Pelo menos dez ministros australianos demitiram-se

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]elo menos dez ministros australianos demitiram-se, avançou ontem a Agência France Presse (AFP), um novo golpe para o primeiro-ministro Malcom Turnbull, que venceu na segunda-feira uma votação interna do Partido Liberal pela liderança do Governo. Malcolm Turnbull obteve 48 votos, contra 35 do ministro do Interior, Peter Dutton, que, entretanto, renunciou ao cargo, embora se mantenha como deputado.
A divergência surgiu na segunda-feira, quando o primeiro-ministro anunciou que ia renunciar à tentativa de promulgar a legislação de redução de emissões de gases com efeito de estufa, reconhecendo que o fazia por falta de apoio no parlamento.
Para Nick Economou, analista político da Universidade Monash, em Melbourne, os deputados do Partido Liberal estão a abandonar o primeiro-ministro com receio que Turnbull conduza o partido a uma derrota esmagadora nas eleições legislativas de Maio de 2019.
Entretanto, outros nove ministros apresentaram a demissão. De acordo com a AFP, Malcom Turnbull ainda só aceitou o pedido de dois: a de Peter Dutton e a da ministra do Desenvolvimento Internacional, Concetta Fierravanti-Wells.
Ainda assim, o primeiro-ministro afirmou ontem que outros ministros “garantiram inequivocamente lealdade e apoio”.

Réplicas políticas

Malcolm Turnbull assumiu a chefia do Governo, em Setembro de 2015, ao afastar o antecessor Tony Abbott, membro do mesmo partido.
Foi durante o Executivo de Abbott que a Austrália se comprometeu a reduzir as emissões em 26 por cento em relação ao nível de 2015 e até 2030 para lutar contra o aquecimento climático. Um objectivo considerado, na altura, insuficiente pelos opositores. Este objectivo foi oficializado em Dezembro de 2015 no âmbito do Acordo de Paris.
A Austrália atravessa um período de grande instabilidade política desde que o primeiro-ministro John Howard perdeu o poder em 2007, após mais de 11 anos no cargo. No próximo mês, Turnbull fará mais de três anos como primeiro-ministro, tornando-se o líder com maior longevidade no cargo desde John Howard.

23 Ago 2018

Portugal | Ministro da Cultura destaca obra deixada pelo arquitecto Hestnes Ferreira

Luis Filipe Castro Mendes, ministro da Cultura
FOTO: José Coelho/LUSA

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] ministro da Cultura, Luís Filipe de Castro Mendes, manifestou hoje “profundo pesar” pela morte do arquitecto Raúl Hestnes Ferreira, vencedor do Prémio Valmor e “autor de vasta obra pública e privada”.

Numa nota enviada à comunicação social, o ministro da Cultura recorda que Raúl Hestnes Ferreira foi um arquitecto multipremiado e que a ele se deve a remodelação e valorização do Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo, em Évora.

“Vencedor de vários prémios, entre eles o Prémio Valmor, em 2002, Raúl Hestnes Ferreira trabalhou em Filadélfia com Louis Kahn, nome fundamental da arquitectura do Séc. XX, assim como acompanhou, através da sua actividade académica, exercida em diferentes universidades, a formação de várias gerações de arquitectos portugueses”, sublinhou.

O arquitecto Raul Hestnes Ferreira, 86 anos, morreu no domingo à noite, em Lisboa, disse hoje à agência Lusa uma fonte da Ordem dos Arquitetos (OA).

Raul Hestnes Ferreira nasceu em Lisboa, em 1931, e o gosto pela arquitetura surgiu-lhe muito cedo devido ao contacto com Francisco Keil do Amaral.

Estudou na Escola Superior de Belas Artes, em Lisboa, onde recebeu o diploma de arquitecto, em 1961, foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, nos Estados Unidos, na Universidade de Yale e na Universidade de Pensilvânia, depois de ter passado pela escola de Helsínquia, na Finlândia.

Filho do escritor José Gomes Ferreira (1900-1985), Hestnes Ferreira projetou, entre outros edifícios, a Casa da Cultura de Beja, a Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, o novo edifício do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, a Biblioteca de Marvila, a Casa de Albarraque, que desenhou para o pai, em Cascais.

Fez igualmente o projecto de renovação do café Martinho da Arcada, na capital. Esteve entre os finalistas a concurso para a Ópera da Bastilha, em Paris.

Entre os projectos habitacionais, conta-se o do bairro das Fonsecas e Calçada, em Alvalade, em Lisboa, das cooperativas Unidade do Povo e 25 de Abril, que remonta a 1975.

Recebeu o Prémio Nacional de Arquitetura e Urbanismo, da secção portuguesa da Associação Internacional de Críticos de Arte, o Prémio Nacional de Arquitetura da antiga associação de arquitectos (anterior à Ordem) e Prémio Valmor.

13 Fev 2018

Miguel Poiares Maduro: “Europa pode ter resposta mais forte contra terrorismo”

Em Macau para falar da União Europeia e dos Direitos Fundamentais, Miguel Poiares Maduro defende que a Europa e o mundo cometeram falhas no processo de acolhimento de refugiados. Quanto ao terrorismo, o ex-Ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional em Portugal acredita que o fecho das fronteiras não é uma solução viável

[dropcap style=’circle’]D[/dropcap]eixou a política para regressar à carreira académica. Como Ministro, o que ficou por fazer?
Fica sempre algo para fazer, mas acho que fizemos muito nas minhas áreas. Fizemos uma reforma profunda na comunicação social, mas gostava de ter feito mais com a agência Lusa. Não pudemos avançar tanto e não podemos concluir o contrato de concessão que era suposto só ser concluído no final deste ano. Tive pena de não ter tido tempo para concluir o que me parecia importante para uma reforma da Lusa. No domínio dos fundos europeus deixamos totalmente preparado o Portugal 2020. Tenho pena de não ver a aplicação em concreto desse novo quadro e de não garantir que todas as reformas que empreendemos e que estão no papel sejam realmente implementadas. Gostava de ter tido a oportunidade de ter uma maior margem financeira e que a capacidade orçamental do Estado permitisse fazer outras coisas. Os constrangimentos financeiros são muito grandes, há certo tipo de coisas que gostaríamos de fazer e que não pudemos. Direi que tive uma ou duas frustrações de coisas que tive muito próximo de conseguir fazer e não consegui.

Quais são?
Uma delas foi o regime de registo e transparência do lobbying. Parecia-me importante esse registo de interesses para Portugal. Tive também uma segunda frustração que é o regime do Televisão Digital Terrestre (TDT), que infelizmente a forma como foi criada em Portugal faz com que seja difícil formar. Tenho muito cepticismo face à realização de uma reforma que permita tornar viável a TDT com uma oferta alargada de canais como eu achava que devia acontecer. Mas devido às circunstâncias, de existir um operador com direitos contratuais e de existir um sistema jurídico também controverso, relativamente aos direitos dos operadores, vai ser muito difícil formar a TDT como ela deveria ser formada. Temos uma expressão que é “o que nasce torto tarde ou nunca se endireita”. E o regime da TDT nasceu muito torto. Mas ao atribuir direitos a certos operadores, torna muito difícil reformar, porque, para a TDT ser viável, implicava um alargamento muito grande da oferta. Quando íamos testar se era possível uma reforma séria da TDT, a PT (Portugal Telecom, o operador) mudou a sua estrutura accionista.

Falando da Agência Lusa. É importante reformar e reforçar as delegações no estrangeiro, até para a própria expansão do Português?
Há três aspectos fundamentais para o futuro da Lusa. Um tem a ver com a sua internacionalização. Aí não é simplesmente uma questão de promoção das delegações no estrangeiro, é de reorganizar o posicionamento da Lusa nesse contexto. Talvez assumir algumas prioridades em vez de outras do passado. Fazer mais parcerias estratégicas. Mas era muito importante reforçar o papel da Lusa ao nível da digitalização, com a oferta de conteúdos digitais e também como escola de Jornalismo. Claro que esta visão estratégica tem uma dificuldade: há um problema que é aquilo que pode ser importante para o futuro da Lusa está, em alguns pontos, em conflito com os interesses de alguns dos accionistas privados da [agência]. Seria importante reformar a própria estrutura accionista da agência e ter o Estado português em maioria para permitir esse desenvolvimento. Numa altura em que os meios de comunicação social dependem tanto de uma agência de notícias, esta torna-se, de facto, num bem público. E é fundamental garantir os interesses estratégicos da Lusa. Era muito importante para mim a participação do Estado, para permitir um modelo de maior independência e desgovernamentalização.

Em relação à RTP, a RTP Internacional é hoje um canal que satisfaz as necessidades da comunidade migrante em todo o mundo?
O papel de um Ministro nesta área, e foi isso que procurei fazer, é criar uma estrutura institucional na RTP que possa promover uma maior independência e o foco naquilo que devem ser as prioridades do serviço público. A minha expectativa é que possamos melhorar a qualidade da RTP e a sua cultura de funcionamento e institucional, com mais independência e conteúdos diferenciadores. E isso também tem de acontecer no serviço internacional. Deve ser uma prioridade e, no novo contrato de serviço público que celebramos com a RTP, definimos que no seu serviço internacional deve servir a comunidade portuguesa mas também promover a cultura e economia portuguesas. Estou convencido que progressivamente isso vai acontecer.

Vem a Macau falar da União Europeia , dos Direitos Fundamentais e da sua “relação complicada”. Nos últimos anos tem-se tornado uma relação assim?
A principal tensão do papel dos Direitos Fundamentais no quadro da UE é que, inicialmente, os Direitos Fundamentais surgiram na UE como forma de garantir que a própria UE não os violaria. Mas à medida que houve um alargamento, quer da área de intervenção da UE, quer na própria composição, com mais Estados Membros, surgiu a necessidade de garantir que o poder que a UE exerce seja compatível com esses Direitos Fundamentais. Daí a criação da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, que hoje em dia é vinculativa. Depois surgiu a questão de que a UE deve ter o papel de protecção dos direitos ao nível dos Estados Membros. Não podemos ter um espaço europeu social, económica e politicamente integrado sem que haja alguma coesão e um nível de protecção dos Direitos Fundamentais nos diferentes Estados. Isso já existe no processo de adesão à UE. Mas uma vez aderindo os mecanismos de protecção dos Direitos Fundamentais são frágeis. Esse é o novo grande debate e a UE tem dois grandes desafios.

Miguel Poiares Maduro_GLP_12Quais são?
À medida que os seus poderes se alargam, na política de emigração, em poderes em matéria criminal e de combate ao terrorismo, surgem questões sobre se a UE garante ou não esses direitos. Por outro lado, à medida que a diversidade dos Estados Membros aumenta, surgem questões como a que surgiu recentemente com a Polónia e com matérias que dizem respeito à liberdade de expressão e pluralismo dos média. Surgem questões relativas à necessidade da UE ter um papel na garantia de salvaguarda dos Direitos Fundamentais dos diferentes Estados Membros. Se não tivermos pluralismo de informação em todos os Estados Membros, não poderemos ter eleições para o Parlamento Europeu que sejam genuinamente democráticas. Por isso é fundamental que a UE tenha um papel mais forte na garantia dos Direitos Fundamentais. Mas ao assumir esse papel, também significa que a União assume mais poder de intrusão na soberania desses Estados, gerando tensão entre a necessidade de integrar a Europa, em termos económicos e políticos, e salvaguardar a soberania e espaço de autonomia.

Portugal tem hoje pluralismo de informação, dado o encerramento de vários jornais?

Não acho que estejamos numa situação em que possamos dizer que não temos pluralismos de informação. Temos hoje um serviço público com maiores garantias de independência e isso é muito importante. Sem dúvida que a crise que os média atravessam hoje apresenta problemas não apenas em Portugal mas na Europa. A crise financeira apresenta um duplo risco para a comunicação social e o pluralismo: a diminuição do número de títulos e o risco de que possa existir algum controlo desses meios de comunicação social por razões que não têm a ver apenas com a sustentabilidade do órgão de comunicação social mas por interesses de outro tipo. É por haver esse risco de outros interesses no controlo económico dos meios de comunicação social que promovemos um novo regime de transparência e conflitos de interesse relativos aos meios de propriedade.

Enquanto Ministro coordenou o processo de acolhimento de refugiados em Portugal. A Europa cometeu aqui muitas falhas?
Cometeram-se e continuam a cometer-se falhas importantes no âmbito da UE. A resposta da UE à crise dos refugiados é insatisfatória. Mas demonstra também a dificuldade de funcionamento das próprias democracias hoje. O discurso populista transformou aquilo que era uma atitude humanitária na Europa, no início, para uma atitude de receio e mesmo rejeição. Isso deve-nos suscitar uma grande preocupação quanto ao funcionamento das nossas democracias hoje em dia. A democracia, para funcionar, precisa de uma dimensão de paixão e de racionalização. E estamos a perder os instrumentos de racionalização. Esse falhanço das democracias nacionais que depois leva ao fracasso da resposta europeia à crise de refugiados. Mas a obrigação de acolher refugiados é a nível internacional, não só na Europa, e a Europa até tem feito mais do que muitos outros países. É importante olhar para os dois lados da resposta europeia: é insatisfatória mas é uma resposta que é mais positiva que outros membros da comunidade internacional.

Está a referir-se aos Estados Unidos…
Sim, aos Estados Unidos e outros membros.

A China, por exemplo, poderia ter sido mais activa neste processo?
A China também poderia ter. Hoje em dia, com a capacidade económica e com a posição política que tem, poderia ter tido um papel relevante.

O terrorismo tem sido outra das grandes questões na Europa. A resposta, no combate ao Estado Islâmico, tem sido eficaz?
Ao contrário do que aquilo que alguns populistas defendem, que é o restabelecimento das fronteiras e colocar em causa o Acordo de Schengen, é o contrário. O terrorismo é, na maior parte dos casos, um terrorismo dos próprios Estados, como se viu em França ou Bélgica. O que a Europa pode é oferecer uma capacidade de resposta mais adequada ao fenómeno do terrorismo e este é um terrorismo diferente do que vimos num passado recente, por exemplo da Al-Qaeda. A Europa pode ter uma capacidade de resposta mais forte e o fundamental é reforçar laços e Schengen é o instrumento mais poderoso para promover a troca de informações. A resposta adequada ao terrorismo deve ser o reforço das políticas de integração europeia, um reforço de Schengen. As fronteiras não são eficazes.

Aqui mantemos o Direito de Macau. Acredita na sua manutenção além de 2049?

A sua identidade fundamental tem que ser mantida porque é esse o factor distintivo de Macau. Assimilar Macau, incluindo a sua cultura jurídica, na China seria errado, porque então que valor diferenciador é que Macau teria para a China? Não creio que isso seja sequer uma vontade das autoridades da China. Mas o facto de manter a entidade do ordenamento jurídico da [RAEM] não significa que ele não possa obter e ser influenciado por outros regimes jurídicos. Com o envolvimento de tantas empresas internacionais aqui, americanas, pouco a pouco alguns elementos da cultura da Common Law possam ter alguma influência, ou até da própria China. Num contexto de globalização todos os sistemas jurídicos são miscigenados.

Portugal poderia fornecer mais instrumentos para a manutenção desse Direito?
Portugal deve fazer o máximo possível e ter a maior disponibilidade para a cooperação. Deve utilizar também a sua presença na UE, porque a sua presença na UE também é um instrumento para manter a identidade do ordenamento jurídico de Macau. É importante que o território tire cada vez mais partido desse posicionamento estratégico que penso que pode ser um pólo de comunicação e encontro de diferentes culturas, sociais, económicas e políticas.

8 Abr 2016