Bilhetes | Governo dá “grande importância” à luta contra a especulação

O Executivo não se compromete com uma revisão legislativa para tornar as sanções para a especulação de bilhetes mais pesadas, nem com um estudo de viabilidade, porém, considera que deve haver uma nova “abordagem mais compreensiva”

 

O Governo considera que o combate à especulação e fraudes na venda de bilhetes para espectáculos culturais e eventos desportivos só pode ser feita através de melhorias no sistema de vendas, que passam por exigir um sistema de registo com o nome e documento de identificação. A posição foi tomada pela subdirectora da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico (DSEDT) Chan Tze Wai, em resposta a uma interpelação do deputado Lam Lon Wai.

Segundo a subdirectora da DSEDT para garantir que não há especulação não basta a intervenção das polícias, é necessária uma “abordagem mais compreensiva”. Esta abordagem passa essencialmente por instalar sistemas de venda de bilhetes mais exigentes, com obrigação de fornecimento do nome verdadeiro, associado a um documento de identificação.

No documento, Chan Tze Wai garante também que o Governo “tem estado sempre preocupado com a especulação na venda de bilhetes e com possíveis “crimes de fraude” no que diz respeito às artes e performances culturais. A responsável também assegura que “os departamentos relevantes continuam a realizar acções de promoção e combate às actividades de especulação e fraude através de várias inspecções, e campanhas de promoção e educação sobre actividades ilegais ligadas à venda de bilhetes e na emissão destes”.

Inspecção in loco

Como parte das medidas contra a especulação, Chan Tze Wai apontou que o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) mantém contactos permanentes com os organizadores dos eventos, para perceber os mecanismos de vendas e intervir, sempre que houver vendas internas ou especulação nos hotéis.

Quanto ao papel da Polícia Judiciária (PJ), Chan Tze Wai indica que tem recolhido informação online e que faz um acompanhamento da situação para actuar quando são detectados programas de pirataria online, que inundam as plataformas de vendas de bilhetes, de forma a impedir a compra pelos cidadãos.

Também no dia dos espectáculos, existe polícia fardada e à paisana nos locais dos espectáculos, para intervir no caso de ocorrerem tentativas de vender bilhetes a preços superiores aos de venda ao público.

Por responder, ficou a possibilidade de ser realizado um estudo para alterar a actual lei que pune a especulação com a venda de bilhetes, apesar de Lam Lon Wai ter questionado essa possibilidade. O deputado também queria saber se era possível introduzir alterações que tornassem as sanções para a especulação mais pesadas, mas este aspecto também não mereceu resposta de Chan Tze Wai.

18 Jan 2024

Ricardo Araújo Pereira, humorista: “Somos o único animal que ri”

Ricardo Araújo Pereira está em Macau para apresentar “Uma conversa sobre assuntos”. O primeiro espectáculo está marcado para amanhã, às 20h, na Torre de Macau e o segundo para domingo, no Instituto Politécnico de Macau, às 18h. Num encontro com jornalistas, o humorista português falou da importância do riso, das concepções de comédia ao longo da história e da única coisa sobre a qual não consegue fazer piadas

[dropcap]Q[/dropcap]uais as expectativas para os espectáculos aqui em Macau?
Não tenho expectativas nenhumas. Esta é a minha maneira de viver, e é boa porque assim nunca temos grandes desilusões e temos só surpresas. A primeira surpresa foi o facto do primeiro espectáculo ter esgotado e depois as pessoas terem feito uma segunda sessão. Foi muito simpático.

De que assuntos vai falar?
Depende das pessoas, vai haver microfones na sala e as pessoas vão fazendo perguntas. É assim que este espectáculo funciona: as pessoas perguntam-me coisas e depois eu respondo. É bom que tenham coisas para perguntar. Venho de outro continente, venho com muita sabedoria acumulada e é muito importante que as pessoas tenham curiosidade para saber coisas sobre assuntos em geral. É a primeira vez que faço este espectáculo fora de Portugal. As pessoas perguntam tudo sobre o que lhes apetece e é mesmo isso. Perguntam sobre o meu trabalho, sobre o Benfica, sobre as minhas filhas, como sou em casa, o que lhes apetecer.

Com nasceu este espectáculo?
Há dois anos houve em Portugal aqueles grandes incêndios. Estava em casa a ver aquilo e pensei que gostava de fazer alguma coisa. O problema é que eu não sei fazer nada. Isso prejudica muito a minha capacidade para ajudar. Falei com a minha amiga e agente para saber se podíamos fazer uma série de espectáculos gratuitos nas zonas afectadas pelo fogo. Fizemos uns 14 e a receita revertia a favor das vítimas, dos bombeiros, etc.. Basicamente, sou eu a tentar responder a perguntas de pessoas. Às vezes dizendo coisas que já escrevi, fingindo que me estão a ocorrer na altura.

Tendo em conta que a realidade de Macau não é bem a mesma da realidade portuguesa, como se preparou para este espectáculo?
Sim, sim. Estudei muito sobre a actualidade de Macau, perguntem o que quiserem. (risos). Ainda bem que me avisou.

Sobre o assunto China, como vê a ascensão do país na economia internacional e a guerra comercial que decorre com os Estados Unidos?
Aqui, em relação a Macau, fico surpreendido por estar a decorrer um banho turco contínuo. A sensação que tenho é que para vir até aqui ao consulado, estive a comer o ar até aqui chegar para poder passar. Não sei como se aguenta este banho turco constante. Eu fico encharcado em suor ao fim de 30 segundos fora do hotel. Em relação à China e à guerra comercial, não tenho nada para dizer sobre o assunto, mas conheço. Mas não faço ideia. Tenho algum receio de que seja inútil competir numa guerra comercial com a China. Eles fazem coisas muito depressa e muito baratas e, portanto, é capaz de ser difícil. É um país muito grande, e não sei se o facto de o regime chinês ser este, digamos que com um défice democrático, ajuda economicamente porque é mais fácil manter pessoas com salários baixos e tal. Nessa medida, é interessante que o Trump esteja também a tentar instituir um sistema destes no Estados Unidos. Uma coisa assim mais pobre pode ser a resposta adequada. Sou a favor da democracia, está bem?

FOTO: Sofia Margarida Mota

Qual é o papel do humor na análise da actualidade?
O papel do humor é fazer rir as pessoas. E há muitas pessoas que me perguntam: só? Acho que quem pergunta isso, em primeiro lugar nunca tentou fazer rir ninguém, e em segundo não está exactamente a ver o que é que o riso é. O riso é uma coisa demasiado importante para que as pessoas digam: “só?”. Para mim, o “só” fazer rir é a mesma coisa que dizer que aquilo entre o D. Pedro e a Dª. Inês era “só” amor. Ou parece que houve ali uma coisa entre 1939 e 1945 mas foi “só” uma guerra. O riso é muito importante, e é fascinante que os seres humanos riam. Acho extraordinário. Somos bichos que sabem que vão morrer, convivemos diariamente com essa informação e, portanto, é muito bizarro que seres nestas condições achem graça a seja o que for, que riam. Imagine que um condenado à morte está na sua cela e depois vai a andar até à cadeira eléctrica, e nesse percurso vai a rir à gargalhada. Acharíamos isso bizarro, absurdo. No entanto, isto é capaz de ser um bom resumo condensado do que é a nossa vida. Nós sabemos perfeitamente que vamos a caminho da cadeira eléctrica. É ainda mais aflitivo porque o condenado sabe exactamente qual é o dia em que vai ser frito e nós não. Pode ser agora. O certo é que vamos a rir no caminho. Há um humorista norte americano chamado Jack Douglas que tem um livro, a sua autobiografia, que se chama “Aconteceu-me uma coisa engraçada a caminho da campa”. Basicamente, é isso. Fazer rir as pessoas é uma coisa que me parece nobre até. Fico muito satisfeito que o papel do humor seja apenas esse, fazer rir. Às vezes, as pessoas têm a ideia, para mim errada, de que o humor consegue fazer coisas. Que consegue derrubar governos ou impedir acontecimentos. No humor político especificamente, pensam que tem algum poder sobre a realidade, que é capaz de impedir que certas coisas aconteçam, que o mal aconteça e o bem prevaleça. Acho que a eleição de Donald Trump indica que isso não é verdade. O candidato mais violentamente satirizado da história foi eleito. Isso significa que os humoristas não têm assim tanto poder político e ainda bem. Ficaria bastante preocupado se o sistema, se a democracia funcionasse de forma em que as pessoas iam às urnas, votavam e eu dizia que tinha uma piada muito boa e ia derrubar isso. Acho que aquilo que o humor faz, e já é muito, é fazer rir as pessoas.

Como é que é isto de aplicar o humor à realidade, que por vezes não tem grande piada?
A questão é essa. É justamente porque a realidade não tem piada que é necessário o humor. Eu duvido que no paraíso, se existir, alguém ria. A minha avó dizia-me sempre que só me ria do mal. Mas do que é que rimos mais a não ser do mal? Molière escreveu comédias sobre misantropos, hipocondríacos, gente com a mania das grandezas. Comédias sobre pessoas boazinhas não existem. Uma pessoa muito boazinha só tem graça se for tão boazinha que acaba por ser prejudicada. Aí já tem graça. As pessoas riem-se do que é mau, do que é triste, e do que é errado. E o facto de nos conseguirmos rir disso é importante, faz com que nos elevemos acima de nós próprios de um certo ponto de vista. Ser capaz de rir da sua própria desgraça, é vantajoso, reduz peso às coisas. Essa operação de subtração de peso parece-me muito importante. Em 2016, na altura do europeu de futebol um filósofo português chamado Cristiano Ronaldo, proferiu umas palavras célebres no fim do jogo entre Portugal e a Polónia em que íamos a penáltis. Ele falou com o João Moutinho e disse assim: “anda bater o penálti, se perdermos que se lixe” – ele até usou um verbo mais expressivo. Acho que esta atitude é melhor para ganhar do que a atitude do temos mesmo que ganhar. Claro que podemos argumentar que o Cristiano Ronaldo está em posição de dizer “se perdermos que se lixe”, mas mortais como nós não se podem dar a esse luxo. Mas acho que a questão é ao contrário. De facto, ganhamos mais, mais vezes e mais facilmente com a atitude do “que se lixe” do que com a atitude do “temos mesmo que ganhar”. O que a comédia faz é dotar as pessoas de uma espécie de atitude do “que se lixe”. Acho muito saudável. O programa que tenho feito a noite na TVI é sobre isso, é sobre a Assembleia da República, é sobre as comissões de inquérito e sobre o Governo, e acho muito saudável que uma sociedade possa rir-se dos seus dirigentes porque também lhes retira peso a eles e porque encurta a distância.

Esta capacidade de rir e amenizar os problemas políticos não limita a acção no sentido das pessoas não se mexerem para mudar as coisas?
Esse é um dos muitíssimos paradoxos da comédia. O que é que a sátira política faz? Critica. Ou seja, aponta o alvo e destrói-o ou homenageia-o. Isso é interessante. Quando faço pouco do primeiro ministro, estou a atingir o primeiro ministro ou estou a suavizar o mal que eventualmente ele faz às pessoas, a fazer com que elas digam que já estão mais aliviadas e já não vão para a rua tentar mudar isto? Toda a sátira implica um interesse pelo objecto satirizado. A minha questão é: será que o que nós, humoristas, fazemos tem poder? Eu não sou ingénuo ao ponto de dizer que não tem poder nenhum. Qualquer coisa dita publicamente tem a sua repercussão. A minha questão é? Qual a dimensão dessa repercussão? Acho que é muito menos do que o que as pessoas julgam e mais uma vez acho que isso foi provado no caso do Donald Trump. Já tinha sido provado antes. Houve ali uma altura entre a primeira e segunda eleição do George Bush Júnior em que o Jon Stewart era o principal comentador político dos EUA. Toda a gente dizia que ele era o grande crítico do Bush. O Bill O’Reilly, de direita, convidou-o para o seu programa na FOX e disse-lhe: “o que é triste é que vais ter uma influência nestas eleições” e estava danado com isso. Depois aconteceram as eleições e o Bush teve mais dois milhões de votos do que tinha tido para o primeiro mandato. É possível que as coisas tenham algum poder, duvido que seja muito grande e nós não o conseguimos controlar. A comédia é muito mais termómetro do que termóstato. Mede a temperatura em determinada altura, não a regula.

Os países não democráticos não encaram bem a sátira política. Mesmo que não tenha força é temida. Acha que esse papel da comédia é diferente consoante o regime político?
Quando digo isto as pessoas questionam o facto de nos regimes ditatoriais o humor ser das primeiras coisas a ser reprimidas. A minha resposta é: porque eles estão enganados. Eu não concordo com os ditadores. Acho que eles não têm grande coisa a temer sobre isso. Este é mais um dos paradoxos da comédia. Dizem que uma rainha poderosa de Inglaterra – Isabel I – tinha um bobo e que quando o chamava dizia para fazer piadas mais azedas sobre ela porque quanto mais azedo ele fosse à frente dela, mais ela podia dizer que tinha poder para permitir isso. Quando uma pessoa teme aquele tipo de manifestação significa que o seu poder não é assim tão grande. De facto, esses governos reprimem a comédia mas não conseguem fazê-lo. A comédia continua clandestinamente a funcionar. No regime soviético, por exemplo, havia várias piadas muito conhecidas e que iam mudando de país para país. Houve pessoas condenadas à morte por isso.

Ainda hoje, os sinos tocam a rebate numa determinada localidade germânica no dia da morte de um padre que foi morto por ter contado a seguinte anedota: “um soldado alemão está moribundo na guerra e faz o último pedido. Queria que lhe dessem uma fotografia do Hitler e outra do Goebbels. Toda a gente ficou comovida com o patriotismo daquele homem que queria ser enterrado com uma fotografia daqueles dois. O soldado acabou por dizer que queria ir como Jesus Cristo, com um ladrão de cada lado. O padre contou esta piada e foi morto. Mas há mais. Há muitas pessoas condenadas à morte por dizerem piadas. As pessoas iam aos tribunais que as julgavam por causa destas anedotas, eram sentenciadas por um juiz e no fim da audiência, o juiz ia para as traseiras do tribunal, para um bar, e contava as piadas que tinha julgado às pessoas que lá estavam. Mas comédia não é agressão. Há uma tendência perigosa e cada vez maior para se achar que uma piada é uma agressão. O que faço não é bater. Posso explicar a diferença a quem tiver dúvidas. Eu primeiro bato e depois digo uma piada muito desagradável e, em princípio, a diferença fica imediatamente clara. Há várias perspectivas sobre a comédia. Há uma que durou muito tempo, dois milénios, entre Platão e Hobbes, que diz que nos rimos por causa da súbita consciência de que somos superiores àquilo de que estamos a rir. O Thomas Hobbes criou a expressão “glória súbita” em que achamos que somos superiores àquilo de que estamos a rir. É uma manifestação agressiva de superioridade. Depois começa a haver críticas a essa perspectiva.

Há um tipo chamado Francis Hutcheson que tem uma perspectiva curiosa sobre o riso em que questiona este sentimento de superioridade. Se é esse sentimento de superioridade que nos dá vontade de rir, porque não vamos todos passar o domingo numa enfermaria a rir à gargalhada dos desgraçados que lá estão? Após estas críticas, o Kant e o Schopenhauer formularam uma outra teoria: rimos da incongruência, ou seja, aquilo que nos dá vontade de rir é o facto de termos uma expectativa desfeita. Somos o único animal que ri, dizem eles, porque somos o único que é impressionado pela diferença de como as coisas deviam ser e como são na verdade. E depois o Freud veio a seguir e disse: não é bem isso. O riso tem a mesma função no ser humano do que aquela válvula tem na panela de pressão, serve para aliviar. Olhamos para as três teorias e pensamos que se calhar cada uma delas descreve uma parte do processo, mas todas juntas não conseguem descrever a totalidade do processo. Aliás, Freud, mais tarde reformulou aquilo que pensava e disse que é de facto uma questão de superioridade, mas é mais complicada do que o que parece porque é uma superioridade minha sobre mim próprio. O que o humor faz é uma superioridade paternal do super-ego sobre o ego.

Entretanto, o humor tem substituído a informação em muitos programas. Com vê esta situação?
Sobre a substituição, vemos um programa do John Oliver e pensamos: mas porque é que os jornais não disseram isto? Normalmente, a resposta é: porque há mais dinheiro para o entretenimento do que para o jornalismo. Porque os programas de comédia têm um orçamento maior do que uma redacção de jornal. Há uma série de questões relativamente à comunicação social. Em Portugal isso e óbvio. Os grupos de media estão todos a despedir as pessoas que ganham mais e que são os jornalistas mais experientes, e as redações ficam nas mãos de pessoas que ganham 500 euros e que são mais fáceis de controlar por causa disso. E não há grande dinheiro para fazer coisas. Não é só o jornalismo clássico. O Facebook e o Instagram são a vitória ideológica das revistas cor-de-rosa, e a sua derrota comercial. Neste momento, duvido que haja paparazzi em Lisboa. Não é preciso andar atrás da Rita Pereira para saber onde ela anda e o que está a fazer. Ela põe as fotografias no seu Instagram, voluntariamente, e mostra como a vida privada dela esta a decorrer.

Já disse em alturas anteriores que não põe limites aos outros. A si, impõe?
Imponho-me um limite. Se não tiver nada para fazer rir as pessoas, não digo nada. Assim de repente, se há algum tema que nunca tenha abordado? Sim, há. É um tema sobre o qual não tenho nada de engraçado para dizer. Quando uma criança morre, eu calo-me.

28 Jun 2019

Espectáculo | Destiny encerrado antes de começar

[dropcap]A[/dropcap]operadora MGM estava a preparar o lançamento de um espectáculo intitulado Destiny, que acabou cancelado, antes da estreia. Uma decisão que deixou sem emprego 50 funcionários.

A notícia foi avançada pelo portal Expediente Sínico, com base no depoimento de dois dos despedidos. A decisão terá sido tomada depois da directora executiva da companhia, Pansy Ho, filha de Stanly Ho, ter assistido à pré-estreia do espectáculo e ter decidido que não tinha qualidade para ser levado ao grande público.

A medida afecta artistas, técnicos de guarda-roupa, operadores de câmara, directores artísticos e maquilhadores, entre outros.

19 Out 2018

Espectáculo | Bilhetes à venda para o bailado “Guerreiros de Ópera”

[dropcap]O[/dropcap] bailado dramático “Guerreiros da Ópera” sobe ao palco do Grande Auditório do Centro Cultural de Macau no dia 3 de Março, às 20h. Os bilhetes para o espectáculo, inserido na série “Feliz Ano Novo Lunar”, já se encontram à venda e custam entre 100 e 200 patacas.

O espectáculo, da autoria da célebre escritora de Hong Kong Lillian Lee, conta com a produção do Grupo de Teatro e Dança de Shanxi Huajin. O enredo envolve a história de vida de três actores de um grupo de ópera e sentimentos que se geram entre mentores e aprendizes, entre pais, filhos e irmãos. Com uma pesada carga dramática, o espectáculo centra-se nos sentimentos amorosos, ressentimentos, na virtude da perseverança, da diligência e da inovação, que estão no cerne da cultura chinesa.

Ainda no capítulo da ópera chinesa, o projecto de cooperação cultural do Grande Delta do Rio das Pérolas de 2018, oferece ao público das três regiões uma série de espectáculos ao abrigo do programa “Apresentação de Novas Estrelas da Ópera Cantonense de Guangdong, Hong Kong e Macau”. O projecto envolve a colaboração entre jovens estrelas em ascensão da ópera cantonense das três regiões. O resultado é a interpretação do espectáculo “A Lenda da Cobra Branca” sucessivamente em Guangdong, Hong Kong e Macau. A actuação em Macau terá lugar no dia 11 de Fevereiro, pelas 19h30, no Cinema Alegria.

Os bilhetes para encontram-se à venda desde ontem nas bilheteiras do Cinema Alegria e custam 30 patacas.

2 Fev 2018

Deputado pede esclarecimento pelo cancelamento de espectáculo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Leong Veng Chai insta o Executivo acerca das “verdadeiras razões” que levaram ao cancelamento do fogo-de-artifício na passagem de ano. De acordo com o tribuno, o facto de não ter havido o espectáculo que acontece anualmente foi fonte de “frustração para os residentes”. Para Leong Veng Chai, é necessário saber o porquê de não terem sido tomadas medidas com a devida antecipação para evitar imprevistos. O deputado questiona se o Executivo “chegou a averiguar a eventualidade de terem existido circunstâncias pessoais”, lê-se em interpelação escrita.

Por outro lado, o colega de Pereira Coutinho na Assembleia Legislativa pretende ainda saber se os contratos feitos com as empresas responsáveis pelos transporte e preparação do espectáculo têm cláusulas que impliquem compensações em caso de falhas. Leong Veng Chai quer que o Executivo esclareça se existe “a previsão do pagamento de uma indemnização por incumprimento contratual ou a sujeição de uma multa em caso de impossibilidade de prestar o serviço em conformidade com o prazo previsto”.

Dinheiro não é tudo

Para Leong Veng Chai, não basta que o trabalho, orçamentado em 2,2 milhões de patacas, não tenha sido pago pela Direcção dos Serviços de Turismo (DST). “Quando as actividades públicas são canceladas ou adiadas, existem custos sociais bastante elevados”, justifica, sendo que o “cancelamento do espectáculo de fogo-de-artifício causou frustração a vários residentes”.

Em causa está a situação referente ao espectáculo anual de fogo-de-artifício marcado para a meia-noite de 31 de Dezembro de 2016. O evento foi cancelado a 29 de Dezembro e a entidade responsável, a DST, justificou a falha com “a impossibilidade do transporte do material pirotécnico para Macau”. O imprevisto, reitera Leong Veng Chai, “deixou toda a população chocada”.

O deputado considera que o Executivo “deve proceder com antecipação aos necessários trabalhos preparatórios quando se trata deste tipo de actividades públicas”. O tribuno exemplifica com as situações dos casinos em que não se registou qualquer incidente capaz de atrasar os festejos de ano novo.

16 Mar 2017

Cartaz | Apresentado o programa do Festival de Artes de Macau

Macau está em ebulição com eventos culturais a preencher o calendário do público. Foi ontem apresentado o cartaz do 28.º Festival de Artes de Macau, que começa a 28 de Abril, e que encherá a cidade de espectáculos até 31 de Maio

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Festival de Artes de Macau (FAM) já mexe. Foi ontem apresentada a programação do evento que terá mais de 100 actividades, da música à dança contemporânea, passando por diversas variantes de teatro.

A edição deste ano tem um orçamento mais modesto: são 23 milhões de patacas. “Fizemos o planeamento mais cedo, alguns dos projectos são financiados pelo Governo e por isso pudemos reduzir o orçamento”, revelou Leung Hio Ming, presidente do Instituto Cultural (IC). O investimento no festival teve uma poupança de cerca de quatro milhões de patacas em relação ao ano passado. De acordo com Leung Hio Ming, tal redução de orçamento “não vai afectar a qualidade dos espectáculos”.

O tema transversal à programação do FAM é a “Heterotopia”, uma ideia baseada na heterogeneidade do espaço que se reflecte num caleidoscópio de textos, imagens, histórias e música.

O festival abre com o espectáculo “Play and Play: An Evening of Movement and Music”, que é uma reinterpretação de clássicos de Schubert e Ravel pela internacionalmente aclamada companhia de dança moderna norte-americana Bill T. Jones/Arnie Zane. A mesma companhia apresenta ainda a representação de “A letter to my nephew”. Escrito pelo coreógrafo Bill T. Jones, o espectáculo é baseado numa carta imaginada ao sobrinho enquanto este repousa numa cama de hospital. Esta história é contada através de misturas delirantes de música pop e canções de embalar que dão a paisagem ao bailado. Em ambos os espectáculos, a dança contemporânea é acompanhada por dois quartetos de cordas que emprestam som ao menu de movimentos aleatórios dos bailarinos.

Em cena

A encerrar o festival, o público terá um clássico do teatro russo: “A Gaivota”, de Anton Chekhov, encenado pela companhia islandesa Teatro da Cidade de Reiquejavique.

A celebrar os 110 do teatro chinês, o Teatro de Arte Popular de Shaanxi apresenta ao público de Macau uma produção realista do afamado clássico “Feudos nas Terras do Oeste”. A peça é um épico de guerra que retrata uma acérrima luta por território entre duas famílias, com um amor proibido pelo meio, um pouco ao estilo de Romeu e Julieta.

Ainda na área do teatro, destaque para a produção da local Associação de Arte e Cultura Comuna de Pedra, que levará a cena a peça “Canções de Migrantes”, que dará a conhecer memórias de migrantes locais. Este espectáculo aborda uma questão fulcral na história de Macau e é o primeiro de uma trilogia de espectáculos com direcção de Jenny Mok.

Fazendo uma incursão pela cultura portuguesa, o FAM deste ano conta com um bailado do emergente coreógrafo Marco da Silva Ferreira. O português traz a Macau os espectáculos “Hu(r)mano”, onde propõe uma aventura através da expressão corporal que representa a relação entre o indivíduo e a urbe. Neste espectáculo sobem ao palco quatro bailarinos, que interagem de forma a reflectir a realidade urbana moderna. Como já tinha sido tornado público, também o artista Vhils, Alexandre Farto, vai fazer parte do cartaz, com uma exposição que vai além das intervenções que, por norma, faz em espaços públicos.

Também dentro da dança moderna, o FAM propõe a ousada obra “Aneckxander: uma autobiografia trágica do corpo”, do coreógrafo Alexander Vantournhout. O espectáculo a solo equilibra-se entre a comédia e a tragédia, misturando acrobacia, linguagem corporal, num reexame da fisicalidade e do corpo humano.

Arte em família

O programa do FAM alarga-se numa multitude de espaços de imaginação artística com “palestras, masterclasses, workshops, conversas com artistas, sessões para estudantes, crítica artística e projecção de filmes”, revela Leung Hio Ming.

O espectáculo “Rusty Nails e outros heróis” é dirigido a um público de todas as idades. Fazendo uso de diferentes materiais e meios de expressão, a peça de teatro da companhia holandesa TAMTAM objektenteather apresenta uma história sem usar palavras. O espectáculo vive da interacção de objectos de dia-a-dia com a música, numa mistura que promete mergulhar o público num mundo de fantasia.

Durante a Mostra de Espectáculos ao Ar Livre, destaque para um musical infantil intitulado “Metamorfose sobre a noite estrelada, uma adaptação da Associação de Artes Pequena Montanha. A peça pensada para deslumbrar a pequenada é um teatro de marionetas onde contracenam uma lagarta e uma couve.

Com uma abordagem mais tradicionalista, a programação do FAM oferece aos público a possibilidade de assistir à ópera tradicional chinesa “A lenda da senhora general”. O espectáculo é interpretado pelo Grupo Juvenil de Ópera Cantonense dos Kaifong de Macau. Na mesma onda da ópera tradicional chinesa, chega-nos a adaptação abreviada do clássico “Senhora Anguo”, interpretada pela companhia de Teatro Nacional de Ópera de Pequim.

Variedade é uma das tónicas da edição 2017 do FAM. “Esta edição engloba 25 espectáculos e exposições de arte extraordinárias, aliados ainda a um programa de extensão que inclui, não só, produções de renome internacional, grandes obras do Interior da China e produções locais de alta qualidade”, explicou o presidente do IC na apresentação do programa.

Aos interessados que queiram beneficiar de um desconto de 30 por cento aconselha-se que estejam atentos. A partir de domingo, até dia 19 de Março, o público pode comprar bilhetes a preços reduzidos. E assim arranca mais um evento cultural de alto fôlego em Macau.


Dóci Papiáçam di Macau volta ao FAM

“Sórti na téra di tufám” é o título da peça que a companhia de teatro que usa o dialecto tradicional patuá como veículo traz aos palcos do Festival de Artes de Macau (FAM). A narrativa, entre a sorte e o azar, gira em torno de Bernardo, um afortunado azarado. A personagem ganha uma lotaria de Hong Kong, mas fica impedido de levantar o prémio por um tufão que o separa da riqueza.

Independentemente da catástrofe natural, o público pode contar com a habitual oportunidade para gargalhada oferecida pelo grupo de teatro. “Muito humor, muito sarcasmo e crítica social”, promete Miguel de Senna Fernandes, encenador e autor da peça. Num contexto de comédia, as peças do grupo de teatro apresentam o estilo de vida de Macau, numa postura de reflexão social em tom jocoso.

A peça estará patente, apenas, no FAM nos dias 19 e 20 de Maio no grande auditório do Centro Cultural de Macau. Isto “porque não há condições para outras alternativas, tudo o que seja fora do âmbito do festival implica aluguer de recinto, custos elevados”, diz o encenador.

Miguel de Senna Fernandes promete levar ao palco um espectáculo com as características a que o público está habituado. Como tal, há lugar também para a exibição dos habituais vídeos que a companhia apresenta, plenos de crítica social, “para entreter o pessoal”. Para o encenador, este ano estão reunidas as condições para as gargalhadas se espalharem pela plateia. Nesse capítulo, o encenador sabe que o público é o último juiz da qualidade da peça, do trabalho feito pela companhia, sendo que o riso é o reflexo honesto da receptividade ao espectáculo.

Para tornar a peça inteligível, uma vez que é interpretada numa língua pouco usada, o encenador revela que suavizou um bocado a língua. Neste caso, Senna Fernandes apoia-se na linguagem universal da comédia. “Usamos muita linguagem corporal e usamos as pausas para colmatar a falta de conhecimento do patuá”, releva. Mas não há razões para preocupações em falhar os punchlines, uma vez que a peça será, como é norma, legendada.

A presença do Grupo de Teatro Dóci Papiaçám di Macau é uma presença habitual no FAM. “A minha sina é escrever e encenar uma peça por ano, para o festival”, brinca Miguel de Senna Fernandes. Além de ser uma afirmação da cultura local, esta é uma questão de sobrevivência de uma língua em vias de extinção, mas que não desiste. A mensagem é: “Estamos aqui, estamos vivos e estamos a fazer pessoas rir”.

7 Mar 2017

Laura Nyögéri, directora artística da Artfusion | A arte de aprender a ser livre

A Artfusion existe há quase três anos para ensinar a criar em liberdade. A direcção artística é assumida por Laura Nyögéri que, um dia, substituiu a publicidade pela criatividade e agora encaminha os mais novos na descoberta

[dropcap]C[/dropcap]omo é que descreve o projecto Artfusion?
O Artfusion é um grupo de artes performativas que existe em Macau desde 2014. Surgiu exactamente nesta altura, no ano novo chinês. Era o ano do Cavalo e a formação apareceu de uma colaboração com o grupo de capoeira Axé. Tivemos a ideia de juntar a capoeira e os batuques com dança contemporânea, ginástica e muita criatividade. O resultado foi surpreendente. Nasceu o conceito de fusão de artes, de onde apareceu o nosso nome.

Não ficaram por aí.
Não. Com a experiência resolvemos começar a organizar workshops onde desenvolvemos várias áreas das artes performativas. Optámos, desde logo, por diversas vertentes: a expressão dramática, a dança, técnicas de improviso e até as próprias artes plásticas. Este trabalho permitiu aos alunos que se inscreveram o contacto com várias valências e, a nós, percebermos quais as competências das crianças e jovens para delinearmos qual seria o caminho a seguir. A partir daí, iniciámos as aulas de artes performativas em que as inscrições foram muitas. Tivemos alunos dos quatro aos 17 anos, o que fez com que começássemos a dividir as formações por turmas, consoante as idades. Actualmente temos cerca de 50 alunos, divididos em três grupos.

São também uma escola?
Acabamos por ser. Uma das nossas principais missões é a formação através das artes orientada para o desenvolvimento da expressão da criatividade e, acima de tudo, para a noção de liberdade. Outro aspecto importante é o desenvolvimento da expressão individual e de grupo. Pontualmente funcionamos com grupos de adultos para eventos específicos. Neste momento, cerca de 80 por cento dos alunos são portugueses e os restantes dividem-se entre macaenses e chineses. Também aqui há uma fusão de culturas que torna a experiência muito interessante.

Como são organizadas as aulas?
Exploramos e seguimos muitos modelos e técnicas criativas aliadas à expressão corporal e dramática. Queremos também permitir a exploração da consciência do eu e do outro para que não só desenvolvam conhecimentos nas diversas áreas artísticas, mas que encontrem também aqui um lugar de divertimento e de criação. Sinto que muitos jovens têm um plano curricular com muitas actividades e uma das maiores dificuldades é terem tempo para fazerem as coisas. É por isso também que temos aulas apenas uma vez por semana e, mesmo assim, os alunos têm, frequentemente, de fazer alguma ginástica com a agenda para conseguirem fazer tudo. Por outro lado, isto também implica algum trabalho das próprias famílias para coordenar os vários horários, mas é possível. Eles gostam muito das aulas.

O Artfusion tem aulas e espectáculos?
Sim. Muitas vezes aproveitamos as aulas para o ensaio de espectáculos, mas também sinto que temos de parar esse processo de produção para que tenham espaço para se libertarem. Sinto que precisam deste espaço.

Não são uma associação. Como é que se organizam?
Somos um grupo que colabora com a associação “Macau no coração”, o que nos permite participar em actividades organizadas por instituições governamentais. Quando participamos em determinados eventos, como a Lusofonia, fazemos questão de levar conteúdos, de alguma forma, lusófonos. Já dançamos o fado, por exemplo.

Como é que chegam à ideia para um espectáculo?
Os alunos também têm aí um papel muito importante. Tentamos perceber quais são os seus interesses e de que forma a nossa cultura pode ser interessante para ser explorada por eles. O nosso público é, essencialmente, familiar e o nosso universo muito vasto pelo que, para agradarmos a todos, temos de fazer um espectáculo o mais completo possível. Tentamos explorar conceitos que inicialmente podem parecer mais abstractos e torná-los mais simples.

E como é que fazem isso?
Posso mesmo dizer que os alunos são a principal fonte de inspiração. Antes da concepção de qualquer espectáculo exploramos os temas que queremos abordar com os estudantes. Eles dão ideias, que não são só verbais, mas também ao nível do corpo. Procuro sempre que, por exemplo, através do grafismo ou do desenho, também possam expressar o seu universo. Depois fazemos a nossa pesquisa e levamos ideias do nosso contacto com grupos que não são de cá.

O Cirque du Soleil é um exemplo?
Sim. Passei o Verão de 2016 nos Estados Unidos a acompanhar o Cirque du Soleil num dos seus espectáculos. Juntei-me a eles desde a criação do espectáculo à digressão. Era uma outsider, mas acompanhei todos os departamentos, vi como aconteciam as coisas e como se fazia a produção, e aprendi com os excelentes profissionais que fazem parte daquela equipa. Foi uma experiência única, apesar de assustadora. É uma equipa muito grande e que envolve uma logística que a maioria das pessoas não faz ideia.

O que trouxe do Cirque du Soleil para Macau?
Trouxe um bocadinho de tudo aquilo. Trouxe ideias, daquelas que muitas vezes nos assustam por acharmos que não são possíveis, mas depois pensamos que existe sempre alguma forma de as concretizar ou adaptar à nossa realidade. Também tive, nos Estados Unidos, oportunidade de conhecer vários grupos de jovens em que o trabalho deles era sem qualquer limite. Ali tudo era possível e é este universo de possibilidades infinitas que acho importante trazer para Macau. Quase nunca é fácil, mas não é impossível.

Quais são as maiores dificuldades que têm sentido?
Os alunos mudam todos os semestres. Crescem e saem de Macau ou experimentam outras actividades. A diferença é que o Artfusion acontece aqui mas poderia acontecer em qualquer lado. Recentemente estivemos em Portugal e fizemos um intercâmbio com vários municípios. Na mira está Taipé onde pretendo que nos juntemos, além de integrar outras actividades, ao Cirque du Soleil na sua digressão asiática da companhia. Esta actividade permitirá mostrar o que é fazer produção em grande escala e com uma equipa em que trabalham profissionais de várias áreas. Quero organizar um programa de residência artística em que poderão participar não só alunos do Artfusion, mas todos os interessados: uma semana de workshops com os artistas do Cirque vindos de diferentes backgrounds, visitas a espaços culturais e artísticos, visitas aos bastidores, etc. Enfim, é dar oportunidade aos jovens de terem contacto com esta realidade e conhecerem o percurso daqueles artistas.

E o seu percurso até aqui, como foi?
Sou formada em Publicidade e Marketing e, da minha experiência, foi a criatividade que mais me chamou a atenção. Acabei por trabalhar em cinema e em televisão, fiz formação em teatro e, com os conteúdos que fui assimilando, descobri que o que mais gostava de fazer era estar na produção, nomeadamente na direcção artística. O facto de ter passado por vários departamentos foi para mim muito importante: deu-me consciência do que é o trabalho de equipa.

Trabalham essencialmente com jovens. Porquê esta população?
O que vejo de especial nestas pessoas é a espontaneidade e a capacidade de trabalhar os medos. As crianças e os jovens são também muito criativos e verdadeiros, o que para mim é um desafio. Cada um tem de ser trabalhado de uma forma individual e, depois, quando colocados em trabalho de equipa, mostram uma grande transformação. Acabo também por desenvolver as minhas competências para poder chegar até eles.

O que vamos ter no espectáculo integrado no Fringe?
Este espectáculo é uma estreia em Macau, a primeira vez que foi apresentado foi em Shenzhen. Mas são espectáculos diferentes. Aqui tive de fazer várias adaptações. Ter o Nam Van como palco foi um desafio enorme, é um palco muito grande. Chama-se “Connection” e o objectivo foi explorar o próprio conceito da palavra, ou seja, como é que o ser humano está ligado aos outros, à natureza, ao mundo à sua volta, muitas vezes de forma inconsciente. Este é um trabalho de alerta para a inconsciência das ligações que existem. São laços muitas vezes invisíveis ou ignorados e, cada vez mais no mundo real, esta falta de consciência transforma-se em intolerância. Todo o trabalho de concepção é neste sentido e os protagonistas têm de sentir tudo isto para fazerem um bom espectáculo, que só acontece se conseguirem fazer com que o público sinta o mesmo.

18 Jan 2017

Cristina Branco, fadista : “O Fado só pode ser cantado na Língua Portuguesa”

Esteve em Macau para um concerto onde mostrou o Fado bem português, ao lado de Mário Laginha. Convidada do Rota das Letras, Cristina Branco fala do percurso marcante da literatura na sua vida, de ser mulher e do sentimento único de ser fadista

De estudante de Comunicação Social à música e, mais concretamente, ao Fado. Como é que este caminho aconteceu?

Foi tudo muito rápido. De facto, era estudante de Comunicação Social e em determinado momento comecei a interessar-me pelo Fado. Pela música já era muito interessada, já ouvia imenso Zeca Afonso, Chico Buarque, os brasileiros… muito jazz, muito blues. Gostava muito de cantar, mas para mim, claro. Estava tudo lá, apesar de nunca ter imaginado ser cantora na minha vida. A determinada altura surge um convite para ir ouvir uma noite de fados, fui porque na altura estava a descobrir, não o Fado, mas a voz da Amália Rodrigues, porque o meu avô me tinha dado um disco [dela] pelo qual me apaixonei. E fui pela curiosidade de ouvir o som das guitarras ao vivo. Alguém perguntou se podia cantar. Eu cantei e fiquei completamente rendida àquela magia. De facto, sempre que o fado acontece e há aquela empatia com o público, há qualquer coisa ali. Ainda no outro dia, alguém em França me disse isso: há um misticismo que se passa naquela relação dos instrumentos com a voz, da voz com o público, há uma empatia muito grande. Há coisas que não se explicam e foi assim que comecei. Na verdade, todo o meu trabalho de fim de curso foi sempre à volta da música, com o ritmo, com a interpretação…

Está aqui no âmbito do Rota das Letras, mas também na sua carreira a literatura está muito presente.
Sempre gostei muito de literatura, gosto muito de literatura portuguesa, gosto muito escrever e acima de tudo gosto da Língua Portuguesa. Tenho a certeza de que de cada vez que se pega num poema em Língua Portuguesa, um poema de um autor que seja menos conhecido, só pelo facto de ser cantado passa para um público muito mais vasto. Pessoas que se calhar não conhecem determinado autor passam a conhecer, pelo simples facto de alguém o cantar. Porque a música é mais imediata, porque há pessoas que não lêem mas ouvem música. Há uma série de condicionantes para que isso aconteça, portanto a literatura entra por aí e por um gosto especial. Na minha casa sempre houve muitos livros, portanto também faz parte da minha educação.

cristina branco Criou personagens para o álbum “Alegria”. Como é que surgiu esta ideia, normalmente também tão associada à literatura?
A intenção não era que fosse um disco exclusivamente virado para a literatura mas no fundo são todos um bocadinho, porque vou sempre pedir [letras] a autores. Os meus discos têm uma vertente muito literária porque eu peço-as a muitos escritores portugueses. No caso do “Alegria” foi talvez mais específico, porque é uma leitura feita por mim antes dos autores. Construi as personagens, fui eu que lhes fiz o BI, disse o que é que elas faziam, como é que se chamavam, de onde vinham e para onde iam, quais eram os sonhos e as angústias e depois dei cada uma aos seus autores e pedi-lhes que escrevessem um poema à volta daquela pessoa. No fundo era criar quase um livro sonoro.

A sua carreira é recheada de colaborações. Como é que funciona este processo?
É por empatia acho. E isso acontece quando se gosta muito de determinado autor. As coisas têm que acontecer de forma espontânea e, no caso do Mário [Laginha], uma vez que vamos estar com ele, também foi assim. Trabalhamos na mesma companhia, com a mesma gente, e as coisas acabaram por acontecer naturalmente. A primeira vez que o Mário colaborou comigo foi com “Margarida” que o Camané também gravou e cantou. Na verdade o tema foi feito para o Camané, mas fui eu a primeira pessoa que o gravou. Perguntei se o Mário gostava de fazer uma música para mim e ele disse ‘olha porque é que não tentas o ‘Margarida’?’ Por acaso, não tenho certeza se foi assim que começou, mas depois fomos fazendo mais coisas. O Mário entra nos meus discos com várias composições. Acontece sempre por acaso, não é uma coisa premeditada. Não acredito na premeditação.


O Fado só pode ser cantado na Língua Portuguesa?
O Fado só pode ser cantado na Língua Portuguesa porque é Português.
Só se canta em Português porque é uma língua que surge naquele país e é a música certa para se cantar naquela língua. Ao cantarmos noutra língua estaremos a descaracterizar aquilo que é o Fado e, se é suposto termos algo que é nosso, o Fado será certamente uma dessas coisas. Não é que não haja uma tentativa de apropriação, antes pelo contrário, até acho que é um privilégio ver que pessoas de outras culturas cantam o Fado. Mas tenho a certeza que essas pessoas vão cantar o Fado na Língua Portuguesa e não nas suas. Porque isso não seria Fado. Não que também não cante noutras línguas, ou o faça com a guitarra portuguesa, mas interpretar uma música noutra língua com guitarra portuguesa é uma música noutra língua interpretada com guitarra portuguesa. Fado, Fado é em Português.
A Cristina tem uma carreira internacional. Como é que acha que os ouvintes que não entendem a Língua Portuguesa percepcionam o fado?

As pessoas não percebem Português e acontecem várias coisas nesse processo. Existem pessoas que desconhecem a Língua Portuguesa e de repente se apaixonam e querem saber mais só porque ouviram Fado, outras já conhecem a língua e descobrem o Fado pelo gosto que têm pela língua. Existem várias formas de chegar a uma convergência, que é o Fado.

Cantar no Oriente é muito diferente do Ocidente?

Cantar não, porque estamos a fazer o que sabemos fazer. Mas é diferente. Aqui há uma delicadeza qualquer que não se explica, é tudo muito diferente. Repare neste facto: temos que enviar rigorosamente o nosso repertório para que seja traduzido ao mínimo detalhe, o que impossibilita que possamos fazer alterações ao programa. Isso condiciona tudo, muda tudo. E depois a forma como as pessoas ouvem e o respeito imenso por aquilo que estamos a fazer. Ao deixar cair a última nota, às vezes não sabem muito bem como é que é, onde reagir, como é que fazemos. Batemos palmas agora, ou batemos palmas depois? Nota-se uma certa tensão que é positiva. Acho que há um carinho especial neste género de público quando ouve a nossa música.

Vem aí um novo álbum, “Menina”. Qual a expectativa?

Acho que é grande. Acho que o último disco é sempre o mais maduro, pelo menos do meu ponto de vista. Não consigo fazer um disco sem que tenha algo para dizer. Nunca aparece um disco que seja só uma imposição editorial. É mesmo porque tem que ser e, normalmente, são discos que marcam períodos importantes da minha vida. A minha história. O “Menina” é um disco que fala de mulheres. O disco fala de uma mulher que ao chegar a determinada idade, e de ter passado por vários estágios na sua vida, consegue concluir que está de bem com o que aconteceu. “Menina” é também “meninas”, “menina” é várias mulheres também em Português, é a “menina” solteira, é a “menina” prostituta. Na verdade, chamamos a tudo “menina”.

Este disco pode ser um auto-retrato, portanto.

Acho que é uma homenagem à condição feminina, sendo eu profundamente feminista.

Feminista, mulher, mãe, cantora. Como é a gestão desta vida de mulher?

É muita coisa. O meu marido costuma dizer que eu consigo abrir e fechar janelas com muita facilidade. A verdade é que quando entro em casa, entro em modo mãe, só e exclusivamente mãe. Não só por mim, mas também por imposição dos meus filhos. Não há cantora, não há artista. Tenho que ser exclusivamente aquilo que eles querem e gosto de o ser. Não gosto de misturar as tintas, mas na verdade, umas coisas entram nas outras necessariamente. A minha atitude enquanto cantora muda a partir do momento em que sou mãe. As coisas acabam por se misturar, é inevitável.

Neste estar em Macau, sente alguma identificação?
Há sempre qualquer coisa, porque a partir do momento em que vamos andando pela rua e há palavras que surgem em Português, há qualquer coisa que desperta de repente e pensamos: como é que é possível? A dada altura da história de um país, termos entrado em meia dúzia de cascas de noz e chegado a sítios tão longe… isso impressiona nesse sentido. Depois acho que somos sobejamente diferentes para percebermos que estamos a fazer com que haja uma afirmação da Língua Portuguesa e da cultura portuguesa num território que já se afastou de nós. E afastou-se tanto que a língua já só reside apenas em monumentos. O que acho que talvez seja menos correcto é que a língua não seja mais falada, não se ouça mais pela rua, ou que não existam mais referências à Língua Portuguesa. Passou também a ser um monumento.

15 Mar 2016

O decénio do século

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) escolheu o Departamento de Cultura da Província de Henan para co-participar nas actividades de comemoração dos dez anos de inscrição do Centro Histórico do território na lista do Património Mundial. Parte disto fazem espectáculos de dança, música, teatro e palestras relativas às duas regiões. O cartaz de eventos inclui cinco exposições, publicação de novos documentos sobre o Centro Histórico e sua preservação, realização de palestras até final do ano e actuações de espectáculos culturais de música clássica e de teatro.

A primeira mostra conjunta estará em exibição no Casino Galaxy e tem entrada gratuita, realizando-se entre os dias 13 a 28 deste mês. “Génese e Espírito” pretende mostrar aos residentes da RAEM o que Henan tem para oferecer e divide-se em várias actividades relacionadas com arte, workshops, música e uma palestra. A última tem lugar das 14h30 às 15h30 do próximo domingo, na Casa do Mandarim.

As Ruínas de S. Paulo vão ser palco para um espectáculo artístico no próximo fim-de-semana, às 17h00 de sábado e 11h00 de domingo. Já na Casa de Lou Kau ocupa-se de uma mostra de artesanato de Henan, de 14 a 28 deste mês, com entrada gratuita das 10h30 às 13h30 e das 14h30 às 17h30.

Outros palcos

De 12 de Julho a 15 de Agosto estará exposta nas Ruínas de S. Paulo uma mostra que “foca os feitos alcançados, ao longo dos anos, na salvaguarda do património” local. E porque a cultura estará espalhada por toda a cidade, é nos Lagos Nam Van que estreia uma outra exposição, desta vez com fotografias de edifícios e outros marcos de Macau. Esta realiza-se de 13 a 20 de Junho, coincidindo com a Regata de Barcos-Dragão. O dia 12 de Julho fica assim reservado para a realização de um seminário sobre a preservação do Centro Histórico, a partir das 11h00. O IC deverá convidar especialistas e académicos para discutirem esta matéria, na sala de convenções e entretenimento da Torre de Macau.

Dar música

Além de tudo isto, o IC guardou ainda espaço para a realização de concertos por orquestras. Estes acontecem de 4 a 26 de Julho, em locais emblemáticos como são o Teatro D. Pedro V e a Casa do Mandarim. Entre os artistas estão a Orquestra de Macau, a Companhia Juvenil de Teatro de Repertório de Macau e a Orquestra Chinesa de Macau, com espectáculos cujas entradas podem ser livres ou variar entre as 30 e as cem patacas.

O programa das comemorações inclui ainda outras duas exposições: a primeira acontece em Novembro e vai integrar uma série de reproduções de mapas antigos da cidade que se encontram espalhados por vários centros de documentação e bibliotecas mundiais. A mostra pretende explicar aos visitantes as mudanças sofridas. Por último, o IC, juntamente com o Instituto do Desporto, pretende organizar, em Dezembro e por ocasião da Maratona Internacional de Macau, uma exposição sobre o Centro Histórico na Nave Desportiva, no Cotai.

11 Jun 2015