Agitpop?

[dropcap style=’circle’]”[/dropcap]Devemos estar mais vigilantes… e colocar nas nossas mentes a necessidade de prontidão para combate.” Esta é uma das várias afirmações que o General Cai Yingting, Comandante da Área Militar de Nanquim do Exército Popular de Libertação (EPL) assina em conjunto com o seu comissário político Geral Zheng Weiping num artigo de 5,000 palavras do Diário de Povo, onde pedem ainda que “o Exército fortaleça a suas capacidades de guerra no mar e o estado geral de prontidão para combate”, alertando para o risco de “estados de guerra à porta de casa”.
Segundo estes dois generais,”aconteceram mudanças profundas nas disputas territoriais nas periferias do país, além de clivagens étnicas e religiosas. As tensões e os pontos quentes estão também em crescimento e o risco de caos e Guerra à nossa porta aumentou.”
Um texto, dizem os autores, “destinado a aumentar a consciência no EPL e no público para necessidade premente de um sistema de defesa aperfeiçoado e preparado para uma luta prolongada pela integridade territorial chinesa.”
O artigo destes dois generais é referenciado no South China Morning Post onde o observador militar Liang Guoliang afirma considerar “um acto muito raro” ver um comandante e um comissário político repartirem um artigo sobre estratégia de guerra.
Raro e, seguramente, preocupante. Não por serem dois, mas por um deles ser comissário político. Porque uma coisa é ter um militar a querer mais bombas, outra é ter o lado político a alinhar pelo mesmo discurso. E “uma luta prolongada pela integridade territorial chinesa”? Que quer isto dizer?

A China tem medo de ser invadida por quem? Pelos japoneses a tentarem equilibrar as contas? Pelos Filipinos que mal conseguem suster-se? Ou será que apontam a ameaças mais distantes?… Ou mais próximas… Ou nada disso?…
Naturalmente, não existirá nada pior para um militar do que uma carreira sem uma guerrinha que seja para ganhar umas medalhas a sério. Nada pior para um militar do que ter tantos brinquedos novos e só poder utilizá-los em exercícios. É como “coiso” e depois não conseguir “coiso”. Mas quando vemos o poder político envolvido ficamos preocupados. Pode não ser mais do que uma manifestação de força, ou uma manifestação de gases, no sentido arcaico de demonstração de poder dos Estados através do tamanho do seu exército. A cena fálica…. mas isto não afecta apenas chineses – faz parte da epidemia mundial de valores que consideramos como certos.
Ao mesmo tempo, a China prepara-se para celebrar em grande o 70º aniversário do final da II Guerra Mundial com um formidável desfile militar marcado para Pequim no dia 3 de Setembro. Dizem que as tropas há três meses não param de exercitar-se. Quais os convites endereçados a chefes de estado estrangeiros permanece incerto mas já se lê aqui e ali que várias potências ocidentais poderão não estar presentes e, muito menos, o conservador primeiro ministro japonês que terá sido convidado.
A ser assim, é pena. É pena que o mundo não consiga reunir-se para celebrar o fim de uma guerra, é pena que o fim de uma guerra seja celebrado com os preparativos para uma próxima, sabe-se lá onde ou porquê.
Claro que do outro lado temos uma Europa autofágica, cada vez a funcionar menos em bloco, ainda ignorante do que a crise grega significará, de facto, para a Comunidade, ameaçada pelas migrações do norte de África, pela tentativa de dissensão da Inglaterra e pelo terrorismo, o que constituem motivos suficientemente encorajadores para um realinhamento de forças no xadrez internacional. Mas é apenas isso, China? 7715P14T1
Seja qual for a razão, este toque a reunir da China “arautado” por estes dois generais no período conturbado que se vive, apenas serve para adensar climas e a consciência dos cidadãos, por muito preocupados que os dois generais estejam com a segurança. Esta chamada às armas pode apenas criar engulhos na relação da China com o resto do mundo e surge no sentido inverso do que os povos por todo o mundo clamam, ou seja menos armas, menos tensão, menos demonstrações de força.
Na minha modesta opinião de observador, a China tem algo a superar: A China tem de livrar-se do complexo de inferioridade. Em primeiro lugar porque não lhe dá saúde, depois porque às vezes transmuta-se em actos típicos de um complexo de superioridade com tons pouco garridos. A China tem de acreditar mais nela, e tem todas as razões para isso, no poder da sua cultura, da sua capacidade de relacionamento com outros povos, da sua sabedoria. Este complexo de superioridade manifesta-se, por exemplo, nesta necessidade de mostrar os brinquedos.
Mas convenhamos: A China levou nas trombas do mundo. Repetidas vezes. De vários lados. Obrigaram-nos a drogarem-se, invadiram-nos, partiram-lhes a casa, até lhes mudaram a forma de vestir… Foram ao fundo, emergiram. Estão num caminho completamente novo. Enfim… A China é como aquele puto que todos tínhamos na escola, a mula de carga, o tolo sempre alvo de “mimos” e “piropos”. Só que o puto cresceu, o “geek” ficou rico e os “bullies” batem-lhe à porta, sorridentes – agora querem quotas de mercado. Eu também me armava em bom. Honestamente… dá vontade. Mas temos de desmultiplicar. Todos. Temos de parar de mostrar a pilinha uns aos outros ou não vamos a lado nenhum. Cuidar da Terra e da nossa vida requer união e concentração absolutas. Requer acordos internacionais vastos, boas relações. Se continuamos a perder tempo não vamos lá.
O mundo pede uma China moderna e construtiva como tem vindo dando mostras que pode ser. Por isso, prefiro acreditar que estas ejaculações de militares frustrados, que não contribuem nada para o sossego das gentes, nem para qualquer formulação de harmonia ou progresso, sejam apenas ruído ou, pelo menos, agit-pop.

MÚSICAS DA SEMANA
Agitpop – “Stop Drop and Roll”
Yoko Ono – “Give Peace A Chance (Remix) 2005”
… Mas nada muda since 1969.
Aprecie a semana, caro leitor. É o que nos resta.

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