China / EUA | Crescente rivalidade ameaça bipolarizar relações internacionais

[dropcap]A[/dropcap] crescente rivalidade com os Estados Unidos marcou a China, em 2019, à medida que uma prolongada guerra comercial se alargou à diplomacia, Defesa ou Cultura, intensificando uma disputa que está a bipolarizar as relações internacionais.
Numa altura em que Pequim assume uma política externa assertiva, visando converter a China numa super potência global até meados deste século, Washington passou a apostar numa estratégia de contenção das ambições chinesas.
Referências a uma nova Guerra Fria são agora comuns nos dois países. Este mês, pela primeira vez, a China foi destacada numa declaração conjunta da NATO: “A crescente influência da China e a sua política externa apresentam oportunidades e desafios que precisamos de enfrentar juntos como uma Aliança”, lê-se.
Segunda maior economia do mundo, a seguir aos EUA, a China deverá passar para primeiro lugar, com base na paridade do poder de compra, já no próximo ano, e em termos nominais, durante a década de 2030, de acordo com diferentes análises.
O general norte-americano Robert Spalding considera a ascensão do país “uma ameaça muito maior” do que a União Soviética: “O alcance da China, sobretudo nos governos e em todas as instituições do Ocidente, excede em muito o que os soviéticos poderiam sequer imaginar”, aponta.
Descartada outrora como fabricante de contrafacção barata e produtos de baixa qualidade, a China passou também, nos últimos anos, a rivalizar com os EUA no sector tecnológico, incluindo no desenvolvimento de Inteligência Artificial ou redes de quinta geração (5G).
“A tecnologia está no centro das mudanças na relação entre a China e o mundo”, esclareceu este mês, num relatório, a consultora McKinsey.
Mas o sucesso económico, no caso chinês, não foi acompanhado de liberalização política: a emergência do país implica hoje uma nova ordem mundial, moldada por um sistema político e de valores profundamente diferentes daqueles cultivados pelo Ocidente democrático.
Outrora pobre e isolada, mergulhada num universo à parte e em constantes “campanhas políticas”, a China ingressou nas últimas décadas numa comunidade internacional liderada por Washington, aderindo ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, Organização Mundial do Comércio, Fundo Monetário Internacional ou Banco Mundial.
Mas, face a uma administração norte-americana que rasgou compromissos internacionais, no comércio, segurança ou clima, o país asiático avançou com outras ambições: “Como membro das organizações internacionais, a China procura agora moldar o sistema com preferências e normas chinesas”, descreve Evan Feigenbaum, do centro de pesquisa sobre política global Carnegie Endowment.
O país adoptou ainda uma “segunda via alternativa”, através da iniciativa ‘uma faixa, uma rota’, ao “introduzir outro modelo das relações internacionais, numa adaptação moderna da preferência milenar da China por laços tributários”, resume.
Assente numa estrutura de poder onde a liderança do Partido Comunista é o “princípio cardeal”, o país asiático continua a pôr na cadeia activistas ou dissidentes.

Um outro mundo

Na frente comercial, os governos dos dois países impuseram já taxas alfandegárias sobre centenas de milhares de milhões de dólares de bens importados um do outro, numa guerra comercial que se prolonga desde o Verão de 2018.
A disputa alastrou-se ao sector tecnológico: os EUA restringiram já o fornecimento de alta tecnologia a várias empresas chave chinesas, incluindo ao grupo Huawei ou às fornecedoras globais de tecnologia de vigilância por vídeo Hikvision e Dahua.
Uma dissociação entre as duas maiores economias do planeta passou a ser defendida por alguns funcionários norte-americanos, com consequências imprevisíveis.
“Se os EUA assumirem que a China não pode desempenhar um papel construtivo dentro do sistema projectado por si, irão, de facto, levar a China a criar um sistema paralelo e separado, com regras muito diferentes”, alerta o antigo presidente do Banco Mundial, Robert B. Zoellick.

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