GPDP | Activistas dizem-se alvos de recolha de dados pela PJ

A possibilidade da PJ ter acesso a dados sensíveis e poder transferi-los para fora deixa membros associativos de pé atrás. PJ diz que é tudo em nome da prevenção do crime

[dropcap style=’circle’]L[/dropcap]íderes de associações acreditam ser alguns dos alvos da PJ no que concerne ao acesso a dados pessoais e sensíveis, recentemente autorizados pelo Gabinete de Protecção dos Dados Pessoais (GPDP). O relatório de 2014 do organismo indica que a Polícia Judiciária (PJ) pediu à Direcção dos Serviços de Identificação (DSI) dados pessoais de “titulares de órgãos associativos”. A notícia foi ontem avançada pelo jornal Ponto Final, que cita o documento, onde se lê que a DSI forneceu os dados para que a PJ possa “cumprir as suas atribuições legais”.
Os dados incluem nome, tipo e número de documento de identificação e cargo, mas o GPDP admite que estão envolvidos “dados sensíveis”. São esses os relativos “à visão do mundo, convicção política, associação política, relação sindical ou convicção religiosa”. Os dados podem ainda ser transferidos para fora de Macau, já que o GPDP deu autorização para tal.
Como é que a DSI tem acesso à informação destes “dados sensíveis”, o relatório não explica. O caso surpreende alguns membros de associações, como Scott Chiang, presidente da Novo Macau.
“Uau, quem me dera ver o meu ficheiro”, começa por ironizar o activista. “Se o relatório for verdadeiro, então temos de perguntar como e porque é que eles [DSI] têm esta informação tão detalhada de diferentes pessoas e porque é que eles dão à PJ autorização para ter acesso a ele. E também, por que precisaria a PJ autorização para enviar os dados para fora de Macau?”
Jason Chao, vice-presidente da Novo Macau e membro do grupo Macau Consciência, acredita ser um dos alvos e diz mesmo não entender como é que aquilo que considera ser uma violação da lei pode acontecer.
“Entendo que há coisas de questão de segurança, em que tem de se saber os dados, mas ir à convicção política é ir longe demais”, começa por dizer.
Opinião igual à de Lei Kuok Cheong, vice-director da Associação Juventude Dinâmica, que diz que o grupo já tem sofrido com investigações da PJ desde 2010, devido às críticas ao Governo. “A sede da associação foi fundada na minha casa, na zona norte, patrulhada propositadamente pela PSP, como confirmou um amigo da autoridade.”
O activista acha razoável se os dados forem para investigação de crimes, mas não se for para supervisionar e tornar Macau “uma espécie de Coreia do Norte ou China continental”.

DSI dita?

Cloee Chao, directora da Associação dos Direitos dos Funcionários de Jogo, assegurou também ao HM que acredita ser um dos alvos desta transmissão de dados, já que “sentiu pressão” quando foi acusada de desobediência qualificada pela PJ, depois de uma manifestação em Agosto.
A responsável conta mesmo que foi “já impedida pela DSI” de criar uma associação denominada “Cuidado Amoroso a Macau”, porque os estatutos da associação “tinham conteúdo político”, logo acabou por ser não foi aprovada. “Acho estranho que a DSI agora tenha esta função”, diz, acrescentando que, apesar do Governo estar a falar mais de privacidade “é o mesmo Executivo que está a destruir este [direito]”.
Scott Chiang diz não estar preocupado consigo próprio – uma vez que a sua actividade política é pública – mas admite que a acção envia uma mensagem de pressão e desencorajamento para os cidadãos que querem expressar a sua voz. Da mesma opinião partilha o director da Associação de Mútuo Auxílio dos Operários de Macau, Iam Weng Hong, que disse não se importar que a PJ tenha pedido o acesso aos seus dados, porque “tudo o que faz é do conhecimento público”. Mas, quanto à transferência de dados, as coisas já não lhe agradam e considera isso um problema.
“Creio que tanto a nossa associação como outras associações políticas e de operários não concordam, porque mesmo que os meus dados pessoais estejam limpos, não sabemos qual é o objectivo das transferências de dados para outros países, parece uma traição à privacidade de outrem e isso não é bom.”
Só Lou Sheng Hua, vice-presidente da assembleia geral da Associação de Nova Visão de Macau, diz ser aceitável o comportamento das autoridades.

“Dentro da lei”

Segundo o documento, que indica que a data desta autorização é de Fevereiro de 2014, está tudo dentro da lei. No relatório, o GPDP assegura que os membros de associações sujeitos a este escrutínio teriam de ser informados e que as autoridades só podem usar estas informações “em casos concretos”, garantindo a segurança dos titulares. Jason Chao duvida.
“Não acredito que a PJ não abuse da transferência de dados. E isto não vai ter apenas um impacto nas nossas acções, mas em toda a sociedade”, diz, admitindo que poderá pedir informações sobre este assunto, ainda que não tenha como provar que poderá ser um dos alvos. O activista diz ainda que é “ridículo” que os dados possam ser transferidos, algo “excessivo” para Lei Kuok Cheong.
Segundo a PJ, que confirma ao HM a veracidade do pedido, a razão para se terem pedido estas informações “é para combater e prevenir o crime e assistir as autoridades judiciais”. Sobre a transferência de dados para fora de Macau, a PJ indica que “não pode dizer quais os locais devido ao segredo judicial”.

Subscrever
Notifique-me de
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Ver todos os comentários