Coloane | AL rejeita projecto de lei de José Pereira Coutinho

A Assembleia Legislativa entende não poder aceitar novamente o projecto de lei da autoria do deputado José Pereira Coutinho referente à protecção da reserva natural de Coloane. Alega-se que é necessário o consentimento prévio do Chefe do Executivo

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á muito que tinha dado entrado na Assembleia Legislativa (AL), pela quarta vez, o projecto de lei do deputado José Pereira Coutinho que propõe uma norma interpretativa sobre a garantia da protecção da reserva natural de Coloane. Contudo, o agendamento da discussão e votação do diploma tardava a chegar.

As razões deste atraso são agora conhecidas. Segundo um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos da AL, o projecto de lei não pode ser acolhido pelo hemiciclo sem que haja autorização do Chefe do Executivo. “O projecto de lei não reúne as condições para ser novamente admitido sem que esteja cumprido o requisito do consentimento prévio”, lê-se no parecer.

Um dos motivos está relacionado com o facto de o deputado ter apresentado, no ano passado, o mesmo projecto de lei, ainda na presente sessão legislativa, tendo o mesmo sido chumbado a 20 de Novembro, “pelo que não pode ser agora admitido”, lê-se.

Depois, a AL considera que parte deste projecto de lei repete o conteúdo da Lei de Terras, além de pretender legislar sobre uma matéria que é da responsabilidade do Governo: terrenos. O parecer alerta para o facto de, segundo a Lei Básica, os deputados à AL poderem apresentar, de forma autónoma, projectos de lei, desde que não “envolvam a política do Governo”. Quando a reserva de iniciativa legislativa é do Chefe do Executivo, tem de ser dada autorização prévia.

“Uma vez que o Governo da RAEM é responsável pela gestão, uso e desenvolvimento dos solos e dos recursos naturais, julga-se que a iniciativa legislativa agora em questão se insere no conceito de ‘matéria atinente à política do Governo’”, acrescenta o documento.

O projecto de José Pereira Coutinho faz referência ao “interesse público” que existe na protecção de reserva natural de Coloane. Contudo, a comissão entende que tal já consta na Lei de Terras em vigor.

“Ouvida a assessoria, a comissão concluiu que a norma interpretativa é o somatório do segundo parágrafo do preâmbulo do decreto-lei (referente à dimensão da reserva natural de Coloane), bem como da Lei de Terras. A parte interpretativa propriamente dita traduz-se na concretização do conceito de interesse público constante na Lei de Terras.”

Contactado pelo HM, o deputado José Pereira Coutinho disse estar “incrédulo” e pondera mesmo recorrer da decisão do hemiciclo. “Há uma dualidade de critérios para este caso em concreto. Se consegui, no passado, por várias vezes apresentar [o projecto de lei] sem autorização do Chefe do Executivo, por que preciso de o fazer agora? Estou incrédulo. Estou a ponderar recorrer da decisão, considero que é muito injusta.”

Um precedente?

A análise em questão foi pedida pelo presidente da AL, Ho Iat Seng, no passado dia 4 de Maio, sendo que a decisão foi tornada pública esta semana.

O parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, que é presidida pelo deputado Vong Hin Fai, faz também referência à análise que foi feita ao projecto de lei apresentado pelo Gabriel Tong, que propunha uma nova interpretação da Lei de Terras, e que também não foi admitido no hemiciclo.

Uma das razões para Ho Iat Seng ter pedido esta análise da Comissão de Regimento e Mandatos foi, precisamente, o projecto de Gabriel Tong. Isto “por ter sido feita uma análise exaustiva e circunstanciada sobre leis interpretativas, o exercício da iniciativa legislativa no âmbito destas leis e sobre a reserva de iniciativa legislativa dos deputados em geral”.

O documento dá ainda explicações sobre o conceito de interesse público no direito, tendo alertado José Pereira Coutinho para a necessidade de ser mais específico na elaboração do seu projecto de lei.

“O conceito de interesse público é um conceito indeterminado, com um alto grau de abstracção, que necessita de ser preenchido para ser concretizado e se cumprir na ordem jurídica. A concretização do interesse público pressupõe que este seja interpretado num determinado sentido, de forma a poder ser tomada uma decisão que torne este conceito abstracto em algo objectivo e concreto.”

Além disso, “dependerá de cada agente em concreto a interpretação que faça do interesse público em causa e, em consequência, a forma como preenche o conceito indeterminado envolvido”, aponta o parecer.

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