Reportagem | A ascensão de Xi no século de afirmação da China

Por João Pimenta, jornalista da agência Lusa

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]unto à entrada do Wujing Yiyuan, um dos maiores hospitais públicos de Pequim, uma faixa com oito metros de comprimento e dois de altura dita: “Ouçam as ordens do Partido Comunista, sigam o Presidente Xi”

Desde que assumiu a liderança da China, em 2013, Xi Jinping tornou-se o centro da política chinesa e é hoje considerado um dos líderes mais fortes da história recente do país, comparável ao fundador da República Popular, Mao Zedong.

No mês passado, numa única sessão do legislativo chinês, Xi conseguiu abolir o limite de mandatos para o seu cargo, criar um organismo com poder equivalente ao executivo para supervisionar a aplicação das suas políticas e promover aliados a posições chave do regime.

“É enorme; é histórico”, afirma à agência Lusa Xie Yanmei, analista de política chinesa do centro de investigação Gavekal, com sede em Hong Kong. “Requer grande margem de manobra e muito capital político”, diz.

Xi Jinping anunciou já o início de uma “nova era” para a China, com dois objectivos: construir uma “sociedade moderadamente próspera”, até 2035, e depois firmar a posição do país como grande potência, até 2050.

“Ele tem uma visão para o país e quer usar os meios institucionais para cumprir essa visão”, explica Xie Yanmei. Entre aqueles “meios institucionais”, destaca-se a criação da Comissão Nacional de Supervisão, que acumula poderes comparados aos do executivo, legislativo ou judicial, e abrange toda a função pública.

Trata-se de uma “organização política e não de aplicação da lei”, que “pode ser potencialmente transformativa”, defende Xie. “A Comissão estará encarregue de garantir que as decisões do partido são rigorosamente implementadas”, através do envio de inspectores para as empresas estatais e diferentes organismos do Governo, afirma.

Trata-se de uma forma de institucionalizar a mais ampla e persistente campanha anticorrupção na história da China comunista, lançada por Xi após ascender ao poder, e que puniu já mais de um milhão e meio de funcionários do Partido Comunista Chinês (PCC).

Grandeza recuperada

Além de combater a corrupção, a campanha tem tido como propósito reforçar o controlo ideológico e afastar rivais políticos, com as acusações a altos quadros do regime a incluírem frequentemente “excesso de ambição política” ou “conspiração”.

David Kelly, director da unidade de investigação China Policy, de Pequim, defende, no entanto, que é no plano internacional que Xi quer deixar o seu “grande legado”. “A China vai trazer para o mundo moderno a sua sabedoria milenar e recuperar a grandeza de outrora. Vai oferecer ao mundo uma solução chinesa. E isto vai ser atribuído a Xi”, aponta o analista, sobre a nova narrativa do regime.

A “solução chinesa” materializa-se na “Nova Rota da Seda”, um gigantesco plano de infraestruturas lançado por Xi e avaliado em 900 mil milhões de dólares, visando reactivar as antigas vias comerciais entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e sudeste Asiático.

A proposta chinesa surge numa altura em que os Estados Unidos de Donald Trump rasgam compromissos internacionais sobre o clima, comércio ou migração.

“Xi projecta a imagem de um líder no comando, com uma visão estratégica de longo prazo e rodeado de uma equipa capaz”, afirma Xie Yanmei. “É um contraste nítido com a imagem agora projectada por Washington”, nota.

Na faixa junto à entrada do Wujing Yiyuan, Xi Jinping está com as duas mãos juntas, palma contra palma, à altura do peito. Veste um uniforme militar verde-oliva. Atrás, a Grande Muralha, um dos símbolos mais expressivos da China, serpenteia por um vasto terreno montanhoso.

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