Portugal está a perder a juventude

Quando eu andava no Liceu de Évora apenas sonhava com a universidade em Lisboa. A família tinha meios financeiros para que eu pudesse estudar. Digo-vos isto, porque no nosso país estão a acontecer fenómenos tristes e desoladores com a nossa juventude.

Cada vez há menos alunos que desistem do ensino secundário; cada vez mais estudantes que terminam o secundário não têm possibilidades de ordem financeira para se inscrever numa qualquer universidade; cada vez mais temos “jovens” com 35 anos de idade a viver na casa dos pais porque não têm emprego que lhes proporcione o aluguer de uma residência; cada vez mais existem casais de namorados que não podem decidir casar porque não têm possibilidade de pagar as despesas do casamento, dinheiro para conseguirem uma casa e muito menos pensar em ter filhos; cada vez mais temos jovens universitários que a meio dos cursos desistem por falta de apoio oficial para o pagamento das propinas e procuram um trabalho diverso, em alguns casos, apenas conseguem laborar num restaurante; cada vez mais temos jovens que terminam o curso superior e não têm condições para obter o mestrado e o doutoramento; cada vez mais temos jovens que tiram o curso de enfermagem e assim que iniciam o trabalho num hospital ou centro de saúde, logo concluem que o salário obtido não chega para sobreviver e decidem emigrar; cada vez mais assistimos a jovens licenciados a emigrarem para Inglaterra, Alemanha, França e Holanda; cada vez mais somos confrontados com jovens que nos interrogam se existe alguma possibilidade de irem trabalhar para Macau; cada vez mais temos à vista desarmada jovens a dormir na rua depois de terem consumido um qualquer tipo de estupefaciente e cada vez mais ouvimos jovens a dizer que em Portugal não têm futuro e que se vão embora para o estrangeiro.

Naturalmente, que esta realidade é chocante e revoltante, porque as autoridades governamentais não querem dar-se conta que o país está a perder a sua juventude e que daqui a uma década serão muito poucos os jovens que viverão em Portugal. Não é possível chegar aos 35 anos e continuar a viver em casa dos pais, alguns na companhia da namorada. E este caso processa-se em residências paternais que têm possibilidades de sustentar os filhos, porque a grande maioria não tem o pecúlio necessário para manter os filhos em casa. Isto, é degradante, é triste e leva-nos a pensar que os governantes não têm qualquer preocupação com o futuro da juventude.

Há dias, um jovem que tinha desistido do curso de Medicina por não poder pagar as despesas inerentes às aulas, dizia-nos que iria para Espanha, mais concretamente para Madrid, visto que tinha lá um amigo que lhe arranjava um bom emprego numa clínica médica e que simultaneamente poderia terminar o seu curso clínico. São inúmeros os exemplos como este. Os jovens só por si são revolucionários e sonhadores. Nós também o fomos, mas nos dias de hoje em Portugal nem podem ser revolucionários nem sonhadores. O único sonho é a emigração. E esta, tem inserido milhares de raparigas e rapazes. Se forem a Paris ou a Londres logo se deparam com este triste panorama, felizmente de bom grado para os jovens que decidem emigrar. E há o outro lado da moeda. A família. Os jovens que emigram sofrem com saudades dos pais, dos irmãos e muitas vezes das namoradas. Os pais ficam pelas suas localidades a vaguear e a pensar a toda a hora nos filhos que viram partir e que não sabem quando os voltarão a rever. É um quadro negro para uns e outros. Para os que partem e para os que ficam.

Na semana passada recebi um email de um filho de um amigo pedindo-me que nada dissesse aos pais. O jovem transmitiu-me que iria deixar a Europa e que tinha arranjado um bom contrato para exercer a sua profissão de engenheiro na Nova Zelândia. Ou seja, no fim do mundo. Imaginam certamente, o estado em que vão ficar os seus pais quando souberem que o filho vive para lá da Austrália. O país, melhor, os responsáveis pelo ensino e pelo trabalho dos jovens têm muito rapidamente de mudar de atitude e legislar medidas de grande apoio social aos jovens. Se um estudante a meio do curso participa às autoridades que não tem dinheiro para continuar, o Governo tem a obrigação de lhe pagar as propinas. O Governo não pode continuar a assistir impávido e incompetente face ao que se passa com a juventude. E, para não falarmos no ano lectivo que está a terminar e que foi um ano perdido para a maioria dos estudantes devido à justa luta dos professores que há mais de um ano enfrentam um ministro da Educação incompetente, cruel, arrogante e que conseguiu que durante o ano lectivo as escolas estivessem praticamente encerradas. Ainda na semana que findou os professores atravessaram Portugal de norte a sul para explicar ao povo do interior as razões da sua luta e a incompreensão vaidosa do ministro e da sua equipa na tutela da Educação.

Não temos dúvidas que Portugal está a perder a sua juventude, o que já acontece nos dias de hoje. As estatísticas de jovens que têm emigrado são assustadoras e chocantes. Termino com um apelo a quantos amigos leitores vivem em Macau: se receberem algum contacto de um licenciado a pedir ajuda para trabalhar na RAEM, façam tudo o que puderem para que esses jovens possam ter um trabalho, casa, companheira e filhos.

4 Jun 2023

Emigração | Os portugueses que chegaram quando muitos estavam a sair

João Veloso e Inês Lemos são o exemplo de portugueses que decidiram emigrar para Macau quando muitos estavam de saída. Mas só o conseguiram fazer no ano passado devido às restrições em vigor. Em plena pandemia, apostaram no desconhecido e numa nova vida deixando de lado as notícias negativas sobre a covid. Amélia António diz ser cedo para se falar de uma eventual renovação da comunidade com o fim das restrições

 

A normalidade começou a instalar-se na Europa a partir de meados de 2021. Os verões começaram a ser vividos por multidões descontraídas e a máscara foi, aos poucos, perdendo importância. Em Macau, pelo contrário, até há pouco tempo, as palavras surto, confinamento, máscara e distanciamento físico, faziam parte do léxico do quotidiano do território, fazendo com que muitos portugueses, há mais de dois anos sem verem as famílias, deixassem o território de vez.

Inês Lemos, designer, e João Veloso, director do departamento de português da Universidade de Macau (UM), contrariaram essa tendência. Ambos sabiam que iam passar pela quarentena de 14 dias, pelo tempo interminável de espera no Aeroporto Internacional de Macau à chegada sem perceberem muito bem porquê, engalfinhados numa burocracia de testes em catadupa e papeladas sem fim.

Ainda assim, por questões pessoais e profissionais, apostaram em emigrar para Macau e hoje não estão arrependidos. “Cheguei em Junho de 2022, na altura do surto e na antevéspera do semi- confinamento”, contou ao HM João Veloso, que, no entanto, nunca pensou em desistir do novo projecto profissional por causa das restrições.

A UM abriu o concurso público para a escolha de um novo director do departamento de português em finais de 2020, mas, na altura, não era permitida a entrada de estrangeiros em Macau. Dessa forma, João Veloso só pôde pisar o solo da RAEM no ano passado.

“Quando concorri sabia qual era a situação, mas tinha esperança de que, nos meses seguintes, as coisas melhorassem. Quando recebi instruções para vir, a meio do surto, confesso que fiquei um bocadinho receoso. Sou um optimista por natureza e um bocadinho lírico, mas sabia que a situação não seria fácil.”

Para João Veloso, vir para Macau e passar por todas as restrições da covid foi como um “regresso ao passado”, pois já em Portugal tinha vivido dois confinamentos e cumprido regras como o uso da máscara e a realização de testes.

“Passei por alguns momentos de desânimo depois de chegar a Macau, mas antes não. No embate com a realidade tive momentos de alguma ansiedade, na altura do isolamento. Cheguei a ter receio de que o território fechasse novamente.”

Ainda assim, como optimista que é, João Veloso faz “um balanço positivo” da vinda para Macau. “Nunca me arrependi de ter vindo. Acho que ter emigrado nesta altura é uma espécie de prova de resistência pessoal. Passei por alguns momentos de desânimo e angústia, mas graças ao apoio que recebi de pessoas aqui em Macau, e ao ver algum espírito de mobilização, faço um balanço positivo. Fico contente por ver que as medidas restritivas estão a ser abandonadas, o que oferece outras perspectivas de contactos e de viagem”, frisou.

Bruscamente no Verão passado

No caso de Inês Lemos, foi o coração que a trouxe a Macau. Chegou no Verão do ano passado, assim que as autoridades decretaram que todos os portadores de passaporte português podiam entrar na RAEM. Antes disso, tinha apresentado um pedido de acesso à residência pela via do casamento que foi recusado.

Inês recorda-se da quarentena de 14 dias que teve de cumprir e para a qual até já estava preparada. Mas as cerca de dez horas de espera no aeroporto, à chegada, foi, para si, “o pior”. “Foi muito sofrido, estive sentada numa sala fria depois de uma viagem longa à espera de coisas. Custou bastante.”

Inês Lemos nunca baixou os braços e, ao contrário da maior parte das pessoas que já desesperava com as restrições há bastante tempo, tinha o espírito mais leve para lutar. “Tinha perfeita noção do que estava a acontecer, mas eu estava super feliz porque ia finalmente ter com o meu companheiro. Foi o concretizar de um desejo passados mais de dois anos em que estivemos afastados. Apanhei com o confinamento mal cheguei a Macau, mas vinha com um ânimo diferente das pessoas que já cá estavam”, lembrou.

Sem ter termo de comparação em relação ao que Macau era antes da pandemia, Inês Lemos sentiu as “ruas vazias”. “Percebi pelos comentários de todos que antes era bem diferente, sempre com muita agitação e filas para tudo. Ouvi falar de Macau pelas lembranças e memórias antes da covid. Agora noto que, de facto, há muito mais movimento de pessoas que não são de Macau.”

Neste momento, Inês frequenta a pós-graduação em Educação da Universidade de São José (USJ) e prepara-se para fazer o estágio que depois lhe vai permitir dar aulas. A designer, a trabalhar remotamente para Portugal, pretende, por isso, entrar no mercado laboral local em breve.

Dados que importam

Divulgado esta quarta-feira pelo Governo português, o Relatório da Emigração relativo ao ano de 2021 dá conta do menor número de sempre de entradas de portugueses em Macau. Apenas 18 o fizeram desde 2000, sendo que esses eram residentes da RAEM, uma vez que não era permitida a entrada de estrangeiros.

Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau (CPM), revela estar mais preocupada com os números dos portugueses que saíram do que daqueles que entraram. E esses são mais difíceis de quantificar.

“Se não podiam entrar estrangeiros, só os residentes é que podiam entrar, até seria normal que os números fossem zero. Vivia-se uma situação complicada e depois tínhamos a própria impossibilidade legal. Obrigaria a uma reflexão maior se conseguíssemos ter os números de quem saiu efectivamente, porque há as pessoas que saíram para férias ou outras razões, mas que não o fizeram de forma definitiva.”

Amélia António traça vários cenários relativamente à saída de cidadãos portugueses. “Quem saiu com mais idade, ou reformado, ou a acompanhar filhos, faz parte de um movimento mais ou menos normal. Foi acelerado, talvez, pela força das circunstâncias, pelo facto de não se poder ver as famílias. Mas pessoas mais novas que saíram, que estavam a trabalhar, com a vida mais ou menos organizada, isso é que é mais assustador para mim, porque essas pessoas não vão voltar para Macau, a não ser que as suas vidas em Portugal não corram como o planeado.”

Nova comunidade?

Sem restrições, será que a comunidade portuguesa pode agora renascer e reinventar-se? Amélia António acredita que, a curto prazo, será difícil chegarem novas pessoas que não tenham contactos prévios com o território. “Pessoas que nunca estiveram em Macau e que venham de novo serão muito poucas, tendo em conta toda a propaganda negativa relativamente às condições de vida e de saúde. Não será fácil isso acontecer. Tal demorará muito tempo e depende da orientação que for dada ao território, caso haja interesse efectivo de que Macau continue a ter uma imagem multicultural e de abertura ao exterior, com a presença de quadros qualificados portugueses e da sua mais-valia.”

Para a dirigente associativa, não basta abrir as fronteiras. “Estes anos foram desmobilizadores e criaram uma imagem pouco atractiva de Macau. Veremos como é que a situação vai evoluir, porque vai depender de coisas que neste momento não conseguimos saber, como é o caso das questões laborais, das operadoras de jogo, em termos de necessidade de mão-de-obra. Haverá uma ligação com as dificuldades que poderão aumentar, ou não, na Europa. Há muita coisa desconhecida ainda. É o momento ainda muito difícil para fazer previsões.”

Para João Veloso os portugueses ainda fazem falta em alguns sectores, como é o caso da Função Pública ou na área da docência. “Neste momento começa a deixar de haver razões para as pessoas terem os receios ou reservas que tinham até agora. Se isso se vai traduzir numa vinda de mais portugueses, não sei. Há lugar para os portugueses ainda pois há certos serviços que precisam deles. As condições de vida e de entrada em Macau tendem a melhorar. Há motivos para a comunidade portuguesa voltar a aumentar. Há lugares para professores de português e funcionários públicos, por exemplo.”

Também Inês Lemos acredita que este “cantinho” na Ásia terá sempre espaço para os cidadãos portugueses. “Há sempre espaço para nos reinventarmos e fazermos coisas diferentes. Acredito que Macau ainda tem muitas coisas agradáveis e boas para oferecer aos portugueses, há uma ligação histórica e temos este cantinho na Ásia que é uma ponte para tantos sítios. Macau continua a ser um bom sítio para se apostar, mesmo com a distância.”

13 Jan 2023

25 de Abril | Presidente da AR dedica discurso aos emigrantes

As comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo foram o tema central do primeiro discurso de Augusto Santos Silva, por ocasião das cerimónias do 25 de Abril, na qualidade de presidente da Assembleia da República. O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros destacou as mudanças no acesso dos emigrantes ao voto

 

Foi um 25 de Abril celebrado em Lisboa de uma forma mais livre, já sem máscaras no Parlamento, e com muitas caras novas. Augusto Santos Silva, na qualidade de presidente da Assembleia da República (AR), e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, centrou o seu discurso nas comunidades portuguesas de emigrantes espalhados pelo mundo.

Santos Silva destacou a importância dos emigrantes para a construção do processo democrático no país, lembrando a crescente participação cívica e eleitoral dos mesmos, graças à criação dos círculos de emigração e o “alargamento do direito de voto às eleições presidenciais e europeias”.

“A última barreira foi quebrada em 2018, quando o recenseamento automático foi expandido aos portadores de cartão de cidadão com morada no estrangeiro, fazendo de um milhão e seiscentos mil deles eleitores de pleno direito.

O efeito não demorou: o número dos que votaram, nos chamados círculos da emigração, nas eleições de 30 de Janeiro de 2022 foi seis vezes superior ao registado em 2015. E vai continuar a aumentar”, declarou.

O objectivo é uma aproximação “da ambição de qualquer democracia, que é tratar por igual todas as pessoas como cidadãos, quer dizer, sujeitos do seu destino”.

Santos Silva destacou também medidas como a institucionalização do ensino português no estrangeiro, o apoio ao associativismo e o nascimento do Conselho das Comunidades Portuguesas. Foi ainda lembrada a “extensão da nacionalidade originária aos lusodescendentes”, considerados “uma trave-mestra do nosso regime democrático”.

Redes criadas

O líder da AR não esqueceu o facto de, nas últimas décadas, muitos luso-descendentes terem vindo a ocupar lugares de destaque nas sociedades onde escolheram viver. Estes “vão alcançando funções de responsabilidade nos municípios, regiões e Estados de que são habitantes: vão ocupando postos dirigentes nas administrações públicas, nos sistemas de justiça, na organização de escolas e universidades; vão-se tornando vereadores, presidentes de câmaras municipais, membros de assembleias estaduais, deputados a parlamentos e congressos nacionais, membros de governos”.

Neste sentido, são um “capital preciosíssimo de que o país dispõe para alavancar e projectar a sua influência no mundo”.

Para Santos Silva, a revolução de 1974 “influenciou sobremaneira o estatuto e os percursos dos residentes no estrangeiro”, sendo os retornados “um dos alicerces do regime saído do 25 de Abril”.

Augusto Santos Silva não esqueceu alguns “problemas” existentes, alertando para a necessidade de “estancar a sangria de muitos dos nossos jovens mais qualificados, apoiar o seu regresso a Portugal e servir melhor as comunidades no estrangeiro”.

27 Abr 2022

Novas regras criaram corrida aos vistos ‘gold’ em Hong Kong e China

Consultores de emigração em Hong Kong e Macau disseram à Lusa que as novas regras, que entraram em vigor a 1 de janeiro, originaram uma corrida aos ‘vistos gold’ portugueses no final de 2021.

De uma média de dez processos por ano, Jeff Yen Li Wei, sócio da sociedade de advogados de Macau Nuno Simões e Associados, passou para 20 pedidos só na segunda metade de 2021, sobretudo vindos da China continental.

Também John Hu, fundador e consultor principal da John Hu Migration Consulting, uma empresa de Hong Kong especializada em emigração, teve clientes locais a tentar iniciar o processo “mesmo antes do Natal”.

O objetivo era antecipar a entrada em vigor de um decreto-lei que proíbe a obtenção de ‘visto gold’ através da compra de propriedade residencial nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e na maioria das regiões do litoral.

A mudança estava originalmente prevista para julho de 2021 e muitos chineses e britânicos radicados em Hong Kong aproveitaram os seis meses extra para “acelerar” o negócio, disse Jason Gillott.

Para o cofundador da Golden Visa Portugal Limited, uma empresa de Hong Kong especializada na obtenção de ‘vistos gold’, a opção mais popular foi comprar casas para reabilitação em Lisboa, Cascais ou Ericeira.

Até ao final de 2021, o programa de Autorização de Residência para Investimento permitia obter residência em Portugal ao investir em imobiliário no valor mínimo de 500 mil euros, valor que caía para 350 mil euros no caso de reabilitação urbana.

Após a correria de dezembro, Jeff Yen não tem novos clientes atualmente, mas disse acreditar que “quem estava interessado, vai continuar a estar interessado”.

Ainda assim, o advogado, que viveu mais de duas décadas em Portugal, defendeu que será mais difícil convencer investidores chineses a comprar imobiliário fora dos grandes centros urbanos.

A aquisição de propriedade era a opção em “80% dos casos”, mas John Hu considerou que a transferência de pelo menos um milhão de euros em capital poderá tornar-se uma escolha mais popular para os investidores de Hong Kong.

Com sete processos em carteira, Jason Gillott está mais otimista, apontando o crescente interesse vindo de residentes do Reino Unido, Estados Unidos e Turquia.

De acordo com números oficiais divulgados na segunda-feira, a inflação anual na Turquia ultrapassou os 36% em dezembro, um recorde desde 2002, devido à queda de quase 45% da lira turca face ao dólar num ano.

“Muitos dos clientes têm já uma boa ideia de onde querem investir”, indicou Jason Gillott, apontando o caso de uma norte-americana que queria comprar casa em Évora para alugar a estudantes universitários.

O britânico afirmou que há ainda oportunidades no imobiliário, nomeadamente no litoral do distrito de Setúbal. “Fiquei muito surpreendido por toda aquela zona, da Comporta até Santiago do Cacém, ter ficado na lista para o ‘visto gold’”, disse.

9 Jan 2022

Migração | Pena do casamento falso justificada com efeito de dissuasão

O Governo aposta numa pena de prisão de dois a oito anos para casamentos falsos com o objectivo de o castigo ter um efeito dissuasor. A proposta de lei sobre a migração prevê também que os operadores de transportes sejam multados se transportarem ilegais, mas apenas quando estiverem a par da situação

 

O efeito dissuasor e a gravidade dos casos de casamento falso foram os principais argumentos invocados pelo Governo para manter a proposta de dois a oito anos de prisão neste tipo de crime. A medida consta da proposta de Lei sobre o “regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e residência” na RAEM, em discussão na 3.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa.

Recorde-se que a proposta prevê penas de prisão para quem “simular casamento, união de facto, adopção ou contrato de trabalho”, tendo como objectivo proporcionar a outros, ou obter para si, a autorização de residência ou autorização especial de permanência em Macau, formalizando o respectivo pedido junto das autoridades.

De acordo com Vong Hin Fai, presidente da Comissão, o Governo explicou que a prática desses crimes tem sido registada “ao longo dos tempos”, nomeadamente casamentos e contratações de trabalho falsas. “A sua criminalização tem dividido as opiniões ao nível das instâncias judiciais, porque mesmo diferentes magistrados têm opiniões diferentes sobre a criminalização ou não de certos casos de casamento fictício”, disse. O deputado acrescentou que o artigo visa então clarificar a necessidade de criminalizar essas acções e “surtir um efeito dissuasor”.

Vong Hin Fai reconheceu que na primeira ronda de discussão os deputados consideraram a pena “bastante pesada”. No entanto, observou que em Hong Kong a pena pode ir até aos 14 anos de prisão. “[Com base na] resposta dada pelo Governo considerou-se que agora essa moldura penal que consta da proposta de lei pode alcançar o efeito dissuasor, tendo em conta o agravamento deste crime nos últimos tempos. Assim, o proponente propôs manter a moldura penal que consta da proposta de lei de dois a oito anos de prisão. E a Comissão não tem outra opinião sobre isso”, explicou.

A proposta de lei revê também a definição de associação ou sociedade secreta da lei da criminalidade organizada, passando a prever o aliciamento ou instigação para simulações de casamento, união de facto, adopção ou contrato de trabalho.

Pagar o conhecimento

O Governo pretende ainda multar os operadores de transportes que tragam para a RAEM passageiros ou tripulantes que não estejam autorizados a entrar no território, apesar de não haver penalização se o operador demonstrar que não tinha conhecimento da condição da pessoa. “Os operadores de transporte serão informados da condição dos passageiros ou tripulantes de forma a que possam ter conhecimento de quem está ou não autorizado a entrar na RAEM”, disse Vong Hin Fai. Além disso, o deputado exemplificou que quando o documento de viagem de um indivíduo tiver um prazo de validade inferior a 30 dias, a sua entrada não é autorizada.

Ao nível das penalidades para operadores de transportes, previa-se também uma multa de 150.000 a 500.000 patacas por cada viagem em caso de “transmissão com erros, incompleta, falsa ou após o prazo” das informações das pessoas transportadas até ao território. No entanto, tendo em conta a prática noutras zonas do mundo, o Governo “vai alterar o montante da multa antes prevista”. Assim, a multa a ser aplicada nessas circunstâncias será reduzida para um valor entre 30.000 a 150.000 patacas.

Dia sim, dia não

O secretário para a Segurança afirmou ontem que a rejeição de entrada de pessoas em Macau funciona de duas formas diferentes. De acordo com Wong Sio Chak, Macau tem uma lista das pessoas que não podem entrar no território referente a quem praticou um crime ou tem antecedentes criminais.

No entanto, garantiu que para as restantes situações é seguida a prática internacional e não existe lista. Ou seja, as medidas da polícia dependem de cada caso, mediante a informação existente. “Esta é uma decisão urgente”, explicou. “Nós não temos esta lista. Mas no nosso serviço policial temos pistas e informações (…). Tem de se estudar caso a caso”, afirmou, acrescentando que se pode lidar com a entrada da mesma pessoa no território de formas diferentes em dias distintos. “Hoje talvez haja problema, mas amanhã talvez não vá haver. Isso depende das pistas e das informações que temos”, apontou.

Questionado sobre quantas pessoas estão em causa, quanto aos dados a analisar pela polícia, Wong Sio Chak respondeu apenas não poder revelar o número.

6 Mai 2021

Migração | Dados biométricos podem ser conservados depois de cinco anos

O prazo de conservação de dados biométricos de não residentes recolhidos nas fronteiras pode ir além dos cinco anos, caso seja alegada utilização para “finalidades específicas”. O Governo assegura, no entanto, que será estabelecido um limite máximo e que alargar a recolha de dados biométricos à íris ou à retina é feito em nome da “salvaguarda do interesse público”

 

O Governo revelou ontem, perante os deputados da 3ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) que estão a analisar a futura lei da migração, que, em situações especiais, os dados biométricos recolhidos nas fronteiras podem ser conservados além do prazo máximo de cinco anos. Isto, apesar de os prazos de conservação dos dados pessoais de turistas e visitantes não aparecer definido na proposta de lei. A comissão levantou dúvidas aos deputados.

“O Governo explicou que vai seguir o que consta no regulamento administrativo [a criar no futuro], ou seja, no máximo, os dados serão conservados durante cinco anos. No entanto, por causa da finalidade específica da recolha desses dados, há a possibilidade de o período ser alargado para mais de cinco anos. Como isso não consta da proposta de lei que estamos a analisar, houve membros da comissão que sugeriram que [os limites de conservação de dados pessoais] deviam constar claramente na proposta de lei”, explicou o presidente da Comissão Vong Hin Fai.

Recorde-se que, em causa, está o facto de a proposta do “Regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e de residência na RAEM” prever que, além da apresentação do passaporte e documento de viagem, a identificação de não residentes na fronteira seja feita também com recurso a dados biométricos como impressão digital, reconhecimento facial e leitura da íris e da retina.

Durante a reunião de ontem, o Governo procurou ainda justificar perante os deputados, as razões para incluir a recolha da informação relativa à retina e à íris, apresentando como exemplo o caso de Singapura, mas assumindo, contudo, que a maioria dos países se ficam pela recolha de impressões digitais e sistemas de reconhecimento facial.

Questionado por alguns deputados sobre as razões pelas quais o Governo optou pela “escolha da minoria”, o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak terá respondido que tudo se resume à maior dificuldade que existe em falsificar este tipo de dados, tendo em conta o objectivo último da salvaguarda do interesse público. “As impressões digitais e os dados faciais são susceptíveis de ser alterados, comparativamente com os dados biométricos da íris ou da retina. Assim, se for incluída essa modalidade de recolha de dados biométricos podemos dizer que, a possibilidade de alteração desses dados será muito reduzida. Segundo o Governo é justificável adicionar (…) os dados biométricos da íris e retina, para salvaguardar o interesse público e a segurança publica”, transmitiu Vong Hin Fai.

Abertura para negociar

Sobre a duração e contagem dos períodos de interdição de entrada, e perante as preocupações dos deputados sobre a inexistência de um tecto máximo na proposta de lei, o Governo explicou que por analogia à lei da criminalidade tem sido definido “um máximo de 10 anos”. No entanto, o Executivo mostrou abertura para adicionar um limite ao diploma.

“A comissão considera que deve ser fixado na lei um limite máximo para interdição de entrada. No entanto, apesar de a lei não fixar qualquer limite máximo, essa ausência não tem levantado dificuldades práticas e os tribunais têm aplicado o princípio de que o prazo de interdição de entrada não deve exceder 10 anos, por analogia com o limite máximo da interdição de entrada prevista da lei da criminalidade organizada. No entanto, o Governo assume uma atitude de abertura sobre a menção clara desse período na proposta de lei”, apontou Vong Hin Fai.

20 Abr 2021

Migração | Deputados questionam período de retenção de passaporte pelas autoridades

Os deputados da 3ª comissão permanente da Assembleia Legislativa pretendem saber se há um prazo máximo a cumprir pelas autoridades policiais quando retêm o passaporte de pessoas que entram ilegalmente em Macau. Na reunião de ontem colocaram-se ainda dúvidas sobre os prazos e o processo de detenção destas pessoas até à sua expulsão do território

 

O regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e residência na RAEM, actualmente em análise na especialidade na Assembleia Legislativa (AL), prevê que, aquando da entrada de pessoas ilegais em Macau, estas possam ficar em liberdade temporária desde que entreguem o seu passaporte ou outro documento de viagem, e sempre em casos considerados menos graves.

No entanto, os deputados pretendem saber se a proposta de lei irá prever um prazo máximo para o confisco deste documento. “O Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) pode deixar a pessoa em liberdade, mas com a condição de ter um passaporte. Foi colocada a questão se há ou não um prazo para a retenção do passaporte do interessado, ou se este prazo pode ou não ser prolongado”, explicou o deputado Vong Hin Foi, que preside à 3ª comissão permanente da AL, responsável pela análise deste diploma.

Segundo a proposta de lei, esta medida de liberdade temporária exclui as situações em que a pessoa tenha “adoptado uma conduta que indicie que pretende furtar-se à expulsão” ou que tenha estado envolvida num caso de imigração ilegal há menos de 10 anos. Estão também excluídos casos em que a pessoa ilegal possa pôr em causa a ordem e segurança públicas do território.

Dúvidas sobre detenção

A proposta de lei prevê que as pessoas que entrem ilegalmente em Macau fiquem detidas por um período inicial de 48 horas com vista à “realização das diligências para o início do processo de expulsão”. No entanto, os deputados pretendem ter acesso a mais dados, como “os números das pessoas detidas, os casos em que a detenção foi de 48 horas e quais aqueles em que se ultrapassaram as 48 horas de detenção”.

O diploma prevê ainda que o prazo de processamento de expulsão é de 60 dias, mas a contagem dos dias pode ficar suspensa sempre que haja dúvidas sobre a identidade da pessoa, ocorram atrasos com a documentação ou o detido esteja impedido de viajar por motivo de doença. Esta detenção nunca pode ultrapassar o prazo máximo de dois anos.

Sobre esta matéria, no entanto, os deputados apresentaram várias dúvidas. “Se depois de 24 meses a pessoa continuar doente ou impossibilitada de viajar, teremos de ver qual o tratamento que vai ser dado”, disse Vong Hin Fai.

Quanto à necessidade de recolha de dados por parte das autoridades, fundamento que pode levar à suspensão do prazo para o processamento da expulsão, os deputados também apresentam questões. “[Quando a pessoa entra legalmente em Macau] as autoridades policiais já possuem dados de identificação da pessoa, porque é que se considera que essa situação de indocumentado como fundamento para a suspensão da contagem do prazo para o processamento da expulsão? As autoridades já teriam recolhido esses elementos da pessoa aquando da sua entrada”, adiantou o presidente da 3ª comissão.

Ainda sobre a detenção da pessoal ilegal, os deputados pretendem clarificar qual será a entidade responsável pela aprovação da extensão da detenção além das 48 horas iniciais após a entrada no território.

26 Fev 2021

Emigração | Aprovada proposta de lei que criminaliza casamentos falsos

Apenas o deputado Sulu Sou votou contra o “regime jurídico dos controlos de migração e das autorizações de permanência e residência”, ontem aprovado na generalidade. Com este diploma o Governo quer criminalizar actos de casamentos, uniões de facto, adopções ou contratos de trabalho ilegais e regular várias lacunas relacionadas com emigração e pedidos de residência

 

A Assembleia Legislativa (AL) aprovou ontem, na generalidade e com apenas o voto contra do deputado Sulu Sou, o “regime jurídico dos controlos de migração e das autorizações de permanência e residência” na RAEM. Com este diploma, o Governo pretende regularizar algumas lacunas existentes na área da emigração e dos pedidos de residência, incluindo a “criminalização do casamento, união de facto, adopção ou contrato de trabalho simulados”.

Wong Sio Chak, secretário para a Segurança, deixou claro que só “quando se trata de crime organizado é que o acto [casamento falso] é considerado crime. O que estamos a fazer é melhorar a identificação da ocorrência de um casamento fictício. Se estiver em causa o crime organizado, temos o Código Penal com uma pena de 15 a 20 anos. O casamento fictício só tem uma moldura penal de dois a oito anos”, explicou.

O secretário frisou que “entre os magistrados não é consensual o entendimento e, por isso, tendo como referência a lei portuguesa, decidimos criar um tipo de crime que pressupõe o casamento fictício. Não vai dificultar o nosso trabalho, bem pelo contrário”, concluiu Wong Sio Chak.

Outra das alterações passa pela obrigatoriedade dos hotéis terem de comunicar às autoridades, no prazo de 48 horas, a entrada e saída de não residentes com mais de 16 anos. Eliminam-se ainda multas fixas e faz-se o agravamento de penas por auxilio à emigração ilegal. Além disso, elimina-se o prazo máximo de detenção de 60 dias para ilegais, passando a contagem do tempo de prisão a ser feita até que a identidade do sujeito seja confirmada, num prazo máximo de dois anos.

O secretário explicou que esta mudança se deve ao facto de muitos indivíduos nesta situação serem oriundos do sudeste asiático. “É difícil confirmar a sua identidade, daí ser necessário passar de 18 para 24 meses. Em Hong Kong não há um prazo limite”, exemplificou.

Foram também clarificadas as entradas no território relacionadas com as actividades de turismo, passando a estar incluídas visitas a amigos e familiares ou participação em seminários e encontros académicos. O Executivo adicionou também a este diploma três figuras adicionais para a autorização especial de permanência em Macau. Além disso, as companhias aéreas passam a estar obrigadas a a divulgar os dados de todos os passageiros e tripulantes às autoridades, aquando do desembarque, estando também prevista a possibilidade de retenção de documentos em casos de emigração ilegal.

E as pessoas “non gratas”?

Os deputados Au Kam San e Sulu Sou aproveitaram o debate para exigir uma maior clarificação, na proposta de lei, da norma que impede as pessoas de entrar no território.

“Não nos opomos ao controlo de entradas e saídas, mas em relação a jornalistas, empresários ou pessoas que, sem uma relação política, viram a sua entrada barrada, é errado porque está em causa a lei de bases da segurança interna. Isso deve ser explicado na lei que estamos a debater”, disse Sulu Sou.

“O conceito de que estas pessoas podem ‘constituir uma ameaça para a segurança interna’ é muito abstracto, o secretário deve explicar esta norma”, adiantou Au Kam San.

Wong Sio Chak frisou que as leis de Macau chegam a ser mais claras do que as da União Europeia (UE) nesta matéria. “Já aqui apresentei leis de outras jurisdições, incluindo da UE, e a nossa lei é mais clara. Por que é que em outros lados é permitido fazer isso e aqui não podemos fazer? Essa questão tem a ver com a segurança interna e pública e até com a segurança do Estado.”

O secretário voltou a frisar que a proibição de entrada de algumas pessoas visa “salvaguardar a segurança nacional e evitar fuga de informações”. Isto porque a entrada de pessoas “pode constituir uma ameaça ainda mais grave para a nossa segurança”, concluiu. O diploma segue agora para discussão na especialidade por parte dos deputados e membros do Governo.

2 Fev 2021

Muros e estradas

[dropcap]F[/dropcap]oi dos compromissos maiores estabelecidos com o seu eleitorado, o de construir um muro magnífico e inultrapassável que separasse definitivamente os fantásticos Estados Unidos do pobre México. Que os mexicanos pagariam por essa gigantesca e formidável obra da engenharia moderna foi outro compromisso assumido pelo que viria a ser eleito Presidente dos EUA, determinando em devolver ao país uma suposta grandiosidade perdida, devidamente protegido de nefastas influências estrangeiras, na economia ou na demografia.

Um pouco por todo o mundo se ergueram vozes indignadas e não poucas vezes se referiram dois aspectos particularmente reveladores de hipocrisias várias nesta discussão: são mais de 60 milhões as pessoas indocumentadas a viver actualmente nos Estados Unidos, fornecendo uma mão-de-obra barata e de escassos direitos que alimenta grande parte da economia nacional; e, na realidade, o muro não é invenção nova – já lá estava, em grande parte da fronteira, e também durante a presidência de Obama aumentou a sua extensão.

Não tendo afinal o dito muro crescido drasticamente durante o actual mandato presidencial, cresceram as acusações de violações de direitos humanos de migrantes, bárbaros actos de separação de famílias e isolamento de crianças ou até criação sistemática de campos de concentração – tem sido mesmo este o termo usado para definir centros de detenção de migrantes, em discussões nas mais altas instituições do estado – onde se acumulam milhares de pessoas que procuram na parte mais rica da América o sonho de liberdade e a ambição de riqueza que foram alimentando.

Apesar de mais discreta, não é muito diferente a situação na Europa: também chegam do sul milhares de pessoas, a fugir da guerra e da pobreza e à procura de sonhos e ambições. Têm muros ocasionais e redes de arame farpado, é verdade, mas há um todo um mar que estabelece mais subtil fronteira onde em tempos houve espaço para cruzamento e contato de antigas civilizações – de fenícios, gregos, egípcios, romanos ou árabes. Hoje há desemprego, escassa confiança na economia e alta desconfiança nos seres humanos, a alimentar ódios e xenofobias.

Não basta nestes dias tenebrosos ter o Mediterrâneo como vala comum de migrantes em fuga desesperada: chegam notícias de diligentes autoridades a perseguir quem ajuda quem se afoga nas outrora plácidas águas que separam o Sul da Europa do Norte de África: chamam-lhe “auxílio à imigração ilegal” e querem bani-los das águas mediterrânicas. Não são só os governantes neo-fascistas que se instalaram em Itália: são em geral as políticas de imigração da União Europeia, que fazem do Mediterrâneo o mesmo muro que se quer reforçar na América. Num e noutro lado do Atlântico alimenta-se a divisão entre os pobres e os ricos do Sul e do Norte, supostamente à procura de uma grandiosidade perdida na história. Não chegará por essa via, certamente.

Há caminhos na história das civilizações que reabrem na contemporaneidade, no entanto. É o caso da chamada Rota da Seda, recuperada pelo governo chinês para promover um massivo programa de investimentos em infraestruturas e empresas da Ásia, África e Europa. Em tempos de competição e desconfiança generalizadas, os poderes europeus e americanos denunciam a ameaça da expansão chinesa e os perigos decorrentes do aumento da sua influência económica, cultural e política no resto do mundo.

Sendo previsível essa consequência, está longe de constituir originalidade histórica. Foi semelhante a expansão da influência dos Estados Unidos sobre a Europa e o Japão com o plano Marshall, que financiou massivamente a reconstrução económica e demográfica que se seguiu à II Guerra Mundial. Com mútuo benefício, diga-se em abono da verdade: os EUA assumiram-se como a grande potência mundial, enquanto a generalidade dos países europeus (e também o Japão) beneficiaram de um longo período de crescimento económico, que duraria até quase ao final do século XX – e que também se traduz numa evidente hegemonia política e militar. Também vem desse período do pós-Guerra o acesso cada vez mais global a formas de expressão cultural com origem nos EUA e hoje altamente massificadas, como os blues, o jazz, o rock ou o cinema de Hollywood.

Nem Europa nem Estados Unidos têm hoje qualquer iniciativa semelhante a um plano massivo de investimentos no apoio ao desenvolvimento: são mais os gastos em financiamento de organizações para-militares e bombardeamentos regulares em larga escala (sobretudo – mas não só – no Médio Oriente) do que os investimentos na riqueza e no desenvolvimento dos países de África ou do sul da América. Quem tem essa iniciativa é a China, que não gasta em guerras a riqueza que vem acumulando. Não é impossível, apesar de todos os maus exemplos, reabrir velhos caminhos da paz e da cooperação económica – mesmo que, já se sabe, os benefícios sejam desiguais e quem promove o investimento acabe por vir a reforçar a sua posição hegemónica, como demonstram os exemplos históricos.

28 Jun 2019

Pressão de Hong Kong na emigração por Macau

[dropcap]A[/dropcap]pós um resumo da História da emigração chinesa, regressamos ao episódio com que iniciamos este tema. A Companhia Metropolitana do Rio de Janeiro, a fim de promover a emigração chinesa para o Brasil, começara nos finais de 1892 por abrir uma agência em Hong Kong, mas sendo as leis locais desfavoráveis a uma tal empresa, o local de operação foi transferido para Macau. O vapor alemão Tetartos, fretado para transportar os emigrantes, em Julho de 1893 foi detido em Hong Kong acusado de ter infringido a ordenança da emigração chinesa de 1889, mas foi absolvido pelo júri e solto. Em Setembro de 1893 veio o Tetartos a Macau e a 17 de Outubro partiram os 475 emigrantes chineses, para no Brasil trabalharem na agricultura.

No relatório do ano de 1893 de Mr. Hippisley, comissário da alfândega da Lapa, que viveu durante anos em Macau, este fala da expedição dos emigrantes chineses para o Brasil, o que era de esperar pois, na sua estadia em Macau para receber os emigrantes, fez por repetidas vezes trabalhar o telégrafo para pôr ao corrente o governo chinês. Quando esse relatório aparece no Echo Macaense, já Camilo Pessanha está em Macau.

Apesar de os jornais de Macau considerarem Alfred Hippisley um funcionário chinês zeloso pelos direitos e interesses do governo chinês, logo se atiram contra ele por acharem o relatório tendencioso, “pois coloca uma arma muito apreciada nas mãos dos que declaram guerra à emigração pelo porto de Macau”. Pergunta O Independente, por que motivo não teve o Sr. Hippisley uma só palavra para malsinar a emigração de Hong Kong? Não se faz por lá também? Não é sabido que tem ali dado lugar a alguns dramas dos que outrora se apontavam em Macau? Será mais livre e de menos perigos para os emigrantes?

“Já ninguém se ilude com as declarações de que a emigração por HK é para colónias inglesas, onde os chineses ficam a coberto das leis da humanitária Albion. Levas e levas de cules têm ido para países que não são ingleses, pelo menos por agora, e bem se sabe que Singapura [onde a emigração chinesa será proibida a 24/4/1895], por exemplo, recebe de Hong Kong número considerável de colonos que aí embarcam para onde querem e nas condições que querem, porque os regulamentos de lá o permitem. É como se nós disséssemos que de Macau só podem ir emigrantes chineses para Timor, permitindo que aí os esperassem os navios para os conduzirem ao Brasil, ao Congo, a toda a parte. Não sabe o ex-comissário da Lapa que isto se passa assim na vizinha colónia?

Magoa-nos pois que, tendo sido testemunha do modo como se operou o embarque dos chineses no vapor Tetartos e sabendo portanto que não há em Hong Kong nem mais escrúpulos, nem maiores garantias de liberdade, se revestisse o Sr. Hippisley de uma atitude hostil à emigração pelo porto de Macau, secundando a guerra que as autoridades inglesas nos começaram a fazer, depois que viram baldados os seus esforços para conseguirem realizar pelo seu porto do Sul da China o que lhes parecia feio pelo nosso. O relatório na parte da emigração podia muito bem ter a assinatura de um funcionário inglês. Entende o Sr. Hippisley que Macau não tem o direito de deixar embarcar colonos chineses para o Brasil, porque esta república não tem tratado com a China a esse respeito. O que asseguramos ao Sr. Hippisley e a todo o humanitarismo inglês é que, se a emigração do Tetartos não foi livre, também não a há livre por Hong Kong, nem por nenhum porto chinês, onde os regulamentos não são melhores nem mais escrupulosamente observados do que em Macau.”

Julgamento parcial

As autoridades chinesas protestaram contra esta emigração e as objecções contra ela eram muitas e sérias. É verdade que um tratado negociado entre a China e o Brasil em 1881, nada estipula sobre a emigração. Essa “insuficiência e a necessidade de uma especial convenção suplementar a fim de obter os trabalhadores que se desejam, foram reconhecidas pelo Brasil, que enviou à China para este fim um enviado especial, que se achava em caminho. O Brasil não tinha representante na China, nem a China tinha algum agente acreditado junto ao Brasil, para velar pelos interesses dos emigrantes.” E continuando no Echo Macaense, “O facto da companhia se recusar a esperar pela vinda do Enviado e pela conclusão das negociações que o seu governo julgou necessárias, naturalmente despertou a suspeita sobre a boa-fé.”

Mr. Hippisley insinuava ter a Companhia Metropolitana, ou o seu agente, agido de má-fé ao promover essa emigração para o Brasil e inserir no contrato uma condição que tornava transferível o emigrante e o contrato, de modo que o emigrante perdera a sua personalidade e liberdade e se convertera em coisa ou mercadoria, sujeita a passar à disposição de qualquer indivíduo, sem o consentimento do próprio emigrante. Acusação encapotada de escravatura feita à companhia promotora dessa emigração. O redactor do Echo vem em socorro dessa Companhia argumentando, “nem o governo português permitiria que se abusasse do porto de Macau para fazer semelhante emigração, nem o Brasil que ainda há pouco tempo aboliu a escravatura sem dar compensações aos patrões, consentiria em tal abuso.”

O Sr. Benavides, agente da Companhia Metropolitana do Rio de Janeiro, “mostrou-nos a cópia do contrato celebrado entre ele e os emigrantes e não vimos aí a clausula de que fala Mr. Hippisley. Os emigrantes apenas se obrigavam a trabalhar nos lugares, isto é, nas fazendas, que a Companhia havia de indicar e não se sujeitavam a ser transferidos a um terceiro, como diz Mr. Hippisley. Mesmo o regulamento chinês de emigração de 1886, no seu artigo 22, providencia acerca da distribuição dos emigrantes na sua chegada pelas diversas feitorias ou plantações. É claro que não se pode esperar que cada fazendeiro que precise de braços venha à China pessoalmente para contratar trabalhadores, mas é natural que a associação promotora da emigração distribua os emigrantes entre os diversos fazendeiros que os quiserem empregar, o que está de acordo com o regulamento sancionado pelo próprio governo chinês.”

“Por ventura o artigo 1º do Tratado brasileiro-chinês não garante a liberdade de poderem os chineses emigrarem para o Brasil, bem como o seu bom tratamento aí? Com quanto seja muito de desejar que haja um convénio especial sobre tal assunto, é certo porém que a falta de tal convénio não autoriza a lançar suspeita de má-fé em quem promoveu a emigração franca e legalmente. É certo, porém, que, se os ingleses, que fizeram mil esforços para que essa emigração chinesa para o Brasil se fizesse por via de Hong Kong, chegando até a mandar Mr. Lochart a Londres para trabalhar neste sentido, tivessem conseguido os seus fins, nem o vapor Tetartos teria sido detido em Hong Kong, nem as insinuações de Mr. Hippisley teriam aparecido; e a emigração chinesa para o Brasil seria a operação mais pura e mais justa do mundo. É contra esta parcialidade inqualificável que nos insurgimos e protestamos.”

18 Fev 2019

Fim da emigração por contrato em Macau

[dropcap]O[/dropcap] Regulamento de 1872 sobre a emigração fora elaborado por uma comissão composta por Jerónimo Pereira Leite, Júlio Ferreira Pinto Basto, Lúcio A. da Silva, P. G. Mesnier, Hermenegildo Augusto Pereira Rodrigues e J. E. Scarnichia, sendo esse uma compilação de disposições dispersas em portarias e regulamentos, harmonizadas e acrescentadas conforme se julgou mais próprio para combinar a liberdade do emigrante com as garantias que deve dar o contratador.

“Macau ficou com o monopólio do fornecimento de trabalhadores chineses para algumas repúblicas americanas; triste e precário resultado, para nós, depois de três séculos de trabalhos e lutas. Uma população numerosa, activa e inteligente, esteriliza-se em especulações sem futuro, vivendo com pouca dignidade à sombra de capitais estrangeiros (espanhóis e peruanos). A instrução pública vai-se anulando porque tais empregos, os únicos que se oferecem, não demandam cultura intelectual, e a população portuguesa de Macau achar-se-á reduzida à mais triste incompetência no dia em que a América disser: Não precisamos de mais cules>. Nesse dia, que todos julgam mui distantes, há-de forçosamente chegar e é tempo que principiemos a tomar precauções. É necessário que a emigração chinesa se torne pouco a pouco a mais insignificante fonte de receita para os habitantes de Macau, desenvolvendo-se quanto for possível os recursos comerciais desta colónia que melhor lhe podem assegurar um futuro estável”, segundo a Gazeta de Macau e Timor.

Ainda neste semanário aparece transcrito do jornal The Weekly Herard de New York de 5 de Outubro: Havana, 27 de Setembro de 1872. Quinhentos cules, com $70.000 de suas economias voltaram para os seus lares na China. “Naturalmente estes chineses já terão chegado, ou estão a chegar às suas terras, tendo vindo pelos paquetes da companhia de mala do Pacífico, como já têm vindo muitos outros. Quando ardeu recentemente em Yokohama, o vapor America, se conheceu que muitos passageiros chineses traziam consigo grandes somas de dinheiro, tendo alguns até mais de 3000 patacas. Regressavam eles naturalmente de Havana ou de Peru, tanto assim que um deles era casado com uma peruana. À vista destes factos, se atreverão ainda a dizer que os chineses que vão para Havana e Peru, não voltam mais à sua Pátria?”

“Em 1873 fez-se uma emenda a favor dos trabalhadores contratados, reduzindo o prazo do seu contrato de oito para seis anos [e findo este, a condição de terem a passagem de regresso]. Além disso, os cônsules portugueses em Cuba e no Peru comunicavam ao governo de Macau as condições dos emigrantes à chegada e, tanto quanto possível, velavam pelo seu bem-estar lá”, Montalto de Jesus (MJ).

“Os governos europeus de Hong Kong e de Macau aperceberam-se claramente da necessidade de acabar com a rede de intermediários e com a satisfação de interesses internacionais assentes na emigração contratada. Os tempos e os modos de reacção foram diferentes, como diferente tinha sido o começo da actividade. Hong Kong proíbe primeiro a emigração por contrato, para fora do Império Britânico, em 1866, confirmando a lei em 1868, 1870 e 1873. Macau mantém por mais uns tempos a situação, disciplinando-a com múltiplas advertências do Executivo”, Beatriz Basto da Silva.

Em 1873, o governo de Hong Kong promulgou três portarias, Ordinances “para cortar a ligação de Hong Kong com o tráfico de cules em Macau e para proteger os emigrantes chineses, dos dois sexos, que partiam de Hong Kong”, segundo Liu Cong e Leonor Diaz de Seabra, que referem, “a 24 de Agosto interditou que se abastecessem e equipassem os navios de cules no porto de Hong Kong e ordenou a sua expulsão, levando estes a mudarem-se para Huangpu.” (…) “Até Setembro de 1873, Macau ficou bloqueado pelos navios de guerra chineses e por ordem do vice-rei, todos os navios que entravam e saiam deste porto eram inspeccionados pelos oficiais chineses. Se fossem descobertos cules a bordo, os navios seriam levados para Huangpu.” O Vice-rei de Cantão então proibiu todos os barcos com cules dos países com ou sem tratado de fundearem nesse porto e em Setembro ordenou ao inspector interino da alfândega de Cantão, H. O. Brown, a expulsão de Huangpu de sete navios peruanos e em Outubro, de um belga e outro italiano.

Pousadas em vez de barracões

A 20 de Dezembro de 1873 o ministro da Marinha e Ultramar, João Andrade Corvo comunicava a proibição da emigração contratada por Macau e a 27, o Governador publicou a portaria fixando para daí a três meses [27 de Março de 1874] o seu termo definitivo. No Boletim de Província de 31/1/1874 foi promulgado o Regulamento dos Passageiros Asiáticos e seu Transporte pelo Porto de Macau, a entrar em vigor a 1 de Abril, por não se poder “negar a nenhum indivíduo em pleno gozo de liberdade, o direito de tomar passagem neste porto para outro qualquer a que se destine, devendo todavia velar pela sua conservação no estado livre e assegurar-se ao mesmo tempo das boas condições a todos os respeitos dos navios que tenham de transportar um crescido número de passageiros”. Em 18 de Março foi extinta a Superintendência da Emigração Chinesa, criada a 30 de Abril de 1860, assim como se acabam com “os depósitos e só serão permitidas para alojamento e pousada de transeuntes chineses, simples hospedarias devidamente licenciadas e registadas na procuratura dos negócios sínicos.” No B.O. dessa data, o Governador Visconde de Sam Januário declara que os denominados corretores, ou quaisquer outros indivíduos chineses que se empregavam na emigração, por acordo feito com o Vice-Rei de Cantão e por sua declaração oficial, “podem voltar livremente ao território chinês sem que sejam perseguidos pelas respectivas autoridades pela intervenção que tiverem tido nos negócios da mesma emigração, até à data do seu acabamento definitivo.”

“Todo ou quase todo o pessoal estrangeiro envolvido na emigração desapareceu com a extinção desta”, segundo Almerindo Lessa, “Os 5534 indivíduos que o recenseamento de 1871 mostra terem afluído ao Bazar, em 1878 desaparecem daquele bairro, deixando-o na cifra que tinha em 1867.” MJ refere, “Em Macau, o resultado dessa medida altruísta foi simplesmente catastrófico: várias ramificações de comércio legal extinguiram-se, milhares de pessoas foram atiradas para o desemprego e, face ao êxodo que se seguiu, as propriedades foram seriamente desvalorizadas.”

Assim, desde 27 de Março de 1874 estava proibida a emigração por contrato a partir do porto de Macau, mas fora aprovado ainda em 31 de Janeiro um novo regulamento para a emigração livre, julgando o Governador “pôr-se a coberto das graves acusações feitas quando deu o seu consentimento para a emigração para Costa Rica”, como refere José da Silva no Independente. Alguns agentes, escudados por esta nova ordem de coisas, prepararam-se para promover a saída de passageiros asiáticos e restaurar o tráfico de cules, apenas substituindo os depósitos em barracões por estalagens.

21 Jan 2019

Emigração de menores chineses

[dropcap]O[/dropcap] Procurador Júlio Ferreira Pinto Basto enviou o seguinte ofício ao secretário-geral do governo de Macau, Sr. Henrique de Castro: Até essa data estava estabelecido deixá-los emigrar, quando nos exames a que aqui se procedia, mostravam espontaneidade e prestando a pessoa que os apresentava fiança idónea para qualquer reclamação, a haver sobre os menores depois de embarcados. Era também anteriormente à citada data esta emigração quase diminuta. Começou a aumentar este ano e com esse aumento, como era natural, tentaram-se os abusos que motivaram a minha informação no já citado ofício.

Desde essa data regularizou-se este serviço merecendo sempre a minha vigilante atenção, e parece-me poder asseverar a V. S.a que algum abuso, que por ventura tivesse havido, anteriormente, ficou completamente extirpado.

Só se aceitam emigrar menores depois de cabalmente averiguada a sua espontaneidade, e que a pessoa que os apresenta é seu pai ou mãe, e no caso de orfandade a pessoa que os representa, devendo esta ser tio ou irmão maior. Para se chegar a este conhecimento empregam-se os meios seguintes, que me parecem profícuos.

Isolado o menor em casa separada da pessoa que o apresenta é-lhe perguntado o seu nome, idade, naturalidade, profissão, o modo por que veio a Macau, o nome da pessoa que o apresenta, o seu modo de vida, a terra em que vivia e muitas outras coisas neste sentido. São escritas as respostas que o menor dá a cada pergunta. Em seguida fazem-se à pessoa que o apresenta as mesmas perguntas que a este e devem as respostas combinar exactamente, sem que o que se não aceita o menor a emigrar. Tanto a pessoa que apresenta o menor como a que o contrata prestam fianças idóneas. A primeira responsabilizando-se por alguma reclamação que por ventura possa ainda haver por parte de algum outro parente do menor, e a segunda por que as estipulações do contrato sejam fielmente observadas pelo patrão do menor. Os contratos são em triplicado sendo entregues um ao menor, outro à pessoa que o engaja e o terceiro remetido à essa secretaria para ser enviado ao cônsul português no país onde o menor se destina, para tomá-lo debaixo da sua protecção e vigiar que sejam observadas as cláusulas ali estipuladas. O contrato garante ao menor um salário mensal de $4 durante 8 anos, uma educação moral e religiosa, assistência médica e ser empregado apenas como criado de casa.

Desde o 1.º de Janeiro até ao último de Julho do corrente ano tem emigrado por esta repartição 97 menores. Sendo 15 para Havana e 82 para o Perú, contando neste último número 11 raparigas.

Por informações colhidas nesta repartição de chineses vindos do Perú e Havana consta que estes menores são ali muito bem tratados, sendo-o alguns como filhos dos seus patrões.

É costume entre os chineses venderem e mesmo darem os seus filhos, quando se vêem sem meios: e por isso não deve admirar que os próprios pais os venham apresentar a emigrar. Debaixo deste ponto de vista a emigração dos menores bem fiscalizada e regulada, como se acha actualmente, é altamente moral e civilizadora. O pai, que iria sacrificar o filho a uma escravidão perpétua vendendo-o, dá-lhe a liberdade e a fortuna contratando o seu serviço sob condições vantajosas. Geralmente são admitidos a emigrar a terça parte dos menores, que aqui são apresentados, e que se propõem emigrar. Os que deixam de emigrar são rejeitados geralmente porque a incoerência ou contradição das respostas dadas pelo menor e pela pessoa que o apresenta, faz suspeitar que ela seja um falso parente e um embusteiro.

A pessoa que vem contratar os menores apenas paga pelo serviço que se faz nesta repartição cinquenta avos ao escrivão, que faz o termo de fiança, além do selo de duzentos réis por cada contrato que é pago na fazenda e o respectivo registo.” Como o serviço fora montado na Procuratura dos Negócios Sínicos de Macau exclusivamente pelo Procurador Pinto Basto, pergunta este se merece aprovação. Pelo secretário do Governo, o Governador respondeu no dia seguinte dizendo aprovar provisoriamente o modo como é regulado esta emigração limitada e excepcional.

Receitas da emigração

“Se um navio estrangeiro vem à China buscar trabalhadores, o número que cada navio há-de transportar é fixado de um modo determinado, e o aliciador de culis faz um contrato, marcando-se dia certo para a saída do navio, devendo nesse dia estar preenchido o número. Quando o aliciador tem já celebrado o seu contrato, vai procurar em cada aldeia e cada distrito um aliciador subalterno, e faz com ele outro contrato. Cada aliciador subordinado deve fornecer um número certo de culis, segundo o tempo fixado no seu contrato. Se no dia designado se passar sem que o aliciador apresente o número de culis a que se comprometeu, exige-se do principal aliciador o pagamento do dinheiro pela carta de fretamento do navio, pelas despesas feitas com arroz e mais alimentos, e por qualquer dinheiro que adiantadamente possa haver recebido, bem como os competentes juros por cada parcela das despesas. Então o principal aliciador vai ter com o seu subordinado para que o indemnize.” Exige ser ressarcido, obrigando-o “a desfazer a sua casa e a dissipar o seu património, vendendo mulheres e filhos, e além disso a suprimir a diferença que faltar.” Assim quando o tempo urge, inventa ardis, “Ou emprega drogas que os tornam insensíveis, ou usa de dolo, ou à força rouba os culis. Põe em prática toda a sorte de malefícios e repete-os indefinidamente. Tem pressa de completar o número e de acabar com a sua responsabilidade. É levado a isso pela força das circunstâncias”, segundo Andrade Corvo no seu Relatório e Documentos, a fonte de grande parte do que apareceu escrito nos artigos anteriores.

Os documentos consulares de 1872 referem terem partido de Macau 33 navios com 13.476 colonos, morrendo na viagem 625 e em 1873, 24 barcos transportaram 13.918, chegando menos 645.

As receitas do governo de Macau resultantes da emigração eram entre outras, por cada colono $1 por passaporte e meia pataca por contrato. A 24/10/1872, o Rei aceitou o acordo feito pelo Governador com os agentes da emigração, a substituir por um só imposto (3,5 patacas) algumas das verbas das licenças pagas por estes.

Da Superintendência da emigração chinesa de Macau, em 1872 foram enviados 21.854 chineses às autoridades de Cantão a fim de serem repatriados para as suas terras de origem.

Pelas ruas de Macau, só em 1873 foram encontrados 292 mortos, sendo a maioria culis inválidos provenientes dos depósitos, que eram abandonados em vez de serem repatriados.

14 Jan 2019

Quebra de portugueses em Macau explicada por dificuldades na obtenção de BIR

O relatório divulgado esta segunda-feira pelo Observatório das Migrações em Portugal dá conta de uma redução na entrada de portugueses em Macau no período entre 2013 e 2016. Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau, defende que os números se explicam pelas dificuldades na obtenção de bilhete de identidade de residente, mas há quem não consiga sequer blue card

 

[dropcap]E[/dropcap]liana Sequeira e Natacha Fidalgo Gonçalves representam dois paradigmas diferentes da emigração portuguesa para Macau. Eliana, farmacêutica, chegou o ano passado pela aventura, Natacha Fidalgo Gonçalves chegou em 2011, desesperada por encontrar qualquer tipo de trabalho que servisse de sustento à sua família.

O mais recente relatório do Observatório das Migrações referente a 2017 dá conta de uma redução progressiva do número de portugueses que emigram para Macau, no período compreendido entre 2013 e 2016. Emigrantes e analistas contactados pelo HM apontam como razões a melhoria da situação económica no país, mas também a dificuldade de acesso ao bilhete de residente permanente e até de um visto de trabalho.

“Em 2016 o número de entradas de portugueses em Macau totalizou 150, menos 3.4 por cento do que em 2015. Em 2007, imigraram 146 portugueses para Macau, cerca do mesmo número de entradas em 2016. Durante este período, o aumento de portugueses foi progressivo até 2013, tendo havido uma diminuição de 2013 para 2016”, lê-se no documento.

Em 2016, “as entradas de portugueses representaram 10.4 por cento das entradas totais em Macau”, sendo que “no contexto da emigração portuguesa, [o território] é a segunda região do mundo onde a entrada de portugueses mais tem impacto no total de entradas de estrangeiros no país de destino”.

No que diz respeito à nacionalidade, o relatório não contém dados pelo facto de, em Macau, apenas ser possível adquirir o estatuto de residente permanente. A Direcção dos Serviços de Identificação (DSI) adiantou ao HM que também neste campo houve uma descida entre 2013 e 2016. Em 2013 obtiveram a residência permanente um total de 203 pessoas, número que se manteve em 2014. No ano seguinte esse valor baixou para 142, número que aumentou ligeiramente em 2016, com a atribuição de residência permanente a 145 pessoas.

Casos escondidos

Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau (CPM), defende que os números espelham as dificuldades crescentes que os emigrantes foram encontrando junto dos serviços de emigração.
“As pessoas foram encontrando cada vez mais dificuldade na busca de trabalho em Macau, pois não dominam a língua. Depois houve também dificuldades em conseguirem os seus documentos para estarem no território ou para conseguirem mesmo a residência.”

A também advogada denota que as dificuldades no acesso à documentação não melhoraram. A redução de que fala o relatório espelha, sim, a desistência de muitos. “Tem havido menos pedidos, e por isso nota-se menos a dificuldade.”

Natacha Fidalgo Gonçalves, professora de inglês, sabe casos de portugueses que nem conseguem o blue card, ou visto de trabalho, por não terem um curso superior.

“As pessoas não estão incluídas nesse relatório porque não foram aceites para trabalhar”, começou por dizer. “Tenho visto pessoas que tentam trabalhar cá e que não conseguem sequer ter o blue card, porque não têm licenciatura. Se não forem trabalhadores qualificados e a ganhar determinado salário por mês, os pedidos são recusados, mesmo para blue card.”

Nesse sentido, a professora defende uma maior flexibilidade no acesso ao mercado laboral de quem não tem uma licenciatura. “Não vejo que haja menos interesse em Macau, continuo a ver muita gente a vir para cá. Mas como é muito difícil trabalhar cá com a residência as pessoas acabam por ir embora.”

Novas razões

Natacha veio em 2011 quando Portugal pediu ajuda financeira ao Fundo Monetário Internacional (FMI), tendo deixado os dois filhos e o ex-marido no país. Nessa altura, buscava qualquer tipo de trabalho, tendo ficado em casa de amigos.

“Vim para cá porque não conseguia arranjar trabalho em Portugal. Fui a várias entrevistas e muitas vezes nem cheguei a essa fase, porque já tinha feito 35 anos e era recusada à partida. Vim um bocado em desespero para tentar arranjar trabalho em qualquer lado.”

Nesse período, Natacha deparou-se com dificuldades, pois sem o bilhete de identidade de residente (BIR) não conseguia nenhum contrato de trabalho. “Andei à procura de trabalho com bastante dificuldade, porque as pessoas querem trabalhadores que dominem o chinês. Todos os dias procurava trabalho, mas não tinha o BIR. Por causa disso não me davam a vaga, e sem o trabalho não queriam apostar no BIR. Foi uma coisa que acho que piorou desde essa altura”, assegura.

Amélia António assegura que são cada vez menos as pessoas que chegam na mesma situação de Natacha. “Tenho tido menos conhecimento de novas situações desse género. Dá-me ideia que o tipo de pedidos deve ter sido um bocado alterado. As pessoas que vieram entretanto para Macau devem ter vindo já com situações previamente estabelecidas, não vieram apenas baseadas no apoio de amigos ou familiares para ver que tipo de trabalho conseguiriam encontrar.”

Foi o caso de Eliana Sequeira, que está em Macau há apenas um ano. “Tive um convite de uma pessoa amiga que me recomendou para este cargo e depois de meses de testes e entrevistas disseram-me que tinha selecionada. Foi uma autêntica surpresa. Aceitei, mesmo estando numa fase boa da minha vida. Vim pela aventura, experiência e desafio e para trabalhar numa equipa multicultural.”

Apesar das melhores condições salariais de Macau, não foi o ordenado que ditou a decisão de Eliana. “Depois de estar aqui é difícil pensar em voltar para Portugal e retroceder.”

A farmacêutica reconhece que hoje as razões para emigrar para Macau mudaram. “Pelas pessoas que conheço desde que estou aqui, vêm mais pelo desafio e novas experiências. Já houve mais essa necessidade de sair por causa de arranjar novas oportunidades e pelo salário. Ainda há esses casos, mas vejo cada vez mais pessoas que vêm por outras razões.”

O futuro em Angola

O relatório do Observatório das Migrações revela que o Reino Unido continua a liderar a lista de países escolhidos pelos portugueses para emigrar. De acordo com o economista José Pãosinho, a tendência de diminuição de novos portugueses na RAEM é para continuar.

“Esta diminuição vai manter-se, e Macau será cada vez menos um destino privilegiado. Se compararmos a situação actual com o que acontecia naqueles anos, apareciam aqui pessoas completamente desesperadas e à aventura, e agora isso já não se verifica. Não quer dizer que isso não aconteça ainda, mas já vêm mais enquadradas.”

Com a concretização do Brexit, a opção pelo Reino Unido dará lugar a outros países europeus ou até Angola. “Caso as coisas em África mudarem substancialmente, Angola passará a ser um destino de eleição, em especial para os quadros técnicos. Quando o país estabilizar, haverá um imenso potencial de crescimento e acho que é um dos locais para as novas gerações se fixarem”, rematou o economista.

 

Portugal regista saldo migratório positivo em sete anos

Portugal teve um saldo migratório positivo em 2017, pela primeira vez em sete anos, com mais de 36 mil imigrantes a ultrapassarem as quase 32 mil pessoas que deixaram o país, revelou o relatório do Observatório das Migrações. Em 2017 imigraram para Portugal 36.639 pessoas, um valor apenas comparável com valores registados na década passada, como, por exemplo, em 2006, quando se registaram 38.800 entradas no país.
Por outro lado, o número de pessoas que deixaram o país também diminuiu, passando de 38.273 em 2016, para 31.753 em 2017, o que subtraído ao número de pessoas que imigraram para Portugal, dá o saldo positivo de 4.886 pessoas.

No entanto, Portugal continua a ser um país demograficamente envelhecido, sendo o quarto país da União Europeia a 28 com maior proporção de pessoas com mais de 65 anos, num total de 21,1 por cento.
Também por isso, nos últimos anos, Portugal tem tido saldos naturais e saldos migratórios negativos, “o que induziu a saldos naturais totais negativos e a um efetivo decréscimo da população residente no país”.

“A recuperação do saldo migratório no último ano não chegou para compensar o valor negativo do saldo natural (-23.432 pessoas), pelo que Portugal continua em 2017 a registar um saldo total negativo (-18.546 pessoas9)”, lê-se no relatório.

Tanto em 2016 como em 2017, “os estrangeiros continuaram a contribuir de forma expressiva para os nascimentos em Portugal”, com as mulheres estrangeiras a serem responsáveis por 10 por cento do total de nados-vivos.

Um facto com “importância significativa” já que a população estrangeira representa 4,1 por cento da população residente no país, com 421.711 pessoas, um número que, aliás, representa um aumento de 6 por cento face a 2016.

19 Dez 2018

Emigração via Macau e Hong Kong

[dropcap]M[/dropcap]acau vivia um longo período de estagnação já desde os anos 40 do século XVII devido à perda do comércio com o Japão, o que originou um declínio económico, de miséria e com períodos esporádicos de maior abastança, até meados do século XIX, segundo Ana Maria Amaro, que refere, “De 1851 a 1874, Macau registou, novamente, um notável surto económico com o tráfico dos cules, que levou certas famílias a reatar os antigos hábitos de luxo e de ostentação. Este surto económico, embora de curta duração, aliado à afluência e refugiados chineses, deram lugar a forte pressão demográfica, que levou à urbanização de parte da área do Campo.”

Victor F. S. Sit adita, “Só entre 1847 e 1874 embarcaram mais de 200 mil cules através de Macau. O número de agências estrangeiras sediadas em Macau envolvidas no tráfico de cules aumentou de uma meia dúzia que existiam em 1850 para mais de 300 em 1873. Nesta data, 30 a 40 mil homens, ou seja metade da população de Macau, estava directa ou indirectamente envolvida neste comércio. Dos cules embarcados em Macau 95% foram enviados para Cuba [sob domínio espanhol] e Peru [já independente].

Uma vez que o preço médio de um cule era de 70 patacas, estima-se que Macau terá ganho cerca de 200 mil patacas por ano no tráfico de cules, cinco vezes mais que o rendimento anual das taxas alfandegárias, antes de 1845. Nos locais de destino, os cules eram simplesmente tratados como escravos. A taxa de mortalidade dos cules a caminho de Cuba ou do Peru era cerca de 35%. Os locais de acolhimento dos cules concentravam-se no Beco da Felicidade, Pátio dos Cules, Rua de Santo António e Rua de Pedro Nolasco da Silva. Só em 1895 foi definitivamente encerrada a maior casa de acolhimento de cules (Heshengji).”

Emigração por contrato

“Em Macau foram os próprios chineses – conhecidos localmente por corretores – que descobriram a lucrativa actividade de contratar os seus irmãos do continente, atraindo-os ao entreposto português. Era comum virem por gosto, mas o problema do voluntariado era secundário, porque surgiram logo inúmeras formas de o contornar, combinando a credulidade de uns com a astúcia e a violência de outros. Redes de intermediários (…) diluíam-se entre a numerosa população da cidade de modo que, apesar de crescer a imoralidade, não estavam criadas estruturas específicas capazes de a reprimir. O ambiente cerrava-se, feio, à volta deste tráfego, cada vez menos defensável, mais distante da contratação de colonos e mais próximo da escravatura”, segundo Beatriz Basto da Silva (BBS).

Em Macau, a primeira emigração por contrato ocorreu em 1851 e os primeiros engajadores desses colonos chineses foram dois franceses, Guillon e Durand. Aí embarcaram os 813 cules com destina a Cuba em dois barcos ingleses. “Seguiu-lhes o exemplo o negociante macaísta José Vicente Caetano Jorge, que transportou no seu navio 250 cules para Callao de Lima, sendo contratados para trabalhar por 8 anos com o soldo mensal de 4 patacas”, segundo Manuel Teixeira (MT).

Legislar contra os abusos

“Até 1851, esta emigração continuou sem conhecimento oficial das autoridades e segundo a maneira determinada pelo contratante. O Governador Isidoro Francisco Guimarães [Visconde da Praia Grande] julgou seu dever intervir, determinando, por portaria de 12 de Setembro de 1853, que os engajadores declarassem o local dos barracões ou depósitos onde recebiam os cules antes de os embarcar e o seu número, devendo os regulamentos desses depósitos ser de antemão submetidos à aprovação do Governo: a inspecção sanitária ficava a cargo do cirurgião-mor, devendo os doentes ser tratados em lugar separado; ao capitão do porto de Macau cumpria visitar os navios para examinar as acomodações, os mantimentos e a aguada.

Dados os enormes lucros deste tráfico, surgiu a competição entre os agentes, que se rodearam de corretores, ou seja, chineses que se internavam pelo interior do império a aliciar emigrantes. Os corretores, na ânsia de aumentar a sua remuneração, iludiam frequentemente os pobres chineses com promessas falazes, forçando-os moralmente a emigrar”, segundo MT.

Em Novembro de 1855, o Governador Guimarães publicou uma portaria onde “determinava que todos os contratos entre esses emigrantes e os agentes da emigração fossem registados na Procuratura dos Negócios Sínicos” e o procurador até à véspera dos embarques ficava obrigado a visitar os depósitos (barracões) dos colonos, para se informar, se algum chinês fora iludido ou forçado a embarcar contra a sua vontade. Caso deparasse com algum relutante, devia mandá-lo repatriar imediatamente.

Como este regulamento guardava silêncio sobre os corretores, estes continuaram a aliciar impunemente os chineses e por isso, segundo BBS em “Junho de 1856, apareceu novo regulamento procurando refrear os corretores: estes deveriam obter da Procuratura uma licença anual, depositando 200 patacas de fiança; pagariam 100 patacas de multa quando se tornassem criminosos de coação ou engano para com os emigrantes ou quando recusassem repatriar os que fossem rejeitados pela autoridade ou pelos agentes.”
Em 1856, de Macau saíram 2473 cules.

Em HK até à II Guerra do Ópio

“O Governo de Hong Kong proíbe [em 1854] gente e navios seus no transporte para as Ilhas Chincha (Peru), porque houve queixas. Mas consente para a Califórnia uma emigração pseudo-livre de corretores”, segundo BBS, que refere, “Não deixa de ser curiosa a cautelosa referência a acompanhar correspondência de John Browing, mencionando que a emigração via Hong Kong, de 1854 a 1855, era livre, não contratada!”.

Com a proclamação pelos ingleses do Chinese Passengers Act em 30 de Junho de 1855, procurava-se assegurar o bem-estar e a liberdade dos emigrantes chineses. “A despeito deste decreto não ser estritamente cumprido pelos oficiais de Hong Kong, os mercadores de cules, sobretudo os agentes que recrutavam emigrantes para a América Latina, começaram a mudar-se de Hong Kong para Macau”, segundo Liu Cong e Leonor Seabra.

“Em documentos apresentados ao Parlamento inglês em 1855 encontra-se uma estatística da emigração para o Peru, nos anos de 1843 a 1855, onde se vê que de 7356 emigrantes embarcados só 4754 chegaram ao seu destino, sendo mortos a bordo 349”, refere Andrade Corvo, mas BBS indica, de “1849 a 1854, foram embarcados de Cantão para o Peru 7356 cules e morreram 549 em viagem”.

O negócio do tráfico de cules em HK ocorreu até 1856, quando o governo inglês, perante os protestos, criou leis e transferiu o problema para fora da sua jurisdição, proibindo o embarque desse porto. “Estas proibições eram levantadas em certas circunstâncias, desde que o capitão da viagem cumprisse com algumas regras severas, excepção que não deixou de ser largamente aproveitada. Na verdade, nunca houve respeito pelas proibições”, segundo Beatriz Basto da Silva que refere, “Em 1860 estimou-se que dos 4 mil cules desviados fraudulentamente, nenhum sobreviveu, tendo muitos procurado no suicídio a morte libertadora.”

30 Nov 2018

Emigração chinesa para o Brasil

[dropcap]O[/dropcap]s monopólios dos bens essenciais encontram-se na ordem do dia quando em 1894 Camilo Pessanha chega a Macau, mas o negócio de Ópio e dos Cules anda ainda pelas páginas dos jornais.

O assunto da emigração de trabalhadores chineses, conhecidos por cules, reaparecera nas páginas dos jornais da cidade pois, Mr. Hippisley, comissário da alfândega da Lapa, no seu relatório respeitante ao ano de 1893 refere o envio de emigrantes chineses de Macau para o Brasil e insinua a má-fé do agente da Companhia Metropolitana do Rio de Janeiro, promotora dessa expatriação.

Tal devia-se ao Sr. Hippisley “entender que Macau não tem o direito de deixar embarcar colonos chineses para o Brasil, porque esta república não tem tratado com a China a esse respeito. É verdade que um tratado negociado entre a China e o Brasil em 1881, nada estipular sobre a emigração”, segundo o Echo Macaense, que prossegue, essa “insuficiência e a necessidade de uma especial convenção suplementar a fim de obter os trabalhadores que se desejam, foram reconhecidas pelo Brasil, que enviou à China para este fim um Enviado especial, que se achava em caminho. O Brasil não tinha representante na China, nem a China tinha algum agente acreditado junto ao Brasil, para velar pelos interesses dos emigrantes.” (…) “O facto da companhia se recusar a esperar pela vinda do Enviado e pela conclusão das negociações que o seu governo julgou necessárias, naturalmente despertou a suspeita sobre a boa-fé.”

A 17 de Outubro de 1893 partiram de Macau para o Rio de Janeiro 475 emigrantes chineses, mandados ir pelo presidente do Estado do Rio de Janeiro, Dr. Porciuncula, para no Brasil trabalharem na agricultura. Transportados no fretado vapor alemão Tetartos, desembarcaram no porto de Imbetiba em Macahe no dia 5, ou 11 de Dezembro de 1893 e com eles veio um carregamento de arroz. De Macahe, divididos em dois grupos, seguiram pela estrada de ferro Macahe e Campos, ramal de Frade e passaram para o estabelecimento de emigração em Cabiunas, de onde foram distribuídos aos agricultores. O Echo Macaense, rebatendo o relatório do Sr. Hippisley, argumenta, “Estamos certos que melhor tratamento não teriam eles recebido se tivessem emigrado para Singapura, ou outras possessões inglesas, onde têm de trabalhar muito arduamente até reunir o preço das suas passagens.”

Clandestina emigração

O Governo da dinastia Qing proibia a emigração de trabalhadores chineses, mas quando a Companhia das Índias Orientais (EIC) em 1786 fez de Penang uma sua colónia, o governador dessa ilha pediu “ao representante da EIC, em Cantão, para recrutar artesãos e lavradores chineses e transportá-los para Penang através dos navios da companhia”, segundo Liu Cong e Leonor Diaz de Seabra, que referem, “Em 1805, o governador de Penang, informava o representante da Companhia das Índias Orientais (EIC) de que o governador da Índia Britânica planeava recrutar trabalhadores chineses para a colónia britânica de Trinidad. Foi proposto que os trabalhadores chineses se juntassem primeiro em Macau e, depois, fossem transportados para Penang por um navio português, a fim de evitar conflitos com o governo chinês.” (…) “Além dos ingleses, os próprios portugueses, em Macau, também recrutavam emigrantes chineses para as colónias portuguesas (Brasil, Timor, entre outras), através de Macau. Em 1812, chegaram ao Rio de Janeiro 300 chineses cultivadores de chá.”

Benjamim Videira Pires refere que “o povoamento do Brasil, no tempo de D. João VI, e por iniciativa do Conde de Linhares, se fez por meio dos chineses. Eles introduziram, no Jardim Botânico e na ex-fazenda dos Jesuítas Santa Cruz, do Rio de Janeiro, a cultura do chá. As plantações ocupavam muitos acres de um morro cheio de pedras, semelhante ao habitar da planta na China.” Adita Leonor Seabra e Liu Cong, “Numa carta enviada, em 1815, para o ouvidor de Macau, Miguel de Arriaga Brum da Silveira, o ‘cabeça’ dos trabalhadores chineses no Brasil lamentava-se da vida dura no Brasil, que não estava de acordo com o que se estipulara no contrato.”

Emigração para o Brasil

Sobre a emigração chinesa para o Brasil, o Echo Macaense de 29 de Agosto de 1893 começa por dizer, “noutros tempos, quando havia guerras, o excesso da população chinesa era tal que podiam emigrar milhões de chineses, com mais razão deve haver agora muita gente para emigrar, porque tem havido vinte anos de paz e não tem havido iniciativa da parte dos capitalistas para dar impulso a empresas agrícolas, o que é devido talvez a ter havido ultimamente tantos abusos e tantas companhias malogradas.

Nestas circunstâncias o Brasil convida os trabalhadores chineses para irem arrotear os campos daquele imenso país, que ocupa mais de metade da América do Sul, onde o solo é fertilíssimo, e rico em ouro e diamantes, arroz, trigo, madeiras, café, açúcar, etc..

Foi em 1531 que começou a colonização portuguesa no Brasil, mas até hoje existem numerosos terrenos incultos, e para os cultivar os capitalistas daquela república resolveram convidar trabalhadores chineses, tendo para esse fim primeiramente pedido ao Presidente da República que fizesse uma convenção com o governo chinês sobre este assunto. O Tsung-Li-Yamen já deu a sua anuência, e por isso vai haver uma legação brasileira em Peking e cônsules em Cantão, Amoy e Shanghae.

O artigo 13.º do tratado de Brasil com a China, celebrado em 1881, estipula que os chineses no Brasil gozarão dos mesmos direitos e privilégios que os brasileiros e os súbditos da nação mais favorecida, por isso a nova convenção servirá só para garantir ainda mais o bom tratamento dos chineses.

Se esta emigração for feita pelo porto de Macau, onde já se acha um agente do Brasil, as autoridades portuguesas serão muito vigilantes para evitar todos os abusos, pois que em Macau os emigrantes são primeiramente examinados na Procuratura dos Negócios Sínicos, e só depois de verificada a sua espontaneidade é que se lhes concede o passaporte.

Nas vésperas da partida do vapor, são de novo interrogados a bordo pelo capitão do porto, que faz desembarcar aqueles que não quiserem seguir viagem, donde se vê a imparcialidade e a justiça que presidem à fiscalização deste ramo de serviço; portanto poderão os mandarins ficar bem descansados a este respeito.” (…) “Seguem-se depois umas breves referências à Historia do Brasil, e a sua transformação moderna de império em república, faz ponderações sobre as garantias que oferece esta emigração feita com protecção do governo chinês, sobre a plena liberdade com que ela é feita, e sobre a conveniência de se aproveitar desta emigração para dar ocupação a tanta gente que não tem meios de subsistência, e para a qual os outros países estão fechados; e conclui por assegurar que o jornal advogará sempre os interesses dos oprimidos se alguém for violentado ou maltratado.” Estão memórias de uma triste História, escondida por detrás destas palavras.

9 Nov 2018

Paul Pun, secretário-geral da Cáritas: “Macau não é só dinheiro”

Candidatou-se quatro vezes à Assembleia Legislativa e em todas perdeu. Em ano de eleições, o secretário-geral da Caritas Macau, Paul Pun, diz que não pondera, por enquanto, uma nova candidatura. Ao HM falou das razões e de algumas prioridades que tem na instituição que dirige

[dropcap style=’circle’]É[/dropcap] candidato às eleições deste ano?
Neste momento, não tenho qualquer intenção de me candidatar às próximas eleições para a Assembleia Legislativa (AL). Tenho sido abordado na rua por residentes que me colocam a mesma questão e que me incentivam a concorrer. Gosto de sentir que sou apoiado e o argumento de quem me apoia é de que a AL deve ter diferentes vozes. Mas, independentemente de concorrer ou não, continuo a ouvir o que as pessoas têm a dizer, o que pensam, e os seus apelos e preocupações. Neste momento, não tenho um plano. Se o tivesse avançaria e seria para que fosse concretizado. No entanto, se até ao momento da formalização das candidaturas, tiver ideias concretas para avançar com uma lista, assim o farei. Nas quatro vezes em que me candidatei pensava seriamente no processo e sentia que tinha de avançar. Este ano, e até à data, nem me ocorreu pensar nas pessoas que poderiam avançar comigo.

Que tipo de eleitores mais se dirige a si e o que procuram com a sua representação?
Posso dizer que represento os menos privilegiados, pois trabalho com eles. Mas as pessoas que me abordam são de diversos estratos sociais e não só os mais necessitados. Alguns trabalhadores, alguns reformados, alguns portugueses, por exemplo. A minha prioridade é continuar a fazer o que faço e não vejo como a minha presença na AL possa melhorar as minhas funções. As pessoas dizem que posso fazer mais, mas não vejo como.

Tem defendido a integração dos imigrantes no território.
Essa é uma das minhas prioridades. Mesmo nas campanhas que fiz para as eleições, tive sempre em mente a questão dos imigrantes em Macau. Acho que é essencial para qualquer deputado pensar em todas as pessoas que habitam no território.

Pensa que a defesa dos imigrantes pode ter tido interferência nos resultados?
Não. Os imigrantes trabalham em Macau, vivem cá e, como tal, temos de pensar neles. Mas as pessoas tendem a não falar muito no assunto. Parece que o que consta da agenda política relativamente à importância dos imigrantes no território é o silêncio. Mas eu falo sempre, talvez porque não tenho preocupações políticas, nem tenho de agir segundo o politicamente correcto. Digo o que penso com base no pulso que sinto por parte da sociedade e das necessidades das pessoas.

O que acha que tem de ser feito nesta área?
Cerca de 40 por cento da nossa força de trabalho depende dos imigrantes. Os residentes pensam, de alguma forma, que estas pessoas que vêm de fora lhes roubam os empregos, o que não corresponde, de todo, à verdade. Por exemplo, no que respeita a cargos de chefia, apenas 1,9 por cento são ocupados por imigrantes. Estes dados podem comprovar que não são os estrangeiros que ocupam os lugares destinados aos residentes. O seu papel tem de ser respeitado. Se não se sentirem respeitados, os residentes ficam em dívida. Se tiverem o devido respeito também trabalham melhor e contribuem activamente para a dinâmica económica e social local. Há muitas pessoas a dizer, por exemplo, que os trabalhadores não residentes não devem ter acesso e apoio nos cuidados médicos porque é uma forma de “levarem” o dinheiro do território. Dizem que a riqueza de Macau não deve ser partilhada com os estrangeiros e argumentam que devem ser os empregadores a suportar seguros de saúde. Defendo que o nosso sistema de saúde deveria incluir esta faixa da população. Estamos a falar de cuidados básicos que não devem ser negados a quem vive no território. Mas isso não está na agenda política. Sem imigrantes, Macau não existiria e seria estático, sem qualquer desenvolvimento. Temos de ter essa consciência e apoiar, pelo menos, as áreas dos cuidados básicos. Até mesmo para os turistas, que lidam directamente com esta população em várias funções, é benéfico que vejam as pessoas a sorrir e satisfeitas. Acaba por dar uma boa imagem de Macau para o exterior. O Governo tem feito melhorias no sistema de saúde e no sistema social, mas ainda é dirigido aos residentes e há uma franja da população que não é abrangida. Macau é um sítio pequeno, seria muito fácil educar as pessoas para o respeito umas pelas outras. No entanto, penso que as pessoas de Macau são generosas por natureza. Mas é necessário analisar e ter a consciência do todo da sociedade com a sua diversidade. Neste sentido, cabe aos políticos ter um papel também mais interventivo e seguirem no sentido da inclusão.

Há vozes na política muito duras com a questão dos imigrantes e dos trabalhadores não residentes.
Sim, mas Macau também dá a oportunidade de ter vozes livres.

Foi recentemente aprovada a Lei Eleitoral. O que acha da revisão?
É um passo positivo para umas eleições mais abertas e para a luta contra a corrupção. O diploma prevê também regras que são importantes para evitar comportamentos desapropriados. Mas continuo a duvidar que o sistema actue em conformidade com a lei. No meu escritório, por exemplo, não admito que ninguém pergunte a quem entra as razões da sua vinda. Defendo uma política de portas abertas. No caso das eleições, também todos se podem juntar. Desta vez, há a questão do juramento de fidelidade à Lei Básica e ao Governo Central, mas acho que sempre que alguém vai para um cargo político já deve ter subentendido a sua fidelidade ao país. No entanto, quando dizemos que amamos o nosso país, isso não pode querer dizer que não gostamos dos outros, de outras regiões e que possamos discriminar outras pessoas. Claro que quando se fala de terrorismo o trabalho é outro e tem de ser feito de forma coordenada. Ainda relativamente à nova lei, penso que poderia ser mais uma razão para me candidatar. A legislação mais clara, e uma sociedade mais desenvolvida e educada como a de hoje são factores apelativos, mas, de facto, ainda não sinto que o deva fazer.

Recente também é a lei da violência doméstica. A Caritas tem vindo a trabalhar com vítimas.
Foi uma lei muito importante e, depois de o diploma ter sido aprovado, as pessoas, felizmente, começam a sentir-se mais à vontade para denunciarem casos de abuso. O mesmo acontece nas situações em que as vítimas são do sexo masculino. Antes da entrada em vigor da nova lei, já tinha casos de homens a recorrem à Caritas para falar da situação. A questão do abuso está muito relacionada com a falta de auto-estima e o trabalho que tem de ser feito é o da sua recuperação. Normalmente são pessoas, principalmente nos casos do sexo masculino, que não são respeitadas por ninguém e que vivem o mesmo tipo e situações de abuso em casa e no trabalho. É necessário promover a confiança. Na Caritas, por exemplo, tentamos integrar estes casos em programas de voluntariado onde podemos fazer com que se sintam úteis e respeitadas.

Tem trabalhado na área da pobreza. Quem é que procura mais ajuda?
Macau não é só dinheiro. Podíamos fazer do território uma terra maravilhosa, dado o dinheiro que existe. Se me perguntasse isso há uns anos, diria que precisam de ajuda aqueles que têm uma renda alta e, como tal, não podem suportar a renda de um tecto, aqueles que partilham casas muito pequenas e aqueles que não têm cozinha em casa. Mas o que tenho constatado é que, felizmente, há cada vez menos pessoas nestas condições. Uma das acções que terá contribuído para esta diminuição é a política de habitação pública do Governo. As pessoas que têm este tipo de apoio já não procuram tanto a Caritas. Temos também o banco alimentar que se destina a quem não tem o que comer. E também aí, há cada vez menos pessoas a precisar de ajuda, sendo que são os idosos que vivem sozinhos quem mais nos procura.

Além das iniciativas sociais já conhecidas da Caritas, há novos projectos?
Estamos agora com o processo de abertura de uma clínica de cuidados dentários. O espaço, num momento inicial, vai ser dirigido, essencialmente, a doentes mentais e a idosos locais, mas o objectivo é que, correndo tudo bem, seja aberta a todos, e aos imigrantes também.

Os idosos parecem ser dos que mais precisam de ajuda no território.
É necessária ajuda em três sentidos: a criação de lares, o apoio domiciliário e o apoio ao cuidador, que pode ser um profissional ou um familiar. A Caritas já dispõe destes três serviços e damos formação geriátrica. Temos também um centro de dia para quem precisa de apoio. Não é um centro de lazer e está preparado para acolher utentes com vários tipos de problemas, como a demência, por exemplo.

Está desde 1991 à frente da Caritas. Tenciona continuar por mais tempo?
Não sei. Pode ser para sempre. Mas isso não é importante. Com ou sem título de secretário-geral da Caritas, pretendo continuar a trabalhar naquilo em que acredito. Algumas pessoas acham que é importante que tenha o cargo e o título porque pensam que é uma forma de ter mais respeito, tanto da população, como do próprio Governo. Não concordo. Quando acreditamos em nós e naquilo que fazemos encontramos sempre o nosso espaço para servir a sociedade. Quando era pequeno tive quem tomasse conta de mim. É a minha função também tomar conta dos que mais precisam.

27 Mar 2017

EUA| Recurso de Trump para repor decreto sobre imigrantes rejeitado

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m tribunal de recurso norte-americano rejeitou ontem o pedido da administração do Presidente Donald Trump para restabelecer imediatamente a aplicação do decreto que impede a entrada nos Estados Unidos de cidadãos de sete países muçulmanos.

O Departamento de Justiça tinha recorrido no sábado à noite da decisão do juiz federal que bloqueou a aplicação do decreto, assinado há oito dias por Donald Trump, para impedir cidadãos de sete países muçulmanos e refugiados de entrarem nos Estados Unidos.

O Governo do Presidente dos Estados Unidos iniciara no sábado o processo de recurso da decisão de um juiz federal.

Num documento apresentado no Tribunal de Recurso do Nono Circuito, com sede em São Francisco (Califórnia), Trump e o seu gabinete recorreram formalmente da decisão judicial que bloqueou temporariamente a polémica ordem executiva e já abriu as portas do país a imigrantes e refugiados.

A notificação do recurso foi apresentada em nome de Trump, do secretário de Segurança Nacional, John Kelly, do secretário de Estado, Rex Tillerson, e dos Estados Unidos.

As partes recorrem “da decisão de 3 de Fevereiro” que “restringe a aplicação de parte da ordem executiva de 27 de Janeiro para proteger o país da entrada de terroristas estrangeiros”, segundo a notificação apresentada no tribunal.

O documento dá início a um processo de recurso que, segundo especialistas legais, vai seguir-se de um pedido de suspensão da decisão judicial que bloqueou o veto migratório, e de um relatório que expõe os motivos por que, do ponto de vista do Governo, o tribunal de recurso deve aceder ao pedido.

Actualmente, mantém-se a decisão do juiz federal James Robart, que bloqueou na sexta-feira a aplicação do decreto de Trump com efeito imediato em todo o país, o que obrigou o Governo a revalidar milhares de vistos e a alterar os seus protocolos de actuação em relação aos imigrantes anteriormente vetados.

6 Fev 2017

LAG 2017 | Governo vai uniformizar legislação sobre imigração ilegal

O Secretário para a Segurança deseja uniformizar já para o ano duas leis e dois regulamentos administrativos na área da imigração, para que haja apenas uma lei e um regulamento. Com esta medida, Wong Sio Chak quer reduzir o número de processos em tribunal

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo pretende rever e uniformizar já no próximo ano os diplomas referentes aos “princípios gerais do regime de entrada, permanência e autorização de residência”, e à “lei da imigração ilegal e da expulsão”, sem esquecer dois regulamentos administrativos. O objectivo é uniformizar os diplomas de combate à imigração ilegal para que exista uma lei e um regulamento administrativo.

“Espera-se que, dentro do corrente ano, se possa definir claramente o rumo a seguir e elaborar a proposta de revisão, por forma a tentar dar início ao processo legislativo em 2017”, disse ontem o Secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, no âmbito do primeiro dia de debate sobre as Linhas de Acção Governativa (LAG) para a sua tutela.

Durante a sessão, Wong Sio Chak levantou a ponta do véu quanto ao conteúdo dos futuros diplomas. “Vai haver uma fusão dos dois diplomas, datados de 2003 e 2004, e a primeira coisa é articulá-los, porque vamos ter uma área marítima muito maior. Temos de ver como podemos fazer essa articulação e reduzir o número de processos nos tribunais.”

Menores mais protegidos

Além disso, vão ser criadas novas regras que visam o pessoal da aviação. “As empresas de aviação, os passageiros e a tripulação poderão dar uma lista às autoridades para que estas consigam dispor destes dados. Alguns passageiros asiáticos vão para Hong Kong, já que muitos refugiados escolhem Hong Kong. A segurança pública pode ser afectada”, explicou o Secretário.

Os novos diplomas visam ainda uma melhor protecção dos menores. “A saída de menores deve ser denunciada. Actualmente o limite é de 12 anos, mas se os encarregados de educação entenderem que os filhos não podem sair de Macau devem comunicar connosco.”

O objectivo é, segundo Wong Sio Chak, controlar os casos de adolescentes que vão para o outro lado da fronteira consumir drogas. “Há situações de jovens que vão à China consumir estupefacientes. Teremos de discutir ainda o assunto no Conselho Executivo, pois trata-se de um conteúdo complexo”, rematou.

Há fugas?

A deputada Ella Lei falou da situação dos imigrantes ilegais nos estaleiros, apontando que existem fugas de informação que levam a que os trabalhadores sem documentação sejam afastados antes da chegada dos inspectores. Wong Sio Chak admitiu que isso poderá acontecer.

“Não tenho provas, mas não afasto totalmente essa hipótese. Mas confio nos meus colegas. De facto, a fiscalização nocturna nos estaleiros leva a uma grande insegurança”, acrescentou. Ainda assim, houve uma redução no número de ilegais detectados: de um total de 467 encontrados entre Janeiro e Setembro do ano passado, passou-se para 371 em igual período deste ano.

O Secretário para a Segurança admitiu que, em muitos casos, é difícil encontrar provas, tendo adiantado que a Polícia Judiciária tem, desde 2012, um projecto de lei na área do ADN. “Esse diploma ainda não está agendado, a Assembleia Legislativa tem estado ocupada, mas estou mesmo preocupado com esta matéria”, concluiu.

29 Nov 2016

Miss Irão interrogada duas horas à chegada a Macau

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]pós recentes denúncias feitas por turistas referentes a descriminação aquando da sua chegada a Macau, é agora dado a conhecer mais um caso, desta feita protagonizado pela Miss Irão, Melika Razavi. Após ser galardoada nas Filipinas com o lugar de Miss Fitness no concurso Miss Global 2016, a beldade iraniana – que também é jogadora de póquer – foi sujeita a duas horas de interrogatório nos Serviços de Migração do Aeroporto Internacional de Macau, aquando da sua chegada ao território.
A notícia, adiantada pelo jornal Macau Daily Times, dá a conhecer o caso de Melika Razavi, que terá sido levada por um agente dos Serviços de Migração após apresentar o passaporte de origem iraniana, tendo sido depois questionada acerca da sua visita à RAEM. A visada apresentou-se como jogadora de póquer visto estar na região para participar num torneio da modalidade. As autoridades solicitaram então que assinasse documentos que lhes permitissem inspecionar a bagagem que trazia e o telemóvel.
“[O agente] deu-me um papel para assinar para que pudesse revistar as malas e depois de o fazer deu-me outro papel para que autorizasse a inspecção do telemóvel”, explica Melika Razavi, citada na mesma publicação.
Após o escrutínio dos objectos pessoais, foi pedido a Melika Razavi para apresentar um montante de cinco mil patacas. A beleza iraniana afirmou que nunca lhe tinha sido solicitado dinheiro anteriormente para entrar em Macau e que esta era a primeira vez que assistia a este tipo de requerimento para poder entrar numa região. “Mostrei-lhes quatro cartões de crédito e perguntei se podia levantar dinheiro ao que me responderam que não”, afirma.
Entretanto, foi informada de que lhe tinha sido recusada a entrada na RAEM e que seria deportada para as Filipinas por não trazer consigo patacas ou dólares de Hong Kong. “Como não sou das Filipinas, nada daquilo fazia sequer sentido para mim”, explica Melika Razavi.
Após ter sido informada que iria de volta para as Filipinas, país para onde não mais tinha visto de entrada, a modelo e jogadora contou às autoridades que era a Miss Irão e mostrou alguns vídeos que o confirmaram. No entanto, só foi autorizada a entrar na RAEM após a visualização de imagens que a tinham a fazer truques de magia em frente ao boxer filipino Manny Pacquiao. Foi-lhe então concedido um visto de dez dias.
De acordo com o Daily Times, os Serviços de Migração classificam este tipo de inspecções como “parte das formalidades”, sendo que para a lesada este foi um caso em que o que esteve em causa foi a nacionalidade.
“Sinto como se fizesse parte do ISIS, quando aqui vim por uma boa causa”, refere Melika Razavi. A jogadora tinha feito saber no concurso em que participara que é seu hábito doar parte dos lucros de jogo a instituições de caridade e que era sua intenção em Macau fazer o mesmo tendo como destinatárias entidades locais.

5 Out 2016

Residentes de Macau que emigraram não pensam em voltar

Estão em Taiwan, Portugal, Estados Unidos, Austrália, mas são muitos outros os sítios onde os residentes de Macau optaram por viver e trabalhar. Não há números concretos, mas dizem que não têm intenção de voltar –poucas oportunidades de trabalho, alta densidade populacional, nível cultural baixo. Daqui só querem a residência

[dropcap]G[/dropcap]abriela e Jorge são um jovem casal que está a morar em Lisboa, onde trabalham num escritório de advocacia. Gabriela estudou Direito na Universidade de Macau (UM) e participou num plano da Fundação Macau que financiou a aprendizagem da Língua Portuguesa e depois fez o Mestrado em Portugal. Jorge acabou o seu curso também em Língua Portuguesa e Direito, em Portugal, há três anos. Ambos decidiram trabalhar por lá – não por causa do dinheiro, mas porque querem aprender mais.

“Decidi não voltar para Macau porque quero ter contacto com mais pensamentos europeus, alargando a minha visão, e aproveito a vantagem de ser bilingue para conseguir um desenvolvimento mais diversificado”, começou por contar Jorge ao HM. “Não preciso de ganhar muito dinheiro, já ficamos felizes quando ganhamos dinheiro suficiente para a nossa vida”, continuou Gabriela.

Para o jovem advogado, em Macau as opções comerciais são poucas e existe um monopólio forte, algo que, diz, limita as oportunidades para os jovens se desenvolverem no sector comercial. Como a empresa onde Jorge trabalha também tem negócios na China, o jovem volta a Macau quando tem trabalho e, garante, não está totalmente desligado da sua terra natal.

Já Gabriela considera que há mais competição para trabalhar em Macau: é que em Portugal, diz, existem muito poucas pessoas bilingues que trabalham em advocacia. “Como nós sabemos Chinês e Direito, a empresa dá-nos casos importantes para tratar. Se for em Macau, tem que se ser muito experiente”.

Sem dados

A Direcção dos Serviços de Estatísticas e Censos (DSEC) afirmou ao HM que tem seguido os registos de entrada e saída do território de residentes de Macau, para saber se ficam no território durante seis meses. Contudo, ainda que as estatísticas sobre emigrantes sejam um dos critérios considerados no cálculo das estimativa total da população, não há – como admite a DSEC – qualquer número sobre os residentes de Macau que saíram de vez do território. Algo que tem explicação: quando os residentes de Macau emigram podem não usar a sua identidade de residência de Macau e podem ser portadores de passaporte de Portugal ou de um documento de Taiwan.

A DSEC também diz que consulta os Consulados dos diferentes países sobre os dados de emigrantes de Macau, mas disse ao HM “não ser apropriado fornecer os números”.

Questionado pelo HM, o Consulado-Geral de Portugal em Macau e Hong Kong também diz não dispor de dados sobre os residentes de Macau que estão a residir em Portugal, já que estes não são obrigados a informar o posto consular para este efeito.

Pelos filhos

Tal como Jorge e Gabriela, Lizette Akouri também está fora. É macaense e chegou à Austrália há 40 anos, quando tinha apenas 20 anos. Falou com o HM numa mistura de Chinês, Inglês e Português.

“Actualmente costumo falar Inglês, mas falo com a minha mãe em Português e falo Chinês com os meus amigos chineses em Sydney”, conta-nos.

Trabalha na área financeira há 15 anos e recentemente criou um negócio como consultora de Feng Shui. Lizette emigrou para a Austrália por causa dos pais. “Desde 1966 que os meus pais pensavam em sair de Macau. Primeiro por causa da instabilidade da altura, depois por razões financeiras. Eles não olhavam muito para o futuro em Macau e achavam que sair era melhor para os filhos”.

A família da Lizette Akouri ainda pensou em emigrar para os Estados Unidos ou Brasil, mas escolheu a Austrália porque o pai conseguiu uma posição no Consulado de Portugal no país.

A vida na Austrália parece agradar muito a Lizette e prova disso é o facto de ela só ter voltado a visitar Macau pela primeira vez dez anos depois de daqui ter saído. Veio com o marido, egípcio, e o filho. Desde então, aparece em Macau com mais frequência: assiste a cerimónias de casamento de filhos de amigos e participa nos Encontros das Comunidades Macaenses, de três em três anos.

“Voltei a Macau duas vezes no ano passado, o meu marido gosta também muito de Macau. Tenho muitas memórias com amigos, tenho saudade da comida, como o chong fan, a massa de Wan Tan, pastéis de nata”, diz-nos Lizette, salientando que gosta muito do território, só que não pensa em voltar a residir em Macau.

“Há mais oportunidades na Austrália e penso primeiro nos meus filhos. A qualidade do ar na Austrália é melhor, os espaços e as casas são maiores”, frisa.

Como Lizette, Jorge considera que fora de Macau é melhor. Para ele, também Portugal tem mais oportunidades de trabalho e é tem mais qualidade para viver.

“Portugal é um país adequado para viver, a densidade populacional é baixa, a qualidade do ar é melhor. Tem sol e praia, uma clima confortável, o índice de consumo é mais baixo. Há mais ingredientes na comida e mariscos”.
Ainda que veja surgirem problemas de Portugal, entre vantagens e desvantagens, o casal não pensa voltar a residir em Macau.

“Portugal está a enfrentar o envelhecimento da população, a taxa alta de desemprego, a falta de apoio às indústrias principais. Mas, actualmente, Macau não é o lugar ideal para se viver. Depois da transferência de soberania e do [rápido] desenvolvimento surgiram uma série de problemas, tais como a grande população que veio de fora, o trânsito, a saúde, a educação, e o ambiente, que estão a enfrentar uma grande pressão. E a inflação é alta”.

Jorge assegura que sendo chinês, obter um apartamento em Macau é essencial, mas o dinheiro preciso para tal é demasiado. “A pressão de vida em Macau é grande e a qualidade de vida é baixa.”

O jovem casal já tem um filho que nasceu em Portugal. E seguem um princípio simples: “a qualidade de vida não deve ser influenciada pelo trabalho, a saúde do filho é mais importante”.

Formosa, meu amor

Segundo dados do Departamento de Imigração e Protecção de Fronteiras do País, a China é a segunda maior fonte de emigração nos últimos anos, depois da Índia. Os chineses de Hong Kong, Macau e Taiwan e Mongólia fizeram com que houvesse um aumento na migração da Austrália, ocupando 15,4% da população em 2014 e 16,1% no ano seguinte. Mais uma vez o departamento não mostra o número concreto de migrantes de Macau para o país.

E em Taiwan? Como é a situação? Segundo dados da Agência Nacional de Imigração de Taiwan, até Fevereiro de 2016, 88 pessoas de Macau obtiveram autorização de residência na Formosa, enquanto 17 já conseguiram a residência permanente. Cookie Ho é um desses exemplos, a quem foi autorizada a residência em Taiwan graças ao trabalho.

A jovem começou a sua vida em Taiwan em 2005, quando frequentou o curso de Medicina numa universidade taiwanesa. Os dias passaram e a jovem gosta cada vez mais do estilo de vida lá, daí ter surgido a ideia de trabalhar e viver nesta ilha depois de se graduar. Agora está a viver em Taipei e a trabalhar num hospital.

“Não foi difícil encontrar um trabalho quando acabei o curso, porque ser médica não é difícil em Taiwan”, disse.
Além disso, diz-nos, Cookie deixou gradualmente de gostar do ambiente de Macau. “É muito pequeno, o nível cultural das pessoas é baixo, a atitude nos serviços é pior do que em Taiwan.”

Cookie adora Taiwan porque a maioria de pessoas é bem educada, costuma fazer filas, gosta de proteger o ambiente e o mundo. “Tudo é feito conforme as regras. Quanto mais vivo com este estilo, mais a minha atitude e os meus pensamentos mudaram. Quando em Roma, sou como os romanos”.

Apesar de ter deixado a sua terra natal, Cookie costuma voltar a Macau a cada três a seis meses, porque quer encontrar-se com os pais e familiares e também pela gastronomia única de cá.

Mesmo assim, a jovem prefere constituir família em Taiwan, porque casou-se com uma pessoa de nacionalidade taiwanesa.

“Agora não tenho planos para voltar a viver em Macau, porque já tenho vida e trabalho estáveis em Taiwan e gosto muito”.

Cookie Ho diz que, embora muitas pessoas de Macau estudem em Taiwan, não vê muitos a emigrar para lá. A jovem conhece apenas entre três a cinco residentes de Macau que estão a residir em Taiwan.

Lá fora com ligações

Ainda que estejam lá fora, alguns dos residentes de Macau não se desligam totalmente do território. Lizette continua membro, depois de ter sido presidente, da Casa de Macau na Austrália. Deixou o cargo apenas este ano para se concentrar mais no seu negócio.

No país, a Casa de Macau tem 600 membros – 400 são macaenses, mas apenas 200, ou menos, nasceram em Macau. “A maioria de membros é macaense de Hong Kong e até não foi nem conhece muito Macau”.

A ex-presidente considera que a maioria dos macaenses que emigraram para a Austrália não opta por voltar para Macau por considerar finanças, trabalhos mais estáveis, um ambiente mais seguro e hospitais mais avançados.

Mesmo que os filhos sejam macaenses e egípcios, e se identifiquem como australianos, as influências dos costumes de Macau estão bem marcadas: a família fala Chinês, aprendem a cultura de Macau, celebram o Ano Novo Chinês e todos os festivais. E mesmo que Lizette tenha background português, não tem dúvidas: é asiática e é de Macau.

Também Ng U Kwong, americano de Macau, não se desliga do território: continua a ler jornais de Macau através da internet e a voltar a Macau cada um a dois anos, com o objectivo de visitar os familiares.

Ng U Kwong tem 58 anos e é engenheiro civil do Departamento de Transporte do Hawai, sendo agora cidadão dos Estados Unidos. A vida que tem nos EUA faz com que não pense voltar a trabalhar ou morar em Macau – a profissão lá corre bem e é na ilha que se quer estabelecer com a sua mulher, outra emigrante de Macau, com quem tem duas filhas.

Ng chegou ao Hawai em 1985, depois de tirar curso na Universidade do Texas. De cá, saiu com 19 anos, depois de uma licenciatura em Hong Kong. Os seus irmãos também se espalham por Hong Kong, Macau e Estados Unidos.

“Na altura, muitas pessoas de Macau estudaram fora, pelo que sei. Como eu estudei Engenharia Civil, não houve problema em encontrar trabalhos nos EUA.”

Como residente de Macau, Ng esteve atento à transferência de soberania de Macau, em 1999, mesmo que já estivesse nos EUA. Olha para a China como um país numa boa situação e não desgosta que Macau tenha regressado à China.

Apesar de tanto Ng, como a esposa serem os dois residentes de Macau, as filhas de ambos não receberam qualquer educação especial sobre o território. “Levámo-las para visitarem Macau, explicamos que os avós, tias e tios estão lá. Não falámos especialmente de como é Macau, porque não querem saber muito sobre a cidade”.

O HM tentou saber o número de emigrantes de Macau nos Estados Unidos através do Consulado Geral do país para Hong Kong e Macau, mas até ao fecho da edição não conseguiu resposta.

22 Abr 2016

Emigração | Menos portugueses em Macau. Território é o 19º local mais apetecido

[dropcap style=’circle’]F[/dropcap]oram menos 1,1% os emigrantes portugueses que deram entrada em Macau em 2014, comparativamente ao ano de 2013. Apesar da ligeira queda, o território é o terceiro local do mundo onde entram mais portugueses, quando comparado com outras nacionalidades. O dados são do Gabinete do Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas e constam do Relatório de Emigração do ano passado.
“Em 2014, o número de entradas de portugueses em Macau totaliza 262, menos 1,1% do que em 2013”, cita o documento. Em 2007 vieram 146 portugueses para Macau. “Durante este período o aumento de portugueses foi progressivo, tendo havido uma ligeira diminuição de 2013 para 2014. Em 2014 as entradas de portugueses representaram 11,5% das entradas totais em Macau”, pode ler-se.
Feitas as contas, Macau atingiu, durante o ano passado, o terceiro lugar na tabela de países do mundo onde a entrada de portugueses mais tem impacto no âmbito da entrada de estrangeiros no país de destino.
Uma análise aos dados indica que a entrada de portugueses em Macau tem vindo a apresentar um aumento gradual de ano para ano, oscilando apenas na percentagem de crescimento. Em 2012, a percentagem das entradas de estrangeiros portugueses em Macau foi de 9,1%, atingindo os 216 emigrantes. Ainda assim, foi no ano anterior, 2011, que se sentiu a maior taxa de crescimento anual, ultrapassando os 38%.
Relativamente ao residentes nascidos em Portugal mas residentes em Macau, os números explicam que a RAEM tem um total de 1835 de portugueses aqui emigrados e a residir, em 2011, ou seja, mais 39% do que em 2006.
“Nos três anos disponíveis para análise, denota-se que o número de portugueses emigrados em Macau diminuiu ligeiramente em 2001 para 2006, tendo voltado a aumentar em 2006 para 2011, passando de 1616, em 2001, para 1835, em 2011”, indica o relatório.
Em termos relativos, lê-se que os portugueses são uma minoria entre os nascidos no estrangeiro a residir em Macau, representando apenas 0,6%, em 2011, o único ano avaliado. Apesar da diminuição, o número de portugueses a residir neste país continua a situar-se acima dos mil, sendo Macau o 19º país do mundo onde residem mais portugueses emigrados.

Uma fuga

A estagnação do crescimento económico de Portugal, depois da entrada do Euro, a pressão sobre o investimento público e o crescente aumento do desemprego são algumas das razões apresentadas, pelo Gabinete, para o aumento da emigração nas duas primeiras décadas do século XXI.
“Hoje Portugal é, sobretudo, de novo, um país de emigração”, indica o relatório.
O Gabinete estima que neste momento existam, no mundo, cerca de 2,3 milhões de portugueses emigrados, isto é, “de pessoas nascidas em Portugal a residir no estrangeiro há mais de um ano”.
O país que mais entradas de portugueses, a nível mundial, recebeu foi o Reino Unido, com mais de 30.500 entradas, seguindo-se a Suíça, com 20 mil entradas. França atinge o terceiro lugar com 18 mil entradas, terminando o pódio com a Alemanha, pouco passando das dez mil entradas.
Em conclusão, o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Cesário, indica que existe uma “relativa estabilização ao fluxo migratório de cidadãos nacionais no ano de 2014, não deixando porém de se tratar de um fenómeno com uma enorme dimensão e um grande complexo social”.

Uma chegada consciente

A entrada dos portugueses, diz Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau, actualmente acontece de forma mais calma e orientada. Em declarações à Rádio Macau, a presidente indicou que “houve um período, talvez na altura pior da crise, em que as pessoas estavam mais à procura de soluções para as suas vidas e que apareceram aqui [algumas] que vinham ver o que conseguiam fazer, na expectativa, porque lhes diziam que era fácil ter trabalho em Macau”.
Tendência que tem vindo a mudar ao longo dos anos. “Nos últimos dois anos essa situação não se tem verificado tanto. Tirando casos muito excepcionais, as pessoas vêm orientadas”, explicou à rádio.
Futuramente, a presidente espera que a entrada de portugueses se mantenha estável, sendo que o território, diz, vai continuar a sentir necessidade de os acolher. “Com o crescimento de Macau é natural que a tendência se mantenha dentro de um fluxo estável. Temos gente jovem muito qualificada e Macau precisa dessas pessoas. É mais fácil um português chegar a Macau e adaptar-se e prestar um bom serviço a Macau do que, muitas vezes, gente vinda de outros universos em que as dificuldades de adaptação são maiores. Portanto, acho que faz todo o sentido que continue a haver alguma procura e oferta para esse mercado que é muito especial”, rematou.

30 Out 2015