Cartaz | Apresentado o programa do Festival de Artes de Macau

Macau está em ebulição com eventos culturais a preencher o calendário do público. Foi ontem apresentado o cartaz do 28.º Festival de Artes de Macau, que começa a 28 de Abril, e que encherá a cidade de espectáculos até 31 de Maio

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Festival de Artes de Macau (FAM) já mexe. Foi ontem apresentada a programação do evento que terá mais de 100 actividades, da música à dança contemporânea, passando por diversas variantes de teatro.

A edição deste ano tem um orçamento mais modesto: são 23 milhões de patacas. “Fizemos o planeamento mais cedo, alguns dos projectos são financiados pelo Governo e por isso pudemos reduzir o orçamento”, revelou Leung Hio Ming, presidente do Instituto Cultural (IC). O investimento no festival teve uma poupança de cerca de quatro milhões de patacas em relação ao ano passado. De acordo com Leung Hio Ming, tal redução de orçamento “não vai afectar a qualidade dos espectáculos”.

O tema transversal à programação do FAM é a “Heterotopia”, uma ideia baseada na heterogeneidade do espaço que se reflecte num caleidoscópio de textos, imagens, histórias e música.

O festival abre com o espectáculo “Play and Play: An Evening of Movement and Music”, que é uma reinterpretação de clássicos de Schubert e Ravel pela internacionalmente aclamada companhia de dança moderna norte-americana Bill T. Jones/Arnie Zane. A mesma companhia apresenta ainda a representação de “A letter to my nephew”. Escrito pelo coreógrafo Bill T. Jones, o espectáculo é baseado numa carta imaginada ao sobrinho enquanto este repousa numa cama de hospital. Esta história é contada através de misturas delirantes de música pop e canções de embalar que dão a paisagem ao bailado. Em ambos os espectáculos, a dança contemporânea é acompanhada por dois quartetos de cordas que emprestam som ao menu de movimentos aleatórios dos bailarinos.

Em cena

A encerrar o festival, o público terá um clássico do teatro russo: “A Gaivota”, de Anton Chekhov, encenado pela companhia islandesa Teatro da Cidade de Reiquejavique.

A celebrar os 110 do teatro chinês, o Teatro de Arte Popular de Shaanxi apresenta ao público de Macau uma produção realista do afamado clássico “Feudos nas Terras do Oeste”. A peça é um épico de guerra que retrata uma acérrima luta por território entre duas famílias, com um amor proibido pelo meio, um pouco ao estilo de Romeu e Julieta.

Ainda na área do teatro, destaque para a produção da local Associação de Arte e Cultura Comuna de Pedra, que levará a cena a peça “Canções de Migrantes”, que dará a conhecer memórias de migrantes locais. Este espectáculo aborda uma questão fulcral na história de Macau e é o primeiro de uma trilogia de espectáculos com direcção de Jenny Mok.

Fazendo uma incursão pela cultura portuguesa, o FAM deste ano conta com um bailado do emergente coreógrafo Marco da Silva Ferreira. O português traz a Macau os espectáculos “Hu(r)mano”, onde propõe uma aventura através da expressão corporal que representa a relação entre o indivíduo e a urbe. Neste espectáculo sobem ao palco quatro bailarinos, que interagem de forma a reflectir a realidade urbana moderna. Como já tinha sido tornado público, também o artista Vhils, Alexandre Farto, vai fazer parte do cartaz, com uma exposição que vai além das intervenções que, por norma, faz em espaços públicos.

Também dentro da dança moderna, o FAM propõe a ousada obra “Aneckxander: uma autobiografia trágica do corpo”, do coreógrafo Alexander Vantournhout. O espectáculo a solo equilibra-se entre a comédia e a tragédia, misturando acrobacia, linguagem corporal, num reexame da fisicalidade e do corpo humano.

Arte em família

O programa do FAM alarga-se numa multitude de espaços de imaginação artística com “palestras, masterclasses, workshops, conversas com artistas, sessões para estudantes, crítica artística e projecção de filmes”, revela Leung Hio Ming.

O espectáculo “Rusty Nails e outros heróis” é dirigido a um público de todas as idades. Fazendo uso de diferentes materiais e meios de expressão, a peça de teatro da companhia holandesa TAMTAM objektenteather apresenta uma história sem usar palavras. O espectáculo vive da interacção de objectos de dia-a-dia com a música, numa mistura que promete mergulhar o público num mundo de fantasia.

Durante a Mostra de Espectáculos ao Ar Livre, destaque para um musical infantil intitulado “Metamorfose sobre a noite estrelada, uma adaptação da Associação de Artes Pequena Montanha. A peça pensada para deslumbrar a pequenada é um teatro de marionetas onde contracenam uma lagarta e uma couve.

Com uma abordagem mais tradicionalista, a programação do FAM oferece aos público a possibilidade de assistir à ópera tradicional chinesa “A lenda da senhora general”. O espectáculo é interpretado pelo Grupo Juvenil de Ópera Cantonense dos Kaifong de Macau. Na mesma onda da ópera tradicional chinesa, chega-nos a adaptação abreviada do clássico “Senhora Anguo”, interpretada pela companhia de Teatro Nacional de Ópera de Pequim.

Variedade é uma das tónicas da edição 2017 do FAM. “Esta edição engloba 25 espectáculos e exposições de arte extraordinárias, aliados ainda a um programa de extensão que inclui, não só, produções de renome internacional, grandes obras do Interior da China e produções locais de alta qualidade”, explicou o presidente do IC na apresentação do programa.

Aos interessados que queiram beneficiar de um desconto de 30 por cento aconselha-se que estejam atentos. A partir de domingo, até dia 19 de Março, o público pode comprar bilhetes a preços reduzidos. E assim arranca mais um evento cultural de alto fôlego em Macau.


Dóci Papiáçam di Macau volta ao FAM

“Sórti na téra di tufám” é o título da peça que a companhia de teatro que usa o dialecto tradicional patuá como veículo traz aos palcos do Festival de Artes de Macau (FAM). A narrativa, entre a sorte e o azar, gira em torno de Bernardo, um afortunado azarado. A personagem ganha uma lotaria de Hong Kong, mas fica impedido de levantar o prémio por um tufão que o separa da riqueza.

Independentemente da catástrofe natural, o público pode contar com a habitual oportunidade para gargalhada oferecida pelo grupo de teatro. “Muito humor, muito sarcasmo e crítica social”, promete Miguel de Senna Fernandes, encenador e autor da peça. Num contexto de comédia, as peças do grupo de teatro apresentam o estilo de vida de Macau, numa postura de reflexão social em tom jocoso.

A peça estará patente, apenas, no FAM nos dias 19 e 20 de Maio no grande auditório do Centro Cultural de Macau. Isto “porque não há condições para outras alternativas, tudo o que seja fora do âmbito do festival implica aluguer de recinto, custos elevados”, diz o encenador.

Miguel de Senna Fernandes promete levar ao palco um espectáculo com as características a que o público está habituado. Como tal, há lugar também para a exibição dos habituais vídeos que a companhia apresenta, plenos de crítica social, “para entreter o pessoal”. Para o encenador, este ano estão reunidas as condições para as gargalhadas se espalharem pela plateia. Nesse capítulo, o encenador sabe que o público é o último juiz da qualidade da peça, do trabalho feito pela companhia, sendo que o riso é o reflexo honesto da receptividade ao espectáculo.

Para tornar a peça inteligível, uma vez que é interpretada numa língua pouco usada, o encenador revela que suavizou um bocado a língua. Neste caso, Senna Fernandes apoia-se na linguagem universal da comédia. “Usamos muita linguagem corporal e usamos as pausas para colmatar a falta de conhecimento do patuá”, releva. Mas não há razões para preocupações em falhar os punchlines, uma vez que a peça será, como é norma, legendada.

A presença do Grupo de Teatro Dóci Papiaçám di Macau é uma presença habitual no FAM. “A minha sina é escrever e encenar uma peça por ano, para o festival”, brinca Miguel de Senna Fernandes. Além de ser uma afirmação da cultura local, esta é uma questão de sobrevivência de uma língua em vias de extinção, mas que não desiste. A mensagem é: “Estamos aqui, estamos vivos e estamos a fazer pessoas rir”.

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