da fruta quer ter uma conversinha com Xiren, um serviçal de posto elevado, e oferece-lhe um cacho de uvas.  Xiren repreende-a: “As uvas podem ainda não estar maduras, mas, mesmo que estivessem, não estamos autorizados a comê-las antes dos nossos patrões. Oh velha, perdeste o juízo?”

A obediência às regras é uma virtude chinesa tão profundamente enraizada que é praticamente impossível de eliminar. Por pensar nisto; é possível que a revolução cultural do Presidente Mao não tenha sido tão disparatada como pensámos?   

Não dês nas vistas 八面玲珑

A história: A poderosa Dama Wang Xifeng saúda a jovem senhora Daiyu, acabada de chegar, e elogia-a na presença da matrona, com uma voz emocionada: “É verdade o que os meus olhos vêem? Que bela rapariga, não acredito que pertença à “segunda divisão” (subtilmente lisonjeia a matrona). Parece mesmo uma das raparigas da “primeira divisão” (desta vez lisonjeia a jovem senhora).  Não admira que a nossa matrona esteja sempre a falar de ti. Pobrezinha, a tua mãe morreu tão cedo…” A seguir põe-se a chorar como se estivesse num velório, durante uma cruzada promocional.

A poderosa Dama Wang Xifeng é pura comédia.  Os seus improvisos são como uma taça de noodles, simples instantâneos e funcionais, se não mesmo, completamente originais.

Sê louco sempre que puderes 难得糊涂

A história:  A poderosa Dama Wang Xifeng quer agradar à matrona e põe-se a fazer pouco da velha Liu, uma parente humilde que estava de visita. Conseguiu que a matrona e a sua selecta entourage desatassem a rir às bandeiras despregadas. A seguir, Wang pediu desculpa pelo seu comportamento.  A velha Liu desvalorizou a situação: “Não estou zangada contigo. Sou uma prima da província. Não me importo de ser o bobo da festa por uma causa nobre. Podes confiar em mim.”

Que mulher tão esperta!      

A décima frase é um mistério. Ainda não consegui perceber se é sobre obrigações kármicas – um ponto de vista que os especialistas têm imposto aos leitores– ou sobre desejo sexual ardente. E este último, acho eu, é o motivo pelo qual a ficção clássica chinesa é um trabalho verdadeiramente revolucionário.  Não saiam do vosso lugar.

(Continua)

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