Uma viagem incompreensível

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ronto. A medida de acesso livre de iates entre Macau e a cidade chinesa de Zhongshan está lançada, e o novo terminal marítimo da Taipa foi, finalmente, inaugurado. Macau parece ter ganho novas faces marítimas para mostrar ao mundo, em termos de sistemas e infra-estruturas.

Mas há que questionar: e depois? O número de pedidos para a entrada de iates é tão pouco, que até Maio deste ano apenas três iates chegaram ao território vindos de Zhongshan. A Direcção dos Serviços de Turismo admitiu que esta medida é dirigida para turistas com maiores capacidades económicas, pelo que o número de visitantes desta categoria não deve registar um grande aumento.

É incompreensível que, apesar de saber que os turistas serão, à partida, poucos, os Serviços de Turismo continuem a afirmar que vão fazer estudos sobre as “características de consumo” dos clientes nesse segmento, mas não estudam como podem atrair mais visitantes ou melhorar essa medida.

Este caso faz-me lembrar o comentário feito por um analista que referiu que o Governo sofre de uma espécie de doença de Parkinson, que estará a aparecer novamente. Assim que descobre um problema, o Executivo limita-se a encomendar estudos a diversas entidades, pois considera que são os melhores medicamentos para as suas doenças.

Fazer estudos não é, de todo, uma medida errada, mas deve ser adequado e ter efeitos práticos. Nesta iniciativa sobre a entrada livre de iates, o ponto essencial é como é que se podem diminuir as exigências a quem tem um iate, para que a medida possa beneficiar mais pessoas.

Levanta muitas dúvidas o facto dos Serviços de Turismo e a Direcção dos Serviços dos Assuntos Marítimos e da Água implementarem medidas sem terem uma comunicação permanente. Este é um velho problema de incoerência que existe nos diversos departamentos do Governo.

Para além da burocracia, há ainda a dificuldade relacionada com o facto do interior da China cobrar quase um milhão de renmimbi para que um iate fique estacionado na marina. Isso não ajuda os proprietários de iates que sejam, digamos, da classe média, ou classe média alta.

Além disso, as taxas de inspecção nas alfândegas são altas, e é algo que o Governo de Macau já disse que precisa de coordenador com as autoridades de Guangdong. Também foi falada a existência de um mecanismo de cooperação entre os dois territórios, mas será que está a ter efeitos?

Quando os iates chegam a Macau, podem ficar estacionados no cais de Coloane ou na marina da Doca dos Pescadores, mas as instalações em Coloane não são simples. Não há sampanas (embarcações asiáticas, com fundo de bambu) que façam a ligação para embarcações de recreio mais específicas. Os iates só podem atracar numa zona a cem metros de distância em relação ao cais, e os turistas precisam de usar o batel para fazer a ligação ao cais. Não deixa de ser uma viagem com um quê de assustador.

Quando os iates de Zhongshan chegam a Macau, não podem passear nas suas águas. Se eu fosse dona de um iate e chegasse ao território, e percebesse que não podia dar uma volta de barco, então ia pensar para que estava eu aqui com o meu iate. O Governo Central já atribuiu à RAEM quilómetros de águas marítimas, mas é estranho que os iates ainda não possam fazer visitas aqui à volta.

Não me assumo especialista. Mas tendo em conta que o terminal marítimo da Taipa já entrou em funcionamento, e tendo em conta a sua enorme dimensão (quatro vezes superior à do aeroporto), devem existir zonas por ocupar ali à volta.

As autoridades deveriam pensar em aproveitar esses espaços para o embarque de iates provenientes da China, e isso iria permitir um melhor acesso dos turistas ao Cotai, Taipa ou Coloane. Talvez fossem proporcionadas melhores condições do que o Cais de Coloane.

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