A marcha dos voluntários

[dropcap style≠’circle’]R[/dropcap]ecentemente, o jornal China’s People’s Daily publicou uma notícia sobre a nova lei que rege as transmissões do hino nacional chinês, em vigor desde dia 1 deste mês. O jornal avança que a lei pretende assegurar que o hino só se faça ouvir em situações adequadas.

A lei proíbe que o hino seja tocado em eventos privados, como funerais, ou que sirva de música de fundo em espaços públicos. Proíbe ainda que o hino seja associado a qualquer tipo de publicidade. Sempre que o hino seja transmitido todos os presentes deverão permanecer de pé em atitude “solene”.

A lei também contempla o ensino e a divulgação do cântico. Fica estipulado que deve integrar o programa escolar do ensino primário e secundário. As pessoas são incentivadas a cantá-lo nas ocasiões próprias para “expressar o seu patriotismo”.

No continente, os prevaricadores podem ser detidos até 15 dias. A violação a este regulamento pode colocar o faltoso sob a alçada de outras leis.

Wu Zeng, director do gabinete jurídico do Comité Permanente do Congresso Nacional do Povo, declarou,

“É uma regra básica que todos os cidadãos terão de respeitar e compreender. Todos têm de saber cantar o hino.”

“A Marcha dos Voluntários” é o hino nacional da República Popular da China. O hino foi tocado em Hong Kong por ocasião da passagem de soberania da Grã-Bretanha para a China, em 1997 e, em Macau, quando Portugal devolveu a soberania do território em 1999. Em Hong Kong o hino foi adoptado ao abrigo do Anexo III da Lei Básica da cidade, com efeito a partir de 1 de Julho de 1997. Em Macau, também ao abrigo do Anexo III da Lei Básica local, com efeito a partir de 20 de Dezembro de 1999.

Em termos da regulação do uso do hino, a lei de Macau é superior à de Hong Kong. A Lei nº 5 / 1999, que entrou em vigor a 1999-12-20, foca-se nesse aspecto. O Artigo 7 estipula que o hino deve sempre ser tocado de acordo com a pauta e, no Apêndice 4, proíbe-se qualquer alteração à letra. O Artigo 9 adianta que qualquer alteração intencional da letra ou da música representa uma violação à lei, e que o faltoso fica sujeito a uma pena de prisão até três anos ou a uma taxa diária ao longo de 360 dias. Embora na RAEM existam duas línguas oficiais, o chinês e o português, a letra do hino só está imprensa em chinês.

Em Hong Kong não existe regulação sobre a transmissão do hino nacional. No entanto, durante certas cerimónias oficiais todas as escolas do governo são obrigadas a tocar e cantar o hino e a hastear a bandeira. É o caso do Dia Nacional da China (1 de Outubro) e do Dia Comemorativo do Estabelecimento da RAEHK (1 Julho). Nas Universidades, durante as cerimónias de graduação o hino é sempre ouvido.

A implementação da Lei do Hino Nacional teve grande eco em Hong Kong. A este propósito pudemos ler no “South China Morning Post” no passado dia 30 de Agosto,

“O noticiário de Pequim divulgava segunda-feira que o Comité Permanente do CNP vai propor em Outubro, durante a reunião bianual, que esta legislação seja inserida no Anexo III da Lei Básica.”

De acordo com o princípio “um país, dois sistemas” a lei nacional chinesa só pode ser extensível à RAEHK se for inserida no Anexo III da Lei Básica de Hong Kong. Algumas leis chinesas foram inseridas no Anexo III, e entraram em vigor a 1 de Julho de 1997, data da transferência de soberania. Foi o caso da legislação referente à bandeira nacional, ao emblema nacional, ao exército chinês e às regulações dos privilégios consulares e imunidade.

Se a “Lei do Hino Nacional” for incluída no Anexo III, Hong Kong passará a ter legislação nesta matéria. Funcionará exactamente como o “Regulamento de Hong Kong sobre a Bandeira e o Emblema Nacionais”. O propósito deste Regulamento é a aplicação em Hong Kong das Leis Chinesas referentes à Bandeira e ao Emblema Nacionais.

“É obrigação e responsabilidade e do Governo da RAEHK a protecção da dignidade do hino nacional e, na verdade, de todos os cidadãos chineses,” declarou a Chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam, que não acredita que neste assunto haja qualquer margem para susceptilidades.

Segundo alguns legisladores citados pelo South China Morning Post, a lei contém alguma linguagem pouco clara; por exemplo, o que é que constitui exactamente uma quebra de solenidade? A propósito o repórter, Wu Zeng colocou a seguinte questão,

“É ilegal tocar a Marcha dos Voluntários no telemóvel?”

A Chefe do Executivo respondeu que não sabia porque nunca tinha lidado com um caso semelhante.

É necessário proteger a dignidade do hino nacional e, por isso, a Lei do Hino Nacional deve ser incluída no Anexo III das duas Leis Básicas. Mas, ao contrário de Macau, Hong Kong não tem legislação própria sobre a matéria. O Governo da RAEHK terá de lidar com as questões atrás mencionadas com clareza e com cautela.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau

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