Benefícios económicos e pegadas ecológicas

O turismo de negócios é normalmente visto como um dos segmentos mais interessantes para qualquer destino turístico: são normalmente pessoas com gastos bem acima da média, que ficam por pouco tempo mas geram maiores benefícios económicos, quer porque os seus rendimentos pessoais não os obrigam a grandes restrições e até lhes permitem eventuais extravagâncias, quer porque, na maior parte dos casos, as despesas são larga ou totalmente cobertas pelas organizações que representam. São turistas com pouco tempo mas com acelerado consumo, o que frequentemente envolve restaurantes de gabarito e até permite mobilizar um conjunto de serviços com relativa sofisticação para oferecer programas de visita de curta duração e alta qualidade e conforto para quem tem oportunidade mas pouco tempo para explorar alguns dos encantos de um território pouco ou nada conhecido.

Essa desproporção entre a o dinheiro e o tempo disponíveis tem outra consequência, no entanto: são viajantes sem tempo a perder, em correrias sucessivas para cumprir as tarefas profissionais, seja uma reunião para concretizar uma parceria estratégica para o desenvolvimento de novas áreas internacionais de negócio, uma feira de promoção turística, uma operação imobiliária, um encontro com jovens criadores, o patrocínio de um festival de verão ou a apresentação de uma comunicação numa conferência. Há sempre pouco tempo para as tarefas e ainda menos para explorar novos destinos ou as últimas novidades em territórios já conhecidos. Tudo corre com uma urgência que requer rapidez e flexibilidade, aparentemente tidas como incompatíveis com a programação colectiva dos transportes públicos e a inerente rigidez relativa de ritmos e horários.

Foi essa a principal conclusão de um estudo ainda fresco, publicado esta semana no Journal of Transport Geography, em que explorámos potenciais relações entre as características sócio-demográficas dos turistas, as suas motivações para a visita, as respectivas opções de transporte e a satisfação que tiveram ou não com a experiência turística. O estudo foi conduzido em Barcelona, cidade com um vasto e bem organizado sistema de transportes público, que garante acessibilidade relativamente fácil a todas as zonas urbanas – ou pelo menos às zonas normalmente frequentadas pelos turistas, incluindo os que viajam por motivos profissionais. Informação abundante, de fácil identificação e interpretação, disponível em várias línguas, ajuda a ultrapassar as possíveis barreiras de comunicação frequentemente associadas à dificuldade de utilização de transportes públicos por turistas.

Nestas circunstâncias – em que se dispõe de uma satisfatória rede de transportes públicos sem significativos problemas de linguagem e comunicação – observámos que as diferentes características dos turistas (idade, sexo ou nível de educação, entre outras variáveis) pouco influenciam a escolha dos modos de transporte (ainda que os turistas mais jovens tendam a preferir transportes colectivos, até por restrições financeiras). No entanto, o factor que se revelou mais determinante nessa escolha foi o motivo da viagem, com os turistas motivados pelo lazer ou pela visita a familiares e amigos a revelar clara preferência por transportes públicos, em contraste com a preferência por transporte individual (taxis, sobretudo) revelada pelos visitantes cuja presença em Barcelona se deve a motivos profissionais. Na realidade, o estudo mostrou ainda que também os turistas com motivação profissional tendem a preferir transportes colectivos quando a visita se torna mais longa e é combinada com lazer ou visitas a familiares e amigos. Também se demonstra com clareza que a utilização de transportes públicos, não só não diminui a satisfação com a visita, como é um dos factores que mais contribui para uma apreciação global positiva da cidade de Barcelona.

A questão dos transportes é, evidentemente, um aspecto central no futuro do turismo, tendo em conta o respectivo impacto nas emissões de CO2 e inerentes implicações sobre as alterações climáticas em curso. Em estudo recente publicado pela Organização Mundial de Turismo e pelo Forum Internacional de Transportes, estimava-se em 5% o contributo do turismo para o total de emissões de CO2 provocadas por acção humana. Para essas emissões contribuem sobretudo o transporte aéreo (40%) e o transporte por automóvel (32%), sendo de apenas 3% o contributo de todas as outras formas de transporte (incluindo comboios, barcos ou autocarros). Se a redução drástica do turismo internacional e do transporte aéreo parecem a única alternativa razoável para tentar compatibilizar o futuro do turismo com uma resposta efectiva às alterações climáticas, a substituição do transporte em automóvel por transportes colectivos parece ter semelhante importância e urgência nos processos de mobilidade no interior de cada destino turístico.

O obstáculo a esta transformação, sugere o nosso estudo, são os atarefados e apressados turistas com afazeres profissionais, o único grupo com preferência inequívoca pelo táxi. São turistas que pelo seu poder de compra proporcionam maior impacto económico, mas que também deixam nas paisagens marca mais pesada da sua pegada ecológica, com acumulação intensiva de emissões de CO2 relacionadas com aviões, primeiro, e automóveis privados, depois. Está por conseguir, mais uma vez, melhor equilíbrio nesta relação entre benefício económico impactos sobre o ambiente. Não deixa de ser relevante, já agora, que neste grupo de turistas nos encontremos também nós, investigadores mais ou menos preocupados com estas questões, quando participamos nas conferências e congressos de que não gostamos de abdicar.

Concluo com uma curiosidade relevante: porque motivo um investigador japonês radicado no Japão e uma investigadora chinesa a trabalhar na Coreia se dedicam a estudar a cidade de Barcelona? É uma razão prática, sobretudo: em Barcelona é entendido que toda a informação obtida com financiamento público deve estar acessível ao público. Assim sendo, estão online e com acesso livre todos os dados recolhidos nos inquéritos regulares que a Câmara de Barcelona faz a turistas e residentes. É verdade que há poucas cidades onde um estudo destes possa ser feito – com quantidade significativa de turistas e uma rede de transportes públicos eficaz e sem grandes barreiras de comunicação – mas esta é a única que disponibiliza gratuitamente os dados necessários a um estudo deste género.

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