Depois das Eleições Legislativas em Portugal

[dropcap style=’circle’]1[/dropcap]Chamados às urnas os portugueses elegeram, a 4 de Outubro, os seus representantes no Parlamento com base nos quais se formará o governo que dirigirá os nossos destinos colectivos, nos próximos quatro anos.
As propostas submetidas a escrutínio eram basicamente duas: o afastamento do governo de direita e o fim da política de austeridade em nome de um crescimento imediato sustentado na Fé; a prossecução de um novo mandato focado em potenciar os sacrifícios pedidos aos portugueses em razão dos compromissos com a Troika e a devolução gradual dos rendimentos que foi imperativo captar para o reequilíbrio orçamental e o pagamento do dinheiro pedido emprestado.
A escolha dos portugueses foi clara. Ganhou a Coligação Portugal à Frente com 38,55% do total dos escrutínios, ficando o PS em segundo lugar com 32,88% dos votos, seguindo-se o Bloco de Esquerda e o PCP (sob a capa da CDU) com 10,22% e 8,27%, respectivamente. Face ao que haviam sido as balizas propostas para o julgamento dos eleitores – maioria significativa pedida pela Coligação, maioria absoluta e derrota da direita pedida pelo PS – a vontade dos eleitores expressa nas urnas foi transparente: a Coligação tem agora um novo mandato como força mais votada para constituir governo, o PS foi derrotado nos seus marcos eleitorais e tem um responsável que se chama António Costa.
Diferentemente do que expressaram os resultados eleitorais, a esquerda radical procurou, nos momentos seguintes, extrair uma outra leitura: que a Coligação apesar de ter conquistado 104 deputados no Parlamento e o PS ter ficado apenas com 85, não teria legitimidade para governar mas sim a esquerda que passara a deter uma maioria negativa. Ou seja o que valera para os governos de Mário Soares, António Guterres e José Sócrates (que governaram em minoria) não valeria para o governo de Passos Coelho, porque as esquerdas odeiam Passos Coelho.
Quer dizer, a Constituição valerá quando joga nos propósitos das esquerdas mas nada vale quando favorece o centro-direita. Catarina Martins – a teatral líder do Bloco de Esquerda e do espaço político BE-CDU – reivindicava-se dessa leitura messiânica às primeiras horas da noite eleitoral, levando o Partido Comunista a reboque.
2. Não se pode desconhecer, contudo, que o quadro global de governabilidade se modificou, significativamente, com a composição da Assembleia da República. Com uma minoria aritmética de votos no Parlamento, o centro-direita terá de encontrar um novo estilo de governabilidade, de aplicação do programa eleitoral que submeteu aos portugueses e que recolheu o aplauso de 38% dos eleitores votantes, isto é dois milhões e sessenta e sete mil eleitores.
Terá que saber negociar com a esquerda moderada, criando sinergias e ultrapassando fossos que não são tão grandes quanto isso (como aqui escrevi em crónica anterior) em matéria de programa económico e alinhamento ao Tratado Orçamental, às directivas da zona Euro. Os sinais que António Costa deu, na noite eleitoral, são promissores e a menos que o PS obreirista lhe imponha uma linha de convergência com as esquerdas comunistas, a negociação é possível e será, apesar de difícil, concretizável. Teremos o programa de governo aprovado no Parlamento e muito provavelmente o Orçamento com a abstenção do PS.
É esse o quadro que Passos Coelho irá colocar ao Presidente da República e não tenho dúvidas que Cavaco Silva irá criar condições para que o governo da Coligação, legitimada por uma vantagem de seis pontos percentuais sobre o segundo concorrente, o PS, possa governar em concertação permanente.
Espera-se que com a moderação, visão estratégica e discernimento que revelou na condução da campanha eleitoral – e cujo veredicto é em larga medida um vitória pessoal – Passos Coelho constitua um governo expedito, pragmático, formado por políticos profissionais, melhor ajustado aos dossiers sociais e que conduza o país, sustentado em bases seguras, a um ciclo de crescimento e progresso.
O recuo do apoio nos eleitorados urbanos de Lisboa, Porto e Coimbra, com perda de 7, 4 e 2 deputados para o conjunto da Coligação, deve merecer uma atenção particular das directorias dos dois partidos e o procurar de um novo contrato de governabilidade com estes eleitores, onde se alicerça a base eleitoral do Partido Social-Democrata e o seu futuro.
3. As eleições mostraram duas coisas complementares. A primeira que as sondagens revelaram, com relativa proximidade, a sensibilidade aprofundada do país ao contrário do que afirmavam as esquerdas. A segunda que a opinião veiculada pela comunicação social, pelas televisões e pelas comunidades sociais em nada expressaram o sentir mediano dos portugueses. Elas foram, sobretudo, instrumentos de propaganda – logo sectários e parciais – de profissionais de marketing político, contratados pelos partidos da esquerda ou profissionais que ecoam agendas político-partidárias em vez de cumprirem a sua missão de informar, com isenção e imparcialidade. E se esse foi um efeito perverso em outras eleições mostrou-se com maior gravidade, nestas. Como alguém escrevia, a maioria silenciosa dos eleitores votou e escolheu o novo governo de Portugal mas ela não teve eco na informação que nos foi prestada. O que as eleições provaram é que esse jogo do engano e da mentira não vinga e que os eleitores, no fim, sabem muito bem fazer um juízo convergente aos interesses dos país.
4. No momento que escrevo esta crónica não são conhecidos os resultados dos círculos eleitorais da Europa e de Fora da Europa. São 4 lugares de deputados que estão em causa e que a confirmar-se a tendência nacional darão 2 a 3 deputados à Coligação Portugal a Frente e 1 ao PS. Esse é o meu prognóstico. Se assim for, a distribuição de lugares no Parlamento passará para 107 deputados para a Coligação, 86 para o PS, mantendo-se a restante distribuição pelo Bloco de Esquerda, a CDU e mais um deputado pelo PAN. Não creio que os eleitores do circulo Fora da Europa tenham acolhido os manobrismos rasteiros de quem, não se conseguindo fazer eleger nos principais partidos, escolheu o expediente de se propor como candidato por um partido que ninguém conhece e que captou 0.3% dos votos expressos, para se alcandorar aos ombros de quem controla politicamente no microcosmos de Macau, a um lugar de representação nacional. Seria um absurdo, uma mistificação e a violação de 40 anos de história da democracia portuguesa. As reclamações que intenta apresentar terão o resultado que espera sempre os populistas e os demagogos: o fracasso e a gargalhada.

Subscrever
Notifique-me de
guest
1 Comentário
Mais Antigo
Mais Recente Mais Votado
Inline Feedbacks
Ver todos os comentários