Iniciais incêndios em Macau

O primeiro incêndio registado por os portugueses em Macau ocorreu em Dezembro de 1565 na Ermida de St.º António, construída com bambu e palha pelos Jesuítas, situada onde hoje é o Largo de S. António. 29 de Julho de 1563 é a data do estabelecimento permanente dos Jesuítas em Macau, sendo em Setembro do ano anterior que Luís Fróis, S.J. e Baptista de Monte, S.J. “dão início a um projecto de residência, instalando-se em divisões sumárias, [casinhas térreas junto da ermida de St.º António] numa propriedade do comerciante Pedro Quintero”, refere Beatriz Basto da Silva. E continuando na sua Cronologia, em 1565 dá-se por oito padres da Companhia de Jesus nesta Cidade a “fundação da primeira residência jesuíta na China, em Macau, com a construção a cargo do Pe. Francisco Perez, perto de St.º António, da Casa dos Jesuítas” em imóvel próprio. Uma pobre casa feita para hospício dos missionários que passavam do Japão e essa Casa, em conjunto com a Capela, ardeu em 1565.

Reconstruída a Casa dos Jesuítas, aí em 1572 foi aberta a escola de primeiras letras. No local da anterior capela, o Capitão-Mor de Macau D. António Vilhena mandou em 1573 erguer às suas custas a nova igreja em madeira (taipa) e coberta de telha, já com o nome de Madre de Deus. Foi-lhe lançada fogo em 1582, tendo os jesuítas a abandonado e o Superior Pe. Pedro Gomes mudou-a para o actual local no sopé do Monte de S. Paulo, cobrindo-a de telha.

Crescendo o ensino até ao nível universitário, a “30 de Novembro de 1594, a Casa da Companhia de Jesus passou a denominar-se Colégio dos Jesuítas”, segundo Beatriz B. da Silva, que refere, a 1 de Dezembro “a escola criada pelos jesuítas passou à categoria de Colégio Universitário. O Colégio de São Paulo foi a primeira Universidade ocidental no Extremo Oriente”, sendo devorado em 1595 por um grande incêndio.

Já desde 1594 se reedificava o Hospício, o Colégio e a Cerca que “passaram a ocupar o terreno que, hoje, se estende pela Horta da Companhia. A fachada desta nova construção ocupava o espaço entre a actual igreja de Santo António e a Travessa de S. Francisco Xavier. No edifício e esquina que dava para a Rua de Santo António, ficavam os aposentos destinados aos mandarins que vinham frequentemente a Macau (Artur Levy Gomes)”, citação de Ana Maria Amaro. A construção do edifício do Colégio, Casa e Seminário de São Paulo, terminou em 1602. Já a Igreja da Madre de Deus voltaria a arder em 1601, sendo então construída uma nova e imponente igreja inaugurada no Natal de 1603 e a fachada, obra realizada por mestres japoneses, só ficaria pronta em 1640.

VISÃO CHINESA DOS PORTUGUESES

Para perceber as razões da pouca vontade chinesa para com a Companhia de Jesus em Macau e pegarem fogo às suas casas, escolas e igrejas, convém iniciar por historiar o percurso dos mercadores portugueses no Mar da China e mais tarde, ligados aos jesuítas, que misturados com eles entravam clandestinos na China.

Às ilhas chinesas da costa de Guangdong anualmente aportavam de Abril a Outubro marinheiros e comerciantes, vivendo a bordo dos barcos e esperando as sedas aí trazidas pelos mercadores chineses.

O Édito Imperial de 1522, que proibia quaisquer relações com os Fu Lan Ki, os desacreditados portugueses considerados na China homens de corações sujos, ladrões e alevantados, por andaram fora da obediência do seu Rei, resultou de duas batalhas navais entre os mercadores portugueses e a armada imperial chinesa.

Com tal má fama foram os portugueses colocados fora de Guangdong. Continuavam pela costa chinesa, agora para Norte a fazer comércio aliados com a pirataria japonesa pelas províncias de Fujian e Zhejiang, ficando os mandarins de Guangdong sem as taxas cobradas aos mercadores chineses e a não receber as peitas dos estrangeiros, sendo os lucros auferidos muito reduzidos. Assim, em 1554 por ‘Assentamento’ entre o Capitão-mor Leonel de Souza e Wang Bo, o haidao (subintendente dos Assuntos de Defesa Costeira), os mercadores portugueses puderam usar a península Haojing, onde a Sul, na Barra estavam instalados ao redor do Templo de A-Má os pescadores de Fujian e na parte Norte, na colina de Mong-Há os agricultores eruditos descendentes da dinastia Song do Sul. Eram administrados por o mandarim de Hiang-shan, que respondia ao Vice-Rei de Guangdong Guangxi e este ao Imperador.

A vinda dos portugueses para a Baía de A-Má (AMáGau) trouxe aos pescadores locais mais negócios por estarem ligados com a sua província de origem, levando as mercadorias para Fujian, de onde se fazia comércio com as Filipinas.

Em 1557, os portugueses têm permissão oficial de se estabelecer em habitações permanentes no fanfang, situado na área central da península e então, a viver a Norte os agricultores de Mong-Há, ao verem instalar-se cada vez mais estrangeiros ficaram desinquietados. Em 1561, eram entre 500 e 600 moradores permanentes e em Dezembro de 1562, o número dos portugueses andava perto de 800, muitos provenientes de Lampacau, ilha a encerrar aos portugueses. Em 1563 viviam cerca de 900 portugueses, excluindo crianças, mil escravos e quatro mil chineses, sendo no total perto de 6 mil habitantes. Segundo Tien-Tsê Chang, “vários milhares de malaquenhos, indianos e africanos”, alguns comerciantes, mas muitos criados e escravos. Os chineses eram os estabelecidos em torno de Mong-há e A-Má.

A MATERIAL IDADE

Os jesuítas encontravam-se em Amagao desde 1555. “Postados geralmente ao lado dos moradores, (…) os padres jesuítas lutavam pela preservação do seu papel fulcral na sociedade macaense. Cabia-lhes gerir e resolver os conflitos pessoais e de grupo no seio da comunidade e as pendências com as autoridades chinesas. (…) De resto, pertencia à Companhia de Jesus a responsabilidade da construção da maior parte das escassas estruturas defensivas da cidade, bem como a constituição da única e verdadeira milícia”, segundo Jorge dos Santos Alves, que refere “Era prática corrente os portugueses declararem os navios mercantes como navios de escolta, de guerra, para fugirem ao pagamento de direitos”, confirmando os chineses o pensamento bélico dos estrangeiros e os japoneses trazidos pelos padres do Japão lembrava-lhes os problemas com os piratas mercadores japoneses (wokou).

A aquisição da Ilha Verde pelos jesuítas em 1603, levou as tropas chinesas dois anos depois a aí destruir as casas e a igreja, propriedade ocupada sem permissão do mandarim de Hiang-shan, que avisava não querer em Macau japoneses. Em 1606 houve pânico em Guangdong, pois constou pretenderem os jesuítas invadir a China com a ajuda dos japoneses.

Perante tal cenário compreende-se a preocupação chinesa sobre a Companhia de Jesus, árbitro da política local, acusada de propagar uma ideologia heterodoxa incitadora à revolta contra a dinastia Ming. Impotentes, os locais chineses tinham o fogo como único recurso contra tão poderosa organização, que construía muros e edifícios fortificados e se ali só havia mais os chineses, então era contra eles.

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