Xadrez | Equipa chinesa campeã do mundo faz visita a Macau

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ela primeira vez na história do xadrez, a China sagrou-se campeã do mundo, no ano de 2015. E, ocasião única, também pela primeira vez vem esta equipa a Macau. A equipa campeã chega este sábado, 9 de Janeiro, à RAEM, onde permanecerá até segunda-feira, inclusivé, para promover o xadrez, também num acto de amizade da Associação de Xadrez da China para apoiar o trabalho de desenvolvimento de xadrez que está a ser feito pela Associação de Xadrez de Macau, Grupo de Xadrez de Macau.
Trata-se, também, de um exemplo de feliz coordenação do Governo Central com a RAEM. Por um lado, esta equipa é verdadeiramente um dos bons “rostos” da RPC no mundo, numa arena particularmente querida que é a dos jogos mentais. Por outro lado, e verdade seja dita, o xadrez em Macau tem vindo a ser inteligentemente apoiado pelo IDM e este é mais um bom exemplo de visão.
O outro, por enquanto menos visível porque planificado para o médio e longo prazo, é o programa de divulgação do xadrez nas escolas que se encontra em curso desde o ano passado. Efectivamente, a Associação de Xadrez de Macau, assistida pelo Governo, está actualmente envolvida num programa de ensino de xadrez, iniciado em 2015, em 16 escolas, que envolve cerca de 400 estudantes primários e secundários.
Não por acaso, a equipa chinesa vai também visitar algumas das escolas na segunda-feira para compartilhar alguns dos seus conhecimentos e para tirar uma foto com os jovens alunos de xadrez, disseminando ainda mais a sua prática.
Voltando concretamente à delegação chinesa, falamos de um alto dirigente, 4 xadrezistas que fazem parte do lote dos melhores jogadores do mundo e que jogam ao mais alto nível nos mesmos torneios internacionais em que figura, por exemplo, o campeão mundial Magnus Carlsen, bem como toda a elite xadrezística mundial e ainda treinadores, também eles Grandes-Mestres mas menos no activo, antes tendo por missão a preparação física, mental e psicológica da equipa, ao detalhe, à boa maneira chinesa.
A composição da delegação é a seguinte: Capitão: Sra. Tian Hongwei (田红卫), Vice-Delegada Geral da Federação de Xadrez da China; Treinadores: GM Xu Jun (徐俊) e GM Yu Shaoteng (余少 腾);
Jogadores: GM Wang Yue (王 玥), GM Bu Xiangzhi (卜祥志), GM Yu Yangyi (余 泱 漪), GM Wei Yi (韦奕).Estamos na presença de alguns dos mais altos QI’s do mundo.
Os campeões vão jogar este domingo, a partir das 10:00, no pavilhão Desportivo do Tap Seac, uma exibição simultânea de xadrez, gratuita, limitada a 200 jogadores do público que os queiram desafiar, com inscrição e admissão entre as 9h00-9h30. Cada um, irá enfrentar, simultaneamente (daí o nome, “partida simultânea”) 50 adversários e todos estes, cada qual com o seu tabuleiro, cada qual com a sua partida, o enfrentam a ele. Mas, note-se, espera-se uma simultânea eclética onde a par de jogadores oficiais de Macau estarão outros que apenas gostam de jogar.
Também se pretende divulgar a modalidade junto das crianças e dos jovens, tenham muitos ou poucos conhecimentos de xadrez, desde que se interessem. Qualquer pai pode vir com os seus filhos, mesmo que eles só conheçam as regras e os movimentos das peças, desde que gostem de jogar. Entretanto, fica prometida uma entrevista com todos eles para depois desta passagem por Macau, a ser aqui publicada.

Os jogadores

Wang Yue ( 王玥; nascido a 31 de Março de 1987) tornou-se, em 2004, no 18º GM chinês com a idade de 17 anos. De Março a Dezembro de 2008, Wang Yue esteve 85 jogos consecutivos sem uma derrota, um feito histórico. Foi também o primeiro jogador chinês a entrar no top 10 do xadrez mundial, o que aconteceu em Janeiro de 2010. Foi o tabuleiro nº 1 da selecção olímpica chinesa que ganhou a medalha de ouro em 2014. Wang é actualmente um estudante de “Estudos de Comunicação” na Faculdadede de Artes Liberais da Universidade de Nankai em Tianjin.

Yu Yangyi (余泱漪; nascido em 8 de Junho de 1994) chegou a Grande Mestre com 14 anos, 11 meses e 23 dias em 2009. Em Dezembro de 2014, venceu o 1º Open de Mestres do Qatar, tendo vencido, entre outros, o russo Vladimir Kramnik e o holandês Anish Giri, actualmente, os nºs. 2 e 3 do mundo. Em Dezembro passado, no 2º open de Mestres do Qatar terminou em primeiro lugar ex-aequo com o actual campeão do mundo, Magnus Carlsen, tendo este feito juz às suas credenciais de campeão no desempate por partidas Blitz, ao ganhar-lhe por 2-0. Fez parte da equipa da China que venceu os Jogos Olímpicos de xadrez de 2014 e da equipa da China que recentemente venceu o Campeonato Mundial de xadrez por Países em 2015. Foi medalha de ouro individual no tabuleiro nº 3 com a melhor “performance” de todo o evento. Fora do mundo do xadrez, Yu estuda Economia do Desporto na Universidade do Desporto de Pequim.

Bu Xiangzhi (祥志; nascido em 10 de Dezembro de 1985) foi campeão da China em 2004 e também fez parte da selecção nacional que ganhou os jogos Olímpicos de 2014 e o campeonato por Países de 2015. Em 1999, ele tornou-se no 10º Grande Mestre da China com 13 anos, 10 meses e 13 dias, na altura, o mais jovem GM do mundo na história do xadrez. Já esteve em Macau em 2007, por altura dos Jogos Asiáticos, onde me concedeu uma interessante entrevista que aqui foi então publicada.

Wei Yi (韦奕; nascido em 2 de Junho de 1999) é um jovem prodígio do xadrez. Em 1 de Março de 2013 alcançou o título de GM aos 13 anos, 8 meses e 23 dias de idade, sendo, na altura, o quarto mais jovem a consegui-lo na história do xadrez. Em Novembro de 2014, Wei, tornou-se o mais jovem jogador a ultrapassar a barreira dos 2600 pontos “Elo” (Sistema de “rating” do xadrez, semelhante ao “ATP”, do ténis) , quebrando o recorde histórico que era até aí detido pelo filipino naturalizado americano, Wesley So. Wei tem um estilo de jogo audaz, pleno de imaginação e recentemente foi alvo das atenções de todo mundo xadrezístico, incluíndo Garry Kasparov, por uma partida das mais belas da contemporaneidade, por alguns considerada a partida da década, em Danzhou, em 07/04/2015. Foi ao estilo antigo e romântico, com sacrifícios de peças uns atrás dos outros que obrigaram o Rei adversário a fugir por todo o tabuleiro até levar Xeque-Mate, que Wei Yi derrotou o GM cubano Lazaro Bruzon e que espero poder aqui trazer brevemente.

Texto de João Valle-Roxo

8 Jan 2016

Natal (não) Macaense

[dropcap style=’circle’]M[/dropcap]acau, 1 de Janeiro de 2016: em tempos passados hoje seria indubitavelmente um dia de cérebro embrumado resultante de uma violenta noite bem regada festejando a entrada no novo ano.
Mas para mim há muito que a passagem de ano deixou de ser assim, tendo-se transformado num acontecimento banal, um fenómeno de calendário e pouco mais, sendo por isso incapaz de olhar para a coisa como um evento propriamente dito, muito menos algo passível de ser festejado.
Acordamos no dia seguinte com a sensação de que está tudo diferente por se tratar de um ano novo?
Não.
Quanto ao Natal:
No passado cheguei a viver o Natal com alguma intensidade. Não apenas por ser miúdo, por causa das festas e das prendas, ou porque ainda acreditava no Pai Natal.
Nada disso e muito pelo contrário até.
O período de Natal era das poucas alturas do ano em que o meu irmão e eu tínhamos forçosamente de andar rigorosamente bem vestidos, no sentido formal e clássico do conceito.
Em casa as celebrações começavam com o jantar de Consoada no dia 24 de Dezembro. Regra geral em tantos anos nunca falhou a Sopa Lacassá, a Capela, o Tacho, o Peixe no Forno e o Camarão Abri-costa. Foram estes os pratos preferidos durante muitos anos.
Chegava-se ao fim do jantar com goma nos lábios – o Tacho genuíno deixa sempre goma nos lábios – e ainda uma mesa bem artilhada de iguarias macaenses: Genete, Farte, Alua, Ladu, Coscorão, Cake e mais, muito mais.
Habitualmente era já altura de nos prepararmos para a missa do Galo. Na igreja não havia as multidões que há hoje nem os curiosos que, chan yit lau (*), aparecem lá munidos de gorros de Pai Natal com luzes. A igreja ainda era uma igreja e podia-se entrar com calma, serenidade e paz.
No fim da missa ficava-se no adro, cumprimentando os presentes, desejando bom Natal e boas entradas. Regressávamos a casa onde nos aguardava uma canja de galinha. E logo a seguir era xarope, chichi, cama, pois acordava-se com um dia longo pela frente.
O nosso dia de Natal começava bem cedo porque logo de manhã saíamos de casa para visitar, um a um, os familiares mais seniores: avós, tios-avós e ainda “outros legítimos superiores” (**), uma tradição que entre nós, macaenses, se entendeu chamar por “via-sacra”. (***)
Eram muitas as visitas pois falamos aqui de uma família numerosa. O que vale é que era um Macau sem os problemas de trânsito actuais. Vivíamos na Penha e ainda antes de entrarmos no carro, logo à porta de casa, começávamos por visitar umas tias que moravam ali ao lado.
Continuava-se depois pela Barra, Chunambeiro, Rua Pedro Nolasco da Silva, Rua Nova à Guia, Rua D. Belchior Carneiro, não se excluindo pelo meio eventuais paragens em lares de idosos ou no hospital onde poderíamos ter de visitar também alguém.
A nossa via-sacra terminava habitualmente no Toi San. Portanto, atravessávamos a cidade de uma ponta à outra, num carro que saía de casa cheio de prendas e que, frequentemente, regressava ainda mais carregado.
Os nossos familiares tinham sempre as casas bem ornamentadas e preparadas para receber as visitas. Dava-se as boas festas e fazia-se sala, convivia-se amenamente. Brindava-se à saúde de todos com pequenos cálices de vinho do Porto e a seguir bebia-se um chá quente enquanto se petiscava.
O meu irmão e eu não corríamos de um lado para o outro como hoje se vê vulgarmente entre a criançada. Não que alguém nos tenha expressamente dito que não nos era permitido, simplesmente com todo aquele ambiente formal, ma non troppo, sabíamos que não era suposto. Recebíamos as prendas, que alguém nos vinha trazer da árvore de Natal, agradecíamos, mas não abríamos logo. E permanecíamos sentados a conversar com os adultos.
Não era frete nem nunca me lembro de ter comentado com alguém de que aquilo tudo era aborrecido. Era o que era e fazia parte do Natal. Convivia-se com cortesia, de forma polida, e foi também assim que cresci, aprendi a socializar e a ser adulto. E numa altura em que não existia nem internet nem Facebook, era também uma oportunidade para captar novidades dos nossos parentes na diáspora. Não era, por isso, inconsequente.
O Natal foi assim durante muitos anos, passou a ser uma rotina. Não sou muito de repetições, mas nessas coisas há algo de romântico quando se faz exactamente o mesmo de ano para ano. A familiaridade do cenário revisitado dá-nos conforto e ajuda a solidificar as recordações.
Com o passar do tempo e por diversas razões, deixámos de fazer via-sacra no Natal. Os encontros de Natal com os nossos familiares passaram a ser diferentes e, nesse novo contexto em que uns deixaram este mundo e outros cresceram e multiplicaram-se, para meu desagrado comecei a constatar que se deixou de conviver da mesma forma – não sei bem porquê.
Trata-se do reconhecimento de um facto e também de uma crítica aberta àqueles que, por algum motivo que desconheço, até parece que não foram educados pelos mesmos que no passado nos direccionaram a comportarmo-nos no Natal com urbanidade, sem histeria nem algazarra. Dói-me o coração quando, na qualidade de macaense, observo a conduta de alguns e verifico que, no espaço de uma geração, tanto se perdeu da nossa identidade.
Sei que os tempos são outros e não fará muito sentido exigir-se o formalismo de outrora nos dias actuais. Mas que haja algum equilíbrio e bom senso – afinal, somos macaenses e ainda há não muito tempo atrás chegámos a passar o Natal juntos num ambiente um pouco diferente, um pouco mais polido.
Não é elitismo, tradicionalismo, conservadorismo ou qualquer outro tipo de “ismo” barato. É ter consciência da riqueza da nossa identidade e não aceitar que, de repente, se passe a celebrar essa importante festividade de forma inadequada, a conviver aos berros, com empanturramentos e encharcamentos de comida e álcool despropositados.
Passei por isso a encarar o Natal com mixed feelings. Porque infelizmente hoje associo todo o período do Natal e passagem de ano a excessos: excesso de festas, excesso de prendas, excesso de lucky-draws, excesso de ambiente carnavalesco, excesso de comida, excesso de álcool, excesso de barulho, excesso de má-educação, excesso de mensagens superficiais e inconsequentes no Facebook, SMS, Whatsapp, WeChat, enfim, excesso de excessos. E todos esses excessos aborrecem-me.
Abomino o discurso “no meu tempo era melhor”, mas tenho sinceramente saudades do Natal do meu tempo, da via-sacra, dos brindes com vinho do Porto, de ser obrigado a andar bem vestido, de fazer sala, de todo aquele formalismo.
Porque as mudanças só fazem sentido quando se ganha alguma coisa no processo. E aqui, caríssimo leitor, posso assegurar que não se ganhou rigorosamente nada. Só se perdeu.
Em tempos um amigo meu afirmou que o Natal passou a ser de tal forma incompreensível que devia ser como o mundial de futebol: apenas de quatro em quatro anos. Respondi com um encolher de ombros. Mas confesso que quanto mais penso no assunto, mais me parece fazer sentido.
Só não deixo que essa ideia ganhe ímpeto porque felizmente sou ainda capaz de ver o que para mim passou a ser o lado positivo e a essência do Natal: um período de descanso que me permite estar com a família.
Por outro lado, sendo macaense e pai, tenho consciência de que cabe a mim fazer com que os meus filhos cresçam celebrando o Natal com a devida importância e de forma adequada à nossa herança cultural. E sem excessos.
Para que do Natal guardem apenas boas recordações.

Sorrindo Sempre

Um dia, no prédio onde moro, entrei no elevador com o meu filho que trazia com ele uma vassoura para pôr no lixo. No elevador estavam duas mulheres e um homem. E como o pau da vassoura era maior que o meu filho de 5 anos, a coisa cambaleou um pouco dentro do elevador.
“Vê lá! Não me espetes com o pau entre as pernas!”, ouviu-se em português, saído da boca de uma das mulheres. Eram os três portugueses, portanto.
Aturei muito disso em Portugal. Ter de aturar o mesmo em Macau custa ainda mais. Respirei fundo e disse ao meu filho, alto e bom som, mas num tom muito calmo e em português: “Diogo, tem cuidado com a vassoura.”
Ficaram os três com cara de chupâ ovo.
Sei que devem ter pensado que não temos cara de quem fala português. E sei também que quem pensa assim em pleno século XXI, na RAEM, 15 anos após a transferência, tem de ser necessariamente mentalmente estreito.
Sorrindo sempre.

(*) 趁熱鬧 : expressão típica em cantonense para aqueles que se juntam a multidões apenas com o intuito de não ficar a perder o que quer que seja, mas sem saber ao certo o que se está a passar.
(**) Do Quarto Mandamento da Lei de Deus.
(***) Leia-se “viassácra”, sem acento tónico na palavra “via”.

8 Jan 2016

Livr(o)e

[dropcap style=’circle’]1.[/dropcap] Aprendi a ler muito cedo, porque quis. Na altura não tinha noção de que saber ler era meio caminho andado para o combate ao tédio, porque desconhecia a palavra. Também não sabia o significado de solidão, filha não única mas sem outras crianças em casa. Com os anos, os livros passaram a ser companhia constante, vício, virtude também. Inundavam as tardes abafadas e intermináveis de Verão. Apagavam as noites de insónia.
Os livros. Só mais tarde, muito mais tarde, percebi a libertação que me trouxe o acto da aprendizagem da leitura. Ler liberta. Ler é poder ir a todos os lados, conhecer todas as pessoas, incluindo aquelas que nunca vimos, que falam línguas que não conhecemos. Ler é prepararmo-nos para o que o mundo tem de diferente. Ler é liberdade.
Às tantas é esta liberdade toda que faz com que goste que a minha filha goste de letras, apesar de ainda não ter idade para saber ler. Gosto que ela goste de livros, que me roube os livros das estantes e brinque com eles, que goste dos livros dela. Quero que possa ler tudo, que todos os livros do mundo estejam ao seu alcance. A minha mãe viveu o tempo em que havia leituras proibidas. A mim foram-me dadas toda as letras que consegui apanhar.
Não conheço o teor dos livros que se vendem que nem ginjas em Hong Kong, e em Macau também, e que são proibidos na China. Os livros que, ao que dizem, são os responsáveis pelo desaparecimento de cinco pessoas que viviam num espaço que julgávamos ser de liberdade. Não sei se os livros são bons ou maus, se contam histórias verdadeiras ou falsas. Só sei que são livros. E que tudo o que se escreve – nos livros e nos jornais – é um exercício de liberdade. Uma liberdade que, quando viola os outros direitos que também temos, deve ser avaliada em sede própria. É assim que acontece nos sistemas que, julgávamos, se regem pelos princípios do Estado de direito.
É estranha a história de Lee Bo. Como é estranho o desaparecimento dos quatro colegas, em Outubro passado, que não mereceu a atenção de ninguém: umas quantas linhas na imprensa local e uma silenciosa reacção da comunidade dita internacional e mais livre. É estranha toda a narrativa, tudo aquilo que nos têm dito. E os livros no meio de tudo isto. Ler. Ser livre.

2. Eles dizem que foi uma bomba a sério, os outros desconfiam. Vivemos – nós, aqui perto, e os outros, mais longe – com um problema sério que tem sido olimpicamente ignorado pela tal comunidade internacional defensora da liberdade, não da dos livros, mas de outra liberdade qualquer cujos contornos, frequentes vezes, não consigo perceber.
Desde que vim para Macau que me comecei a interessar pelas questões coreanas. Afinal, é aqui ao lado. No início era a curiosidade que me despertava um regime que parou no tempo; depois, com os livros que fui lendo, a vontade de criar uma imagem de um país que dificilmente conhecerei de outra forma.
A Coreia do Norte é a prova de que o mundo é uma coisa muito mal-amanhada e muito mal resolvida. É a prova também de que o xadrez da política internacional é um jogo sujo que não serve ninguém – nem os povos que alegadamente estão representados, nem os povos sem voz, aqueles que só merecem a preocupação de meia dúzia de organizações não-governamentais e de outros tantos observadores indignados.
Pyongyang tem sido um problema conveniente que a China tem no quintal. Ontem lia especialistas na matéria, todos eles chineses, dizerem que dificilmente Pequim terá uma atitude interventiva em relação ao regime que tem vindo a proteger porque não só tem perdido influência na liderança sem tino de Kim Jong-un, como também passaria a contar com dilemas adicionais resultantes de uma eventual queda do regime. Mas, explicam também esses especialistas, um quintal com competências nucleares não serve a Pequim. E não serve ao resto do mundo.
O mundo tem, aparentemente, mais um problema para resolver – um problema com que os norte-coreanos, esfomeados e perseguidos, vivem há 60 anos. Pois. Essa coisa da liberdade.

8 Jan 2016

Felix Januário Vong: “As minhas memórias estão em Macau”

[dropcap style=’circle’]É[/dropcap] um jovem finalista da licenciatura em Design Gráfico do Instituto Politécnico de Macau (IPM) e conta-nos que o seu grande interesse é ser fotógrafo. Felix Januário Vong nasceu em Macau e por cá cresceu e assume, em conversa connosco, que tem um hábito diário: colocar todos os dias na sua página do Facebook e do Instagram as fotografias que vai tirando. A ideia? Chamar a atenção das pessoas para aquilo que gosta mesmo de fazer.
Apesar de chamar casa a Macau, a verdade é que esta terra não é, para Felix, muito atractiva. Algo que pode ter ajudado o jovem a descobrir a sua paixão: é que o interesse de Félix pela fotografia chegou devido a um problema próprio – depois de não ter descoberto nada mais para fazer, mesmo estando há mais de 20 anos a viver em Macau. A terra era, para ele, demasiado pequena e “uma seca”.
“Quando comecei a sair à rua com a máquina, obriguei-me a ver mais coisas à minha volta”, conta-nos, dizendo que agora até tem um sítio preferido, que é o Leal Senado. “Não tenho um destino certo para tirar fotografias, tiro à vontade. Mas gosto do Leal Senado durante a noite. É o sítio onde passo mais vezes, também é simbólico para Macau. Acho que consigo observar muitas coisas lá.”
Quase todas as suas fotografias são tiradas nas ruas, mas não é só pelo trabalho final que Felix carrega consigo a sua câmara. Para o jovem, este interesse fá-lo também perceber uma coisa.
“Na verdade, as pessoas são muito interessantes, muitas são inesperadas. Por exemplo, tirei a fotografia de um grupo de turistas do interior da China. Eles e nós próprios construímos uma cena interessante e única, porque não se pode tirar a mesma fotografia se eles tivessem viajado em Taiwan ou Hong Kong. As pessoas são as mesmas mas as ruas e os edifícios são de tipo europeu. Acho uma coisa muito interessante e que só nós temos aqui”.

Paixão pela arte

Cada vez que passeava, Felix tirava fotografias das ruas, janelas ou apenas das luzes, que começou depois a colocar nas redes sociais. Os passeios surgiram por necessidade.
“No meu curso tenho sempre muitas horas de aulas e muitos trabalhos. Comecei a ter o hábito de me deitar muito tarde durante vários anos. Assim, quando estou de férias ou não tenho nada para fazer, não consigo dormir à meia-noite. Tento, então, passear nas ruas para conseguir dormir melhor”, disse, acrescentando que começou em 2013.
Na altura nem tinha uma máquina boa. Todas as fotos eram tiradas com o telemóvel. Até porque pensou que o interesse nunca seria tão grande: mesmo tendo uma disciplina obrigatória de fotografia no seu curso, Felix gostava mais de ouvir música nos tempos livres.
Mas, a paixão não se escolhe e cada vez mais Felix se apaixonou pela arte de tirar fotografias. Especialmente a preto e branco. Especialmente tiradas à noite. Vai daí, comprou uma câmara melhor.
“Só comprei uma máquina mais profissional no ano passado. Estabeleci uma meta para mim próprio: tirar uma fotografia por dia e pô-la nas redes sociais. Estou sempre com a máquina, até quando vou à casa de banho”, conta a sorrir.
No final de 2014, Felix conseguiu conhecer vários fotógrafos profissionais que também tiram fotografias nas ruas e assim decidiu desenvolver este interesse mais seriamente. Além das técnicas básicas que aprendeu no seu curso de Design, até agora ainda não tirou um curso profissional de fotografia, sendo que aprendeu apenas por apreciar obras de outros.

Sonhos

Através das fotografias que Felix nos mostra, podemos ver que o jovem vai frequentemente a Hong Kong durante as férias ou festivais especiais. Além de ruas, luz e pessoas, este fotógrafo gosta de capturar circunstâncias acidentais. Mais recentemente, o jovem tenta tirar fotografias onde os objectos olham para o foco da máquina.
Mas, mais do que tudo, para Felix o mais importante é ter histórias para contar. “Quero mostrar personagens nas fotografias, além dos sentimentos e ambientes reais. Por exemplo, quando fotografei um ferreiro, capturei não só a pessoa mas também o ambiente de trabalho lotado, porque esta é uma cultura única que só existe em Macau e Hong Kong. Assim crio um significado e deixa as pessoas a pensar na cultura”.
Para o jovem, actualmente Macau está lotada de pessoas e não é fácil procurar espaços tranquilos. Mesmo assim, Felix conta-nos que consegue descobrir características únicas desta pequena cidade.
“Macau é especial na mistura Oriental e Ocidental e eu gosto disso. Nasci e cresci aqui e, mesmo que existam cada vez mais elementos culturais e políticos diferentes, bem como pensamentos e imagens diferentes, a minha raiz e as minhas memórias estão aqui. Gosto de ficar em Macau”.
O jovem estudante de Design admite ser uma pessoa “aborrecida”. Perguntámos porquê e ele explica, na sua visão, o que quer dizer: além de ser fotógrafo, gosta de assistir concertos de rock, ouvir música indie e electrónica, bem como assistir a exposições.
Olhando para futuro, Felix quer fazer documentários de fotografia depois da licenciatura. Acabou de participar na elaboração de uma curta-metragem onde documenta a situação dos mercados, mercearias, fachadas de antigos prédios e os que simbolizam Macau.
“Agora estou a demonstrar a minha faceta mais artística. No futuro, queria fazer fotografias documentais, porque é uma forma de mostrar preocupação por este mundo”, disse.
Mas, Felix gosta do território e não vê muitas oportunidades para isso em Macau. Por isso é provável que volte a trabalhar na área de Design. Por enquanto, as fotografias que o jovem vai tirando podem ser vistas na sua página do Facebook.

8 Jan 2016

Coreia do Norte diz que testou pela primeira vez bomba de hidrogénio

O regime de Pyongyang afirma ter feito explodir uma bomba de hidrogénio. A condenação é geral. A China retira gente da fronteira

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Coreia do Norte afirmou ontem ter realizado, com sucesso, o seu primeiro teste nuclear de hidrogénio, dando um significativo passo no desenvolvimento do seu programa nuclear. “O primeiro teste com bomba de hidrogénio da República foi realizado com sucesso às 10:00 do dia 6 de Janeiro, 2016, baseado na determinação estratégica do Partido dos Trabalhadores”, anunciou a televisão estatal norte-coreana.
Vários centros de actividade sísmica detectaram ontem um abalo na Coreia do Norte, levantando-se, de imediato, a possibilidade de ter sido causado por um teste nuclear. “Com o sucesso total da nossa histórica bomba-H, juntámo-nos ao grupo dos Estados nucleares avançados”, anunciou Pyongyang, acrescentando que o teste foi feito com um dispositivo “miniaturizado”.
O teste foi encomendado pessoalmente por Kim Jong-un e aconteceu dois dias antes do seu aniversário. No mês passado, durante uma inspecção militar, Kim sugeriu que Pyongyang tinha já desenvolvido uma bomba de hidrogénio, apesar de o anúncio ter sido acolhido com cepticismo por especialistas internacionais.
A bomba de hidrogénio, ou termonuclear, usa a fusão nuclear numa reacção em cadeia que resulta numa explosão poderosa. “O último teste, totalmente assente na nossa tecnologia e pessoal, confirmou que os nossos recursos tecnológicos, recentemente desenvolvidos, são precisos e demonstram cientificamente o impacto da nossa bomba-H miniaturizada”, disse o apresentador televisivo, que transmitiu a mensagem do regime.
A realização efectiva do teste tem ainda de ser confirmada pela comunidade internacional. Apesar de se comprometer a não ser o primeiro a recorrer à bomba, o regime de Pyongyang indicou que continuará a desenvolver as suas capacidades de ataque nuclear. “Enquanto persistir a política anti-Coreia do Norte dos Estados Unidos não vamos parar de desenvolver o nosso programa nuclear”, afirmou.

Chineses deslocados

Entretanto, os chineses que residem em zonas perto da fronteira com a Coreia do Norte foram deslocados de suas casas, após o anúncio da realização de um teste nuclear, informa a imprensa oficial. Os residentes fronteiriços “sentiram claramente tremores”, após Pyongyang ter detonado o que diz ser uma bomba de hidrogénio, afirmou a emissora pública chinesa CCTV. As zonas evacuadas incluem Yanji, Hunchun e Changbai na província de Jilin. Segundo a televisão chinesa CCTV, os residentes de Yanji viram as mesas e cadeiras abanarem durante vários segundos e algumas empresas ordenaram aos funcionários que abandonassem os escritórios. Os estudantes de uma escola secundária foram dispensados durante um exame depois de uma fenda ter surgido no pátio.

Japão e EUA medem radiação no ar

Por seu lado, o Japão e os Estados Unidos enviaram ontem aviões de reconhecimento para uma área próxima da península coreana para medir a radioactividade no ar, depois de o governo norte-coreano ter anunciado o primeiro teste de uma bomba de hidrogênio. Um avião das Forças de Defesa do Japão vai recolher amostras de ar para analisar a presença de partículas radioactivas, o que representaria um indício do novo teste atómico desenvolvido pelo regime de Kim Jong-un, informaram fontes governamentais à agência Kyodo. Os Estados Unidos também enviaram aviões para o local com o mesmo objectivo, como fizeram em testes nucleares anteriores da Coreia do Norte, em 2006, 2009 e 2013, disse à agência Efe um porta-voz do Ministério da Defesa japonês. Os testes para detectar material radioactivo podem fornecer informação sobre a natureza do teste nuclear. No último teste atómico norte-coreano, em 2013, os aviões de reconhecimento não encontraram quaisquer vestígios, o que poderia indicar que o país fechou totalmente os túneis onde ocorreu a explosão.

China | Firme oposição

A China, o principal aliado da Coreia do Norte, disse ontem que se “opõe firmemente” ao teste nuclear de Pyongyang, acrescentado que o ensaio foi realizado “apesar da oposição da comunidade internacional”. “Instamos fortemente a DPRK [Coreia do Norte] a respeitar o seu compromisso de desnuclearização, e a suspender qualquer ação que possa tornar a situação ainda pior”, afirmou a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Hua Chunying.

Japão | Condenação veemente

O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, condenou hoje o teste de uma bomba de hidrogénio, anunciado pela Coreia do Norte, considerando-o uma “ameaça grave” para o Japão e um “sério desafio” aos esforços de não-proliferação nuclear. “Condeno-o veementemente”, afirmou Abe. “O teste nuclear que foi realizado pela Coreia do Norte é uma grave ameaça à segurança da nossa nação e não podemos, absolutamente, tolerá-lo”, disse. O primeiro-ministro nipónico considerou também que o teste representa “um sério desafio aos esforços internacionais de não-proliferação” nuclear.

Hidrogénio, mas pouco

O Ministério da Defesa da Coreia do Sul afirmou ontem que as autoridades do país acreditam que o ensaio nuclear ontem anunciado por Pyongyang envolveu uma pequena quantidade de hidrogénio.
“Vamos descobrir o que aconteceu depois de uma análise mais aprofundada, mas o que sabemos, para já, é que uma pequena quantidade de hidrogénio foi utilizada no quarto teste nuclear” da Coreia do Norte, explicou o porta-voz do ministério, Kim Min-seok, citado pelo serviço noticioso online MoneyToday.
O anúncio norte-coreano, ontem de manhã, acerca de um primeiro teste com uma bomba de hidrogénio começou por ser recebido com algum cepticismo. Peritos ouvidos pelas agências internacionais levantaram dúvidas sobre a verdadeira composição do ensaio levado a cabo pelo regime de Kim Jong-un, afirmando que a actividade sísmica provocada pela explosão sugere a utilização de um explosivo com menos potência.
O especialista australiano Crispin Rovere, perito em controlo de armas e em política nuclear, entende que o tremor de terra de magnitude 5.1 registado no local de testes nucleares de Punggye-ri, na Coreia do Norte, não sustenta a notícia avançada por Pyongyang.
“Os dados sísmicos que foram recebidos indicam que a explosão é provavelmente mais fraca do que seria de esperar de uma bomba de hidrogénio”, aponta. “Parece que conseguiram conduzir com sucesso um teste nuclear, mas não foram bem-sucedidos na segunda fase da explosão do hidrogénio.”
Também Choi Kang, vice-presidente do Instituto para o Estudo de Políticas Asan, com sede em Seul, tem reticências em relação à verdadeira natureza da explosão. “Não me parece que tenha sido um teste de uma bomba de hidrogénio. A explosão teria de ser maior se fosse uma bomba desse género”, defende.
A Coreia do Norte, um dos regimes mais fechados do mundo, tem feito vários anúncios em torno do armamento nuclear de que dispõe, mas são alegações que, até à data, estão por confirmar. Entre as capacidades bélicas que Pyongyang diz ter está a possibilidade de um ataque aos Estados Unidos, uma hipótese que, até à data, tem sido afastada pelos especialistas na matéria.
Bruce Bennett, analista de defesa a trabalhar para a Rand Corporation, não estava ontem convencido da autenticidade do anúncio norte-coreano: “Se fosse uma verdadeira bomba de hidrogénio, o registo na escala de Richter teria sido muito mais forte do que aquele que vimos”.

Coreia do Sul | Isto muda tudo

A presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye, disse que o país vai tomar medidas firmes contra qualquer provocação adicional da Coreia do Norte e trabalhar com a comunidade internacional para garantir que Pyongyang pague o preço pelo seu mais recente teste nuclear. Em declarações divulgadas pelo gabinete presidencial sul-coreano, Park disse que o novo teste pode mudar a natureza fundamental da situação sobre o programa nuclear da Coreia do Norte. Separadamente, a agência de notícias sul-coreana Yonhap disse que o serviço de inteligência de Seul acredita que a potência da explosão provocada pelo teste norte-coreano foi equivalente a 6.0 quilotons.

Reino Unido | Grave provocação

“Se um dispositivo nuclear foi detonado pela Coreia do Norte, isto é uma grave violação das resoluções do Conselho de Segurança da ONU e uma provocação que eu condeno”, disse o ministro de Relações Exteriores do Reino Unido, Philip Hammond. “Estamos a trabalhar com outros membros do Conselho de Segurança da ONU para garantir que a comunidade internacional responda com urgência e de forma decisiva esta ação da Coreia do Norte”, acrescentou Hammond.

França | Violação inaceitável

“A França condena esta violação inaceitável das resoluções do Conselho de Segurança da ONU e apela a uma forte reacção da comunidade internacional”, afirmou o gabinete do presidente francês, François Hollande.

Austrália | Um país perigoso

Julie Bishop, MNE australiana, afirmou em um comunicado que a acção “confirma o país como ‘perigoso’ e uma contínua ameaça à paz e segurança internacional”.

Rússia | Violação das resoluções da ONU

A Rússia classificou ontem de violação flagrante das resoluções da ONU o anúncio feito pela Coreia do Norte do seu primeiro teste com uma bomba de hidrogénio. «Se esse teste for confirmado, representará um novo passo de Pyongyang no caminho do desenvolvimento de armas nucleares o que constitui uma violação do direito internacional e das resoluções do Conselho de Segurança da ONU», afirmou o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) em comunicado.

Conselho de Segurança reúne de emergência

O Conselho de Segurança da ONU planeava realizar ainda ontem, quarta-feira, uma reunião de emergência para discutir o teste feito pela Coreia do Norte com uma bomba de hidrogénio, disse a missão dos EUA na ONU. Falando à Reuters sob a condição de anonimato, vários diplomatas disseram que a reunião foi marcada para as 11h (22h, pelo horário de Macau). Os diplomatas disseram que a reunião será provavelmente à porta fechada. “Os Estados Unidos e o Japão solicitaram consultas de emergência ao Conselho de Segurança, com relação ao alegado teste nuclear da Coreia do Norte”, disse a porta-voz da missão dos EUA na ONU, Hagar Chemali, em comunicado. “Condenamos qualquer violação das resoluções do Conselho de Segurança e, novamente, pedimos à Coreia do Norte que se adeque às suas obrigações e compromissos internacionais”, acrescentou. Não ficou imediatamente claro qual atitude a tomar pelo Conselho de Segurança, formado por 15 países, em resposta ao comunicado da Coreia do Norte afirmando ter conduzido um teste nuclear. Um diplomata ocidental disse que, caso seja confirmado o teste nuclear da Coreia do Norte, os membros do conselho expandirão as actuais sanções da ONU contra Pyongyang.

7 Jan 2016

Diploma contra violência doméstica pronto “em breve”

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ) afirmou ao Jornal Ou Mun que os trabalhos de legislação da Lei de Violência Doméstica estão “basicamente concluídos”. O organismo acredita que o diploma possa, em breve, ser entregue à Assembleia Legislativa (AL) para entrar em processo legislativo final.
Segundo a publicação chinesa, depois da aprovação na generalidade da Lei de Violência Doméstica, em Janeiro de 2015, a 1.ª Comissão Permanente da AL reuniu várias vezes para discussão do tema. A definição de crime público ou semi-público é a grande pedra no sapato deste regulamento.
Melinda Chan, deputada e também membro da 1.ª Comissão Permanente, confirmou ao jornal que a proposta será apreciada em breve pela AL, indicando que na última o Governo não se mostrou contra a definição de crime público. Sinal, defende, de alguma concordância para com a grande dúvida.
“Depois do Governo entregar a proposta, a Comissão irá reunir outra vez”, confirmou Melinda Chan.
Há mais de quatro anos que o Governo está a trabalhar nesta lei. O trabalho legislativo foi preparado pela DSAJ, pelo Instituto de Acção Social e pela Polícia de Segurança Pública, que será a responsável pela aplicação da lei.

7 Jan 2016

Ensino Superior | Protocolos condicionados por falta de Regime, diz Peter Stilwell

Peter Stilwell defende que a Lei do Ensino Superior – ainda em análise pelos deputados – virá beneficiar, em muito, o sector do ensino superior local

[dropcap style=’circle’]U[/dropcap]ma das alterações positivas que virá com a entrada em vigor da Lei do Ensino Superior será, de acordo com Peter Stilwell, a facilidade na criação de cursos em modelo de intercâmbio. O reitor da Universidade de São José (USJ) relembrou ao HM que o actual modelo educativo universitário não permite este tipo de formatos de aprendizagem, numa afirmação que surgiu na sequência da renovação de um protocolo de cooperação com a Universidade Católica Portuguesa. peter stilwell
“Estes protocolos estão condicionados a uma questão: a actual Lei [do Ensino Superior] não permite a realização de graus com outras universidades ou instituições e só quando a nova lei for aprovada é que esse tipo de protocolos são viáveis”, começou por dizer. “Quando a lei for publicada, já irá ser permitida a realização de licenciaturas, mestrados e até doutoramentos conjuntos, que são coisas que, hoje em dia, são do maior interesse e importância a nível internacional”, acrescentou o responsável. É que está em causa, defende Stilwell, “uma conjugação de competências” em termos do que de melhor cada universidade tem para oferecer.

Ver para crer na qualidade

A Universidade de São José assina, às 10h30 de hoje, um protocolo com Universidade Católica Portuguesa para a realização do curso de mestrado integrado de Teologia. Ao HM, o reitor da USJ explicou que se trata de um acordo que vem sendo renovado desde a sua primeira assinatura, em 2009.
“Começou para que o curso ensinado aqui tivesse uma atribuição de grau pela Faculdade de Teologia da Católica.” Ao curso disponível na USJ acresce mais um ano de estudos para completar o grau desejado e expresso no acordo. “Até agora completaram este curso vários alunos nos últimos dois anos, já que o mestrado dura cinco anos em média”, disse.
A ideia do protocolo é que os alunos locais possam completar cadeiras do curso de Estudos do Cristianismo na USJ para depois terem uma certificação de mestrado da Católica. Os finalistas realizam um exame que será avaliada por um júri seleccionado pela universidade portuguesa e ficam assim com o aval da Católica.

7 Jan 2016

CP | Jurista e deputada defendem criminalização de pornografia infantil

Escapou algo na revisão ao Código Penal: a visualização de pornografia infantil deveria ser criminalizada, dizem analistas

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]advogado Ho Kam Meng e a deputada Wong Kit Cheng defenderam ontem a necessidade de criminalização de actos como o assédio verbal e a posse ou visualização de pornografia infantil. Para o jurista, que ontem falou no programa Macau Talk do canal chinês da Rádio Macau, navegar em sites de pornografia infantil “é a mesma coisa que violar os direitos jurídicos dos menores”. crianças assédio
A revisão do Código Penal (CP) para criar novos tipos de crimes foi um dos temas abordados no programa de ontem. Durante a sessão, um ouvinte disse que a proposta da revisão do CP mencionou o crime de posse e aquisição de pornografia, mas não detém qualquer alínea acerca de pornografia com menores. Cheong Ham, chefe substituto do Departamento de Estudo do Sistema Jurídico e Coordenação Legislativa da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ), foi também convidado para o programa e afirmou que, no âmbito internacional, espera eliminar totalmente eventuais casos que incluam pornografia desta natureza. No entanto, diz, é necessário considerar questões como métodos de recolha de provas e casos concretos para incriminar um suspeito.
“O organismo deve considerar acrescentar uma cláusula para aumentar a protecção. Contudo, se os navegadores não tiverem intenções criminosas, é preciso perceber como lidar com estes casos”, afirmou.
O especialista exemplificou com situações em que a navegação em websites legais é interrompida com a abertura involuntária de janelas contendo estas imagens e vídeos de componente sexual. Em relação ao facto do assédio sexual verbal e da pornografia não estarem incluídas na proposta de alteração ao CP, Wong Kit Cheng defende que o conteúdo das cláusulas devia ser alargado, uma vez que o significado de assédio verbal é demasiado restritivo.
Já o advogado considera que existe dificuldade na recolha de provas para acusar alguém de assédio sexual verbal, mas, adiantou, “não significa que não haja necessidade operacional e real” para implementar este tipo de medidas. O crime não deve ser excluído da legislação, acrescentou.
Cheong Ham, responsável da DSAJ, afirmou que o organismo tem uma atitude aberta sobre a questão do assédio verbal, mas acredita que estes crimes também podem ser resolvidos através de acção cível.
Flora Fong
flora.fong@hojemacau.com.mo

destaque
A proposta da revisão do CP mencionou o crime de posse e aquisição de pornografia, mas não detém qualquer alínea acerca de pornografia com menores

7 Jan 2016

Mais de 230 mil jovens com entrada recusada nos casinos

[dropcap style=’circle’]E[/dropcap]m média, por mês, cerca de 17 mil menores de 21 anos viram-lhes ser recusada entrada nos casinos ao longo de 2015, de acordo com dados facultados à agência Lusa pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ). Ao abrigo da Lei de Condicionamento da Entrada, do Trabalho e do Jogo nos casinos, em vigor desde 1 de Novembro de 2012, os espaços de jogo estão impedidos de contratar ou de permitir o acesso a menores de 21 anos.
Apesar de elevado, o número reflecte uma tendência de diminuição: em 2015 foi recusada entrada a 236 mil menores de 21 anos de idade, ou seja, menos 94 mil do que em 2014. Em 2013, segundo a DICJ, o número de recusas foi exactamente igual a 2014 – 330 mil –, enquanto em Novembro e Dezembro de 2012 – primeiros meses de entrada em vigor da lei – foram 50 mil os menores de 21 anos que ficaram à porta dos espaços de jogo.
Esta lei – que esteve longe de ser consensual – foi beber a outras ordens jurídicas, que embora consagrem os 18 anos como a maioridade definem o tecto dos 21 anos para o exercício de actividades como a entrada em espaços de jogo.
A lei prevê sanções administrativas para quem violar as regras, cujas multas oscilam entre as mil e dez mil patacas. É ainda imposto um “dever de fiscalização” às concessionárias de jogo, cujo incumprimento é penalizado com coimas que vão de dez mil patacas até 500 mil patacas.
Além do Corpo de Polícia de Segurança Pública e da Polícia Judiciária são autoridades competentes para solicitar a identificação dos frequentadores dos casinos e para ordenar a sua expulsão, quando em exercício de funções, inspectores da DICJ e respectivas chefias e os directores dos casinos.

7 Jan 2016

Caso L’ Arc | Angela Leong “desconhece funcionamento” do casino

Instada a comentar o caso do desaparecimento de cem milhões de dólares de HK de uma sala VIP, a directora da SJM diz nada saber

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]ngela Leong, número um da Sociedade de Jogos de Macau (SJM), assegurou ontem não saber como funciona o Casino L’Arc, de onde foram alegadamente desviados cem milhões de patacas investidos numa sala VIP. Instada a comentar o caso, a também deputada não se alongou muito.
De acordo com informações da Polícia Judiciária, o vice-director de uma sala VIP do casino terá desviado 99,7 milhões de dólares de Hong Kong e desaparecido sem deixar rasto, numa situação semelhante à da promotora Dore. Ainda não sabe o nome da empresa que geria esta sala VIP no Casino L’ Arc, mas sabe-se que o rombo levado a cabo por Chan Yan Hung teve impacto em pelo menos dez outras salas do casino.
Ainda assim, questionada sobre o assunto, a directora-executiva da SJM, a quem pertence o casino, afirmou que “não sabe bem o funcionamento financeiro entre as salas VIP e o casino”. Ao canal chinês da TDM, Angela Leong afirmou que não participa na gestão do casino, “nem entende bem o funcionamento das contas”.
Questionada sobre se irá ser a responsável pela eventualidade de indemnizar investidores, Leong respondeu apenas que “não”.

Revisões precisam-se

Para o deputado Zheng Anting este não é só mais um caso semelhante à Dore: é apenas “a ponta do iceberg”. O deputado aponta ter conhecimento de “muitas insolvências de negócios de salas VIP”, o que só mostra, diz, que há “falta de regulamentos ou leis” para um desenvolvimento saudável do Jogo. Zheng Anting pede à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) que acelere a revisão das leis relativas ao Jogo, criando um regime de registo dos trabalhadores dos casinos e diminuindo, assim, a possibilidade de desvio de fundos.
Também o advogado Keon Chan concorda com a necessidade do Governo regular melhor as empresas promotoras de Jogo para que estas não possam transferir o dinheiro dos investidores das salas VIP e que tenham, ainda, de apresentar contas aos clientes.

7 Jan 2016

Pedida transferência de serviços de urgência da MUST para o Carmo

Au Kam San sugere: E se parasse de se gastar tanto dinheiro com o arrendamento de parte do hospital da MUST e se pusesse o Centro de Saúde público do Lago a prestar esses serviços de urgência?

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]deputado Au Kam San quer saber porque é que o Governo não faz a transferência dos serviços e equipamentos de urgência do Hospital da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (MUST) para o Centro de Saúde de Nossa Senhora do Carmo-Lago, na Taipa. O pró-democrata considera irracional o facto do Governo estar a arrendar o espaço, quando poderia apostar no desenvolvimento do Centro de Saúde.
O arrendamento do serviço de urgência da MUST causou polémica em 2011, quando a MUST anunciou a cobrança de 910 mil patacas ao Governo pelo serviço, que está localizado num terreno cedido gratuitamente pelo Executivo à universidade.
“Há alguns anos o Governo arrendou uma parte da área do hospital da MUST para conseguir oferecer serviços de urgência aos residentes das ilhas. Assim conseguiria aliviar a pressão sentida pelo Centro Hospitalar Conde de São Januário. Este arrendamento custava mais de novecentas mil patacas, na altura, por isso é possível que a renda já tenha aumentado muito nos últimos anos. É um valor sobre o qual nada se sabe porque o Governo, até hoje, ainda não divulgou quanto é que gasta”, frisou o deputado numa interpelação escrita.
Au Kam San relembra ainda que vários cidadãos já apresentaram as suas preocupações, no programa de rádio da TDM ‘Macau Talk’, sobre este serviços de urgência, queixando-se que não é conveniente já que falta um sistema completo de transportes na zona. Outros têm vindo a queixar-se de falta de serviços deste género no Centro de Saúde do Carmo.
“Ao mesmo tempo, o Centro de Saúde Nossa Senhora do Carmo-Lago – que é o maior Centro de Saúde – tem um grande espaço de estacionamento e uma boa rede de transportes. Infelizmente, o Centro só está aberto até às oito da noite, ainda que tenha capacidade para ter serviços de urgência. Por isso, queria saber se o Governo tem um plano para transferir os serviços de urgência do hospital da MUST para o Centro”, indaga o deputado, que diz ainda que “a transferência pode fazer poupar dinheiro público” e que é preciso saber quais os gastos correntes que o Governo tem tido com este arrendamento.

7 Jan 2016

Gás natural | Governo continua a negociar com a Sinosky

O Executivo continua a negociar com a Sinosky para resolver os problemas de fornecimento de gás natural, sendo que todas as hipóteses contratuais estão em aberto. Hoi Chi Leong, novo coordenador do GDSE, quer “estabilidade” no fornecimento

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]ano passado a Sinosky foi notícia devido aos problemas de fornecimento de gás natural, tendo sido avançada a possibilidade de rescisão de contrato com a concessionária. Um ano depois, continua tudo em aberto.
“Estamos em negociação com a empresa e vamos encontrar a situação mais viável para resolver a situação. Vamos ver todas as opções para garantir que não há uma interrupção do fornecimento do gás natural”, disse ontem Hoi Chi Leong, novo coordenador do Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético (GDSE), à margem da cerimónia de tomada de posse.
No seu discurso, Hoi Chi Leong disse querer “assegurar a estabilidade e a segurança do fornecimento de electricidade e de gás natural a longo prazo a Macau”, bem como “promover a cultura de conservação energética e de redução de emissões”. O engenheiro promete envidar “os maiores esforços para o desenvolvimento do sector energético”.
Data de 2007 o primeiro contrato para o fornecimento de gás natural assinado entre o Executivo e a Sinosky, sendo que até ao momento pouco foi feito para garantir a totalidade desse fornecimento. Em Agosto do ano passado, os deputados da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Terras e Concessões Públicas já levantaram dúvidas sobre a implementação de uma rede de gás natural no território.
“Esse prazo já passou de metade e ainda não foi celebrado um contrato de fornecimento a longo prazo de gás natural (…) duvidando-se assim da possibilidade de concretização da política de gás natural, lançada pelo Governo”, referiu o representante da Comissão na altura. Actualmente apenas o complexo de habitação pública de Seac Pai Van e o campus da Universidade de Macau (UM) possuem este tipo de fornecimento.

“Uso racional” dos recursos

Num breve discurso, Raimundo do Rosário, Secretário para as Obras Públicas e Transportes disse que Hoi Chi Leong “cumprirá com elevado sentido de responsabilidade estas novas funções”.
“Para que os objectivos possam ser cumpridos, é naturalmente imprescindível a cooperação de todos, empresas e população, pelo que continuar-se-á a investir em trabalhos de educação e sensibilização com vista a uma utilização mais racional dos recursos energéticos”, apontou o Secretário.
O novo coordenador do GDSE não deixou de recordar a sua anterior experiência como director substituto dos Serviços para a Regulação das Telecomunicações (DSRT).
“É do vosso conhecimento que tenho vindo a exercer funções no sector das telecomunicações. Embora este e o sector energético pertençam a duas indústrias com tecnologias diferentes, estão ambas envolvidas com a prestação de serviços públicos em Macau”, referiu. “Aproveitarei a minha experiência anterior no âmbito da Administração e da regulação de serviços de utilidade pública e procurarei familiarizar-me com o funcionamento do serviço e do sector, que para mim são novos.

CEM negoceia tarifas

O novo coordenador do GDSE garantiu que o aumento de tarifas da electricidade ainda está a ser discutido com a Companhia de Electricidade de Macau (CEM). “Ainda estamos em negociações com a companhia sobre o preço da electricidade. O preço da electricidade depende da economia e de outros custos”, explicou.

Terrenos não afectam contrato com Transmac

Raimundo do Rosário garantiu que a questão do terreno concedido à Transmac não está a trazer problemas à alteração do contrato com a operadora de autocarros. “Não, de todo. São duas questões. Uma coisa é o contrato. Há um parecer do CCAC que pede para regularizar a situação e que pede para passarmos isto para a concessão pública. Estamos a tratar disso. E outra coisa totalmente independente são os terrenos em relação à sua caducidade. As Obras Públicas vão iniciar os procedimentos para a declaração da caducidade desses terrenos”, frisou. A empresa está a funcionar com um contrato que não dá grande poder ao Executivo, quando deveria ter um contrato de prestação de serviços.

7 Jan 2016

Subjectividade, alteridade e ficção

Braga, Maria Ondina, A China Fica ao Lado, Instituto Cultural, Macau, 1996.
Descritores: Literatura portuguesa, conto, De longe a China: Macau na historiografia e na literatura portuguesas / coord. Carlos Pinto Santos, Orlando Neves, – 4 vol., p. 1545-1559
Cota: Mc/S234d

[dropcap style=’circle’]M[/dropcap]aria Ondina Braga nasceu em Macau a 3 de Janeiro do ano de 1932 e faleceu em Braga a 14 de Março de 2003. Estudou em França e Inglaterra, tendo-se licenciado em literatura Inglesa pela Royal Asiatic Society of Arts. Trabalhou vários anos como enfermeira durante o período dos seus estudos no estrangeiro. Entretanto viveu em Angola, Goa e Macau, tendo regressado definitivamente a Portugal em 1964. Fixou-se em Lisboa, mas no fim da vida regressou às origens, para a cidade que a viu nascer, Braga. Da sua obra destaco: O livro de crónicas, Eu Vim para Ver a Terra de 1965. Os livros de contos, A China Fica ao Lado de 1968, Amor e Morte de 1970, A Revolta das Palavras de 1975 e O Homem da Ilha e Outros Contos de 1982. A coleção de novelas, Os Rostos de Jano de 1973. E finalmente os romances Estátua de Sal de 1969, A Personagem de 1978 e Nocturno em Macau de 1991. Destas obras eu seleccionei os seguintes contos e crónicas: Angústia em Pequim de 1988, Chá de Jasmim, Coloane, Macau nos Longes do Tempo, Chinesinha, Mulheres de Letras na China Antiga, Macau Uma roda Cega, Nam Van, A Condição Feminina na Literatura Chinesa do Século XX e Porto Interior.

Quase que me atrevo a dizer que escrever sobre Maria Ondina Braga me estava destinado com o sabor de um encontro e de uma fatalidade. E porquê? Desde logo porque os meus mais de dez anos de Macau fizeram com que os nossos caminhos se cruzassem (como eu gosto desta palavra, caminho, que intuitivamente se liga intimamente com andança, paragem, partida, diáspora, etc.). Não sou muito dado a leituras que não deseje e a cultos priveligiados de obras ou autores através de mecanismos de identificação obrigatória, seja pela nacionalidade ou pela língua. As minhas escolhas nunca suportaram esse tipo de condicionamento e não seria agora que o iriam suportar. Como tal grande parte do que se escreveu e escreve em Macau, não me interessa e nunca me interessou e não acabará por me interessar. Mas Maria Ondina Braga interessou-me desde sempre. A trajectória existencial da escritora de Angústia em Pequim, profundamente associada a deslocamentos geográficos constantes, por França, Goa, Angola, Inglaterra e Macau, colocava-a na órbita das minhas potenciais paixões literárias. Propositadamente misturei os lugares, sem nexo e sem fio codutor e sem linha de eventual continuidade histórica, para acentuar a matriz anárquica da deriva, da procura, da insatisfação, pois a haver um nexo, ele não será geográfico, mas ontológico, disso, pelo menos, estou certo. A obra de Maria Ondina Braga é inseparável desta flutução itinerante, desta viagem, deste processo de desenraizamento que me é tão caro. Não sei à partida o que é a causa e o efeito, se a biografia se o Eu. Não sei quem engendrou quem e provavelmente nem fará sentido esse tipo de escrúpulo analítico. A obra seguramente não irá deslindar o ovo da galinha, imbrincados como já estarão lá a vida e a arte, a ficção e a memória. Será a obra e a memória que a vida produziu que determinará a auto consciência de uma dispersão das modalidades existenciais, ou será essa dispersão nativa, autóctone e estrutural, diria, que dramaticamente estimula a vida às travessias, aos exílios e às diásporas reconfigurando no espaço e no tempo o que por si já aparece a si na sua vocação íntima acrónica e atópica, e, quem sabe, por uma demanda insatisfeita e agónica de uma eutopia soteriológica. O que sabemos de modo iniludível, por ser da ordem positiva dos factos é que Maria Ondina Braga, fez da fragmentação uma obra e da prossecução da obra uma vida fragmentada, porque não tenhamos dúvidas era a arte, que nela havia, o motor da sua insatisfação e esta a causa última e primeira do trânsito obstinado. A instabilidade estrutural do eu, ou seja dos eus, ou das suas fragmentações dispersas, encontraria no território da escrita a sedimentação possível de uma ilusão de permanência. Precária ilusão, acrescento sem medo, pois a ficcionalização do eu constitui a máxima artificialidade da ficção. A recriação da unidade do eu que passa primeiro por uma ideia de desdobramento entre a vida, através do exercício da memória, e a subjectividade aí espelhada, acentua ainda mais a inevitável não conformidade entre o ser e o devir. E portanto nesse sentido a ficção alimenta-se de uma ficção e torna-se a ficção suprema. Procuramos ouvir a nossa voz, na ilusão de que ela pode assegurar a transparência fenomenológica da consciência mas, simplesmente, a reelaboração da consciência e da memória nunca são a realidade. Essa realidade em que se acredita, esse modo de pensar que ‘é assim que as coisas estão a acontecer’, ou se passaram, é de uma ingenuidade tocante. A mobilidade territorial do eu, a sua inconstância, a sua alienação quer do ponto de vista da gnose, quer do ponto da afectividade falsifica as próprias modalidades da apropriação e portanto tudo se transforma ou numa forma cristalizada do vivido, que é sempre falsa, ou numa forma de representação onírica que é sempre fluida, projectada apenas como vaga nostalgia ou desejo. Entre estes dois pólos se move a escrita de Maria Ondina Braga. Vamos ver como.
Vou centrar a minha abordagem no conto que transcrevo aqui em parte:

“ (…) Nem no primeiro, nem no segundo, nem no terceiro Natal que passei em Macau, a senhora Tung era cristã, mas todos os anos se nomeava catecúmena. A seguir ao jantar falava-se nisso. A directora, uma francesa de mãos engelhadas que noutros tempos frequentara a Universidade de Pequim, perguntava em chinês formal quando era o baptizado. Inclinando a cabeça para o peito, a senhora Tung balbuciava, indicando a irmã Chen-Mou. A filha… a filha sabia. Talvez se pudesse chamar cristã pelo espírito, mas o coração atraiçoava-a. O coração continuava apegado a antigas devoções… Todavia, vestira-se de gala para a festividade da meia-noite, tinha no quarto o Menino Jesus cercado de flores, e a alma transbordava-lhe de alegria como se cristã verdadeiramente fosse.

O conto é manifestamente autobiográfico e o narrador que neste caso é também manifestamente omnisciente, embora não o pareça, é a própria Maria Ondina Braga. Isso pouca importância teria se não devêssemos exigir à autora um desdobramento que lhe permita o jogo lúdico de uma duplicidade hetero referencial. Nas narrativas autobiográficas o autor é obrigado a produzir dentro de si a emergência de um outro, uma figura da alteridade no seu próprio teatro interior, pois só assim se instala um universo ficcional completo. Muitas vezes nas crónicas essa dimensão especular não chega a aparecer e a narrativa persiste no âmbito de uma veracidade empírica de verosimilhança histórica. Nem o papel ambíguo da memória a salva, pois muitas vezes a salutar ambiguidade e até o anacronismo ficcional é substituído por um rigor positivista eventualmente conveniente na historiografia mas contraproducente na efabulação romanesca. O ideal neste domínio é justamente o contrário do rigor documental e da veracidade confirmável, mas antes o sentimento de dúvida e eventualmente de estranheza ou incredulidade. Será que as coisas se passaram assim? Será que isto é mesmo autobiográfico. Onde começará a ficção e acabará a realidade? Essa perplexidade surge neste texto? E como?
Em minha opinião surge e é isso que faz a diferença entre a boa literatura e a Grande Literatura. Os textos de Maria Ondina Braga contêm aquilo que Mikhail Bakhtin considera imprescindível, o desdobramento da consciência em duas entidades que não coincidem. É a irrupção da alteridade no seio do mesmo que abre o caminho ao processo efabulador e ficcional.
A dado passo ela diz:

“A menina sabia… ― a «menina» era a irmã Chen-Mou, a subdirectora do colégio ―, sabia que ela continuava a venerar a Deusa da Fecundidade. Tratava-se de uma pequena divindade, toda nua e toda de oiro. Fora ela quem lhe dera filhos. Estéril durante sete anos, a senhora Tung recorrera à sua intercessão divina quando o marido já se preparava para receber nova esposa. Não podia portanto deixar de a amar. Toda a felicidade lhe provinha daí, dessa afortunada hora em que a deusa a escutara.
Parava a meio do largo átrio enluarado, de olhar meditabundo, mãos cruzadas no colo. E as palavras saíam-lhe lentas e soltas, como se falasse sozinha…. E aquele mistério da virgindade de Nossa Senhora! Virgem e mãe ao mesmo tempo… Não se lia no Génesis: «O homem deixará o pai e a mãe para se unir a sua mulher e os dois serão uma só carne?» Não era essa a lei do Senhor? Porquê então a Mãe de Cristo diferente das outras, num mundo de homens e de mulheres onde o Filho havia de vir pregar o amor? A Deusa da Fecundidade, patrona dos lares, operava milagres, sim, mas racionalmente, atraindo a vontade do homem à da sua companheira e exaltando essa atracção. Como o Céu alagando a Terra na estação própria.
Retomávamos a marcha em direcção aos nossos aposentos. Difícil para mim responder às dúvidas da senhora Tung, nem ela parecia esperar resposta. Mudava, rápida, de assunto, aludindo ao tempo, à viagem de regresso, às saborosas guloseimas da criada macaísta. Já em casa, convidava-me a ir ver o seu presépio. O quarto cheirava fortemente a incenso. Em cima da cómoda, entre flores, lá estava o Menino Jesus, de cabaia de seda encarnada, sapatinhos de veludo preto, feições chinesas.
(…)
Os olhos da senhora Tung atentavam nos meus, como se à procura de compreensão, mas as suas palavras prontas (a deter as minhas?) eram de autocensura. Não, não devia fazer aquilo. A filha asseverara que o Menino Jesus entristecia, em cima da cómoda, por causa da deusa, na gaveta. E quem sabia mais do que a filha? Eu já sentia frio, apesar da aguardente de arroz. O Inverno, ali, chegava de repente. A senhora Tung, no entanto, tinha as mãos quentes e as faces afogueadas. Despedíamo-nos. Eu sempre me apetecia dizer-lhe que estivesse sossegada, que de certeza o Menino Jesus não havia de se entristecer, em cima da cómoda, por causa da deusa, na gaveta. Mas nunca lho disse nos três anos que passei o Natal com ela. Palpitava-me que a senhora Tung se enervava com o assunto. E que, de qualquer jeito, não me acreditaria”.

Acreditamos que tenha existido esta senhora Tung, mãe de uma freira de nome Chen-Mou e que viesse passar regularmente o Natal naquele colégio de freiras sub entendido e ainda que conhecesse suficientemente bem a Bíblia para discutir a virgindade de Maria, etc. Tudo é verosímil e provável, mas a narrativa, partindo de factos seguramente comprováveis possui a dimensão onírica de uma memória nubelosa à luz da qual, passe o paradoxo, as pessoas e sobretudo a senhora Tung adquirem uma dimensão de personagens que não possuíam na vida real. Trata-se de uma modulação mínima, que instaura os contornos de um universo poiético e que constitui o segredo da literatura. A senhora Tung existiu, vamos acreditar, mas esta senhora Tung, enquadrada do modo como Ondina Braga a concebe, é já uma personagem, enfim o esboço de uma personagem e é dessa personagem que nos começamos a aproximar e a afeiçoar. A senhora Tung só nos atrai e provoca curiosidade porque nos surge transformada pela retorta alquímica da escritora, que ao caracterizá-la fisica e socialmente não como o teria feito a Maria Ondina Braga que com ela contracenou, mas como o faz a escritora que agora no seu gabinete de trabalho a manipula levando-a a adquirir uma aura estranha e fascinante. Nesta mesma transformação é arrastada a própria autora que aqui contracena com a senhora Tung e que a senhora Tung seguramente não conheceu. Em boa verdade a mutação deu-se primeiro em Maria Ondina Braga e só depois por arrastamento em tudo aquilo que ela convoca, a começar pela senhora Tung, que seguramente também não se reconheceria a si mesma agora na pessoa de uma personagem.

7 Jan 2016

Bistro D’Indochine | Paris no copo, China no prato

[dropcap style=’circle’]M[/dropcap]acau tem um novo espaço que pretende juntar o Ocidente com o Oriente. Chama-se Bistro D’Indochine e traz o sabor de Paris ao copo, através dos seus vinhos, e o da China, nos tão típicos noodles que chegam ao prato.
“O Bistro D’Indochine abriu um pouco antes do Natal e o que estamos a fazer é um bistrô estilo francês, que muitas vezes é visto em Paris, mas introduzindo a comida chinesa, assim como as [típicas] baguetes”, começou por explicar Stephen Anderson ao HM, também dono do Café Cathedral.
Do menu fazem parte vários pratos, mas a especialidade é de facto os noodles, assim como típicos vinhos franceses, ainda que haja vinhos também de outros países.
Tal como aconteceu no Café Cathedral, a escolha deste lugar foi altamente pensada. “Um pequeno pátio”, como Stephen Anderson descreve, numa transversal a uma das principais ruas da zona história de Macau. bistro d'indochine
“Temos também uma pequena área de jardim. Limpámos toda aquela zona e neste momento pode ser usada pelos nossos clientes”, aponta, frisando que a intenção é sempre trazer as pessoas à cidade e humanizar mais as ruas.
“O mesmo que acontece no pátio em frente ao Café Cathedral”, reforçou. A proximidade ao Consulado Português é também uma forma de chamar clientes portugueses, adiantou o empresário.
“O que quereremos é basicamente revitalizar a zona histórica da cidade”, frisou. Neste momento, o novo espaço está aberto até às 22h00, todos os dias, mas Stephen Anderson conta, em breve, com a nova licença que permitirá ter o Bistro D’Indochine aberto até à meia-noite. Para os apreciadores de vinho e noodles, o café situa-se no Pátio da Lenha, perto da Rua Pedro Nolasco da Silva.

7 Jan 2016

Novos Aterros | Zona A volta a ter areia para construção

A oferta de areia para a construção da zona A dos novos aterros já está restabelecida, confirmou a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT). Segundo o jornal Ou Mun, nos últimos dias vários navios de transporte de areia e máquinas voltaram a operar na zona. A DSSOPT avançou ainda que, antes do problema de fornecimento de areia, já tinha sido concluído 70% da construção da zona A. Para já, o Governo diz que vai exigir ao construtor o ajuste dos processos da obra, esperando concluir todas as obras relacionadas com as areias já no primeiro trimestre deste ano. O problema da falta de areia na zona A começou em Fevereiro do ano passado, o que causou atrasos na obra, para além das influências na conclusão da ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau.

7 Jan 2016

Túnel da Guia não fica pronto este ano

A construção do túnel pedonal da Guia não deverá estar concluída este ano, já que os Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) ainda só confirmam a conclusão da análise de um estudo sobre a viabilidade da obra para Junho deste ano. Ao HM, a entidade explicou, na versão original da resposta em Chinês, que a análise estará finalizada “no segundo trimestre de 2016”, admitindo que não está ainda definido um orçamento. A resposta indica então que não é certa a construção do referido túnel. Em Novembro passado, a deputada Kwan Tsui Hang pediu esclarecimentos ao Executivo sobre os avanços no processo. O túnel deveria ser construído perto do local onde, antes do Grande Prémio de 2014, foram inauguradas passagens de peões que ligam a zona da Avenida Rodrigo Rodrigues à Guia.

7 Jan 2016

Galeria de arte com workshops até final de Fevereiro

A galeria Macpro organiza, nos próximos dias 9 e 23 de Janeiro e 20 de Fevereiro, três workshops temáticos com lugares limitados. A reserva deverá ser efectuada através de registo prévio no site da galeria e cada curso tem o custo de 350 patacas com direito a chá durante a actividade.
O primeiro workshop, que se realiza já no próximo sábado, vai focar-se no cultivo de mini-plantas, com a condução de Minnian Ng. A artista é professora a tempo inteiro numa escola primária, mas tem as Artes como passatempo, interessando-se especialmente por decoupage, uma técnica de colagem de tecidos em objectos. Este vai das 14h30 às 17h30 e é leccionado em Inglês e Cantonês.
O segundo curso também acontece a um sábado e lecciona a arte do Zentangle – agregação das palavras “zen” e “entrelaçar” –, uma técnica de desenho com figuras estruturadas para criar formas como animais, prédios e até mesmo cidades inteiras. Este é conduzido pelo treinador espiritual Sumitro Wong, que vai ensinar, entre as 14h30 e as 17h30, a arte de desenhar em padrões com o intuito de relaxar e promover o bem-estar interior.
Em último lugar está o workshop de Tarot, onde o monitor Sandeep vai ajudar a que os participantes saibam ler cartas de Tarot, também das 14h30 às 17h30 de dia 20 de Fevereiro. Todas as sessões serão acompanhadas de chá gratuito e terão lugar na sede da galeria de arte, na Avenida de Praia Grande.

7 Jan 2016

Ei. Você aí! Não viu…

[dropcap style=’circle’].[/dropcap]..um livreiro aí? Resolvi acabar a frase no início do texto senão o título ia ficar “de rabo cortado”, como no último texto publicado (cala-te boca). Mas até vem mesmo a calhar, já que falamos de rabos que após contados se apercebe da ausência de cinco deles, aparentemente vis propagadores do mal para uns (sabemos bem quem), e paladinos das liberdades e da democracia para outros (ainda a anunciar): [voz tenebrosa] livreeeeeeiroooos!!! Espera aí, livreiros??? Aqueles velhinhos corcundas com olhos de lupa que na indústria cinematográfica porno estão na categoria de “weirdo”? Essa agora, já não bastava que alguém com a pinta de Jason Chao fosse considerado “inimigo público número um” para certas sensibilidades, e temos “Os doze indomáveis livreiros”, que neste caso são cinco, e terão pavor de borboletas.
“Talvez eu esteja agora aqui a brincar com coisas sérias” – pensarão alguns. “O vosso problema é mesmo esse: pensam, e deviam abster-se dessa inglória e frustrada ambição”, responderei eu, que nada aqui é a brincar, “leidizangentelmén”. Não há nada pior do que me abster de ler notícias, escrever qualquer coisa ou ler mensagens (fiquei dez dias sem abrir o Facebook, pasme-se) desde o Natal até aos reis, e a primeira notícia com que dou de frente com a tromba quando resurjo ao mundo, é esta, do tipo: “Olha, já foste, acabou-se o que era doce”. Deveras. Quem é que podia adivinhar uma coisa dessas, depois de ter andado tanto tempo a brincar com coisas sérias?
Não vou aqui fazer nenhuma leitura política ou qualquer outra deste facto, mas o desaparecimento dos tais livreiros por razões com que nos fingimos surpreendidos são mais do tipo “andas-te a pedi-las”. E acreditem, depois de ter andado o último quartel do ano passado a deparar com pessoas A DESEJAR que acontecessem tragédias para depois usá-las para incriminar um certo grupo de outras pessoas, fiquei mais ou menos imune aos anti-corpos da “indignação”, aquela panaceia para todos os terrores mas administrada na forma de “vai lá tu que eu fico aqui a torcer por ti” – nem sei como é que ainda não se processou judicialmente certos personagens, que iam ao ponto de difundir notícias falsas com o óbvio intento de causar o pânico. Adiante que se faz tarde.
Assim, mal soube da notícia, fui inquirir um colega meu, orgulhoso patriota que nem disfarça – antes ostenta – a sua simpatia e intimidade com o Partido (aquele, “o único”): “Olha lá, onde é que puseste os livreiros desaparecidos? Atão qué isto, uh?”. Ao que ele então retorquiu, identificando de imediato a minha intenção: “Claro… naturalmente!”, e sem mover um nervo em sobressalto, tal era a certeza de que “digam o que disserem, não têm nada contra nós desta vez”. Muito na linha oficial do Partido (o tal), que na forte possibilidade de se dizer do lado do bem e estar a afirmar a verdade, tem adoptado este estilo tão cândido de fada dos nenúfares. É até bem possível que alguém o tenha feito por eles, e sem que eles o encomendassem – ou aprovassem, até. Que sorte e azar ao mesmo tempo, vejam só.
Talvez esta seja a versão em chinês do “quem anda à chuva, molha-se”, que no Ocidente tem paralelo numa certa elite que repete vezes sem conta anedotas sem graça para provocar quem dizem ser “maléfico”, mas que no fundo não é mais do que alguém como nós, e quem já andaram a encher até aos cabelos com provocações parvas. Imaginem só se certos tipos desatassem a molestar-vos a toda a hora, porque “ouviram dizer” que vocês faziam assim e eles assado, e “eles é que estão certos, e vocês são uns bárbaros”. Quanto tempo iam aguentar até ir ao focinho do primeiro que estivesse à vossa frente? Pensamento profundo, mas no fim fico com pena realmente dos livreiros-pessoas, e não dos livreiros-utensílios de arremesso político. Sabe-se lá onde estão, e se estão bem, e se não precisam de tomar de alguma medicação, ou se dormem em ambientes salúbres. Isso é que me preocupa. Falando como pessoa, é claro, para o resto estou nem aí. Vamos ver agora quem “vai à frente”, que a gente fica aqui a “dar a nossa poia moral”.
Para reflectir em 2016, já que 2015 ficou marcado pela queda no ridículo daquilo a que chamam “luta pela liberdade”, com manifestações por tudo e por nada, e sempre com aqueles figurões já com mais que idade para ter juízo, ostentando fitas à volta da mona pedindo “fleedom”. Especialmente encantadora foi aquela greve de fome que se ficou pelo jantar do dia seguinte, aparentemente ao melhor estilo do antigos filmes “B” da antiga colónia britânica, com muito “Amelican style”. “You pay now”. Sayonara.

7 Jan 2016

Coisas que não compreendo

[dropcap style=’circle’]À[/dropcap]medida que vamos ficando crescidinhos, tenho a sensação que em vez de percebermos mais vamos percebendo cada vez menos. Não sei se sente o mesmo mas comigo é o que se passa. Não vislumbro se é fruto de alguma condição somática ainda não diagnosticada o que, claro, me preocupa, por isso resolvi desabafar esperando que talvez você que agora lê esta minha confissão me possa dizer se estou, ou não, a perder o juízo. Ficam aqui um resumo das (muitas) coisas que não compreendo. Neste mundo e nos outros.

Não compreendo porque o Chefe do Executivo da RAEM ainda vai pensar num plano para a diversificação económica de Macau quando isso já foi pedido por Wen Jiabao e por Hu Jintao.
Não compreendo como se pode incrementar a diversificação económica em Macau e cortar os orçamentos dos departamentos do governo que, como se sabe, é o principal motor da economia local.
Não compreendo o que o Governo de Macau entende por diversificação económica.
Não compreendo como o governo de Macau só depois do anúncio das milhas marítimas vai pensar num plano para as águas territoriais. Terá sido uma genuína surpresa de Natal?
Não compreendo a draconiana lei do fumo na cidade do lazer quando, ainda por cima, aparecem cada vez mais opções alternativas (e melhores) nos países vizinhos sem proibições cabotinas como esta.
Não compreendo como a mesma cidade do lazer em vez de fechar ruas ao trânsito e de criar alternativas de transporte não poluente prefere aumentar os impostos sobre veículos, cavando mais divisão social e mantendo um mau ambiente.
Não compreendo como Macau ainda não tem autocarros amigos do ambiente.
Não compreendo porque há tantos autocarros parados com o motor ligado apenas para manter o motorista fresco à custa dos cidadãos que têm de levar com mais diesel pelas narinas acima.
Não compreendo porque a cidade do lazer não tem equipas para investigar os veículos poluentes e os motoristas encalorados como tem para fiscalizar os bandidos dos fumadores.
Não compreendo porque a zona nobre de Macau é dedicada ao estacionamento de autocarros.
Não compreendo porque o plano pecuniário de Macau é atribuído de forma igualitária e não ponderada.
Não compreenderei se o governo não disser o que vai fazer em termos de desenvolvimento económico e social com os 223 milhões que sobraram do apoio pecuniário.
Não compreendo como Macau continua a fazer planos dia a dia e ainda não conseguiu imaginar uma cidade para o futuro.
Não compreendo como o Chefe do Executivo da RAEM pode nomear para a AL indivíduos como Fong Chi Keong e não responder politicamente pelas barbaridades do sujeito.
Não compreendo a plataforma Macaense para a China e os países de língua Portuguesa.
Não compreendo como foi possível o canídromo ver a licença renovada.
Não compreendo porque é a marijuana considerada medicamento nuns países e droga proibida noutros.
Não compreendo a guerra contra a droga.
Não compreendo a relação entre os escândalos bancários em Portugal e o número de arguidos.
Não compreendo o acordo ortográfico.
Não compreendo a presença de um futebolista num panteão.
Não compreendo para que serve um Panteão.
Não compreendo a quantidade de inglesismos utilizados no português de Portugal quando existem palavras no léxico luso para os substituir.
Não compreendo o enorme “tempo de antena” que os média portugueses dão à política quando, no limite, isso faz com que as pessoas se enjoem da política.
Não compreendo como Portugal tem telejornais a abrirem com notícias de futebol.
Não compreendo porque os políticos portugueses mandam tantos bitaites sobre a bola mas quando devem intervir, como no caso dos direitos televisivos, ficam calados que nem ratos.
Não compreendo para que servem as conferências de imprensa da bola se a conversa é sempre a mesma jogo após jogo, ano após ano.
Não compreendo como se gasta tempo num telejornal em Portugal com a conferência de imprensa do bipolar presidente do Real Madrid a falar de treinadores de futebol.
Não compreendo os benfiquistas. Mesmo.
Não compreendo o número avassalador de medalhas que Cavaco já entregou.
Não compreendo como ninguém se apercebe das incongruências do Marcelo Rebelo de Sousa e já todos lhe estendem a carpete para Belém.
Não compreendo a paixão insensata pelo turismo em Portugal.
Não compreendo como antes o nosso dinheiro tinha correspondência directa com ouro e agora não. Nem de longe.
Não compreendo como a NATO ainda não puxou as orelhas à Turquia. No mínimo.
Não compreendo como a Comunidade Europeia tolera no seu seio governos como o húngaro ou o polaco sem lhes puxar as orelhas. No mínimo.
Não compreendo a incapacidade logística e organizativa da Europa para lidar com a crise de refugiados.
Não compreendo como ninguém debate os mapas desenhados a régua e esquadro pelas potências coloniais quando é claro que grande parte dos problemas de África e do Médio Oriente residem neles.
Não compreendo como o mundo actual produz que chegue e tem condições técnicas e humanas para cuidar de todos e continuamos em guerra e com tantos milhões a passarem fome e sem condições dignas para existirem.
Não compreendo porque os detentores do capital tudo fazem para aumentar a desigualdade social quando, a montante, desigualdade crescente implica problemas de rentabilização do capital.
Não compreendo como existem dirigentes de países que se eternizam no poder e o mundo tolera. Para além do Alberto João.
Não compreendo como o Brasil continua a não ser capaz de conter a destruição da Amazónia e ainda não teve qualquer tipo de sanção, ou ameaça de perder a soberania do território a favor das Nações Unidas (esta figura legal se não existe, não compreendo a sua inexistência).
Não compreendo como ninguém leva a sério os líderes sul-americanos que clamam pela dívida europeia sobre as riquezas roubadas durante a colonização, no mínimo como garantia de perdão das dívidas soberanas.
Não compreendo porque a China pretende mais território.
Não compreendo porque os países asiáticos, de uma forma geral, não atribuem a nacionalidade a estrangeiros nem a nados no próprio país que não sejam da mesma etnia.
Não compreendo porque o mapa-mundi do Mercator continua a ser utilizado como “o mapa” se já toda a gente percebeu que está grosseiramente errado nas proporções.
Não compreendo como se permitem indústrias privadas de armamento sabendo que o fito de qualquer indústria é expandir negócio.
Não compreendo como a guerra pode ser privatizada.
Não compreendo como depois do que os judeus passaram os israelitas façam agora parecido aos palestinianos.
Não compreendo como ainda nos dividimos por religiões e dentro das próprias religiões.
Não compreendo como a Arábia Saudita preside à Comissão dos Direitos Humanos da ONU.
Não compreendo as pessoas que concordam com o Donald Trump.
Não compreendo o que Donald Trump pretende dizer com “Make America Great Again”. Está a falar de que período? Da lei seca? Da Colonização? Da Guerra-civil? Do Apartheid? Do “Macartismo”? Do assassinato de Kennedy? Está a falar do quê, exactamente?
Não compreendo como um país tão grande como os EUA precisa de socorrer-se de herdeiros políticos (Bushes, Clintons, Flinstones…) na corrida à presidência.
Não compreendo como ninguém foi punido pelo escândalo das financeiro dos fundos imobiliários de Wall Street. Antes pelo contrário.
Não compreendo como o Federal Reserve Bank pode imprimir notas como se fossem panfletos de massagens em Macau.
Não compreendo os conservadores.
Não compreendo porque os americanos se referem a “afro-americans”, “native americans”, “italian-americans”, “irish-americans”, “asian-americans” e por aí fora. Fico sem saber quem são os americanos no meio de tudo isso.
Não compreendo os americanos de uma forma geral.
Não compreendo como alguém possa pensar que negócios como a Uber são o futuro se apenas promovem emprego precário e sem qualquer tipo de apoio social.
Não compreendo como os indianos ainda não perceberam que grande parte das violações provêm de uma sociedade sexualmente reprimida.
Não compreendo porque o sexo faz tanta confusão a tanta gente.
Não compreendo como se pode ilegalizar a prostituição.
Não compreendo porque os homens podem andar de tronco nú e as mulheres não.
Não compreendo porque o Paris-Dakar ainda se chama Paris-Dakar.
Não compreendo porque o governo Angolano pratica o nepotismo e tem medo de músicos.
Não compreendo porque existem carros que andam a muito mais de 120 km/h e praticamente em todo o mundo ultrapassar esse limite é ilegal.
Não compreendo porque não existem estradas onde se possa conduzir a mais de 120 km/h.
Não compreendo tanta coisa… Estarei doente? Será da idade?

MÚSICA DA SEMANA

“Shameless” – Groove Armada featuring Bryan Ferry
(…) I can read your lips
I can read your mind,
It’s all I want to hear,
Why am I so blind?

And the way we were
Fatefully entwined
In a shameless world,
Rock ‘n roll desire
(…)

7 Jan 2016

A sarça ardente

[dropcap style=’circle’]T[/dropcap]al como a Fénix renasce da sua própria cinza, a sarça – quando parasitada por uma outra planta de frutos e inflorescências avermelhadas – dá-nos a impressão de chamas. Esta planta é mais vulgarmente conhecida como acácia e os seus belos ramos, tão valorizados em ritos e liturgias. A Fénix é uma ave e esta é uma planta: as coisas extraordinárias acontecem entre estes dois planos, de forma sempre renovável, presente e até insondavelmente desafiando muitas leis ditas imutáveis e pondo a funcionar o mecanismo alternativo da realidade paralela, partindo das mesmas organizações internas mas mudando-lhes a forma.
Para os primeiros hebreus, Deus era mesmo designado por “Ehyeh” “Ehyeh-Asher-Ehyeh” – o que habita na sarça – sendo todos os objectos da liturgia feitos a partir dela. A Fénix entrava em combustão e desfazia-se, as suas lágrimas curavam a dor e a doença ao misturarem-se com o que sobrou do incêndio dela; tinha o poder de voltar à vida, a sarça não se consumia, não ardia, não entrava em combustão, era um fogo que não tinha o ciclo transformador. Aparentemente entre uma Sarça e uma Fénix parece haver antagonismo completo: onde mora o estático da planta que arde e não consome?
As árvores sempre guardaram segredos. São os reinos vegetais, tão passíveis de produzir frutos proibidos como comestíveis, a estranha maneira de morrerem de pé com aquilo que por cima delas se passa e aparece, como se o reino vegetal fosse aquele onde os insondáveis caminhos do conhecimento de Deus mais falam sem que possamos extrair de tanta linguagem grande coisa.
É nos ciclos de florestação que os incidentes mais bonitos e estranhos se consumam e quase sempre os seus efeitos, ora perversos, ora benéficos, nos instruem da finalidade sagrada da sua função. As aves quase sempre podem também morrer no ar, que o mesmo é dizer que de pé, mas, no vasto princípio paradisíaco, elas não estavam lá nem se manifestavam, era talvez um paraíso onde o céu não era este e o apelo da liberdade não se punha.
Afinal, o Homem Adâmico era «Para lá do Bem e do Mal». Nietzsche testou esse efeito e conseguiu provar que nem toda a consciência necessita de juízo de valor. Os anjos vieram mais tarde como querubins que guardam a parte oriental ainda do Paraíso e não se lhes conhecendo outras actividades de mor importância nestas entradas, eles velam, voam, como a Fénix combusta, mas nada lhes é dado ainda de efeito inalterável “estão ao serviço de…”. São “intermediários”.
Muitas vezes – e hoje que estamos no fim do Ano –as coisas tornam-se de uma eterna monotonia giratória, pois que ele se devolve aos nossos sonhos como cantigas de um circuito instável. Nós estamos efectivamente numa Terra com pouca sustentabilidade para podermos continuar aqui por muito mais tempo. O Ano que vem já deve ser a descontar para o «Êxodo» e nem que comamos as ervas amargas e o pão que o diabo amassou, parecemos aptos a recomeçar.
Como não somos a Fénix, não ardemos, nem fazemos arder. Estamos em formas mansas de atrasar a transformação radical, mas que seria bom não esquecermos da vista, pois que a saturação dos Invernos é como a saturação dos cadáveres: gera pestilência. Entre coisas que nos deviam aproximar e a distância do sorriso bom do Verão, vimos como as águas avançam mais que as labaredas e a humidade do ar seguramente será boa para batráquios daqui para a frente. Nada de gelar que estamos a aquecer, mas este melhoramento climatérico tem pouco de risonho, ele quase nos agride a reserva biológica de dispositivo automático.
Embora nem todas as plantas sejam acácias, o que arde deve fazer-nos pensar e o que nos inunda também. Não haver combustão não é suficiente para que salvemos o Mundo, nem as asas nos protegerão em caso de raios disparados, mas há algo que me intriga na grande marcha ambiental. Chegámos mais rápido do que julgáramos. Tão rápido que todas as esferas sonhadas e sabidas nos vêm agora à memória como possíveis esclarecimentos e tentativas de compreensão. A Terra é efectivamente e cada vez mais um planeta instável, onde a grande transformação se dá com alguma incerteza para o nosso permanecer. Vicissitudes de origem invulgar, abruptas, chegam-nos como tufões, os anjos devem andar chamuscados neste redil, e nem de nós por vezes dão conta, com o seu sistema de renovação radical.
Por vezes, podem ser desesperantes como o de Heine Muller, que se suicidou num 30 de Dezembro e escreveu o «Anjo do desespero», no qual acrescentou esta coisa tão bela e enigmática: «Depois do desaparecimento das mães o trauma do segundo nascimento e o que eu vi era mais do que eu podia suportar». Talvez que nascer segunda vez não seja afinal um bem, talvez que não suportemos essa forma de nós outra vez.
É certo que os anos passam, ou seja, que nós passamos pelo tempo, umas vezes tão indelevelmente que ele nos esquece. Parecemos abandonados da sua demolidora passagem, mas, depois, vimos que tal como a Sarça que estávamos sem nos consumirmos e sagramo-nos da sua luz estática. Depois tudo avança e desejamos descansar, um estranho sono que nos ajude pela mão das ervas daninhas a ficar sem a memória das coisas que fôramos. Quase nem podemos chorar! Há uma calcinação muito grande nos olhos que nos obrigam a manter abertos e que empurramos com quentes lágrimas pela vida que nos deram.
Por vezes era melhor saudarmos coisas mais simples, ter reservas, andar em outro chão… por vezes não aguentamos as “asas” como bem disse Baudelaire : “o poeta é semelhante ao princípio da altura …. exilado no chão em meio à corja impura … a asa de gigante impedem-no de voar”.
Sim, mas nunca de se gastar, de fazer de si a Fénix e deixar para Deus as labaredas sem chamas, como as línguas do Espírito Santo, que sendo luzes e em luz caem, permanecendo todas e como vozes, produzindo a não combustão.
A língua como um fenómeno imenso, os homens antigos ouviam sempre vozes… talvez haja um lado cerebral que os dispunha para isso… As vozes à medida que as sociedades se transformam vão tendo outras características. Esta nossa, mais visual, e já nada nos visita de forma apelativa, e com o tempo de tudo dizer, as vozes se foram. Nomear, ouvir, escutar, mas o cérebro tornou-se intolerante à solidão, o cérebro humano não ausculta e por isso não ardem as sarças nos locais de uma fogueira, que o lume aquece e os dias do últimos dias do Ano são frios.

7 Jan 2016

Union Pay | Transacções ilegais ascenderam a mais de mil milhões de patacas

Mais de mil milhões e três dezenas de casos. Continuam as transacções ilegais com recurso a Union Pay

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]volume das transacções ilegais com recurso a terminais portáteis da Union Pay International em Macau ascendeu a 1224 milhões de patacas em 2015, segundo dados facultados pela Polícia Judiciária (PJ) à agência Lusa. A verba diz respeito a 30 casos abertos pela PJ, dos quais 24 foram entregues ao Ministério Público (MP).
Em 2014, foram detectados mais casos (47), mas o montante envolvido nas transacções ilegais foi inferior (784 milhões de patacas). As operações em causa são ilegais porque são efectuadas em Macau através das máquinas POS da Union Pay China ou outras fornecidas por terceiros, o que faz com que a Union Pay International não receba a percentagem a que tem direito por a transacção ter sido realizada, de facto, fora da China continental.
Segundo dados facultados pela PJ, no âmbito dos 30 casos detectados ao longo de 2015, foram entregues 76 suspeitos (58 homens e 13 mulheres) ao MP, dos quais 13 são residentes de Macau, 62 do interior da China e um proveniente de Taiwan.
“Findo interrogatório no Ministério Público, os arguidos ficaram sujeitos a termo de identidade e residência”, indicou a PJ.
As transacções ilegais detectadas em 2015 traduziram-se em prejuízos para a Union Pay International de cerca de 2,29 milhões de patacas – contra prejuízos de 1,56 milhões de patacas em 2014, de acordo com os dados facultados à Lusa. Os 30 casos resultaram na apreensão de 71 máquinas POS (point of sale), indicou a PJ.
Ao contrário de 2014, os casos foram detectados em hotéis. “Não há informações quanto a casinos”, garantiu a PJ na resposta à Lusa.

Esquemas com sabedoria

Os esquemas com os cartões de débito da Union Pay foram apontados por analistas consultados pela Lusa como um dos factores para a primeira queda em cinco anos das receitas de jogo em termos anuais homólogos verificada em Junho de 2014 – cuja tendência não mais se inverteu – por contribuírem para fazer diminuir a liquidez de grande parte dos jogadores.
Questionada sobre diligências adicionais que têm sido tomadas para conter as transacções ilegais com as autoridades da China, a PJ referiu apenas que tem “um mecanismo de cooperação com o Ministério da Segurança”.
Em meados de Dezembro, a Autoridade Monetária de Macau (AMCM) anunciou um sistema de monitorização em tempo real para os cartões bancários emitidos na China, de modo a combater “as actividades financeiras ilegais transfronteiriças e o branqueamento de capitais”.
“As empresas comerciais/comerciantes a monitorizar em tempo real serão primeiro as de alto risco, localizadas perto dos casinos, consistindo, principalmente, em lojas de ‘joalharia’ e ‘relojoaria’, enquanto, num segundo momento, o sistema de monitorização será extensivo a outras de alto risco, onde sejam transaccionadas mercadorias de elevado valor”, referia uma nota da AMCM. “Tendo presente que o volume de negócios é relativamente elevado, os cartões China ‘UnionPay’ ficarão sujeitos à referida supervisão de monitorização em primeiro lugar”, acrescentava o supervisor bancário.
Este sistema de monitorização em tempo real tem como função “verificar a identidade dos portadores de cartões bancários emitidos na China, relativamente ao processo de consumo, bem como a confirmar a relação efectiva entre os cartões bancários e os seus titulares, salvaguardando, assim, os direitos e interesses legítimos dos titulares dos cartões, dos comerciantes e dos bancos”.

6 Jan 2016

Lei de Terras | Promessas de Lau Si Io caem em saco roto

Intervenientes na produção da Lei de Terras e investidores juram a pés juntos que Lau Si Io prometeu que não haveria “problemas” com a caducidade de terrenos

[dropcap style=’circle’]F[/dropcap]oi a 1 de Março de 2014 que a nova Lei de Terras entrou em vigor. Desde então, muita discordância tem causado, algo comum já que desde o primeiro projecto de alteração da lei – em 1980 mas só apresentado em 1993 – o desacordo foi também um dos pontos fortes. O caso do lote do Pearl Horizon – que já entrou em caducidade – e dos terrenos das zonas C e D dos Nam Van– que entram este ano – fizeram estalar o verniz e trouxeram à sociedade muitas perguntas sem resposta. As diferentes versões e a polémica com o diploma continuam.
“Esta é uma história muito mal contada. O Governo não quer assumir a culpa, claro que o [Secretário para os Transportes e Obras Públicas] Raimundo do Rosário não pode assumir uma culpa que é do seu antecessor. Foi Lau Si Io [ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas] que garantiu que isto [da caducidade dos terrenos] não seria um problema no futuro. Ele garantiu isto, por mais do que uma vez, nas reuniões com a [Primeira] Comissão Permanente da AL, na altura presidida pela deputada Kwan Tsui Hang”, começa por defender ao HM uma fonte interveniente no processo de elaboração da lei, que prefere manter o anonimato.
Durante as várias reuniões da Comissão responsável pela análise no diploma na especialidade, Lau Si Io terá apaziguado as preocupações levantadas pelos deputados, explicando “que iriam ser criadas cláusulas, ou leis, que protegessem os interessados”. Um garantia que nunca chegou a acontecer, especialmente com a saída do então Secretário.
A ideia de que haveria arestas a limar no futuro foi também defendida pelo deputado Leonel Alves, durante uma sessão plenária da Assembleia Legislativa (AL) no mês passado, onde o deputado se disse “enganado” por Lau Si Io.
“Perguntei qual iria ser a solução. [Lau Si Io] disse que, na altura, seria encontrada uma solução. Trabalho aqui há 31 anos, sempre segui o princípio da justiça. Quando os empréstimos são concedidos, creio que tem de haver uma solução razoável para isto. O Governo diz que, com base no artigo 48º [sobre a renovação de concessões provisórias], a porta está totalmente fechada. Fui enganado, pelo que tenho de pedir desculpa à população”, disse.
O deputado justificou ainda o seu voto a favor do diploma pois, defendeu, acreditou que o bom senso iria prevalecer nos casos em que os projectos e os empréstimos para o desenvolvimento das concessões estivessem já aprovados. Mas, “claro que com a entrada de Raimundo do Rosário nada seria feito, ele [o actual Secretário] não faz ideia do que aconteceu, do que foi dito”, apontou a fonte ao HM.
Apesar das dúvidas, a aprovação aconteceu apenas com o voto contra, do deputado Ng Kuok Cheong. “Claro que foi aprovada, claro que todos iriam votar a favor, tínhamos a segurança da única pessoa que nos podia dar: Lau Si Io. E percebemos a pressão imensa que vinha do Governo Central. Por isso é que se aprovou esta lei: pressão”, acrescenta a fonte do HM.

Braços de ferro

“A culpa vai morrer solteira. Raimundo do Rosário nada pode fazer perante uma situação que é reflexo de erros da governação anterior. (…) Este braço de ferro entre concessionárias e Governo irá para aos tribunais e arrastar-se-á. O Governo jamais assumirá que errou, porque na verdade erraram todos, sejam concessionárias ou Administração”, reforçou o advogado de uma das concessionárias, sublinhando mais vez mais “os favores e interesses” entre os agentes envolvidos.
Questionado pelo HM, Au Kam San, então membro da comissão responsável pela análise da Lei de Terras afirmou não se lembrar se Lau Si Io garantiu resolução para as concessões acordadas antes da revisão da lei.
“Não me lembro, acho que ele nunca disse que existia a possibilidade de se criarem outras lei ou regulamentos para funcionarem como complemento desta lei. Passaram muitos anos desde que se começou a discutir esta ideia, não se pensava no futuro. Lembro-me, sim, de Lau Si Io garantir que existiriam resoluções, por isso é que alguns deputados se dizem enganados. Na minha opinião a Lei de Terras já oferece soluções para todos os possíveis casos, por exemplo, o concurso público”, rematou.

Brincadeiras

Uma brincadeira entre amigos – Governo e investidores – e uma troca de favores “que agora pode correr mal”. É assim que o advogado de defesa de alguns investidores classifica a situação que se vive actualmente.
“Ninguém pode negar os interesses claros que existiram nas trocas de terrenos, na cedência dos mesmos. É inegável. E agora, com o novo Secretário – se o mesmo aguentar a pressão – a brincadeira vai correr mal para quem nunca quis construir. Os terrenos valem dinheiro, valem muito dinheiro. É de dinheiro que se fala aqui”, apontou ao HM, através de um email identificado.
A questão das promessas de encontrar uma solução não se limitou à revisão da Lei de Terras. Anteriormente questionada pelo nosso jornal, a direcção da concessionária Nam Van afirmou que não foram construídos os projectos idealizados em locais que ainda hoje permanecem vazios, porque os mesmos nunca foram aprovados pelo Governo. O administrador Jorge Neto Valente indicou ainda que as “coisas se foram arrastando” e que nada aconteceu.
“A Nam Van não ganhou nada com a troca [de terrenos nas zonas actuais do casino Wynn pela zonas C e D], deixou apenas de construir. O Governo pediu à Nam Van para autorizar [a desistência], com a promessa de que o que estava previsto construir na zona B iria passar para as zonas C e D”, reforçou Neto Valente ao HM, adiantando que, por isso, a empresa não “se preocupou porque mesmo que não se fizesse a construção ali, o Governo iria, mais tarde, certamente arranjar uma solução”. “Tudo isto está escrito”, frisou Neto Valente, há cerca de três meses.
Investidores de Hong Kong, ligados aos terrenos das zonas C e D, contactados pelo HM, garantiram que apresentaram “projectos para as áreas em causa” que “nunca foram aprovados”. “É muito difícil para as concessionárias, e por isso para nós, dizer o que está certo ou errado. A única coisa que posso dizer é que, no nosso caso, tentámos, demos o nosso melhor para fazer um trabalho completo, cumprindo as obrigações”, explicou um representante de uma empresa investidora.
Mas a verdade, diz, é que é “muito fácil determinar as falhas seguindo os factos”. “De 1999 a 2006 o Governo nada quis fazer, nem tão pouco saber. Em 2006 o Governo começou a falar de um ‘grande plano’, condicionado por várias coisas. (…) Vamos culpar as concessionárias?”, indagou.

EDITORIAL

Por Carlos Morais José

[dropcap style=’circle’]Q[/dropcap]uando se lê nas entrelinhas deste caso, não será fácil especular sobre o que estará por detrás do imbróglio. Algo mais que ultrapasse a ambição natural dos intervenientes. Esse algo mais, arriscamos, serão as intenções da República Popular da China e do Governo Central.
Pensem comigo. As terras são o mais precioso bem de Macau. Que o diga a ex-administração portuguesa. Naturalmente, a sua gestão preocupará quem, ao longe, observa o que se vai passando na RAEM, com o dever de supervisionar o que necessita de ser supervisionado.
Ora, quando da discussão da Lei de Terras, dizem-nos, Lau Si Io terá referido existir uma grande pressão por parte do Governo Central para a sua rápida aprovação. Na altura, os deputados, também ligados a interesses, terão aquiescido, perante a promessa de contornar os problemas no futuro. Mas Lau foi à sua vida e Raimundo do Rosário em nada se comprometeu.
O que falta então na lei é o que o sempre acutilante Fong Chi Keong definiu com desassombro e sagacidade: uma “porta nas traseiras” que permita aos senhores da oligarquia entrar e sair a seu bel-prazer e de acordo com os seus interesses.
O que parece ter acontecido é que Pequim lhes deu a volta e de que maneira. Leonel Alves sentiu-se, pela primeira vez, “enganado”. Com a saída de Lau, as promessas da “porta das traseiras” serão naturalmente quebradas.
Será que foi na Lei de Terras, cuja importância para a RAEM é incontornável, que Pequim deu o primeiro sinal de que um determinado reino vai acabar?

6 Jan 2016

Imobiliário | Ho Ion Sang quer saber razão para extinção de grupo de trabalho

O deputado interroga-se sobre a decisão “repentina”. E sobre quem vai agora gerir o assunto

[dropcap style=’circle’]H[/dropcap]o Ion Sang quer que o Governo explique por que procedeu à extinção do Grupo de Trabalho para a Promoção de Desenvolvimento Sustentável do Mercado Imobiliário. O deputado mostrou-se preocupado com o facto do mercado imobiliário ficar agora sem um responsável a longo prazo.
Já na passada segunda-feira o Chefe do Executivo havia publicado um despacho onde decidiu extinguir o grupo, criado em 2010. Ao Jornal Ou Mun, Ho Ion Sang disse considerar que a decisão foi “repentina”, acrescentando que não foram dadas justificações.
O prazo de validade do grupo estava prevista para Junho deste ano, pelo que teria ainda mais de meio ano de vida. Ao mesmo jornal, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) afirmou que o grupo já lidou com uma série de assuntos, incluindo a elaboração do Regime Jurídico da Promessa de Transmissão de Edifícios em Construção, da Lei de Actividade de Mediação Imobiliária, ou da Lei do Imposto do Selo Especial sobre a Transmissão de Bens Imóveis Destinados a Habitação. No futuro, diz, não vai existir um departamento que se responsabilize especialmente sobre os assuntos referentes ao mercado imobiliário.
A DSSOPT frisou que, quando for necessário, o Governo vai elaborar medidas ou políticas de acordo com a situação do mercado. Contudo, Ho Ion Sang, também presidente da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Terras de Concessões Públicas da Assembleia Legislativa (AL), considera que o mercado imobiliário envolve as pastas da Economia e Finanças, Solos e Obras Públicas e Justiça. A inexistência de um grupo especial pode, segundo Ho Ion Sang, dar aso a que cada organismo funcione à sua maneira.
“O Governo deve explicar e pensar em trabalhos posteriores. Com a extinção do grupo de trabalho e a falta de um mecanismo, quem é que fica responsável pelo mercado imobiliário? O Chefe do Executivo? É impossível a Autoridade Monetária de Macau (AMCM) supervisionar todo o mercado, e a Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) apenas faz coordenação”, apontou.

6 Jan 2016

Pereira Coutinho denuncia lacunas na legislação que facilitam o trabalho ilegal

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]deputado José Pereira Coutinho voltou a interpelar o Governo sobre alegadas “lacunas” existentes no regulamento sobre a proibição do trabalho ilegal, depois de ter, em Maio do ano passado, questionado a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) sobre o assunto.
Pereira Coutinho pede mudanças ao regulamento na parte que “permite aos não residentes que ocupem postos de trabalho cujas funções podem ser facilmente exercidas pelos jovens de Macau”.
O deputado e presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública (ATFPM) pede ainda que as entidades fiscalizadoras realizem uma maior vigilância e fiscalização “aos trabalhadores não residentes que são contratados ao abrigo deste regulamento administrativo”, por forma a exigir que estes trabalhadores que “venham a ser autorizados a trabalhar temporariamente em Macau estejam devidamente identificados, a fim de eliminar os abusos com identificação rudimentar e simplista dos mesmos”.
O deputado fala de “lacunas existentes na actual legislação que permite aos trabalhadores estrangeiros exercerem funções sem prévia autorização oficial, prejudicando os trabalhadores locais habilitados a exercerem as mesmas funções”.
Pereira Coutinho deu como exemplo a realização de uma exposição de máquinas, equipamentos e concessões de Jogo realizada no salão de convenções e exposições de uma das concessionárias de Jogo na Taipa, onde “estariam a trabalhar um elevado número de jovens, a maioria proveniente de Hong Kong a exercer funções simples de registos de dados ou contabilização genérica de equipamentos, cujos trabalhos poderiam ser exercidos por trabalhadores locais”.
Para além disso, diz, no local de montagem do palco e dos stands a maioria dos trabalhadores não residentes estavam identificados de uma forma rudimentar e simplista, sem a designação das funções para os quais foram autorizados a trabalhar temporariamente no local, queixa-se o deputado.

6 Jan 2016