Eventos MancheteAmor Electro | “Escrevemos e fazemos a música de uma forma que gostamos” Joana Freitas - 27 Out 201527 Out 2015 Ainda com o habitual jet lag daquela que é a primeira viagem que os faz chegar a Macau, os Amor Electro falam do novo disco – (R)Evolução – e de um percurso que se transformou em sucesso. Marisa Liz, Tiago Pais Dias, Ricardo Vasconcelos e Rui Rechena explicam como o Português é a língua que os fascina e como os clássicos da música lusa os inspiram para transformarem sons conhecidos numa sonoridade sua e completamente nova. Sobem hoje ao palco do CCM, às 20h00, antes de começarem a dar os “primeiros passos” para a internacionalização É a primeira vez que estão em Macau? O que estão a achar? Marisa: Os quatro sim. Eu e o Rui já nos fomos perder por aí, durante três horas. Rui: Fomos ao Mercado Vermelho. Marisa: Fomos a todo o lado. Acho que fomos a sítios que não estão no mapa (risos). Já não sabemos ir lá novamente, mas soubemos vir ter ao hotel. O que esperam hoje do vosso concerto e do público de Macau? Marisa: É emocionante vir tocar a nossa música a um país diferente, na nossa língua. E o que é mais emocionante é ter pessoas que moram cá que são do nosso país, sendo que muitas delas não vão a casa, a Portugal, há muito tempo, o que torna as coisas mais nostálgicas, mais fortes, tanto para nós, como para eles. Sentimos também da parte das pessoas isso. Já tivemos oportunidade para encontrar aqui amigos que nem sequer sabíamos que moravam cá. E é muito forte o reencontro, porque às vezes estamos em Lisboa – somos de lá – e não vemos a pessoa há um ano, mas quando a encontramos há uma saudade, mas é um “olá, tudo bem”. Quando encontramos essa mesma pessoa fora do nosso país, é diferente, a reacção é muito mais intensa. Já vos aconteceu tocar em locais com comunidades portuguesas onde o concerto se torna mais intenso devido à ligação com o público? Marisa: Sim, claramente. No Canadá senti isso, mas também tenho lá família que não vejo nunca. Mas somos uma banda que ainda não saiu muito do país, optamos por tocar mais em Portugal e agora estamos a dar os primeiros passos para reencontrar os portugueses pelo mundo. Em 2010 formaram a banda, em 2011 “Cai o Carmo e a Trindade”. Como é que está a ser o vosso percurso desde esse ano até agora? Tiago: Tem sido sem dúvida interessante. Não estávamos muito à espera do resultado final da coisa, fazemos música porque gostamos de fazer música. Obviamente, queríamos chegar às pessoas, tocar no coração. E foi uma surpresa, foi com muito orgulho que conseguimos atingir as pessoas e o mercado, no bom sentido. As pessoas abraçaram-nos e ao nosso trabalho e tem sido de facto uma aventura bem louca. Nos dois sentidos de “loucura”, também no sentido positivo. Até agora tem estado tudo a correr bem, tanto no primeiro, como no segundo disco, e estamos, como a Marisa disse, a dar agora os primeiros passos para a internacionalização. O vosso primeiro álbum tinha versões de clássicos portugueses, o segundo – “(R)Evolução” – também se mantém na mesma linha, mas tem originais? Marisa: Temos duas versões. No primeiro fizemos mais versões do que originais, no segundo alterámos, apostamos mais em originais. Mas as versões são algo que fazemos sempre, porque antes de sermos Amor Electro, éramos uma banda de bar chamada Catwalk, com a qual só fazíamos versões. E por quê a escolha desta música clássica portuguesa com elementos electrónicos? Marisa: Somos fãs de muita música que foi feita há uns anos atrás em Portugal e dá-nos muito gozo poder desconstruir alguma coisa, respeitando sempre a melodia, a letra, o autor e o letrista – muito passa também pelo Tiago, que faz todas as produções e consegue juntar todas as nossas influências . Não é de todo a nossa intenção alterar por completo a música, mas queremos também fazer quase como se essa música fosse nossa. Se tivéssemos feito essa música nesta década, como seria? Seria desta forma. Às vezes, até temos um sentimento de “fogo pá, porque é que esta música não é nossa?” (risos). Porque achamos realmente que são músicas extraordinárias e por isso é que pegamos nelas e temos uma curiosidade e vontade de trabalhar e pegar em algo que as pessoas conhecem, talvez mais a geração mais antiga, e depois ver a geração mais nova – que não conhecia essa música – a conhecer e a cantá-la. Músicas do Fernando Tordo, do Ary dos Santos… Acho interessante ver uma criança de dez, 12 anos a cantar Ary dos Santos sem saber. Marisa, enquanto vocalista, há alguma música dessas clássicas que tenha preferência em cantar? Ai, é lixado dizer. (risos) É difícil, porque cada música que pusemos no disco foi escolhida com muita atenção e muito cuidado. Por isso é que, em cada um dos discos, temos dez temas. Queríamos contar uma história, não queríamos vinte temas, as coisas tinham de fazer sentido. Por isso é que cada uma das músicas nos dois discos tem a sua importância e, muito sinceramente, se eu disser que gosto mais de cantar uma do que a outra, parece que a outra vai ficar com ciúmes, ou que vai ficar triste. Sério. É quase como um filho. Apesar das músicas não terem sentimentos… Rui: As músicas têm sentimentos… Marisa: Têm o nosso. Tiago, como é misturar clássicos portugueses com elementos electrónica, mais modernos? É complicada a produção? Bem, certamente é um desafio. Dizer que não parece estar a facilitar a coisa, se disser que sim também parece que é estar a complicar a coisa… Marisa: Também, a gente tenta, houve coisas que tentámos e não resultaram. Tiago: Sim, há coisas que resultam quase imediatamente, outras que não dão. Acima de tudo, encontrámos um conceito e acho que esse conceito passa um pouco pela nossa sonoridade e o que representamos enquanto músicos. A junção de nós os quatro é o que faz o que se encontra nos discos. E essa mesma abordagem é a abordagem que temos nas versões: no fundo é pegar num tema que gostamos enquanto leigos e consumidores de música e pegar num tema e fazê-lo à nossa imagem. A sonoridade da electrónica com a mistura do fado ou da música mais tradicional, isso tem a ver de facto com as nossas influências. Se calhar, se fossem outras quatro pessoas, a sonoridade era outra. Mas, não é pensada nem idealizada, é a mistura dos quatro. Marisa: E há uma coisa engraçada que acontece quando se está a alterar as harmonias, que é ver a reacção dos quatro a isso. Até mesmo quando temos temas que não têm um arranjo extraordinário. Simplesmente alteramos ali o corpo. Tiago: Já temos sonoridades que já são “nossas”. Já sabemos por onde é que as coisas vão. Rui: É muito natural, porque já conhecemos os gostos uns dos outros, sabemos que se fizermos de certa maneira vai agradar à Marisa, ao Tiago, ao Ricardo e a mim. Quais as principais diferenças entre o “Cai o Carmo e A Trindade” e o “(R)Evolução”? Marisa: No “Cai o Carmo e a Trindade” estávamos muito bem comportadinhos. (risos) Musicalmente, porque mal comportados vamos ser sempre (risos). Mais comportados no sentido em que tivemos mais cuidado no disco… é difícil explicar, não quer dizer que o outro não tenha tido uma produção cuidada. Vou começar pelo segundo: no (R)Evolução, tínhamos vindo de três anos de estrada, onde nos apercebemos que, ao vivo, a nossa banda se tornava muito mais Rock e havia uma abertura maior para o erro, para aquilo que é humano, em vez de estar tudo muito perfeitinho, tudo muito afinado, muito no ponto… E isso foi um pouco o que se passou no segundo disco. Viemos um bocado com essa bagagem de estrada e quisemos que a influência do Rock tivesse mais presente em alguns temas. Por isso é que o nosso primeiro single foi “A Nossa Casa” e é o tema mais Rock do disco, mais desconstruído, mais despreocupado. Foi um bocado mais a ‘vibe’ com que vínhamos da estrada. É difícil fazer música em Português devido aos preconceitos que eventualmente existam face à música portuguesa? Marisa: Não, acho que quando iniciámos o Amor Electro muita gente cantava em Inglês no nosso país e agora as coisas estão-se a alterar. Ricardo: Está a aparecer muita coisa boa em Português. Marisa: E coisas que já havia que eram em Inglês e que os artistas estão, agora, a fazer em Português. E deve-se à abertura que houve para ouvir a nossa língua. Rui: A isso e também a artistas a gravarem músicas em Português e a chegarem às pessoas na mesma. Marisa: Bom, há sempre essa dúvida: vamos cantar em Inglês ou em Português e connosco, quando começámos, nunca houve essa questão. Não havia essa dúvida connosco, se iria resultar, se nos iriam perceber. Vão continuar em Português? Marisa: Sim, sem dúvida. Acho que existe alguma ideia de que é difícil cantar e compor em Português. Não foi, chegámos a toda a gente. Fomos e somos sinceros nas músicas que fazemos. As letras que eu escrevi, que o Jorge Cruz e o Hélder escreveram, são o que acreditávamos e o que queríamos dizer. Nunca houve nenhum entrave entre nós e o nosso público. E até público que não é português, que não percebe nada do que estamos a cantar, só pela nossa energia, porque a mensagem não é só transmitida pelas palavras. Não acho que foi difícil para nós. Tiago: Acho que é mais difícil fazer música em Português do que ouvir, porque o Português é muito complexo na escrita e é mais fácil – e por isso é que se calhar muitos artistas escreveram em Inglês -, cantar música importada, porque a nossa adolescência teve muitas influências estrangeiras. É normal, quando estamos a cantarolar qualquer coisa, que saiam os ‘I love you, yeah’, e coisas que são banais na língua e que, supostamente, seriam mais fáceis de dizer em Inglês. Marisa: E havia um grande preconceito, sim, de que não podíamos dizer “amo-te” sem soar a brega. Havia aí um limbo que podia ser bom, mas que um bocadinho ao lado já podia ser brega. E uma das coisas de que me orgulho em Amor Electro é de nos estarmos bem a lixar para o preconceito. Falando muito francamente. Escrevemos e fazemos a música de uma forma que gostamos e não temos medo nenhum em admitir que Amor Electro é uma banda sentimental, que fala de amor e relações. E não há problema nenhum nisso. Depois, claro, damos com a electrónica e o rock em cima, mas não há problema nenhum em utilizar palavras que utilizamos normalmente. A junção do que pomos antes e a seguir é que vai dar a esse limbo que estávamos a falar. E há esse cuidado, obviamente. Mas somos sinceros na música que fazemos, sem pensar muito no que os outros possam dizer. Disco de platina, Marisa como uma das melhores vozes de Portugal e um disco novo. E, agora, projectos para o futuro? Marisa: A Marisa uma das melhores vozes tem dias (risos). Vamos agora começar a compor o terceiro disco que vai sair para o ano. Não sabemos quando, nem tem nome. Vai ser numa das vossas conversas em que alguém vai dizer alguma coisa e vai ficar o nome… Marisa: Basicamente. Ricardo: Como sempre. Muito planeado. (risos) Marisa: Nunca é muito planeado, por isso é que não sabemos quando vai sair, porque temos de ter um disco de que nos orgulhemos. Por enquanto estamos a experimentar coisas e depois vamos começar a compor. Agora, vai ser Macau e depois vamos parar um bocadinho para nos concentrarmos nisso. Macau poderá servir-nos de inspiração para uma música nova? Marisa: Ai, certamente. Ainda não sabemos muito bem em que pegar, mas certamente. Olha, o Rui está já a ter ideias (Rui Rechena a pensar muito). Eu vou continuar a fazer o “The Voice” (Portugal) e vamos continuar a ser amigos e felizes.