A Páscoa não é uma amêndoa

A Páscoa, efeméride tradicional dos religiosos católicos, e não só, já lá vai e aqui em Portugal esta rapaziada foi toda para a praia porque apareceu um calor na ordem dos 27 graus, sem ter a noção de que para a semana vão ter chuvadas fortes com a temperatura a baixar para uma máxima de 14 graus. Uma semana em que Braga delirou cheia de cidadãos espanhóis para as cerimónias tradicionais pascais.

Muito se falou do nascimento de Jesus Cristo, da sua morte e da sua ressurreição. Os crentes discutem esta matéria mas também têm de ouvir aqueles que dizem que Cristo nunca existiu, que Cristo não foi crucificado, que nunca ressuscitou e por aí fora. Cada ser humano tem o direito de pensar e de amar aquilo que pensa ser verdadeiro.

Se vos disser que um irmão vosso tem uma fortuna de mil milhões de patacas e que sabe que você passa fome e não o ajuda nem com uma pataca, você não acredita. É difícil a um homem que lhe ensinaram aos cinco anos de idade o que foi Cristo, o que fez e porque há Páscoa, não acreditar nos dias da sua vida que não aconteceu como lhe ensinaram.

A maioria dos portugueses é católica, mas que raio de catolicismo quando passaram o tempo na praia, na pesca, no futebol e as igrejas quase vazias. O cardeal Patriarca de Lisboa, em plena Páscoa não soube, ou não quis, explicar por que razão os sacerdotes pedófilos que abusaram de crianças continuam no seu posto mantendo o abuso sexual de menores e de mulheres. Quem acredita em Cristo e na Páscoa fica desesperado com tanta hipocrisia, com as igrejas cheias de ouro e ao lado, nos bairros de lata, estão católicos a morrer à fome.

O Presidente da República foi de visita na Páscoa à ilha de São Jorge, nos Açores, um ilhéu que pode desaparecer se um vulcão emergir das profundezas terrestres/marítimas. Não vimos Marcelo Rebelo de Sousa a oferecer uma amêndoa a uma criança. E esse gesto é que representaria o simbolismo da solidariedade, da paz e do amor pela igreja que se escolheu. Marcelo Rebelo de Sousa vai à missa todos os domingos. Para quê? Se não sabe que na Páscoa temos de ser solidários com o semelhante com uma simples amêndoa. Já não há amêndoas ou não há solidariedade? Ir a uma missa falar com Deus é um sinal de que se tem de ser honesto, sério e mostrar que se anda neste mundo com o objectivo de fazer bem aos outros.

Nós não somos ricos, mas tivemos de nos lembrar que a nossa empregada que vem uma vez por semana limpar a casa tem uma filha pequenita e, como tal, tivemos de comprar uma caixa de amêndoas para adoçar a boca da filhinha e para que a mãe lhe explicasse o que era a Páscoa e porque se oferecem amêndoas.

Se Cristo morreu para nos salvar, porque não caminhamos para a morte fazendo o bem e salvando vidas que estão numa plataforma de perigosidade por falta de meios? Nós sabemos que toda esta matéria teológica é muito complicada. Tem muita discussão pelo meio. Tem os ateus, os pouco crentes, os seres humanos das mais diferentes religiões, sabemos que é tão complicado que até a entidade máxima ortodoxa da Rússia anunciou que os seus conterrâneos deviam ajudar Putin e deviam ir para a guerra matar outros seres humanos. Tal como sabemos que as alas mais conservadoras de certas religiões em países da Europa e nos Estados Unidos da América estão a apoiar certos grupos nazis da Ucrânia e a enviar-lhes material bélico de tão sofisticada tecnologia que até mandaram ao fundo o melhor barco de guerra russo.

A Páscoa já passou. Já estamos noutra, mas os que não receberam sequer uma amêndoa não esquecem que a Páscoa é uma mentira. Tal como tantos episódios da vida, sem solidariedade essa vida é uma morte lenta e, não tenhamos dúvidas, que a culpa da falta de solidariedade está na maioria das vezes nos gestos e na prática de certas religiões. Atenção, que não estamos a defender o ateísmo, mas mesmo que defendêssemos, ninguém poderia dizer que estávamos errados porque ao longo dos séculos tivemos exemplos de sobra que nos manifestaram que os religiosos estiveram errados e que ainda nos dias de hoje continuam, quando tomamos conhecimento que os nossos filhos e netos são obrigados a fazer sexo oral ao padre durante a catequese.

Na Páscoa todos os católicos, antes de ir para a praia, futebol ou discoteca, deviam pensar se já cumpriram o exemplo de Jesus Cristo. Deviam pensar na namorada Madalena que Cristo teve e quando a acusaram de prostituta e ele respondeu “Atire a primeira pedra aquele que nunca pecou”. Todos os fariseus ficaram inertes e foram desaparecendo. Cumprir o exemplo de Cristo, para os crentes, é muito difícil num mundo cada vez mais egoísta, corrupto e avarento. Cumprir Cristo e a Páscoa sabemos que não é para todos, mas aqueles que fazem o sinal da cruz não podem depois esquecer-se de uma amêndoa para a filha do vizinho que é tão pobre e nem sequer sabe o que é a Páscoa.

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